Acórdão nº 12984/19.0T8PRT.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 25-01-2021

Data de Julgamento25 Janeiro 2021
Número Acordão12984/19.0T8PRT.P1
Ano2021
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Pº nº 12984/19.0T8PRT.P1
Apelação
(490)
ACÓRDÃO

Acordam os Juízes do Tribunal da Relação do Porto

I - RELATÓRIO

B…, intentou a presente ação comum contra C…, com o seguinte pedido: ser reconhecido que a oposição por carta do autor à renovação do contrato de arrendamento em que a ré é titular passiva, com destino a habitação relativo à casa . do prédio sito na Rua …, n.º…, no Porto, é válida e, em consequência, a ré condenada a reconhecer que por via dela esse contrato de arrendamento cessou em 31 de maio de 2019 e, em consequência, a ré condenada a entregar imediatamente ao autor a casa . do prédio sito na Rua …, n.º…, no Porto, livre de pessoas e das suas coisas.
Alegou, para tal e em suma, que por contrato, iniciado em 1 de fevereiro de 1976, os então proprietários D… e E… cederam de arrendamento a F… que, por sua vez, lhes tomou de arrendamento, a casa . do prédio sito na Rua …, n.º…, …, no Porto, inscrita na matriz predial urbana da referida freguesia sob o artigo 1547, com destino a habitação dos arrendatários, pelo prazo de 12 meses, com início em 1 de fevereiro de 1976 e termo em 31 de janeiro de 1977, pela renda mensal de 590$00 a pagar em casa do senhorio no 1.º dia útil do mês anterior ao que respeitar. Mais alegou que a ré foi casada com F… de quem se divorciou por sentença de 23 de fevereiro de 1995, tendo-lhe sido atribuído no divórcio o direito ao arrendamento em questão; por sua vez, o autor sucedeu aos primitivos locadores e desde há cerca de 20 anos que ocupa a posição de senhorio e a ré a posição de inquilina no arrendamento alegado.
Aduziu, ainda, que em 17 de fevereiro de 2014 dirigiu à ré carta registada com aviso de receção a comunicar a intenção de transição do contrato de arrendamento para o NRAU e proceder a atualização da renda, indicando como valor de renda mensal a quantia de €129,89, sendo o contrato com prazo certo e duração de cinco anos, informando que o valor do locado é de € 23 380,00. Carta a que a ré respondeu informando que concorda com a atualização da renda e transição do contrato de arrendamento para o NRAU.
Por fim, alegou que, com um ano de antecedência, comunicou à ré por carta registada com AR, a sua oposição à renovação do contrato a prazo certo pelo período de 5 anos, carta que a ré recebeu em 3 de março de 2018; porém a ré não procedeu à desocupação e entrega do arrendado.

A ré contestou a ação e, em suma, alegou que o autor tinha conhecimento que a ré é uma pessoa de idade avançada, praticamente analfabeta e que vive com o salário de empregada doméstica e o autor sempre a tranquilizou no sentido de não se preocupar com a comunicação enviada, que a mesma servia apenas para que fosse atualizado o valor da renda e não teve a verdadeira noção do efeito que as comunicações do autor se refletissem nas condições do contrato de arrendamento.
Mais alegou que se encontrava em situação de proteção, prevista no n.º4 do artigo 31.º da Lei 6/2006, sendo que o autor usou de má-fé, ludibriando a mesma, fazendo-a acreditar que a sua comunicação não traria nenhuma consequência para o contrato de arrendamento em vigor. Alegou, ainda, que tanto quanto se recorda na comunicação recebida do autor apenas fazia referência a que o contrato ficaria sujeito as regras do NRAU, não tendo sido fixado qualquer prazo contratual, nem feita qualquer referência ao tipo de contrato, sendo ineficaz.
Por fim, concluiu que o contrato não foi validamente transitado para o NRAU.

O autor respondeu à matéria de exceção invocada pela ré, pugnando pela improcedência da mesma.

Foi proferida sentença que:
- Por inconstitucional a alteração introduzida pela Lei 31/2012 de 14/8 no artigo 26.º, n.º4 a) da Lei 6/2006 de 27/2 ao ofender o direito do arrendatário à permanência no arrendado quando se tenha mantido por um período superior a 30 anos integralmente transcorrido à data da entrada em vigor da Lei 31/2012, julgou inválida a transição do contrato de arrendamento para o NRAU e para o tipo de arrendamento com prazo certo e a sua subsequente cessação por oposição do senhorio à sua renovação, e em consequência:
- Julgou a presente ação improcedente e absolveu a C… do pedido formulado pelo autor B…;
- Absolveu a ré do pedido de condenação como litigante de má-fé.

Inconformado, apelou o autor, apresentando alegações cujas conclusões são as seguintes:
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Foram apresentadas contra-alegações pela ré, cujas conclusões são as seguintes:
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Foram colhidos os vistos legais.

II – QUESTÕES A RESOLVER

Como se sabe, o âmbito objectivo do recurso é definido pelas conclusões do recorrente importando decidir as questões nelas colocadas – e, bem assim, as que forem de conhecimento oficioso –, exceptuadas aquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras – artºs. 635º, 639º e 663º, todos do Código Processo Civil.
Assim, em face das conclusões apresentadas, são as seguintes as questões a resolver por este Tribunal:
1. Do erro na interpretação e aplicação do regime transitório, previsto na Lei nº 6/2006 de 27/02, com a redacção da Lei nº 31/2012 de 14/08, aos contratos de arrendamento, para fins habitacionais, celebrados antes da entrada em vigor do Dec-Lei nº 321-B/90 de 15/10 (RAU).
2. Da conformidade constitucional da alteração introduzida pela Lei 31/2012 de 14/08 ao disposto na al. a) do nº 4 do artº 26º da Lei nº 6/2006 de 27/02.
3. Da litigância de má fé.

III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Factos Assentes:
1. Por contrato iniciado em 1 de fevereiro de 1976 D… e E… cederam a F… o uso e fruição da casa . do prédio sito na Rua …, n.º…, freguesia …, no Porto, inscrita na matriz predial urbana da referida freguesia sob o artigo 1547, mediante o pagamento da renda mensal de €590$00 (€2,94) a pagar em casa do senhorio no 1.º dia útil do mês anterior ao que respeitar, com destino a habitação dos arrendatários.
2. Pelo prazo de 12 meses, com início em 1 de fevereiro de 1976 e termo em 31 de janeiro de 1977, tudo conforme documento n.º2, junto com a petição inicial, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
3. A ré foi casada com F…, de quem se divorciou por sentença de 23 de fevereiro de 1995 do 1.º juízo do Tribunal de Família do Porto, tendo-lhe sido atribuído no divórcio o direito ao arrendamento do imóvel referido em 1).
4. O autor sucedeu aos primitivos locadores e desde há cerca de 20 anos que ocupa a posição de senhorio.
5. A ré paga a renda ao autor e o autor emite os correspondentes recibos em nome da ré.
6. Com data de 17 de fevereiro de 2014 o autor dirigiu à ré, carta registada com aviso de receção, com o seguinte teor: «Ao abrigo do disposto no artigo 30.º da Lei 6/2006 de 27/2, com a nova redação dada pela Lei 31/2012 de 14 de agosto, venho comunicar-lhe a minha intenção respeitante à transição para o NRAU e à atualização da renda mensal da Casa . do prédio urbano sito na Rua,, freguesia, concelho do Porto, inscrito na respetiva matriz sob o artigo 1547, de que V. Excia é arrendatária. Deste modo, indico como valor de renda mensal a quantia de €129,89 (cento e vinte e nove euros e oitenta e nove cêntimos), sendo o contrato com prazo certo e duração de 5 anos, informado V. Ex. cia que o valor do locado é de €23 380,00, pelo que, junto cópia da respetiva caderneta predial urbana.
7. Carta a que a ré respondeu, por comunicação datada de 26 de fevereiro de 2014: «Na qualidade de arrendatária da Casa 6 do prédio sito na Rua, n.º…, ….-… Porto, venho informar V. Excia que concordo com a atualização da renda e transição do contrato de arrendamento para o NRAU. Gostaria, no entanto, que me informasse o mês exato em que terei de iniciar o pagamento da renda pelo novo valor (129,89).
8. A que o autor respondeu em 12 de março de 2014: «Em resposta à sua carta de 26 de fevereiro, em que expressa a sua concordância com a transição do contrato de arrendamento para o NRAU, bem como a atualização da renda, venho comunicar-lhe que: - O novo valor (129,89€) passará a vigorar a partir da renda que se vence no próximo mês de maio”.
9. Por carta registada com aviso de receção que a ré recebeu em 3 de março de 2018 o autor comunicou à ré a sua oposição à renovação do contrato a prazo certo pelo período de 5 anos.
10. A renda desde maio de 2018 é de €132,27 mensais. 11. A ré nasceu no dia 27 de novembro de 1953.
11. A ré nasceu no dia 27 de novembro de 1953.
12. A ré é empregada doméstica e aufere cerca de €500,00 mensais.

Factos não provados:
1- A ré é analfabeta.
2- O autor tranquilizou a ré no sentido de que a comunicação enviada servia apenas para que fosse atualizado o valor da renda.
3- A ré não teve a noção de efeito que as comunicações do autor se refletissem nas condições do contrato de arrendamento,

IV – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

1.Do erro na interpretação e aplicação do regime transitório, previsto na Lei nº 6/2006 de 27/02, com a redacção da Lei nº 31/2012 de 14/08, aos contratos de arrendamento, para fins habitacionais, celebrados antes da entrada em vigor do Dec-Lei nº 321-B/90 de 15/10 (RAU).

O autor/senhorio, ora recorrente pretende que se considere válida a sua oposição à renovação do contrato de arrendamento em que a ré/recorrida é a arrendatária e, como consequência seja a ré condenada a reconhecer que o contrato de arrendamento cessou e por via disso a entregar o locado livre de pessoas e bens.
A sentença recorrida assim não entendeu absolvendo a ré do pedido formulado pelo autor, por ter recusado a aplicação do artº 26º nº 4 al. a) da Lei nº 6/2006 de 27/02 na redacção da Lei nº 31/2012 de 14/08, julgando inválida a transicção do contrato de arrendamento para o NRAU e para o tipo de arrendamento com prazo certo e a sua subsequente cessação por oposição do senhorio à sua renovação.
Vejamos a quem assiste razão.
Tal como decorre do ponto 1 dos factos provados, estamos perante um
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