Acórdão nº 149/11.4YFLSB de Supremo Tribunal de Justiça, 26-06-2013

Data de Julgamento26 Junho 2013
Case OutcomeNEGADO PROVIMENTO AO RECURSO
Classe processualRECURSO CONTENCIOSO
Número Acordão149/11.4YFLSB
ÓrgãoSupremo Tribunal de Justiça




Acordam na secção do Contencioso do Supremo Tribunal de Justiça

I
1. AA [AA] e BB [BB], juízes de direito, ao abrigo dos artigos 168.º e ss., do Estatuto dos Magistrados Judiciais[1], interpuseram recurso contencioso de anulação da deliberação do plenário do Conselho Superior da Magistratura[2], de 11/10/2011, no processo disciplinar n.º 179/2011, pela qual foi decidido:
«– condenar a Exm.ª Juíza de Direito AA, pela prática de uma violação do dever de honestidade, p. e p. pelo art.º 82.º e 95.º/1 al. b) do Estatuto dos Magistrados Judiciais, e art.º 3.º/2, al. g) e n.º 9, do Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores que Exercem Funções Públicas (Lei 58/2008 de 9 de Setembro) ex vi art.º 131.º do Estatuto dos Magistrados Judiciais, na pena disciplinar de 100 (cem) dias de suspensão de exercício (art.º 89.º e 104.º do mesmo Estatuto);
«– condenar o Exm.º Juiz de Direito BB, pela prática de uma violação do dever de honestidade, p. e p. pelo art.º 82.º e 95.º/1 al. b) do Estatuto dos Magistrados Judiciais, e art.º 3.º/2, al. g) e n.º 9, do Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores que Exercem Funções Públicas (Lei 58/2008 de 9 de Setembro) ex vi art.º 131.º do Estatuto dos Magistrados Judiciais, na pena disciplinar de 120 (cento e vinte) dias de suspensão de exercício (art.º 89.º e 104.º do mesmo Estatuto).»
Ao longo de 544 artigos, suscitam as questões que passamos a elencar:
a) a questão prévia da falta de pronúncia sobre a matéria do recurso hierárquico impróprio interposto (artigos 1.º a 15.º);
b) a nulidade por falta de audiência dos arguidos (artigos 16.º a 92.º);
c) o erro nos pressupostos de facto da decisão punitiva
c) 1. – por omissão da circunstância de a arguida AA ter actuado fora do exercício das suas funções profissionais (artigos 93.º a 105.º),
c) 2. – por omissão da circunstância de a Dr.ª CC, no seu depoimento ter confirmado que a arguida não proferiu a expressão que lhe é imputada no processo n.º 333/2010 (artigos 106.º a 120.º);
d) o erro nos pressupostos de direito da decisão punitiva
d) 1. – a irrelevância disciplinar da conduta da arguida AA: a impossibilidade de punir a arguida como autora de falso testemunho (artigos 121.º a 152.º), a ausência dos pressupostos de que depende a punição a título de co-autoria (artigos 153.º a 178.º), a incomunicabilidade à arguida da relação especial que fundamenta o ilícito praticado pela testemunha (artigos 179.º a 186.º);
d) 2. – o direito de necessidade justificante (artigos 187.º a 407.º);
d) 3. – o estado de necessidade desculpante (artigos 408.º a 428.º);
e) quanto às penas aplicadas
e) 1. – a omissão de pronúncia quanto à suspensão da execução das penas aplicadas (artigos 429.º a 434.º);
e) 2. – a manifesta desproporcionalidade das penas aplicadas (artigos 435.º a 544.º).
2. Cumprido o disposto no artigo 174.º, n.º 2, do EMJ, o CSM sustentou a improcedência do recurso.
3. Na sequência da notificação, nos termos e para os efeitos do artigo 176.º do EMJ:
– os recorrentes não apresentaram alegações;
– o CSM remeteu para a resposta já apresentada.
4. Entretanto, a recorrente AA suscitou a questão do reenvio prejudicial, quanto a determinadas questões, ouvindo-se, na matéria, o Ministério Público e o CSM.
5. Ainda na oportunidade conferida pelo artigo 176.º do EMJ, o Ministério Público suscitou a questão interlocutória de «dever ao presente processo ser apensado o processo 15/12.6YFLSB» vindo, depois de vicissitudes processuais que já não importa, agora, referir, por acórdão de 11/12/2012, desta secção do contencioso, a decidir-se pelo indeferimento da apensação requerida.
6. Veio, depois, o Ministério Público, nos termos daquele artigo 176.º do EMJ, alegar no sentido de a deliberação sob recurso ser mantida por não estar ferida dos vícios que os recorrentes lhe apontam nem de outros de que cumpra conhecer.
7. Para além dos documentos juntos com o recurso, ao longo da tramitação processual descrita, foram os recorrentes juntando aos autos diversos documentos.
Assim:
– cópia da deliberação do plenário do CSM no processo disciplinar 333/2010;
– cópia da decisão final proferida no inquérito n.º 218/11.0TRPRT dos serviços do Ministério Público junto do Tribunal da Relação de Guimarães;
– cópias relativas a decisões do CSM sobre requerimentos da recorrente de obtenção de documentos respeitantes ao inquérito n.º 9/11.9YGLSB;
– cópia da decisão instrutória proferida no processo n.º 218/11.0TRPRT do Tribunal da Relação de Guimarães.
8. Colhidos os vistos cumpre apreciar.
II
1. A questão prévia do reenvio prejudicial
Suscitou a recorrente AA a questão do reenvio prejudicial sobre as questões de saber:
– «se o direito da União, no segmento em que reconhece aos cidadãos da União, o direito fundamental a que a sua causa seja julgada de forma equitativa, publicamente e por um tribunal independente e imparcial, previamente estabelecido por lei – artigo 47.º da CDFUE e artigo 6.º/1 da CEDH – se opõe a uma legislação nacional (artigo 168.º/2 do EMJ) na vertente normativa em que esta procede à atribuição de competência para conhecer da impugnação contenciosa dos actos administrativos praticados pelo CSM, como o são as decisões em matéria disciplinar do CSM, não aos tribunais administrativos e fiscais como determina o artigo 212.º/3 da CRP, mas ao Supremo Tribunal de Justiça e, mais especificamente ainda, a uma secção ad hoc deste – constituída pelo mais antigo dos seus Vice-Presidentes, que tem voto de qualidade, e por um Juiz de cada uma secção anual e sucessivamente designado pelo Presidente do STJ, que é simultaneamente o Presidente do CSM (artigo 137.º/1 do EMJ)»;
– «se o direito da União, no segmento em que reconhece aos cidadãos da União, o respeito dos direitos de defesa e o direito a uma boa administração, designadamente, o direito a ser ouvido antes de ser tomada qualquer medida individual que afecte o administrado(artigos 41.º e 48.º/2 da CDFUE) se opõe a uma legislação nacional que rege em matéria de contencioso da magistratura judicial (artigo 117.º/1 do EMJ) e à interpretação que dela é feita que, em matéria disciplinar, dispensa o respectivo instrutor de indicar na acusação a pena aplicável (…)»;
– «se o direito da União, no segmento que reconhece aos cidadãos da União o respeito dos seus direitos em virtude da sua condição de arguido (artigo 6.º/3 da CHDH) se opõe a uma legislação nacional e à interpretação que dela é feita que censura disciplinarmente, em processo disciplinar autónomo um magistrado judicial (…) pelo teor da sua defesa num procedimento disciplinar originário em que era visado (…)»;
– «se o direito da União, no segmento que reconhece aos cidadãos da União os direitos fundamentais à presunção de inocência e o direito a não ser punido mais do que uma vez pelo mesmo alegado delito previstos nos artigos 48.º e 50.º da CDFUE e 6.º/2 da CEDH, se opõe a uma legislação nacional (artigo 126.º do CPP ex vi artigo 131.º do EMJ) e à interpretação que dela tem vindo a ser feita pela entidade administrativa que, depois de, nos presentes autos ter condenado a requerente e a testemunha de defesa arrolada, pelo depoimento desconforme desta, quanto à razão de ciência, em penas suspensivas do exercício das funções jurisdicionais, não se coibiu de valorar, no processo originário onde aquele depoimento foi produzido, aquele mesmo facto como circunstância agravante da culpa da requerente, facto esse que também serviu para fundar a convicção do órgão decisor quanto à culpabilidade da arguida»;
– «se o direito da União, no segmento que reconhece aos cidadãos da União o direito a uma boa administração da justiça, previsto no artigo 41.º da CDUEF, se opõe a uma legislação nacional e à interpretação que dela tem vindo a ser feita pelo CSM que exige dos seus administrados, ainda que nas vestes de arguidos, um incondicional dever de lealdade/honestidade para com o seu órgão de tutela, com uma extensão tal que os obrigue a contribuir para a sua auto-incriminação, quando é certo que o instrutor que o órgão de tutela nomeou para a instrução dos presentes autos, assumiu uma conduta processual que conduziu à sua recusa e escusa nos autos, instrutor esse que se encontra actualmente suspenso das suas funções inspectivas, com processo disciplinar pendente no próprio órgão que o nomeou (…)»;
– «se o direito da União, no segmento que reconhece aos cidadãos da União o direito fundamental a uma boa administração da justiça, que decida a sua causa de forma imparcial e equitativa, o direito a não ser condenado por acção não tipificada no momento da sua prática e ainda o direito a que a pena (disciplinar) aplicada não seja desproporcionada à infracção, previstos nos artigos 41.º/1 e 2, 49.º da CDFUE, se opõe a uma legislação nacional (artigo 170.º/5 do EMJ) e à interpretação que dela é feita pela jurisprudência interna, segundo a qual a providência cautelar nominada de suspensão provisória da eficácia do acto, preliminar de um recurso contencioso, tendente a suspender os efeitos de uma deliberação que, em matéria disciplinar, aplicou a uma magistrada judicial uma pena suspensiva de funções, com a duração de 100 dias, em caso algum pode abranger a suspensão do exercício de funções».
Notificado da pretensão, pronunciou-se o Ministério Público no sentido da falta de pertinência do suscitado procedimento de reenvio, em suma, pelo seguinte:
– as questões de direito, agora enunciadas pela recorrente AA, como objecto de obrigação de reenvio, deveriam supor um quadro alegatório anteriormente oferecido, o que, no caso, não se verifica, não podendo a apontada omissão processual ter-se por superada ou consumida com a apresentação do requerimento;
– nenhuma das questões, todas relativas a “parâmetros comunitários de protecção de direitos” constantes das diversas disposições indicadas da CDFUE e da CEDH, no que releva para a decisão da
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