Acórdão nº 1434/16.4T8VIS-A.C1 de Tribunal da Relação de Coimbra, 17-05-2016
Data de Julgamento | 17 Maio 2016 |
Número Acordão | 1434/16.4T8VIS-A.C1 |
Ano | 2016 |
Órgão | Tribunal da Relação de Coimbra |
Comarca de Viseu, Viseu, Instância Central – Secção de Comércio
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra
A... , residente na Rua (...) S. Cristóvão de Nogueira, intentou o presente Procedimento cautelar de suspensão de gerentes nos termos do art. 1055º do C.P.C., contra os ora Requeridos:
B... , casado, residente na Rua (...) Vila Nova de Famalicão;
C... , casado, residente na Rua (...) Vila Nova de Gaia;
“D... , Lda ”, com sede na Rua (...) S. Cristóvão de Nogueira; e
“E... , Lda.” , com sede na Rua (...) S. Cristóvão de Nogueira;
Pedindo que se decrete a:
- Suspensão do Requerido B... das funções de gerente.
- Nomeação do Autor como gerente das duas sociedades Requeridas ou, assim não se entendendo, nomeação de pessoa que o Tribunal julgue adequada para o exercício dessas funções.
Para tal e em resumo, o requerente, alega que o requerido B... é o gerente único das duas sociedades Requeridas. A partir de meados de 2015 as sociedades foram diminuindo progressivamente a sua actividade até chegarem ao ponto de não terem qualquer actividade ou esta ser muito reduzida. Todavia, nos meses em que a actividade das sociedades foi praticamente nula, as despesas relacionadas com a sua actividade continuaram a existir.
Estas despesas suportadas pelas sociedades Rés são efectuadas em benefício de uma outra sociedade – “I... ” – de que o Requerido B... é o gerente de facto e que pertence uma sua irmã. Esta sociedade tem o mesmo objecto social das sociedades Rés, sendo que os clientes têm vindo a ser desviados para esta nova sociedade. A isto acresce que o gerente B... tem celebrado negócios de venda de veículos que o Requerente classifica de ruinosos.
Procedeu-se à inquirição das testemunhas indicadas pelo requerente e foi, este, ouvido, em declarações de parte, cf. acta de fl.s 88 e 89.
Após o que foi proferida decisão de fl.s 90 a 97, na qual se procedeu ao saneamento tabelar dos autos, se fixou a matéria dada como provada e não provada e respectiva motivação e a final, se decidiu o seguinte:
“ Nesta conformidade, e pelo exposto, o tribunal decide:
- Julgar parcialmente procedente o presente incidente se suspensão do cargo de gerente das sociedades Requeridas.
- Decretar a suspensão do Requerido B... do cargo de gerente da Requerida “ D... , Lda.”.
- Nomear o Autor A... como gerente desta sociedade.
- Custas pelo Requerente, a atender a final
- Proceda-se ao registo oficioso da decisão.”.
Inconformado com a mesma, dela interpôs recurso o requerente A... , recurso, esse, admitido como de apelação, com subida imediata, em separado e com efeito suspensivo – (cf. despacho de fl.s 223 v.º), rematando as respectivas motivações, com as seguintes conclusões:
A) - Nas sociedades com mais de dois sócios é admissível o recurso ao Tribunal para destituição de um gerente com base na justa causa;
B) - O n.º 5 do art. 257º do CSC, ao impor o recurso à via judicial nas sociedades com apenas dois sócios, não está a impedir que o mesmo caminho possa ser seguido naquelas que têm mais sócios;
C) - A redação do n.º 4 desta disposição legal reforça esta ideia, ao estabelecer que "qualquer sócio" pode requerer judicialmente a suspensão, existindo justa causa;
D) - Salvo melhor opinião, o Tribunal não fez a melhor interpretação do art. 257º, n.ºs 4 e 5 do CSC,
E) - Sendo este o único obstáculo, colocado na decisão recorrida, a tal, deverá ela ser revogada e suspenso o R. B... da gerência da Ré " E... , Ldª", e nomeado gerente o A.;
F) - Na verdade a matéria provada (arts. 12 a 16, 62 a 70) reflete de forma inequívoca a violação grave dos seus deveres também enquanto gerente da" E... , Ldª"
Termos em que o recurso deve merecer provimento, e revogada a douta decisão na parte em que improcedeu, sendo o R. B... suspenso da gerência da Ré " E... , Ldª", e nomeado gerente o A., com todas as consequências legais.
Não foram apresentadas contra-alegações.
Dispensados os vistos legais, há que decidir.
Tendo em linha de conta que nos termos do preceituado nos artigos 635, n.º 4 e 639.º, n.º 1, ambos do NCPC, as conclusões da alegação de recurso delimitam os poderes de cognição deste Tribunal e considerando a natureza jurídica da matéria versada, as questões a decidir são as seguintes:
A. Se nas sociedades com mais de dois sócios é admissível o recurso à via judicial, com vista à destituição de um gerente, com base em justa causa e;
B. Se o requerido deve ser, também, suspenso da gerência da requerida “ E... , L.da” e, em sua substituição, ser nomeado o ora requerente.
É a seguinte a matéria de facto dada como indiciariamente provada na decisão recorrida:
1. O Requerente e o Requerido B... são os únicos sócios da Ré “ D... , Lda.”, sendo cada um detentor de uma quota no valor nominal de €2.500,00, correspondente a 50% do capital social.
2. A sociedade foi constituída em 1992, tem como objeto social o apoio técnico à agricultura, e o CAE principal 016120-R3 - especificamente dedica-se à podologia animal.
3. A sociedade começou com dois sócios-gerentes a prestar-lhe dois tipos diferentes de colaboração: o Requerido B... estava especializado no que era específico de atividade da sociedade, ou seja, o apoio técnico à agricultura, e o Requerente A... ocupava-se da sua gestão e dos aspectos organizativos, logísticos, e financeiros.
4. Em 15-01-2007 foi alterado o contrato de sociedade, e passou a bastar a assinatura de um gerente.
5. Nessa ocasião o Requerente renunciou à gerência, a qual ficou a ser exercida apenas pelo Requerido B... .
6. Ao longo dos anos a Requerida “ D... , L.da” cresceu de forma sustentada.
7. Seguindo aconselhamento fiscal Requerente e Requerido B... constituíram nova sociedade - a Requerida “ E... , L.da” - em Setembro de 2014, com objecto similar, e o mesmo CAE Principal (01620-R3).
8. Requerente e Requerido B... planearam dividir pelas duas sociedades a atividade e os clientes.
9. Convidaram para sócio da “ E... , Lda.” o Requerido C... .
10. No capital social de €5.000,00, o Requerente ficou titular de quota no valor nominal de €2.000,00, o Requerido B... de outra no valor do mesmo valor, e o Requerido C... de uma quota no valor nominal de €1.000,00.
11. Nos termos do pacto social bastava a assinatura de um gerente para obrigar a sociedade, e para a gerência foi designado apenas o Requerido B... .
12. A partir de então ficou a atividade dividida pelas duas sociedades Requeridas, com uma única pessoa a gerir as duas: o Requerido B... .
13. A partir de meados de 2015 o Requerido B... , com vista ao afastamento do Requerente, e em seu proveito próprio, arquitetou um plano que passava por esvaziar as duas sociedades, criar uma nova, fazer o arranque desta nova sociedade à custa das outras duas (sociedades Rés), seja transferindo para ela os ativos destas (clientes, património, pessoal, etc), seja utilizando ativos delas e pondo-as a suportar os seus custos.
14. Em data indeterminada, mas anterior a 9/10/2015, data em que a registou na Conservatória, fez constituir a “ I... Unipessoal, Lda.”, com o capital social de €30.000,00, cuja quota única pertence a sua irmã F... , e a sede é em casa dela (Rua (...) , Vila nova de Gaia).
15. Esta sociedade só formalmente pertence à irmã, e foi para ela que o Requerido B... foi passando a atividade das duas sociedades de que era e é gerente.
16. Simultaneamente foi diminuindo a sua atividade ao serviço das duas sociedades requeridas, levando as vendas até ao ponto zero, mas continuando com todo o tipo de custos e despesas, incluindo consumíveis, em benefício da " I... ", e para ela...
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