Acórdão nº 1551/09.7BELRA de Tribunal Central Administrativo Sul, 11-01-2023

Data de Julgamento11 Janeiro 2023
Ano2023
Número Acordão1551/09.7BELRA
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
Acordam, em conferência, os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul


I - RELATÓRIO


Á. M. , ora recorrente, inconformado com a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Leiria que julgou improcedente a oposição à execução fiscal n.º ….683 e apensos, por dívidas de 2006 referentes a IVA, IRC e juros, no montante de € 104 998,40, em que é devedora originária a AM.. – M. I. U., Lda, formulando, para o efeito, as seguintes conclusões:

«A AM.. – M. I. U., Lda. doravante referida como AM.. foi constituída em 23.2.2001 com a atividade de “montagem e manutenção de instalações elétricas e automatismos”, tendo executado como subempreiteiro, a parte elétrica de obras de grande dimensão.

O relacionamento com os empreiteiros, era desfavorável à AM.., uma vez que estes, não preparavam atempadamente as obras para a parte elétrica, com sobrecarga nos custos de instalação que eram suportados pela AM...

Por outro lado os pagamentos por parte dos empreiteiros, eram quase sempre tardios, sendo raros os casos em que eram cumpridos na data do vencimento, criando graves problemas de tesouraria.

A posição do subempreiteiro, como era o caso da AM.., é extremamente delicada, uma vez que se fizesse exigências, não era admitido pelo empreiteiro nas obras seguintes.

A empresa poderia ter tido, mesmo assim, condições para se manter em atividade, não fora a grave crise que se instalou na economia em geral e no sector da construção civil em particular.

No final de 2006 a AM.. não tinha qualquer obra para exercer nela a sua atividade e não dispunha de capacidade financeira para solver as dívidas fiscais e à segurança social.

A empresa nunca possuiu património, quer imobiliário, quer mobiliário com exceção de pequenas máquinas e ferramentas, como rebarbadoras, berbequins, aparafusadoras, alicates e chaves diversas.

A data do encerramento da atividade todo o património da empresa foi guardado num armazém situado próximo da residência do oponente onde ainda hoje se encontra.

A gestão do oponente foi sempre diligente e criteriosa, e, embora não tivesse conhecimentos académicos em gestão, tomou sempre as decisões que se lhe afiguravam as mais adequadas.

O oponente não alienou qualquer património, considerando que a empresa nunca possuiu bens imóveis e o imobilizado não era de valor significativo,

A culpa a ilidir é a da dissipação do património, de acordo com a jurisprudência comummente aceite. Ora, a empresa não alienou qualquer património, pelo que é impossível, alguém ser responsável por uma alienação de património que inexistiu.

A douta decisão recorrida não fez a apreciação correcta das invocadas irregularidades da citação uma vez que as mesmas têm a ver com as ilegalidades cometidas no procedimento de reversão, designadamente, não se conhecem as diligências efectuadas para concluir da inexistência de bens referida na citação.

A douta decisão recorrida, ao considerar como provado o fundamento da Autoridade Tributária para a reversão, ser a inexistência de bens penhoráveis, dando igualmente como provado o facto da existência de bens, não poderia concluir pela improcedência da acção, pelo que viola os nºs 2 e 3 do artºs 23º e 24º nº 1 alínea b) da LGT.

Os factos provados são contraditório e não podem conviver ambos como provados, uma vez que, se se verifica a inexistência de bens, não pode considerar-se provada a existência de bens, mesmo que de valor diminuto.

Não ficou definido na douta decisão recorrida o que se entende por valor diminuto das ferramentas, nem as normas ínsitas nos nºs 2 e 3 do artigo 23º da LGT faz qualquer alusão a qualquer limite de valor dos bens penhoráveis.

A decisão recorrida está em desconformidade com o direito positivo, uma vez que sabendo da existência de património penhorável da devedora originária, entendeu que sendo de valor diminuto, se verificava a inexistência de bens penhoráveis.

A douta decisão recorrida, no tocante ao invocado benefício da excussão volta a cometer erro de interpretação do direito positivo, ao assentar no fundamento de que não é necessária a venda dos bens da devedora originária bastando que o valor dos bens seja notoriamente inferior ao valor da dívida exequenda.

Na motivação utiliza conceitos vagos como “… valor dos bens penhorados seja notoriamente inferior …”

A douta decisão não fez a interpretação correta do direito uma vez que não corresponde à interpretação autêntica que emana da Lei, e por esse facto a douta sentença recorrida é ilegal por violação dos nºs 2 e 3 do artigo 23º da LGT e do nº 2 do artigo 153º do CPPT.

A decisão recorrida é ininteligível e carece de fundamentação clara, precisa, suficiente e congruente, pois dá como provada a existência de bens no património da devedora e dá como assente que não ficou provado a existência de património.

A douta sentença recorrida refere que a lei responsabiliza subsidiariamente os gerentes quando o património da sociedade se tornou insuficiente por culpa sua, mas o que ficou provado é que o património nunca foi suficiente para pagar as dívidas fiscais, como foi considerado provado na sentença, considerando-o de diminuto valor.

A douta decisão recorrida está em desconformidade com a norma ínsita na alínea b) do nº1 do artigo 24º da LGT, ao considerar que deve atender-se às circunstâncias do caso concreto, pois a gestão das sociedades tem especificidades próprias decorrentes da atividade, conjuntura económica que não se medem por padrões abstractos, quando a interpretação da norma vai no sentido de apurar a culpa, exclusivamente, quanto à dissipação de património.

Ficou provado que o oponente enquanto gerente não alienou bens do património da sociedade e que todo se encontra num armazém junto à residência daquele.

A culpa do oponente não pode assentar na boa ou má gestão que tenha tido na cobrança das dívidas, nem na existência ou não de acções para realizar as receitas, mas só pode ser responsabilizado subsidiariamente pela culpa na dissipação de património, que inexistiu in casu, pelo que a douta decisão é ilegal por violação da alínea b) do nº 1 do artigo 24º da LGT e encontra-se em desconformidade com a corrente jurisprudencial.

A fundamentação da sentença recorrida assenta na culpa havida na gestão do oponente enquanto gerente; A que emana da Lei não tem a ver com a boa ou má gestão da sociedade com os erros ou com os bons negócios, mas tão só, com a culpa do gerente ou administrador na dissipação de património, que neste caso não se verificou.

A devedora originária nunca teve outros bens, além dos que se encontram guardados em armazém junto à residência do oponente, como provado na audiência de julgamento.

A culpa dos responsáveis subsidiários não pode ser aferida como se pretende na douta decisão recorrida, uma vez que o oponente e gerente da sociedade não era um especialista em gestão, é tão só um especialista em montagens elétricas.

Mesmo que se entendesse como vertido na douta sentença sobre a culpa assente em critérios de gestão, dir-se-à que também inexistiu este tipo de culpa.

Os grandes empreiteiros é que impunham as suas regras, e como a AM.. dependia deles, intentar acções para a cobrança mais rápida das dívidas seria um suicídio empresarial imediato e um péssimo ato de gestão.

Cabia à AT proceder à penhora de todos os bens da sociedade o que não fez até à presente data.

O património da devedora originária nunca foi suficiente para pagamento das dívidas fiscais e o oponente não alienou qualquer património que inviabilizasse a cobrança dos impostos da devedora originária, guardando-o em lugar seguro e à disposição dos credores institucionais.

Pelo que se lhe afigura que não lhe pode ser imputada culpa por dissipação de património.

Nestes termos e nos demais de direito, sempre com o mui douto suprimento de V.Exªs deve o presente recurso ser julgado procedente, por provado, determinando a anulação da decisão recorrida.»


*


A Recorrida não apresentou contra-alegações.

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O Digno Magistrado do Ministério Público, junto deste Tribunal Central, emitiu douto parecer no sentido da improcedência do recurso.

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Com dispensa dos vistos legais, vem o processo submetido à conferência para apreciação e decisão.

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II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO

Atento o disposto nos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2, do novo Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, o objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões formuladas pelo recorrente no âmbito das respectivas alegações, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.

Importa assim, decidir:

i) se a sentença recorrida efectuou errado julgamento quanto à nulidade da citação ao julgar que não constitui fundamento de oposição e que, quanto a ela ocorreu erro na forma de processo por falta de comunicação ao citando – chamado à execução fiscal por reversão na qualidade de responsável subsidiário – dos elementos essenciais da liquidação, em violação do disposto no n.º 4 do artigo 22.º da LGT por falta de indicação das diligências efectuadas para concluir pela inexistência de bens;

ii) se ocorre erro de julgamento quanto à legitimidade da Recorrente, no que se refere à culpa.

III - FUNDAMENTAÇÃO


III – 1. De facto


É a seguinte a decisão sobre a matéria de facto constante da sentença recorrida:

«1. Em 23/2/2001 foi constituída a sociedade AM.. – M. I.l U.l, Lda. por Á. M. M. G., ora oponente, com o objecto de importação, exportação e comércio a retalho e montagem de todo o tipo de equipamentos e de máquinas, elaboração de projectos e manutenção industrial e automatismo, ficou nomeado gerente o único sócio, para obrigar a sociedade basta a assinatura de um gerente, nos termos da...

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