Acórdão nº 13610/21.3T8SNT-A.L1-7 de Tribunal da Relação de Lisboa, 27-09-2022
Data de Julgamento | 27 Setembro 2022 |
Ano | 2022 |
Número Acordão | 13610/21.3T8SNT-A.L1-7 |
Órgão | Tribunal da Relação de Lisboa |
I–Relatório:
A [Sandro ….] veio, em 24.11.2021, deduzir oposição por embargos à execução comum, com o valor de € 9.400,00, que contra si foi instaurada por B […..Investimentos Imobiliários, Lda. ].Tendo esta, invocando o art. 14-A do Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU), dado como título executivo contrato de arrendamento acompanhado do comprovativo de comunicação ao executado, fiador do arrendatário, do montante em dívida, sustenta o embargante a inexequibilidade do título, alegando que a notificação indicada na referida norma só permite formar título executivo contra o arrendatário e não contra o fiador. Mais invoca a extinção da fiança por não ser responsável pelo valor reclamado, respeitante apenas ao incumprimento do arrendatário quanto à devolução do locado, posto que não contribuiu para a demora na restituição. Pede a procedência dos embargos e a extinção da execução.
Recebidos os embargos, contestou a exequente invocando, no essencial, que o título executivo referido no art. 14-A do NRAU se forma também relativamente ao fiador, como é entendimento dominante da jurisprudência, pelo que o envio ao embargante da comunicação do valor em dívida acompanhada do contrato de arrendamento que este subscreveu constitui contra o mesmo título executivo bastante. Mais refere que o embargante é responsável pela dívida exequenda nos termos contratados, tanto mais que esta foi corretamente identificada na comunicação efetuada ao mesmo. Conclui pela improcedência dos embargos e pelo prosseguimento da execução.
Em 27.3.2022, foi dispensada a realização de audiência prévia e proferido despacho saneador que conferiu a validade formal da instância e, considerando que o estado dos autos já o permitia, decidiu nos seguintes termos: “(…) julgo IMPROCEDENTES os presentes embargos de executado e, por conseguinte, os autos de execução deverão prosseguir os seus ulteriores termos.
Custas pelo executado/embargante – artigo 527.°, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil.
Fixa-se o valor da causa no montante da causa dos autos de execução a que se reporta, ou seja, em €9.400,00 (nove mil e quatrocentos Euros), nos termos do disposto nos artigos 306º, n.ºs 1 e 2, e 307.°, n.° 1, do Código de Processo Civil.
(…).”
Inconformado, interpôs recurso o embargante/executado, apresentando as respetivas alegações que culmina com as conclusões que aqui se transcrevem:
“
A.–O Tribunal de 1.ª instância julgou improcedentes, em sede de despacho saneador, os embargos de executado apresentado pelos Recorrente;
B.–A Recorrida e o Senhor Francisco ….. celebraram um contrato de arrendamento para habitação referente à fração autónoma destinada a habitação, designada pela letra "F", correspondente ao 3º andar Direito do prédio urbano constituído em regime de propriedade horizontal, sito na Avenida ..... ..... ....., número ….., em ....., União das freguesias de ..... e ....., concelho de Sintra, descrito na Conservatória do Registo Predial de ..... sob o n.º ...., e inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo ...., com a Licença de Utilização n.º ..., emitida pela Câmara Municipal de Sintra, em 27.01.1961, tendo o Recorrente se constituído fiador do referido contrato;
C.–Sucede que a Recorrida intentou um processo no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste, Juízo Local Cível de Sintra, Juiz 4, no âmbito dos autos que correram termos sob o Processo n.º 2259/19.0YLPRT contra o arrendatário Francisco ....., no qual este foi condenado, com especial interesse nestes autos, a pagar à aqui Recorrida a título de indemnização por atraso na entrega do locado, a quantia que, nesta data, se cifra em nove mil euros, acrescida do montante mensal de quatrocentos euros relativo aos meses que decorrerem desde fevereiro de 2018 até á data efetiva entrega do locado à Autora, aqui Recorrida;
D.–O Recorrente não foi parte no processo identificado em C);
E.–Não obstante, por carta registada datada de 17 de fevereiro de 2021 foi o Recorrente interpelado pela Recorrida para efetuar o pagamento de € 9.400 (nove mil e quatrocentos euros) a título de indemnização por entrega tardia do locado;
F.–Uma vez que o Recorrente não pagou (e desconhece-se se o arrendatário Francisco ….), a Recorrida intentou ação executiva, apresentando como título a missiva referida em E.;
G.–O Recorrente quando foi citado apresentou os seus respetivos embargos tendo o Tribunal a quojulgado no Despacho Saneador que os mesmos eram improcedentes;
H.–Em sede de embargos o Recorrente alegou em síntese duas situações:
i.-Da não vinculação do Recorrente a sentença proferida pelo Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste, Juízo Local Cível de Sintra, Juiz 4, no âmbito dos autos que correram termos sob o Processo n.º 2259/19.0YLPRT, o qual condenou o arrendatário no pagamento de uma indemnização de € 9.000 pela entrega tardia do locado;
ii.-Da irresponsabilidade do fiador após a cessação do contrato de arrendamento;
I.–Quanto a i) não obstante o título apresentado a execução ser uma carta enviada pela Recorrida ao Recorrente a verdade é que, do teor da mesma é pedido o pagamento de € 9.400 (nove mil e quatrocentos euros) a título de indemnização que havia sido decidido no âmbito do Processo n.°2259/19.0YLPRT, no qual o Recorrente não foi parte;
J.–Quanto a ii) diga-se que tem sido entendimento dos nossos tribunais que o pagamento da indemnização prevista no nº 2 do art. 1045º nº 1 do C. Civil, não é da responsabilidade do fiador mas sim, do próprio arrendatário;
K.–O Fiador (aqui Recorrente) não pode ser responsabilizado pela entrega tardia de um Locado, quando não pode ter qualquer controle sobre o arrendatário;
L.–A responsabilidade do fiador, em situações como a presente, em que aquele se comprometeu a garantir as obrigações do arrendatário perante a senhoria, aqui Embargada, até à entrega do locado, respeitam à renda em singelo até à efetiva desocupação e entrega (cfr. Acórdão do STJ de 9.11.1999 – proc. nº 99A668), mas não pode abarcar a responsabilidade pelo incumprimento na devolução, exceto se se provasse que o próprio fiador, pessoalmente, contribuíra ou colaborara na demora da restituição, o que não é o caso.
M.–Nestes termos, a exigência ao fiador, aqui Recorrente, da indemnização pelo atraso na devolução, a que se reporta o n.º 2 do art. 1045º do C. Civil, não é exigível a este, uma vez que este para além não ter sido prontamente informado da cessação do contrato (facto este que foi alegado em sede de embargos e que o Tribunal a quo não ser importante para a boa decisão da causa) e da necessidade de entrega do locado, este nunca iria obstar ou dificultar a entrega do mesmo, podendo inclusive auxiliado na entrega imediata do mesmo.
N.–Por tudo o exposto, deveria o Tribunal decidido pela procedência dos embargos de executados apresentados pelo Recorrente.
Normas Violadas:
Art. 1045/nº 2 do CC
Art. 703º do CPC
Art. 14.º-A (Título para pagamento de rendas, encargos ou despesas) da Lei n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro (que aprovou o Novo Regime do Arrendamento Urbano, na redação introduzida pela Lei n.º 31/2012 de 14 de Agosto).”
Pede a procedência do recurso e a revogação da decisão recorrida.
Em contra-alegações, defende a embargada o acerto do julgado, alinhando as seguintes conclusões:
“
A)–Para se formar o título executivo a que alude o artigo 14°-A do NRAU por força do artigo 9°, n.° 7, do NRAU, ex-vi artigo 1084°, n.° 2, do Código Civil, basta a interpelação acompanhada do contrato de arrendamento, na qual, se discrimine a origem da dívida e respectivo cômputo;
B)–O título que serve de base à execução sub judice, é [1] a comunicação da autoria do mandatário da Recorrida, datada de 17 de Fevereiro de 2021, [2] acompanhada do contrato de arrendamento;
C)–Afigura-se absoluta e inequivocamente irrelevante para/na apreciação do mérito dos presentes autos, a intervenção ou não do Recorrente, naqueloutros que correram termos sob o Processo n.° 2259/19.0YLPRT, no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste, Juízo Local Cível de Sintra, Juiz 4, e consequentemente, a sua vinculação ou não à sentença aí proferida;
D)–Sendo certo que, o direito de defesa do Recorrente, sempre estaria assegurado, precisamente, conforme o fez, deduzindo embargos à execução que contra si moveu a Recorrida;
E)–A Recorrida entendeu por bem, anexar a sentença em apreço àquela interpelação - única e exclusivamente -, como documento suporte, susceptível de demonstrar a liquidação dos valores em dívida, ou seja, todos os dados para o cálculo aritmético dos montantes em dívida.
F)–Nos termos contratualizados, o Recorrido, na qualidade de fiador, é solidária e pessoalmente responsável pelas obrigações advenientes do contrato, nas quais expressamente aí se incluem as indemnizações, pela entrega tardia do locado.
G)–A fiança assim prestada deverá pois, subsistir até à efectiva restituição do local livre e devoluto e nas condições estipuladas;
H)–A fiança não se extingue com a cessação do contrato de arrendamento;
I)–Devendo responder também, pelo valor devido a título de indemnização pelo atraso na entrega do locado;
J)–A posição jurisprudencial dominante à presente data, é a de que o legislador equipara as quantias devidas nos termos do artigo 1045° do CC, a rendas.”
O recurso foi admitido como apelação, com subida nos próprios autos e efeito devolutivo.
Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
*
II–Fundamentos de Facto:
A decisão da 1ª instância fixou como provada a seguinte factualidade:
1)–No dia 10 de Setembro de 2021, foi dada em execução sentença, que aqui se dá por integralmente reproduzida, proferida a 6 de Janeiro de 2021, no âmbito do processo n.° 2259/19.0YLPRT, que correu termos no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste, Juízo Local Cível de Sintra, Juiz 4.
2)–Nesses autos a exequente...
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