Acórdão nº 149/22.9YLPRT.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça, 12-04-2023

Data de Julgamento12 Abril 2023
Case OutcomeINDEFERIDA A RECLAMAÇÃO, MANTENDO-SE O DESPACHO DO RELATOR
Classe processualREVISTA
Número Acordão149/22.9YLPRT.P1.S1
ÓrgãoSupremo Tribunal de Justiça

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, 1ª Secção.

AA, requereu junto do BNA contra BB e mulher CC procedimento especial de despejo relativamente ao imóvel sito na Rua ..., em ..., ao abrigo do disposto no nº3, do artigo 1083º, do Código Civil, alegando, para tanto, a falta de pagamento das rendas vencidas desde novembro de 2018 e até outubro de 2021, no valor global de €1.979,28 (mil, novecentos e setenta e nove euros e vinte e oito cêntimos) e que por notificação judicial avulsa, datada de 23/11/2021, foi pelo senhorio comunicada ao arrendatário a resolução do contrato de arrendamento, com fundamento na mora do arrendatário por mais de três meses, por não pagamento de rendas, e comunicação ao arrendatário do valor em dívida vencido até àquela data, a título de rendas em dívida, a que acrescem juros de mora e rendas vincendas até efetiva desocupação do locado.

Prosseguindo processo seus termos, foi proferido acórdão pelo Tribunal da Relação, sendo decidido por maioria e após deliberação que, “Pelo exposto, decidem em conferência os juízes do Tribunal da Relação do Porto, alterar a decisão reclamada e julgar improcedente o recurso interposto, confirmando a decisão recorrida”.

Novamente inconformado, o requerido interpõe Recurso para o Supremo Tribunal de Justiça.

Diz que:

“Requer que V.ª Ex.ª se digne considerar interposto o recurso, que é de Revista, com efeito suspensivo, nos termos e efeitos dispostos nos artigos, 629º nº 3 al. a), 671º 675º e 676º nº1, todos do Código Processo Civil.

E conclui:

“I. Vem o presente Recurso de Revista interposto do douto Acórdão proferido pela Conferência da ... Secção Cível, com voto de vencido, porquanto entendem as Venerandas Desembargadoras que beneficiando o Inquilino de Apoio Judiciário na modalidade de dispensa de pagamento de custas e mais encargos como processo não o dispensa de prestar a caução a que alude o artigo 15º-F do NRAU.

II. Salvaguardado o devido respeito por melhor opinião, afigura-se ao Recorrente que a decisão proferida não representa uma digna e correta aplicação do direito, demonstrando-se profundamente injusta.

III. Deu entrada, o Requerente ora Recorrido, junto do Balcão Nacional do Arrendamento de um Requerimento de Despejo com fundamento na falta de pagamento de rendas.

IV. Dentro do prazo estabelecido para o efeito deduziu Oposição, o Requerido ora Recorrente, demonstrando e comprovando que tudo quanto alegado em sede de Requerimento de Despejo era falso juntando para o efeito os comprovativos de pagamento de renda, bem como, o comprovativo do pedido de proteção jurídica que veio, mais tarde, a ser concedido.

V. Considerou assim o Tribunal de 1ª Instância que a concessão do apoio judiciário ao Arrendatário apenas o isenta do pagamento da taxa de justiça devida e não do depósito da caução no valor das rendas em atraso.

VI. Inconformado com esta decisão recorreu o Arrendatário para Tribunal da Relação do Porto, tendo aquele douto Tribunal decidido, e bem, pela 2ª corrente interpretativa, isto é, que da letra da lei conclui-se pela intenção do legislador em conceder a isenção de taxa de justiça e de prestação de caução nos casos em que o Requerido beneficie de apoio judiciário.

VII. Desta decisão reclamou o Requerente ora Recorrido para a Conferência requerendo que sobre aquela matéria recaísse um Acórdão nos termos do artigo 652º nº3 do CPC.

VIII. Tendo este Acórdão vindo dizer que no procedimento especial de despejo não sendo junto com a oposição apresentada o documento comprovativo do pagamento de caução, tem que aquela ser desentendida, a menos que resulte verificado o pagamento ao Senhorio das rendas em atraso ou o seu depósito.

IX. Não pode o aqui Recorrente concordar com o douto Acórdão proferido porquanto o mesmo enferma de contradições ao longo da fundamentação, bem como, os seus fundamentos se baseiam pressupondo uma realidade que não a que resulta verificada nos presentes autos.

X. Antes de mais cumpre referir que sufragamos na totalidade o entendimento perpetrado pela Veneranda Desembargadora Dra. DD, vencida no seu voto, nomeadamente, em toda a fundamentação por si sustentada.

XI. Consequentemente, não consegue o Recorrente compreender as posições adotadas pelo douto Tribunal da Relação, pois, no nosso entendimento as mesmas são completamente contraditórias entre si.

XII. Se por um lado se afirma que o Inquilino está dispensado de demonstrar o pagamento da caução caso se verifique nos autos que as rendas se encontram liquidadas ou depositadas (tal como acontece no presente caso), por outro lado afirma-se que não obstante o Inquilino ter alegado que as rendas peticionadas se encontram pagas, tal não poderá ser objeto de apreciação nesta fase de processo dado que a questão a resolver é apenas a de saber se a oposição apresentada pode ou não ser considerada.

XIII. O douto Tribunal tanto podia como devia ter tido em conta o Documento comprovativo do pagamento e junto com a Oposição analisando o artigo 665º nº 2 do Código de Processo Civil.

XIV. Ainda que o Tribunal da Relação confirme a existência de alguma nulidade na sentença, não se pode limitar a reenviar o processo para o tribunal a quo. Deverá, ao invés, prosseguir, em princípio, com a apreciação das demais questões.

XV. O importante é ter dispor dos elementos necessários para o efeito.

XVI. O mesmo ocorre nos casos em que, apesar de não se verificar qualquer situação de nulidade de sentença, o Tribunal a quo tenha deixado de apreciar determinada questão que foi considerada prejudicada pela solução dada a outra.

XVII. Neste caso existindo elementos para conhecer das questões que ficaram excluídas da primitiva decisão (como as há no presente caso) a Relação deverá apreciá-las sem necessidade sequer da expressa iniciativa da parte.

XVIII. Tal não depende sequer da ampliação do objeto do recurso, tal como ficou expresso na fundamentação do Acórdão de Uniformização de Jurisprudência nº 11/15.

XIX. Assim, e visto que o único momento que o Recorrente teria para comprovar e arrolar para os autos os devidos comprovativos do pagamento seria com a Oposição ao Procedimento Especial de Despejo, tal como o fez.

XX. A Oposição foi o primeiro e único momento processual em que interveio o Inquilino a fim de demonstrar a sua posição.

XI. Para se seguir a posição adotada pelo douto Tribunal da Relação – vide sumário do Acórdão – e se saber se a oposição deduzida poderá ou não ser considerada pelo Tribunal é inequívoco que se terá de analisar pelo menos o Documento que comprova o pagamento (Documento 10 da Oposição), a fim de conseguir aferir se poderia ou não o Inquilino ficar dispensado da prestação da referida Caução.

XXII. Não se poderá é entender que terá sido omitida a caução e não se encontra verificando nos autos o pagamento das rendas vencidas (alegação esta que não corresponde à realidade), e, ao mesmo tempo, referir que não é este o momento processual adequado para se aferir se as mesmas se encontram ou não pagas.

Isto porque, é totalmente contraditório entre si.

XXIII. E, não obstante ser contraditório poderia o Tribunal da Relação decidir esta questão.

XXIV. In casu, e uma vez estarem todas as rendas pagas sendo a Oposição desentranhada, estará a abrir-se a porta a um despejo totalmente infundado, desprotegendo-se totalmente o Arrendatário que cumpriu com todas as suas obrigações até à data de hoje.

XXV. Situação esta com a qual não podemos compactuar porquanto padece o Arrendatário de insuficiência económica tendo a mesma sido devidamente comprovada com a concessão do apoio judiciário.

XXVI. Procedendo-se ao referido despejo que, repita-se não tem qualquer fundamento dado o motivo invocado não se verificar, ficará o Arrendatário sem a casa onde reside há mais de 25 anos e sem meios para suportar uma renda como as que se praticam hoje em dia.

XXVII. Por outro lado, é evidente que existe manifesta contradição entre o estipulado no nº 3 do artigo 15º-F do NRAU e o estipulado no nº 2 do artigo 10º da Portaria nº 9/2013, de 10/01.

XXVIII. Assentando-se que estamos perante dois diplomas com diferente natureza – a Portaria traduz o exercício do poder regulamentar, que é uma atividade especificamente administrativa, por confronto com a lei.

XXIX. O legislador pretendeu isentar o arrendatário que goza do benefício do apoio judiciário da obrigação de demonstrar, aquando da apresentação do articulado de oposição, que pagou a taxa de justiça devida (responsabilidade perante o Estado) e que pagou a caução no valor das rendas, encargos ou despesas em atraso (responsabilidade perante o senhorio), sendo certo que nem se pode estranhar tal regulação porquanto o legislador, ao longo do tempo, em...

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