Acórdão nº 129/16.3GILRS.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça, 19-12-2018

Data de Julgamento19 Dezembro 2018
Case OutcomePROVIDO
Classe processualRECURSO PENAL
Número Acordão129/16.3GILRS.L1.S1
ÓrgãoSupremo Tribunal de Justiça

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

I. Relatório

No Juízo Local Criminal de Torres Vedras, da Comarca de Lisboa Norte, foram julgados:

AA, a quem eram imputados um crime de violência doméstica, p. e p. pelo art. 152º, nºs 1, a), e 2, do Código Penal (CP), e um crime de dano, p. e p. pelo art. 212º, nº 1, do CP;

BB, a quem eram imputados um crime de violação de domicílio ou perturbação da vida privada, p. e p. pelo art. 190º, nºs 1 e 3, do CP, e um crime de dano, p. e p. pelas disposições citadas.

Por sentença de 14.7.2017, foi o arguido AA absolvido do crime de violência doméstica, mas condenado pelo crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo art. 143º do CP, na pena de 100 dias de multa, à taxa diária de 5,00 €, e condenado também por um crime de dano, na pena de 150 dias de multa, à mesma taxa diária. Em cúmulo, foi o arguido condenado em 220 dias de multa, à mesma taxa diária. Foi ainda este arguido condenado no pagamento de uma indemnização à assistente/demandante CC no montante de 300,00 €, a título de danos não patrimoniais.

Pela mesma sentença foi o arguido BB condenado, por um crime de violação de domicílio, p. e p. pelas disposições atrás citadas, na pena de 100 dias de multa, e, por um crime de dano, na pena de 250 dias de multa, ambos à taxa diária de 5,00 €. Em cúmulo, foi condenado em 310 dias de multa, à mesma taxa diária. Mais foi condenado a pagar à assistente/demandante CC a quantia de 6 161,55 €, por danos patrimoniais.

Foi dada como provada nessa sentença a seguinte matéria de facto:

1. O arguido AA e CC mantiveram uma relação de namoro entre os meses de Fevereiro e Junho de 2016, encontrando-se, para o efeito, quer na residência daquele, sita na Rua ..., quer na residência desta, sita na ..., também em Loures.

2. No decurso da relação, CC abriu com o arguido uma empresa de "laser", o que sucedeu no dia 18 de Abril de 2016.

3. O arguido AA, em número de vezes indeterminado, disse-lhe "És burra que nem uma porta! És uma estúpida! És uma ignorante!".

4. O arguido AA exigiu a CC que lhe fizesse um relatório diário pormenorizado dos seus passos.

5. Foi instalando um dispositivo de localização por GPS no veículo automóvel normalmente utilizado por CC.

6. Após o término da relação em Junho de 2016, manteve-se a convivência profissional entre ambos.

7. Após, o arguido AA, enviou mensagens escritas (sms e Whatsapp) para CC, nas quais lhe disse "Isto vai-te correr muito mal CC te garanto! Estás a criar um ódio dentro de mim CC e isso não é bom! Prepara-te! Prepara-te! és muito ignorante e tu sabes disso!".

8. Entre as 21h00 do dia 22 de Julho de 2016 e as 08h00 do dia seguinte, o arguido AA retirou do local onde se encontrava estacionado, em frente ao prédio de CC, o veículo automóvel por esta habitualmente utilizado, de matrícula ..., e que foi adquirido pela sociedade comercial de ambos a que acima se aludiu.

9. No dia 17 de Agosto de 2016, pelas 17h15, o arguido AA seguiu CC pela rotunda existente à loja IKEA, sita em ..., sendo que esta refugiou-se no interior da Esquadra da PSP de ...

10. No dia 18 de Agosto de 2016, cerca das 21h15, CC visualizou o referido veículo automóvel, de matrícula ...; após o que foi guardá-lo, como habitual, na garagem de uma pessoa amiga - em concreto de DD -, sita na ..., num local muito próximo da sua residência.

11. Momentos antes, o arguido BB, pai do arguido AA, destruiu a porta da residência de CC - que forçou rebentando com a fechadura -, introduzindo-se, deste modo, no seu interior, onde vandalizou e estragou vários objectos desta, que lá se encontravam, nomeadamente uma máquina de depilação modelo IPLBI84LCD, dois castiçais de marca Swarovski, um candeeiro, uma estátua retratando Buda e uma moldura, bem como na porta de entrada, no chão do corredor e nas paredes do corredor.

12. Nesse entretanto, o arguido AA destruiu o portão da referida garagem, tendo no acto sido detido em flagrante delito, cerca das 03h00, juntamente com seu pai, pelos agentes da PSP que se deslocaram ao local, alertados pelos vizinhos de CC por causa do arrobamento da porta da residência desta e acima referido.

13. Os danos causados pelo arguido BB na residência de CC e nos vários objectos supra descritos ascendem ao valor global de € 6.161,55.

14. E os estragos causados pelo arguido AA na porta da garagem acima referida, perfazem o montante global de € 1.598,20.

15. No dia 27 de Agosto de 2016, cerca das 11h00, o arguido AA seguiu CC até à "Clínica ...", sita na ..., e estacionou o veículo que conduzia mesmo à porta do estabelecimento, visando controlar os movimentos daquela.

16. No dia 14 de Setembro de 2016, pelas 12h45, o arguido AA seguiu CC até ao estabelecimento "...", sito na Rua ...; e, em acto contínuo, agarrou-a violentamente pelos cabelos e arrastou-a, pelos cabelos, para junto do veículo no qual se transportava.

17. Na semana anterior, o arguido AA tinha estado no dito estabelecimento comercial, onde fazendo-se passar por cliente obteve a informação sobre o dia e o horário em que CC ali iria realizar os tratamentos referidos.

18. No dia 31 de Agosto de 2016, foi entregue a CC o aparelho relativo à sua inserção no programa de protecção por teleassistência, que a mesma accionou no dia 14 de Setembro de 2016.

19. O arguido AA sabia que, com as condutas acima descritas em 3), ofendia CC na sua honra e consideração pessoais, desassossegava a sua vida pessoal, a impedia de trabalhar, de recuperar a sua vida e de manter a sua integridade psíquica, e quis fazê-lo.

20. O arguido AA sabia que a conduta acima descrita em 16), molestava fisicamente a ofendida. (idem).

21. Sabia ainda o arguido AA que, na ocasião referida em 12), causava estragos na porta de uma garagem que não lhe pertencia.

22. O arguido BB ao agir da forma descrita sabia que estava a entrar numa residência que não lhe pertencia e que não dispunha de autorização para o efeito e que estava a fazê-lo contra a vontade da sua legítima proprietária, e ainda assim não se absteve de fazê-lo, pois que nela entrou e no seu interior causou estragos nos objectos daquela e que se mostram supra descritos.

23. Os arguidos agiram em tudo de forma livre, deliberada e consciente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei.

24. Como consequência da conduta do arguido AA, no dia 14.09.2016, CC foi assistida no Hospital ..., em episódio de urgência, na qual foi sujeita a assistência médica, no valor total de 98,11.

25. O arguido AA não tem antecedentes criminais.

26. O arguido AA encontra-se desempregado.

27. Vive com a mãe e uma companheira, a qual é administrativa.

28. Possui o 12.º ano de escolaridade.

29. Por sentença do Tribunal de Vila Franca de Xira, datada de 31.01.2008, transitada em julgado em 03.03.2008, o arguido BB foi condenado pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, praticado em 10.08.2007, na pena de 100 dias de multa à taxa diária de €2,50.

30. Por sentença do Tribunal de Vila Franca de Xira, datada de 11.11.2008, transitada em julgado em 26.01.2009, o arguido BB foi condenado pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, praticado em 09.11.2008, na pena de 200 dias de multa à taxa diária de €2,50.

31. Por sentença do Tribunal de Vila Franca de Xira, datada de 24.01.2013, transitada em julgado em 14.02.2013, o arguido BB foi condenado pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, praticado em 23.01.2013, na pena de 3 meses de prisão substituída por 90 horas de trabalho a favor da comunidade.

32. Por sentença do Tribunal do Cartaxo, datada de 21.01.2009, transitada em julgado em 23.02.2009, o arguido BB foi condenado pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, praticado em 23.07.2008, na pena de 100 dias de multa à taxa diária de €5,00.

33. Por sentença do Tribunal de Vila Franca de Xira, datada de 12.05.2011, transitada em julgado em 02.06.2011, o arguido BB foi condenado pela prática de um crime de violência doméstica, praticado em 01.09.2009, na pena de 2 anos e 3 meses de prisão suspensa na sua execução por igual período de tempo.

34. O arguido BB trabalha ocasionalmente como carpinteiro, auferindo nessas alturas quantia entre os € 40,00 e os € 50,00.

35. O arguido BB recebe RSI no valor mensal de € 184,00.

36. Vive sozinho.

37. Possui o 2.° ano antigo.

Factos não provados:

38. O arguido AA convenceu CC a despedir-se do emprego que mantinha como técnica de laser e de abrir com ele uma empresa do dito ramo de actividade.

39. Desde o momento referido em 2), o arguido AA passou a mostrar-se como uma pessoa muito instável, muito prepotente, muito gananciosa, conflituosa e manipuladora, tratando CC como "uma empregada", não a respeitando enquanto mulher e nem como sócia-gerente da empresa.

40. E, nesse período, o arguido "contratou" um indivíduo de identidade não apurada, para atingir fisicamente um ex-empregado, o que, tudo conjugado, fez CC temer seriamente pela sua vida e integridade física, terminando, por isso, o relacionamento que, até então, mantinha com o arguido AA.

41. Porém, o arguido AA não aceitou a decisão de CC e pediu-lhe várias vezes desculpa insistindo em reatar, ao que aquela acedeu, passadas cerca de duas semanas e face aos insistentes pedidos de desculpa do arguido AA.

42. No dia 22 de Junho de 2016, CC decidiu, novamente, terminar a relação, por ter descoberto que o arguido AA era casado.

43. O arguido AA, mais uma vez, não aceitou o término da relação.

44. Desde então, o arguido AA passou a seguir CC por todos os locais que bem sabe que a mesma frequenta, para saber com quem está e o que está a fazer, o que fez diariamente.

45. Além das mensagens referidas em 7), o arguido AA enviou a CC outras de idêntica natureza.

46. Aquando do facto descrito em 9), CC refugiou-se no interior da esquadra por temer o arguido AA.

47. No...

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