Acórdão nº 139/14.5TBCBC.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 26-04-2018
Judgment Date | 26 April 2018 |
Acordao Number | 139/14.5TBCBC.G1 |
Year | 2018 |
Court | Court of Appeal of Guimarães (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães
I – Relatório
Baldio X e M instaurou a presente acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra:
V. M.,
F. S.,
Manuel,
C. J.,
António, e
Maria,
Pedindo a condenação dos réus a reconhecerem que os terrenos denominados “Olival P.”, “TT” e “Cerca B” são terrenos baldios, pertencendo em propriedade comunitária aos moradores dos locais de X e M, não praticando quaisquer actos de apropriação daquele terreno.
Mais pediu o cancelamento das descrições prediais dos referidos imóveis, bem como das inscrições, assim como o cancelamento das matrizes rusticas.
Alegou, em síntese, que, os réus, no ano de 1996, fizeram constar no inventário que correu por óbito de Manuel e V. M. três verbas denominadas “Olival P.”, “TT” e “Cerca B”; que tais verbas, por adjudicação e sucessão hereditária, estão actualmente registadas como pertencendo aos réus; que os terrenos relativos a tais verbas são baldios, sendo utilizados pelos habitantes dos lugares de X e M para pasto e corte de mato; que os antecessores dos réus, nas décadas de 40 e 50 do século passado, cultivaram os terrenos em causa ao abrigo de licenças de cultivo, nunca tendo utilizado os mesmos desde então e que os réus vedaram tais terrenos com esteios de cimento há cerca de três anos.
*
O réu C. J. contestou negando ter-se apropriado de terrenos baldios, já que desde sempre o próprio e os seus antecessores utilizaram os terrenos em causa, limpando-os, cortando lenhas e matos, à vista de todos e sem qualquer oposição. O “Olival P.” encontra-se registado a seu favor e desde 1938 que os antepossuidores de tal terreno o começaram a possuir.Em Reconvenção peticionou o reconhecimento da propriedade de tal terreno e o pagamento pelo autor de uma indemnização no valor de € 500,00 pelas preocupações que lhe estão a ser causadas em consequência da conduta deste.
*
A ré V. M. contestou negando ter-se apropriado de terrenos baldios, já que desde sempre a própria e os seus antecessores utilizaram os terrenos em causa, limpando-os, cortando lenhas e matos, à vista de todos e sem qualquer oposição. O “Olival P.” foi adquirido pelo seu pai em 1938. A “TT” igualmente foi adquirida pelo seu pai em 1945. Desde tais datas que a ré e os seus antepossuidores utilizam tais terrenos, assim como a “Cerca B”, nele limpando o mato, cultivando e apascentando o gado, à vista de toda a gente, ininterruptamente, sem qualquer oposição e na convicção que o fazem no exercício de um direito próprio. Em reconvenção peticionou o reconhecimento da propriedade, a seu favor, dos três terrenos.
*
O autor replicou alegando factos que, em seu entender, demonstram a natureza baldia dos terrenos em causa. *
Posteriormente o autor requereu a ampliação do pedido peticionando a declaração de nulidade parcial da partilha operada pelo inventário n.º 30/1996 que correu termos neste Tribunal por óbito de Manuel e V. M., tendo a mesma sido deferida.*
Procedeu-se ao registo da acção na Conservatória de Registo Predial. Foi realizada audiência prévia, na qual foram admitidas as reconvenções, fixado o objecto do litígio e enunciados temas de prova.
Procedeu-se à audiência de discussão e julgamento.
No final da audiência de julgamento foi proferido despacho no âmbito do qual foi determinado que seria apreciada a nulidade do contrato de compra e venda ocorrido em 1945, tendo as partes sido notificadas para se pronunciarem.
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Foi proferida sentença, cuja parte decisória reproduzimos na íntegra:“Em face do exposto, o Tribunal decide julgar a presente acção parcialmente procedente e a reconvenção totalmente improcedente e, em consequência:
1. Declarar que o prédio rústico denominado “Olival P.”, com a área de 5.000 m2, no lugar de X, a confrontar do norte e nascente com a estrada, sul e poente com monte baldio, actualmente descrito na Conservatória de Registo Predial sob o n.º …, freguesia de …, é terreno baldio e pertence em propriedade comunitária aos moradores dos lugares de X e M, concelho de Cabeceiras de Basto;
2. Declarar que o prédio rústico denominado “TT”, com a área de 20.000 m2, no lugar de X, a confrontar de todos os lados com baldio, tendo dentro três nascentes de água, descrito originalmente no Registo Predial sob o nº …, fls. 192 do Livro …, de Cabeceiras de Basto, e actualmente sob o n.º …, freguesia de ... e inscrito na matriz rústica de Cabeceiras de Basto sob o n.º …, é terreno baldio e pertence em propriedade comunitária aos moradores dos lugares de X e M, concelho de Cabeceiras de Basto;
3. Declarar que o prédio rústico denominado “Cerca B”, composto por carvalho, videiras, olival e pinhal, com a área de 7.000 m2, no lugar de X, a confrontar de todos os lados com baldio, com direito a água das poças da J. e do B, desde segunda feira às oito horas até quarta feira à mesma hora, actualmente descrito na Conservatória de Registo Predial sob o n.º …, freguesia de ..., e omisso na matriz, é terreno baldio e pertence em propriedade comunitária aos moradores dos lugares de X e M, concelho de Cabeceiras de Basto;
4. Condenar os Réus a reconhecerem a propriedade dos compartes sobre os prédios acima referidos e a restituí-los à posse daquela comunidade, desocupando-os e deixando-os no estado em que os encontraram;
5. Declarar parcialmente nula a partilha judicial celebrada no âmbito do proc. n.º 30/1996, que correu termos neste Tribunal, no que concerne às verbas n.ºs 12, 14 e 16;
6. Declarar oficiosamente nula a escritura de compra e venda celebrado entre M. B. e Manuel, datado de 27 de Fevereiro de 1945, lavrada a folhas 19 verso do Livro número … do Cartório Notarial de Cabeceiras de Basto, inscrita na transmissão número …, lançada a folhas 152 do Livro …. oitavo, em 11 de Dezembro de 1946;
7. Ordenar o cancelamento de todas as inscrições prediais dos prédios descritos sob os n.ºs ..., ...1 (originalmente descrito no Registo Predial sob o nº ..., fls. 192 do Livro ..., de Cabeceiras de Basto) e ..., todos da freguesia de ..., concelho de Cabeceiras de Basto, com a consequente inutilização das respectivas descrições prediais;
8. Ordenar o cancelamento do art.º 2401 da matriz rústica de ...;
9. Condenar os Réus a retirar os esteios de cimento por eles colocados nos terrenos acima referidos e a não mais perturbar, por qualquer modo, a posse, uso e fruição das mesmas parcelas pelos moradores dos lugares de X e M;
10. Condenar os Réus numa sanção pecuniária compulsória no valor de € 100,00 por cada acto de apropriação das parcelas de terreno denominadas “Olival P.”, “TT” ou “Cerca B”, com excepção do direito à exploração das oliveiras, por parte dos Réus, na parcela de terreno designada por “Olival P.”;
11. Absolver os Réus do demais peticionado;
12. Absolver os Autores do pedido de condenação formulado por C. J. no pagamento de uma indemnização de € 500,00 pelos transtornos por si sofridos;
13. Absolver os Autores dos demais pedidos reconvencionais de reconhecimento da propriedade dos prédios denominados “Olival P.”, “TT” e “Cerca B”, formulados pelos Réus C. J. e V. M..
(…)”
*
Não se conformando com a decisão veio a ré V. M. dela interpor recurso de apelação, apresentando alegações e formulando as seguintes conclusões:“I) O Tribunal "a quo" julgou provado que parte da "TT", foi, em tempos recuados, cultivada pelos antepassados dos réus, com base em licenças de cultura concedidas pelos Serviços Florestais, o que a Recorrente considera incorretamente julgado.
II) Da análise dos documentos constantes de fls.234 a 252 (documentação trocada entre Manuel e pai da ora recorrente e os Serviços Florestais de então) e também de toda a prova testemunhal produzida, não se deduz, não resulta e muito menos de forma clara e inequívoca, que alguma vez tivesse sido concedida alguma licença de cultivo a Manuel, antepassado dos Réus, apenas se pode concluir que tal licença foi requerida.
III) Pelo que, entende a Recorrente que a existência de cultivo pelos seus antepassados na TT com base em licenças de cultura deve ser julgada não provada.
IV) O Tribunal "a quo" julgou provado que os antepassados dos Réus, designadamente Manuel, vedaram a “TT” em meados dos anos 50, tendo os Serviços Florestais ordenado e procedido à demolição de tal vedação.
V) No entanto, salvo o devido respeito, não resultou da referida prova testemunhal, supra identificada, que os antepassados dos Réus designadamente Manuel, vedaram a TT em meados dos anos 50, mas antes em meados dos anos 40, conforme as declarações prestadas pelas testemunhas S. G., A. P. e conforme o documento n.º10 apresentado com a Réplica.
VI) Assim no entender da Recorrente deve ser julgado provado que os antepassados dos Réus, designadamente Manuel, vedaram pelo menos uma parte da "TT" em meados dos anos 40 com a área de 5000m2.
VII) Julgou provado o Tribunal "a quo" que desde data não concretamente apurada, mas anterior a 1970, os Réus ou os seus antepassados, designadamente Manuel, não usaram tal terreno.
VIII) Da fundamentação da matéria de facto resulta que o Tribunal "a quo" se baseou nas declarações de M. G., tendo o mesmo declarado ter começado a frequentar o terreno (Tapada TT) desde 1970 e que nessa altura não existia qualquer cultivo.
IX) Da prova testemunhal prestada por M. G. não decorre que ele tenha sequer frequentado o terreno, pelo contrário:
(1m36s-1m54s)
Mandatário do Recorrido: naquele rápido interrogatório para saber o que o senhor sabia, o senhor disse que lá para cima para as "TT" conhece muito mal, não é?
Testemunha: muito mal nem sou capaz de localizar aquilo.
Mandatário do Recorrido: então não lhe vou fazer perguntas sobre as "TT".
X) Consta da matéria de facto provada no ponto 33) que há doze anos, o Réu C. J. cortou um caminho público que atravessa o terreno baldio na zona das TT, desviando-o para fora da zona que os réus consideram sua propriedade, tendo o caminho...
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