Acórdão nº 1360/08.0TBFAF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 07-10-2010
Judgment Date | 07 October 2010 |
Acordao Number | 1360/08.0TBFAF.G1 |
Year | 2010 |
Court | Court of Appeal of Guimarães (Portugal) |
Acordam os Juízes na 1ª Secção do Tribunal da Relação de Guimarães.
I- Relatório:
A…., casado, veio propor contra B…. e mulher C…., acção declarativa de condenação sob a forma sumária, pedindo, em síntese, que seja declarado válido e eficaz o contrato promessa de compra e venda por si celebrado com os RR., em Junho de 1994, respeitante à parcela de terreno identificada nos autos, declarando-se suprida a declaração negocial dos RR. faltosos no que respeita à venda respectiva, “designadamente considerando que os mesmos venderam ao A. o prédio identificado no art. 1º desta petição, pelo preço de 3.622.976$00 a que corresponde € 18.071,50, já recebido do A.”. Refere, para tanto, que os RR. vêm protelando a realização da escritura pública respectiva, alegando que estão a tratar da desanexação da parcela, e que aquela escritura pública apenas se não efectuou por culpa exclusiva destes.
Contestou a Ré mulher, arguindo a sua ilegitimidade passiva, atento o óbito do R. marido e a ausência de todos os seus herdeiros na causa, e invocando que o A., ao celebrar o aludido contrato promessa de compra e venda, convenceu os RR. demandados de que iria ele próprio proceder à legalização da parcela prometida, tendo sido nessa condição que os RR. celebraram o negócio. Mais refere que o A. jamais procedeu à interpelação para a realização da escritura. Conclui pela procedência da excepção e improcedência da causa.
Foi apresentado articulado de resposta, ali se concluindo como na p.i..
Deduzido pelo A. o correspondente incidente de habilitação por óbito do primitivo R. marido, foi tal incidente julgado procedente e declaradas D… e E…., casada com F…. , habilitadas para prosseguirem na causa como herdeiras do falecido B…..
Seguidamente, foi proferido saneador sentença que, conhecendo do mérito da causa, julgou a acção improcedente com o seguinte fundamento: “Resulta da matéria de facto dada como provada que a parcela objecto da promessa que se pretende executar ainda não se mostra autonomizada, isto é, destacada do prédio mãe. Ora, é o próprio autor que reconhece, em sede de resposta à contestação, que sem tal desanexação não pode ser celebrada a escritura pública, posto que esta pressupõe a autonomia jurídica da parcela a alienar. Assim, também não poderá o Tribunal proferir sentença em que faça produzir os efeitos da declaração negocial do promitente faltoso se não estiver demonstrada a desanexação do imóvel a alienar. Conclui-se, por isso, sem necessidade da aferição da argumentação esgrimida pelas partes, que o autor não pode prevalecer-se da execução específica do contrato-promessa e obter sentença que fizesse proceder esse pedido.”
Inconformado, o A. recorreu da sentença, apresentando as respectivas alegações as quais culmina com as seguintes conclusões que se transcrevem:
“
1- Os autos não contêm desde já todos os elementos para se poder apreciar o mérito da causa.
2- Deve ser fixada a base instrutória e os autos prosseguirem os demais trâmites legais.
3- A douta sentença ora em crise violou o disposto no art. 668 nº 1 alínea b) do C.P.C., porquanto não contém os fundamentos de direito que justificam a decisão.
4- A sentença ora em crise violou o disposto nos arts. 508-A, 510, 511 e 668 nº 1 alínea b) todos do C.P.C..”
Por seu turno, as recorridas apresentaram contra-alegações nas quais concluem, em contrário, que dos autos já constam todos os elementos para a apreciação de mérito e que a sentença recorrida não enferma de nulidade ou irregularidade, pelo que deve ser mantida.
O recurso foi adequadamente admitido como de apelação, com subida imediata nos próprios autos, e efeito meramente devolutivo.
Proferido o despacho a que alude o art. 670, nº 1, do C.P.C., após convite deste Tribunal, entendeu-se não existir a nulidade arguida.
Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
***
II- Fundamentos de Facto:
A decisão da 1ª instância fixou como provada a seguinte factualidade:
1. Por documento escrito assinado pelo autor, B…. e mulher, C… datado de 29.6.1994, que consta de fls. 8 e verso, estes declararam que prometiam vender ao autor, uma parcela de terreno, com a área de 2.297,92 m2, a confrontar do Norte com o vendedor, do Sul com ….., Nascente com loteamento da Quinta dos Lemos, e do Poente com o campo, a desanexar do prédio rústico denominado “Coutada dos Estremadouros”, sito no Lugar de Fontelas, Freguesia de Airões São Romão, descrito na Conservatória do Registo Predial de Fafe sob o n.º 18 225, inscrito na matriz sob o art. 372º - cfr. ponto 1;
2. Consta do mesmo documento que o preço da compra e venda é de Esc. 3.622.976$00, que B….e mulher, C…., já receberam do autor, de que lhe dão quitação total – cfr. ponto 2;
3. Consta do referido documento que a parcela de terreno objecto do contrato que titula já se encontra dividida e demarcada do prédio rústico donde vai ser desanexada, tendo o autor Assinala-se que na sentença, por manifesto lapso, se fazia neste ponto da matéria de facto referência ao “réu”, sendo que do “autor” evidentemente se trata, analisado, além do mais, o documento mencionado no ponto 1. Corrigiu-se, assim, o lapso na reprodução da matéria de facto tida por assente na 1ª instância. construído um muro de blocos de cimento, com a altura de 90 cm, encimado por uma rede com a altura de 1 m – cfr. ponto 3;
4. Consta do mencionado documento que a escritura será celebrada logo que o autor Também aqui, e nos termos atrás referidos, se fazia referência ao “réu”, o que se corrigiu nos mesmos moldes atrás assinalados. deseje, devendo avisar B…. e mulher, C…., por qualquer meio, da data e local da sua realização, com a antecedência de oito dias – cfr. ponto 4;
5. O prédio mencionado em 1 encontra-se inscrito na Conservatória do Registo Predial de Fafe sob o n.º 863/19960325, encontrando-se registada a favor da habilitada F…. a aquisição do respectivo direito de propriedade, por sucessão hereditária e partilha por óbito de B…., mediante a apresentação 20 de 13.10.2008 – cfr. fls. 64 e ss.;
6. Na Conservatória do Registo Predial de Fafe, sobre o prédio referido em 1 e 5, não se mostra inscrita a desanexação da parcela mencionada em 1 – cfr. fls. 64 e ss.;
7. A parcela mencionada em 1 ainda não foi destacada do prédio referido em 1 e 4 na respectiva matriz.
***
III- Fundamentos de Direito:
Cumpre apreciar do objecto do recurso.
À luz do novo regime aplicável aos recursos (aprovado pelo DL nº 303/07, de 24.8), tal como antes sucedia, são as conclusões que delimitam o respectivo âmbito (cfr. arts. 684, nº 3, e 685-A, do C.P.C.). Por outro lado, não deve o tribunal de recurso conhecer de questões que não tenham sido suscitadas no tribunal recorrido e de que, por isso, este não cuidou nem tinha que cuidar, a não ser que sejam de conhecimento oficioso (art. 660, nº 2, “ex vi” do art. 713, nº 2, do mesmo C.P.C.). É também incontroverso que, sem prejuízo destas últimas questões, os recursos visam apenas modificar as decisões impugnadas mediante o reexame das questões nelas equacionadas e não apreciar matéria nova sobre a qual o tribunal recorrido não teve ensejo de se pronunciar.
Compulsadas as conclusões do recurso, verifica-se que as questões que importa apreciar respeitam à arguida nulidade da sentença e à oportunidade do conhecimento do mérito da causa no despacho saneador.
A) Da nulidade da sentença:
Defende o apelante a nulidade da sentença, ao abrigo do disposto no art. 668, nº 1, al. b), do C.P.C., sustentando que a mesma não especificou os fundamentos de direito que sustentam a decisão.
Cumpre recordar que as nulidades da decisão, previstas no art. 668 do C.P.C., são deficiências da sentença que não podem confundir-se com o erro de julgamento que se traduz antes numa desconformidade entre a decisão e o direito (substantivo ou adjectivo) aplicável. Nesta última situação, o tribunal fundamenta a decisão, mas decide mal; resolve num certo sentido as questões colocadas porque interpretou e/ou aplicou...
I- Relatório:
A…., casado, veio propor contra B…. e mulher C…., acção declarativa de condenação sob a forma sumária, pedindo, em síntese, que seja declarado válido e eficaz o contrato promessa de compra e venda por si celebrado com os RR., em Junho de 1994, respeitante à parcela de terreno identificada nos autos, declarando-se suprida a declaração negocial dos RR. faltosos no que respeita à venda respectiva, “designadamente considerando que os mesmos venderam ao A. o prédio identificado no art. 1º desta petição, pelo preço de 3.622.976$00 a que corresponde € 18.071,50, já recebido do A.”. Refere, para tanto, que os RR. vêm protelando a realização da escritura pública respectiva, alegando que estão a tratar da desanexação da parcela, e que aquela escritura pública apenas se não efectuou por culpa exclusiva destes.
Contestou a Ré mulher, arguindo a sua ilegitimidade passiva, atento o óbito do R. marido e a ausência de todos os seus herdeiros na causa, e invocando que o A., ao celebrar o aludido contrato promessa de compra e venda, convenceu os RR. demandados de que iria ele próprio proceder à legalização da parcela prometida, tendo sido nessa condição que os RR. celebraram o negócio. Mais refere que o A. jamais procedeu à interpelação para a realização da escritura. Conclui pela procedência da excepção e improcedência da causa.
Foi apresentado articulado de resposta, ali se concluindo como na p.i..
Deduzido pelo A. o correspondente incidente de habilitação por óbito do primitivo R. marido, foi tal incidente julgado procedente e declaradas D… e E…., casada com F…. , habilitadas para prosseguirem na causa como herdeiras do falecido B…..
Seguidamente, foi proferido saneador sentença que, conhecendo do mérito da causa, julgou a acção improcedente com o seguinte fundamento: “Resulta da matéria de facto dada como provada que a parcela objecto da promessa que se pretende executar ainda não se mostra autonomizada, isto é, destacada do prédio mãe. Ora, é o próprio autor que reconhece, em sede de resposta à contestação, que sem tal desanexação não pode ser celebrada a escritura pública, posto que esta pressupõe a autonomia jurídica da parcela a alienar. Assim, também não poderá o Tribunal proferir sentença em que faça produzir os efeitos da declaração negocial do promitente faltoso se não estiver demonstrada a desanexação do imóvel a alienar. Conclui-se, por isso, sem necessidade da aferição da argumentação esgrimida pelas partes, que o autor não pode prevalecer-se da execução específica do contrato-promessa e obter sentença que fizesse proceder esse pedido.”
Inconformado, o A. recorreu da sentença, apresentando as respectivas alegações as quais culmina com as seguintes conclusões que se transcrevem:
“
1- Os autos não contêm desde já todos os elementos para se poder apreciar o mérito da causa.
2- Deve ser fixada a base instrutória e os autos prosseguirem os demais trâmites legais.
3- A douta sentença ora em crise violou o disposto no art. 668 nº 1 alínea b) do C.P.C., porquanto não contém os fundamentos de direito que justificam a decisão.
4- A sentença ora em crise violou o disposto nos arts. 508-A, 510, 511 e 668 nº 1 alínea b) todos do C.P.C..”
Por seu turno, as recorridas apresentaram contra-alegações nas quais concluem, em contrário, que dos autos já constam todos os elementos para a apreciação de mérito e que a sentença recorrida não enferma de nulidade ou irregularidade, pelo que deve ser mantida.
O recurso foi adequadamente admitido como de apelação, com subida imediata nos próprios autos, e efeito meramente devolutivo.
Proferido o despacho a que alude o art. 670, nº 1, do C.P.C., após convite deste Tribunal, entendeu-se não existir a nulidade arguida.
Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
***
II- Fundamentos de Facto:
A decisão da 1ª instância fixou como provada a seguinte factualidade:
1. Por documento escrito assinado pelo autor, B…. e mulher, C… datado de 29.6.1994, que consta de fls. 8 e verso, estes declararam que prometiam vender ao autor, uma parcela de terreno, com a área de 2.297,92 m2, a confrontar do Norte com o vendedor, do Sul com ….., Nascente com loteamento da Quinta dos Lemos, e do Poente com o campo, a desanexar do prédio rústico denominado “Coutada dos Estremadouros”, sito no Lugar de Fontelas, Freguesia de Airões São Romão, descrito na Conservatória do Registo Predial de Fafe sob o n.º 18 225, inscrito na matriz sob o art. 372º - cfr. ponto 1;
2. Consta do mesmo documento que o preço da compra e venda é de Esc. 3.622.976$00, que B….e mulher, C…., já receberam do autor, de que lhe dão quitação total – cfr. ponto 2;
3. Consta do referido documento que a parcela de terreno objecto do contrato que titula já se encontra dividida e demarcada do prédio rústico donde vai ser desanexada, tendo o autor Assinala-se que na sentença, por manifesto lapso, se fazia neste ponto da matéria de facto referência ao “réu”, sendo que do “autor” evidentemente se trata, analisado, além do mais, o documento mencionado no ponto 1. Corrigiu-se, assim, o lapso na reprodução da matéria de facto tida por assente na 1ª instância. construído um muro de blocos de cimento, com a altura de 90 cm, encimado por uma rede com a altura de 1 m – cfr. ponto 3;
4. Consta do mencionado documento que a escritura será celebrada logo que o autor Também aqui, e nos termos atrás referidos, se fazia referência ao “réu”, o que se corrigiu nos mesmos moldes atrás assinalados. deseje, devendo avisar B…. e mulher, C…., por qualquer meio, da data e local da sua realização, com a antecedência de oito dias – cfr. ponto 4;
5. O prédio mencionado em 1 encontra-se inscrito na Conservatória do Registo Predial de Fafe sob o n.º 863/19960325, encontrando-se registada a favor da habilitada F…. a aquisição do respectivo direito de propriedade, por sucessão hereditária e partilha por óbito de B…., mediante a apresentação 20 de 13.10.2008 – cfr. fls. 64 e ss.;
6. Na Conservatória do Registo Predial de Fafe, sobre o prédio referido em 1 e 5, não se mostra inscrita a desanexação da parcela mencionada em 1 – cfr. fls. 64 e ss.;
7. A parcela mencionada em 1 ainda não foi destacada do prédio referido em 1 e 4 na respectiva matriz.
***
III- Fundamentos de Direito:
Cumpre apreciar do objecto do recurso.
À luz do novo regime aplicável aos recursos (aprovado pelo DL nº 303/07, de 24.8), tal como antes sucedia, são as conclusões que delimitam o respectivo âmbito (cfr. arts. 684, nº 3, e 685-A, do C.P.C.). Por outro lado, não deve o tribunal de recurso conhecer de questões que não tenham sido suscitadas no tribunal recorrido e de que, por isso, este não cuidou nem tinha que cuidar, a não ser que sejam de conhecimento oficioso (art. 660, nº 2, “ex vi” do art. 713, nº 2, do mesmo C.P.C.). É também incontroverso que, sem prejuízo destas últimas questões, os recursos visam apenas modificar as decisões impugnadas mediante o reexame das questões nelas equacionadas e não apreciar matéria nova sobre a qual o tribunal recorrido não teve ensejo de se pronunciar.
Compulsadas as conclusões do recurso, verifica-se que as questões que importa apreciar respeitam à arguida nulidade da sentença e à oportunidade do conhecimento do mérito da causa no despacho saneador.
A) Da nulidade da sentença:
Defende o apelante a nulidade da sentença, ao abrigo do disposto no art. 668, nº 1, al. b), do C.P.C., sustentando que a mesma não especificou os fundamentos de direito que sustentam a decisão.
Cumpre recordar que as nulidades da decisão, previstas no art. 668 do C.P.C., são deficiências da sentença que não podem confundir-se com o erro de julgamento que se traduz antes numa desconformidade entre a decisão e o direito (substantivo ou adjectivo) aplicável. Nesta última situação, o tribunal fundamenta a decisão, mas decide mal; resolve num certo sentido as questões colocadas porque interpretou e/ou aplicou...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO