Acórdão nº 1279/06.0TVPRT-C.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 04-02-2013

Data de Julgamento04 Fevereiro 2013
Número Acordão1279/06.0TVPRT-C.P1
Ano2013
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto

APELAÇÃO Nº 1279/06.0 TVPRT-C.P1
5ª SECÇÃO
Acordam no Tribunal da Relação do Porto:
I
Aos presentes autos com o nº 1279/06.0TVPRT correm apensados os autos com nº 515/07.0TVPRT, por ter sido considerado que, entre uma e outra ação, existe identidade de causas de pedir e de direito que permitem a coligação ativa, sendo, por isso, conveniente que o saneamento, a questão prejudicial a colocar ao Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias (doravante TJCE, ou TJE) e, o julgamento da causa, sejam feitos em conjunto.

Na ação principal é Autora a B…… e são Rés: C….., associação de direito privado; D….., LIMITED, sociedade comercial com sede em Gibraltar e E….. AG, sociedade comercial com sede na Áustria, entretanto incorporada na sociedade F….. PLC, estando esta devidamente habilitada a intervir nos autos como cessionária.

Na ação apensada (apenso B) são Autoras a G….., H….., SA, I…., SA, J……., SA, K….., SA e L….., SA, sendo Rés as mesmas que na ação anterior.

Nos autos em que é Autora a B….. formulou esta os seguintes pedidos:
a) Ser declarada a nulidade do contrato de patrocínio celebrado entre as RR.;
b) Ser declarada a ilegalidade da atividade das RR. E….. em Portugal e da publicidade a essa atividade;
c) Serem as RR. E….. condenadas a absterem-se de explorar por qualquer forma em Portugal jogos de lotarias e apostas mútuas;
d) Ser ordenada às RR. a proibição de efetuar qualquer publicidade ou divulgação ao sítio E….. .com bem como às 2ª e 3ª RR;
e) Serem as RR. solidariamente condenadas a título de sanção pecuniária compulsória no pagamento de uma quantia pecuniária não inferior a €.50.000,00 (cinquenta mil euros) por cada infração a esta proibição;
f) Ser dada publicidade à decisão de proibição de divulgação e publicidade do sítio E........com e às 2ª e 3ª RR;
g) Serem notificados todos os órgãos de comunicação social portugueses para que se abstenham de publicitar ou divulgar o sítio E....... .com e as 2ª e 3ª RR., devendo tal notificação ser pelo Tribunal ordenada realizar ao ICS-INSTITUTO DA COMUNICAÇÃO SOCIAL - o qual, por sua vez, e nos termos das suas atribuições difundirá a ordem através da publicação de anúncios;
h) Serem as RR. solidariamente condenadas no pagamento à A. de uma indemnização no montante de € 27.296.816,00 e ainda de juros moratórios que à taxa legal se vencerem sobre tal quantia desde a citação até integral e efetivo pagamento.

Nos autos em que são Autoras G….., H…. SA, I….., SA, J….., SA, K….., SA e L….., SA formularam estas os seguintes pedidos:
a) Ser declarada a nulidade do contrato de patrocínio celebrado entre as RR.;
b) Serem as Rés condenadas a reconhecer a nulidade do contrato de patrocínio celebrado;
c) Serem as RR. condenadas a não executar o contrato de patrocínio celebrado;
d) Ser ordenada às Rés a proibição de efetuar qualquer publicidade ao sítio “…… .com”;
e) Serem as RR. solidariamente condenadas a título de sanção pecuniária compulsória no pagamento de uma quantia pecuniária não inferior a € 50.000,00 (cinquenta mil euros) por cada dia em que perdurar a infração das alíneas b) a d);
f) Ser dada publicidade à decisão de proibição de divulgação e publicidade do sítio “…. .com”.

A Autora B….. (doravante B…) fundamentou os seus pedidos, sumariamente, no seguinte:
A B….. prossegue fins humanitários e de ação social; Com vista a financiar esses fins a Lei atribuiu-lhe o direito exclusivo de explorar as lotarias e os concursos de apostas mútuas, em nome e por conta do Estado Português; Compete-lhe igualmente em comparticipação com o Estado, em regime de monopólio, a exploração da lotaria nacional portuguesa; Tem ainda, o direito exclusivo de promover concursos de apostas mútuas em nome e por conta do Estado Português, incluindo a exploração dos jogos sociais através de meios eletrónicos.
A R. C….. é a entidade responsável pela organização, regulamentação e exploração comercial das competições de caráter profissional que se disputam no âmbito da Federação Portuguesa de Futebol. As RR. D…. e E....... .com AG (doravante designadas conjuntamente “E.......”) dedicam-se à exploração, através de meios eletrónicos, de jogos de fortuna e azar, modalidades afins destes e jogos sociais (de apostas mútuas e diferentes formas de lotaria). Fazem-no, nomeadamente, através do seu sítio na internet localizado em www.E....... .com, com versão em língua portuguesa. Não existe qualquer restrição relacionada com a localização territorial dos utilizadores, pelo que qualquer pessoa localizada em Portugal pode jogar e fazer apostas em tal sítio.
Em Agosto de 2005 a R. C….. (doravante C…) e a R. D…. celebraram um contrato de patrocínio a vigorar para as épocas entre 2005 e 2009, assumindo a D....... a condição de Patrocinador Institucional da Super Liga. Para o efeito entregou à C….. determinados montantes, dando-lhe esta, como contrapartida (entre outras), o direito de figurar com o seu nome na designação oficial da Primeira C1..... de Futebol Profissional (“…E....... .com”), que é simultaneamente o endereço do sítio da R..
No cumprimento desse contrato vê, a R. D......., colocado o seu logótipo “E........ com” no espaço de entrevistas rápidas, em todas as mangas das camisolas dos jogadores, nas bolas, junto dos bancos dos treinadores, nos quadros eletrónicos, painéis e écrans, em transmissões televisivas, etc.
A R. C….. obrigou-se inclusive a envidar os seus esforços no sentido de conseguir que a R. D....... possa inserir as probabilidades de determinada partida durante a respetiva transmissão em direto. Contrato que, face à publicidade efetuada, se tornou público em várias das suas vertentes.
Ora, sendo a exploração dos jogos de fortuna e azar, de lotarias e apostas mútuas reservada por lei ao Estado, a atividade das Rés é ilegal, constituindo a exploração ou promoção/publicidade de concursos de apostas mútuas, com violação do exclusivo da B…., uma contraordenação.
Por sua vez, o direito nacional mostra-se compatibilizado com o Direito Comunitário referente aos jogos de fortuna e azar, sendo expressão disso a vasta Jurisprudência proferida pelo TJCE, e em particular o acórdão Anomar que, incidindo expressamente sobre a lei portuguesa – in casu a Lei do Jogo – reconheceu a sua conformidade com o Direito Comunitário.
Compatibilidade essa que resulta do facto de, a legislação nacional que atribui à B…. o exclusivo da exploração de lotarias e de promoção de concursos de apostas mútuas (inclusive através de meios eletrónicos) ter na sua génese e na sua ratio razões imperiosas de interesse público e geral, assentando em preocupações de política social e de prevenção da fraude. Tal lei, não é igualmente, discriminatória em razão da nacionalidade e, é proporcional.
A atividade das Rés não só é ilegal como causa avultados prejuízos à Autora.

As Autoras G….., H…., SA, I…., SA, J….., SA, K…., SA e L…., SA alegam, como fundamento dos seus pedidos, o seguinte:
Em Portugal – por razões que se prendem com a proteção dos seus cidadãos, com a salvaguarda da honestidade do jogo e com a necessidade de sujeitar essa atividade a um adequado controlo - a atividade de exploração de jogos de fortuna e azar, de lotarias e de concursos de apostas mútuas, é reservada por lei ao Estado.
Assim, a exploração de jogos de fortuna e azar depende da concessão deste e apenas é permitida em Casinos, detendo as Autoras por concessão do Estado o exclusivo da exploração de jogos de fortuna e azar no Território Nacional. Como contrapartida de tal exclusividade as sociedades concessionárias (Autoras) encontram-se contratualmente vinculadas, perante aquele, ao pagamento de vultuosas quantias (contrapartidas iniciais e contrapartidas de exploração).
Através do sítio da Internet localizado em www.F... .com as 2ª e 3ª RR. promovem a participação pelos utilizadores de jogos de fortuna e azar, lotarias e concursos de apostas mútuas.
Tal sítio contém concursos de apostas mútuas desportivas relativas ao Campeonato da Primeira Liga Portuguesa de Futebol Profissional.
As Rés C…. e D......./F… celebraram entre si um contrato de patrocínio, que publicita e divulga sob diversas formas, e em diversos momentos, a marca e logótipo destas, correspondente ao referido sítio da Internet.
A imagem que vem sendo publicitada pela Ré viola a norma do art. 21º do Código da Publicidade que prevê que “não podem ser objeto de publicidade os jogos de fortuna ou azar enquanto objeto essencial da mensagem”.
Têm os casinos funções turísticas, sendo a publicidade por si feita, ainda que com inclusão do seu logótipo, destinada a publicitar eventos culturais por si realizados ou a realizar, tendo, por isso, uma função social relevante, não constituindo o incitamento ao jogo, por si só, o objeto essencial da mensagem. Tal não acontece com a publicidade das Rés cuja única atividade é a da exploração de jogos de fortuna e azar.
A publicitação do logótipo “E....... .com”, ou “F…. .com” imposta pelo clausulado contratual, viola o comando do nº 1 do art. 21º do Código da Publicidade, norma legal imperativa, sendo, por isso, nulo o contrato nos termos do art. 294º do Código Civil.

As Rés contestaram e, em ambas as ações centram a sua defesa na argumentação de que a atividade por si desenvolvida é lícita, não se lhes aplicando a legislação portuguesa – seja, porque a atividade que desenvolvem apenas pressupõe o acesso à internet, seja, porque tal resulta da aplicação das normas e jurisprudência comunitárias, pois que, as 2ª e 3ª RR. enquanto sociedades fornecedoras de serviços com escritórios registados e possuidoras de licença emitida num Estado-Membro da EU (União Europeia), têm a liberdade de oferecer e comercializar os seus serviços em outro Estado-Membro da mesma EU.

Assim,
Na ação principal, depois de excecionarem a incompetência territorial e a cumulação ilegal de pedidos (questão já decididas improcedentes com trânsito em julgado),
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