Acórdão nº 1252/22.0YRLSB.S1 de Supremo Tribunal de Justiça, 31-08-2022

Data de Julgamento31 Agosto 2022
Case OutcomeNEGADO PROVIMENTO AO RECURSO
Classe processualEXTRADIÇÃO / M.D.E. / RECONHECIMENTO DE SENTENÇA ESTRANGEIRA
Número Acordão1252/22.0YRLSB.S1
ÓrgãoSupremo Tribunal de Justiça

Acordam na 3ª Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça



1. RELATÓRIO

1.1. O Ministério Público junto do Tribunal da Relação, em conformidade com o disposto nos artigos 39º, 62º n.º 2 e 64º n.º 1, da Lei n.º 144/99, de 31 de Agosto, apresentou AA, solteiro, natural de ..., ..., de nacionalidade britânica, nascido a .../.../1992, filho de BB e de CC, titular do passaporte nº..., emitido em .../.../2021, pelo Reino Unido, válido até 19/01/2031, detido no dia 30 de abril de 2021 pelas 19h15m pelo SEF – ... no Posto ... aérea do aeroporto ... - Lisboa, área da competência do Tribunal da Relação de Lisboa, para audição, nos termos seguintes:

1. O Requerido foi detido no dia 30 de Abril de 2021 pelas 19h15m pelo SEF – ... no Posto ... aérea do aeroporto ... - Lisboa, na área de jurisdição deste Tribunal da Relação de Lisboa,

2. - Com base num mandado de detenção internacional número: ...76 emitido em 10-06-2021, pelo Tribunal [Magistrates Court] de North and East Devon, Reino Unido, inserido na INTERPOL sob caso 2021/41775-1, referência de IP Manchester EP3-145616943-21 de 28-06-2021, Manchester, Reino Unido, pela prática de factos integradores para a autoridade judiciária de emissão como crimes de

1. Conspiração para o fornecimento de droga controlada de classe B.

2. Branqueamento de capitais.

3. Conspiração para o fornecimento de droga controlada de classe A.

4. Conspiração para aquisição de arma de fogo. 5. Conspiração para aquisição de munições. Previsto e punido pela 1. Secção 1(1) da Lei Criminal, de 1977 2. Secções 327(1) e 334 da Lei relativa aos Produtos do Crime, de 2002. 3. Secção 1(1) da Lei Criminal, de 1977 4. Secção 1(1) da Lei Criminal, de 1977 5. Secção 1(1) da Lei Criminal, de 1977, correspondendo-lhe em pormenor: 1. Prisão perpétua 2.14 anos de prisão 3. Prisão perpétua 4. Prisão perpétua 5.10 ano;

3. Segundo o qual o detido é procurado pelas autoridades judiciárias do Reino Unido para efeitos de procedimento criminal pela prática dos factos constantes do referido mandado de detenção internacional, tendo sido acusado de cinco crimes relacionados com fornecimento de drogas, branqueamento de capitais e aquisição de arma de fogo proibida e munições. Entre março e junho de 2020, outros indivíduos produziram, pelo menos, 50kg de ketamina. O Indivíduo Procurado comprou vários quilos dessa ketamina. Em 11 de maio de 2020, o Indivíduo Procurado providenciou para que fosse entregue dinheiro ao seu fornecedor. Ordenou a outros que entregassem mais de £600,000 a outra pessoa numa permuta em .... O Indivíduo Procurado é alegadamente um distribuidor regional de droga em todo o Sudoeste de Inglaterra.

Tinha contactos diretos com os fornecedores e providenciava para que a droga circulasse na zona de ... e no Sudoeste. Há muitas mensagens que referem cocaína em blocos de lkg, que o Indivíduo Procurado vendia por aproximadamente £40,000. O Indivíduo Procurado acordou também com outro indivíduo adquirir armas de fogo automáticas e munições para serem utilizadas em atividades criminais no Sudoeste de Inglaterra.

4. Factos adicionais do caso: 6 coarguidos foram acusados e estão a aguardar julgamento.

5. Os referidos factos constituem igualmente crimes para a Lei Portuguesa.

6. A detenção foi efetuada com observância das disposições legais aplicáveis, nomeadamente do disposto no art.º 39º da Lei n.º 144/99, de 31/08.

7. - Por crimes que admitem extradição, não havendo indicação de qualquer motivo que a possa excluir (arts. 31º e 32º da Lei n.º 144/99, de 31/08, promovendo-se desde já que seja solicitada ao Estado requerente a prestação da garantia a que se refere o art. 32º n.º 3 da Lei nº 144/99, de 31/08).

8. Este Tribunal da Relação é o competente para a audição do Requerido e subsequente tramitação do processo.

Nestes termos, requer-se a V.ª Ex.ª que seja dignado dia e hora para a audição do Requerido, nos termos do art.º 64º, nº 1, da Lei n.º 144/99, de 31 de Agosto seguindo-se os demais termos.

Junta: Todo o expediente recebido do Serviço de Estrangeiros Fronteiras».

1.2. Foi proferido despacho liminar e em 2/5/2022, ao abrigo do disposto no art. 18º da Lei 65/2003 de 23/8, a Mmª Juíza Desembargadora do Tribunal da Relação de Lisboa, procedeu á audição de AA, ora Recorrente, assistido por Mandatário e acompanhado por intérprete.

Nesta audição o Recorrente consentiu na execução do mandado, e na consequente entrega á autoridade judiciária do Reino Unido, e tomou posição relativamente ao princípio de especialidade, ao qual não renunciou.

1.3. O Ministério Público promoveu que se julgasse válida a detenção porque legalmente efetuada com base na inserção no SIS de um Mandado de Detenção emitido pela autoridade judiciária competente, e que fosse proferida decisão judicial de homologação de consentimento nos termos do artigo 20° da Lei 65/2003 e que a detenção se mantenha para efeitos de entrega do requerido à autoridade judiciária de emissão, a qual só deverá ter lugar após ser prestada garantia pelo Estado emissor, nos termos do artigo 78° - F da Lei 144/99.

Requereu que se fizessem as devidas comunicações às entidades referidas no artigo 64° n° 2 da Lei 144/99, isto é PGR, Embaixada do Reino Unido e Gabinete Nacional Interpol.

Pelo mandatário do requerido, foi dito nada ter a requerer.

Em, seguida pela Exma. Sra. Desembargadora Relatora, foi proferido o seguinte:

«DESPACHO

Ao Mandado aqui em apreciação, porque emitido pela autoridade judiciária do Reino Unido, que já não é membro da União Europeia aplica-se o regime jurídico do Mandado de Detenção Europeu aprovado pela 65/2003 de 23 de Agosto e, bem assim, o Acordo de Comércio e Cooperação entre a União Europeia e a Comunidade Europeia da Energia Atómica, por um lado, e o Reino Unido da Grã Bretanha e da Irlanda do Norte, por outro aprovado em 30 de Dezembro de 2020, na versão publicada no Jornal Oficial da União Europeia Lei 149 de 30 de Abril de 2021 (Acordo entre a União Europeia e o Reino Unido).

Valido a detenção do requerido, a qual foi efetuada a pedido de autoridade judiciária do Reino Unido, com base no Sistema de Informação Interpol n° ...76. A inserção SIS do Mandado emana de autoridade judiciária competente e contém as informações legalmente exigidas, este é o tribunal competente para julgar o Mandado e os crimes em causa enquadram-se no disposto do artigo 599° n° 5, do Acordo acima referido.

Considerando que o consentimento declarado expressamente pelo detido foi prestado com inteira consciência do seu significado e de livre vontade, homologo o mesmo para todos os efeitos legais de acordo com o disposto nos artigos 20° e 26° da Lei 65/2003.

Uma vez que algumas das infrações que determinaram a emissão do mandado são puníveis no Reino Unido com pena de prisão perpétua, a execução do presente Mandado e, consequentemente da entrega do detido ao Estado emissor fica condicionada à prestação das garantias previstas na alínea a) do artigo 604° do Acordo entre União Europeia e o Reino Unido.

Por forma a não frustrar as finalidades que se pretendem alcançar com o Mandado de Detenção Internacional, tendo em conta a natureza e a gravidade dos crimes em causa e a circunstância de o detido não ter qualquer ligação a Portugal determino que o mesmo continue a aguardar a execução da entrega na situação de detenção.

Determino que se solicite ao Estado de emissão que, no mais curto prazo possível, máximo de 10 dias proceda à emissão de garantia de que no caso de o detido vir a ser condenado por algum dos crimes em causa, em pena de prisão perpétua irá, mediante apresentação de pedido ou o mais tardar no prazo de 20 anos, rever a pena imposta ou proceder de acordo com o disposto na referida alínea a) do artigo 604° do Acordo acima referido.

Determino a comunicação, de imediato, com expressa indicação da data da detenção, à Embaixada do Reino Unido, à PGR, e ao Gabinete Nacional da Interpol.

Passe os competentes mandados de condução ao estabelecimento Prisional ... e proceda às notificações e demais diligências necessárias.

Honorários ao ilustre Intérprete no valor de 158 Euros.

O antecedente despacho foi notificado a todos os presentes»

1.4. Em 4/5/022 foi junta aos autos a Garantia solicitada, que foi prestada pelo Secretário de Estado inglês, através de um texto, redigido em inglês e devidamente subscrito por um seu representante.

Em 5/5/022 foi junta aos autos o que se chamou de uma “Tradução Informal”, para português, através da Embaixada Britânica em Lisboa, proveniente do FCDO.

Em 5/5/022, ao abrigo do disposto no art. 605º do Acordo entre a União Europeia e o Reino Unido, aplicável nos termos do disposto no art. 78º-G da Lei 144/99 de 31/8, na redação da Lei 87/2021 de 15/12, foi solicitada á PGR a tradução do referido texto.

Esta tradução da PGR veio a ser junta aos autos em 6/5/022.

1.5 Em 6/5/022 foi proferida a seguinte decisão judicial:

«Mostrando-se prestada a garantia que foi solicitada por este tribunal ao Estado emissor, prevista no artigo 604º, alínea a) do Acordo entre a União Europeia e o Reino Unido, e estando já homologado o consentimento livre do detido na entrega à autoridade judiciária de emissão do mandado, determino que esta seja executada no mais curto prazo possível.

Notifique e D.N»

1.7. Inconformado com o despacho dele interpôs recurso o extraditando, que motivou concluindo nos seguintes termos:

«O recorrente vem interpor RECURSO com efeito suspensivo a subir nos autos do

1 - Despacho/Sentença que homologou a decisão de Extradição e do

2 - Despacho que mandou executar a extradição

Ambos os despachos judiciais / sentenças supra identificados estão em prazo (dez dias) para serem recorríveis para STJ e em ambos os casos o recurso tem efeito suspensivo.

1 - Porquanto:

2 - A Audição de Detido no caso concreto foi no dia 02 de Maio de 2022 fls.91.

Efetivamente o Recorrente consentiu na extradição, mas tal não...

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