Acórdão nº 1389/10.9BESNT de Tribunal Central Administrativo Sul, 25-02-2021
Data de Julgamento | 25 Fevereiro 2021 |
Número Acordão | 1389/10.9BESNT |
Ano | 2021 |
Órgão | Tribunal Central Administrativo Sul |
1 – RELATÓRIO
M..., melhor identificada nos autos, veio, na sequência do indeferimento de reclamação graciosa, impugnar judicialmente a liquidação adicional de IRS de 2005, emitida na sequência de procedimento de inspeção tributária, de que resultou a pagar a quantia de € 68.684,38, e que inclui tributação das mais-valias resultantes da alienação de um imóvel, que não haviam sido, inicialmente, declaradas.
O Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, por decisão de 13 de janeiro de 2019, julgou procedente a impugnação.
Inconformada, a FAZENDA PÚBLICA, veio recorrer da decisão, tendo apresentado as suas alegações e formulado as seguintes conclusões:
«a)Visa o presente recurso reagir contra a decisão proferida nos presentes autos que julga procedente a impugnação judicial deduzida por M..., devidamente identificada nos autos, contra o acto de liquidação de IRS referente ao exercício de 2005, na sequência de despacho de indeferimento de reclamação graciosa interposta do acto, no montante de € 68.684,38.
b) Discorda a Fazenda Pública do entendimento sufragado na douta sentença, e com o mesmo não se conforma, e com o devido respeito, porquanto procede a uma errónea apreciação dos factos pertinentes para efeitos de decisão, com consequente erróneo enquadramento jurídico.
c) Pois, salvo o devido respeito, contrariamente ao entendimento sufragado na douta sentença, a notificação da liquidação de IRS a cuja apreciação de legalidade se deverá ater o douto Tribunal a quo não é a notificação constante do facto da alínea E) do probatório, mas sim a constante dos factos das alíneas M) e L) do probatório, por ser essa a notificação que se reporta à notificação do acto de liquidação de IRS do ano de 2005.
d) A notificação constante da alínea E) dos factos assentes da douta sentença refere-se a notificação emitida no âmbito do procedimento de inspecção interno dirigido à impugnante, consubstanciando-se em mera notificação de convite à regularização da sua situação tributária (cf. anexo III ao Relatório de Inspecção), ante a constatada omissão de rendimentos referentes à categoria G de IRS, impondo-se notificação nos termos do disposto no artigo 43.° do RCPIT, por enquadrada no âmbito de procedimento inspectivo, sendo que, ademais não é notificação da qual resulte a alteração ou correcção dos rendimentos da impugnante em sede de IRS, não se lhe aplicando portanto os normativos a qua apela a douta sentença.
e) No âmbito do procedimento inspectivo foi a impugnante notificada nos termos legais do projecto de relatório para efeitos de exercício da audição prévia, nos termos do disposto no artigo 60.° do RCPIT e no artigo 60.° da LGT, e subsequentemente notificada do relatório final nos termos previstos no artigo 39.° do CPPT, pelo que, não se vislumbra ilegalidade decorrente de qualquer notificação anterior à notificação da liquidação de IRS susceptível de eivar de ilegalidade o acto nos presentes autos impugnado, e cuja efectiva notificação não é colocada em causa, tendo sido a impugnante devidamente notificada da liquidação de IRS em causa nos presentes autos e referente ao ano de 2005, como assente no facto N) do probatório.
f) Atento o exposto, ao julgar procedente a presente impugnação o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento de facto, por subsumir erroneamente a notificação constante da alínea E) dos factos assentes a notificação da qual resulta a liquidação em apreço nos autos, e lhe conceder o estatuto de notificação que procede à alteração e correcção dos rendimentos na acepção dos artigos 65.°, n.° 4, 66.° e 149.°, n.° 2, do CIRS, mais incorrendo em erro de julgamento de direito, por errónea interpretação de tais normativos legais em face da sua não aplicação à notificação de mero convite à regularização da situação tributária efectuada no âmbito do procedimento inspecção tributária.
Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso deve a decisão ser revogada e substituída por acórdão que julgue totalmente improcedente a impugnação judicial.
Sendo que Exas. Decidindo farão a Costumada Justiça.»
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A recorrida, M..., devidamente notificada para o efeito, veio apresentar as suas contra-alegações, formulando as conclusões seguintes:
«A.A Fazenda Pública entende que o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento de facto “por subsumir erroneamente a notificação constante da alínea E) dos factos assentes a notificação da qual resulta a liquidação em apreço nos autos, e lhe conceder o estatuto de notificação que procede à alteração e correcção dos rendimentos na acepção dos artigos 65.°, n.° 4, 66.° e 149.°, n.° 2, do CIRS, ademais desconsiderando a devida notificação à impugnante do projecto de relatório e do relatório final elaborados no procedimento inspectivo, com consequente notificação da liquidação de IRS de 2005 que comprovadamente chegou ao conhecimento da mesma.” - vide o artigo 16.°, das alegações de recurso.
B. Salvo erro, o raciocínio expendido pela Fazenda Pública, no seu recurso, decorre do facto de entender que a notificação constante da alínea E), dos factos assentes, foi realizada já no âmbito da acção inspectiva, sendo a notificação da liquidação de IRS que tem de seguir o regime ínsito nos artigos 65.°, 66.°, e n.° 2 do artigo 149.°, do CIRS - vide os artigos 5.°, 6.°, 7.°, 8.° e 13.°, das alegações de recurso.
C. A norma ínsita no artigo 65.°, n.° 4, do CIRS, não é apenas aplicável à notificação de liquidação adicional de IRS, mas também à notificação que precede o procedimento inspectivo, tanto na medida em que, a notificação neste caso constitui um acto a que a lei confere a solenidade de uma citação (podendo, para melhor compreensão, fazer-se um paralelismo com o processo judicial), uma vez que se trata da primeira chamada do destinatário - neste caso, para um procedimento administrativo - que poderá vir a determinar uma alteração da situação tributária do sujeito passivo.
D. Para efeitos de alteração dos elementos declarados no modelo 3 do IRS, a Fazenda Pública terá de notificar o contribuinte, de forma fundamentada de que irá proceder a tal alteração. Esta notificação tem de ser feita obrigatoriamente mediante carta registada com aviso de recepção.
E. Apesar de não constar no Facto Provado E), o Tribunal a quo, na página 16, da douta sentença, refere que no ofício n.° 035776, datado de 05.05.2009, constava que “no caso de incumprimento da presente notificação [...] far- se-ão de imediato as correcções que se mostrem devidas com os elementos disponíveis [...]”.
F. Andou bem o Tribunal a quo ao ter entendido que a notificação referida no Facto Provado E) se encontrava sujeita ao regime do artigo 65.°, n.° 4, do artigo 66.°, n.° 1 e do artigo 149.°, n.° 2, do CIRS, visto que, em tal ofício, a Fazenda Pública informa que caso a Recorrida não procedesse à alteração do modelo 3, de IRS, estaria sujeita às correcções feitas pelos Serviços da Autoridade Tributária - situação abrangida pelo artigo 65.°, n.° 4, do CIRS.
G. A norma ínsita artigo 65.°, n.° 4, do CIRS - a que se aplica o regime do artigo 149.°, n.° 2, do CIRS, por força do artigo 66.°, n.° 1, do mesmo diploma legal -, determina obrigatoriamente a necessidade de notificação, por carta registada com aviso de recepção, do sujeito passivo, nas seguintes situações:
i. Sempre que a Autoridade Tributária entende que o sujeito passivo deva promover alterações na sua declaração de IRS; e,
ii. Sempre que a Autoridade Tributária notifique o sujeito da liquidação adicional de IRS.
H. A notificação a que alude o Facto Provado E), manifesta-se, à saciedade, ser a notificação que chama o sujeito passivo, para a tomada de conhecimento de que a Autoridade Tributária pretende alterar a sua situação contributiva, logo, ocorre num momento prévio à abertura da acção inspectiva, e, por essa razão, não consubstancia nenhum dos actos previstos no Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária e Aduaneira.
I. A douta sentença recorrida não padece de qualquer erro de julgamento, razão pela qual deverá ser mantida.
NESTES TERMOS E NOS MELHORES DE DIREITO QUE V. EXAS. MUI DOUTAMENTE SUPRIRÃO, requer-se que, na sequência dos fundamentos supra alinhados, seja negado provimento ao recurso interposto e, consequentemente, mantida a douta decisão recorrida.”
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A Exma. Procuradora-Geral Adjunta junto deste Tribunal, nos termos do artigo 289.º, n. º1 do CPPT, veio oferecer o seu parecer.
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Com dispensa de vistos legais, vem o processo submetido à conferência desta 1.ª Subsecção do Contencioso Tributário para decisão.
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2 – OBJECTO DO RECURSO
Antes de mais, importa referir que, independentemente das questões que o Tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, é pelas conclusões do recorrente nas alegações de recurso que se determina o âmbito de intervenção do tribunal (cfr. artigo 635.º, n.º 4 e artigo 639.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho).
Assim e constituindo o recurso um meio impugnatório de decisões judiciais, neste apenas se pode pretender, salvo a já mencionada situação de questões de conhecimento oficioso, a reapreciação do decidido e não a prolação de decisão sobre matéria não submetida à apreciação do Tribunal a quo.
Termos em que a questão sob recurso que importa aqui decidir é a de saber se a sentença padece de erro de julgamento de facto e de direito ao considerar que a falta de notificação a solicitar o envio de documentos de suporte à declaração de IRS eivou de ilegalidade formal todo o procedimento administrativo, incluindo a própria liquidação adicional.
3 - FUNDAMENTAÇÃO
De facto
É a seguinte a decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida
«A) Em 31.03.1998 foi celebrada escritura pública de doação através da...
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