Acórdão nº 1245/20.2BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 21-01-2021
Judgment Date | 21 January 2021 |
Acordao Number | 1245/20.2BELSB |
Year | 2021 |
Court | Tribunal Central Administrativo Sul |
D....., identificado como autor no Outro processo urgente que instaurou contra o Ministério da Administração Interna, inconformado veio interpor recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, de 30.9.2020, que julgou improcedente a acção e absolveu a Entidade requerida dos pedidos.
O A./recorrente formulou na acção os seguintes pedidos: “
i declaração de nulidade ou anulação do ato de indeferimento do pedido de concessão de proteção internacional do Autor;
ii ii) A condenação do Réu à prática do ato devido de concessão do direito de asilo ao Autor, com a prévia tramitação do procedimento legalmente devido.
iii iii) Caso assim não se entenda relativamente ao pedido (ii), a concessão ao Autor de proteção subsidiária, com a prévia tramitação do procedimento legalmente devido.”
Nas respectivas alegações, o Recorrente formulou as conclusões que seguidamente se reproduzem:
“A. O presente recurso versa sobre: (i) a falta de realização da fase de apresentação de alegações escritas, (i) o despacho proferido pelo Tribunal a quo, que indeferiu o requerimento de produção de prova por declarações de parte, requerida pelo Recorrente; (ii) da Sentença proferida pelo Tribunal a quo que julgou improcedente a ação interposta pelo Recorrente.
B. O Tribunal a quo emitiu despacho indeferindo a realização de prova por declarações de parte, pois que considerou estar em condições de decidir, por dispor de todos os elementos necessários para o efeito.
C. Sucede que esse despacho sempre determinaria a possibilidade de apresentação de alegações escritas, o que não sucedeu.
D. Consequentemente é nula ou pelo menos anulável a decisão recorrida, impondo-se a respetiva revogação.
E. Por outro lado, o Tribunal a quo ignorou, dando por não provados, factos invocados pelo Recorrente e que deveriam ter sido dados como provados. Factos que, podiam facilmente ter sido demonstrados através de declarações de parte.
F. No caso concreto, o Tribunal a quo não poderia ter dispensado a prova por declarações de parte requerida pelo Recorrente, porquanto tal prova era essencial para demonstrar factos determinantes para o exame e / ou decisão da causa (artigos 4.º a 25.º da petição inicial).
G. Com efeito, o Tribunal a quo incorreu num erro de julgamento ao considerar que não se justifica a produção de prova requerida, já que o Recorrente, tendo em conta o caso concreto e o benefício da dúvida de que beneficiam, bastava alegar os factos e demonstrá-los através do meio de prova oferecido.
H. A factualidade descrita – não considerada provada pelo Tribunal a quo – podia e devia ter sido objeto de prova por declarações de parte, permitindo ao Tribunal a quo concluir indubitavelmente que se encontram verificados os requisitos para a concessão de asilo ou de proteção subsidiária ao Recorrente.
I. Com efeito, em virtude de a preterição da prova por declarações de parte não poder ser admitida e tendo tal omissão influído no exame e / ou decisão da causa, o despacho e sentença recorridas são nulas em virtude do disposto no n.º 1 do artigo 195.º do CPC.
J. Sem prejuízo de se considerar que o Tribunal a quo, por não dar como provada a factualidade constante dos artigos 4.º a 25.º da petição inicial, deveria ter, no mínimo recorrido à prova por declarações de parte requerida de modo a aferir da veracidade da mesma, certo é que o Recorrente entende que aquela factualidade estava em condições ter sido dada como assente.
K. De facto, o Recorrente alegou tais factos e os mesmos não foram impugnados pela contraparte no presente processo, o que significa que os mesmos foram confessados.
L. O Tribunal a quo, com o devido respeito, não podia ter ignorado essa confissão, bem como o teor de tais factos porquanto os mesmos eram essenciais para a decisão a proferir.
M. Com efeito, dentro das condições possíveis – dadas as limitações materiais e linguísticas – o Recorrente demonstrou e alegou a factualidade descrita nos artigos 4.º a 5º da petição inicial, não existindo assim qualquer razão para que a mesma não se considere assente.
N. Por outro lado, tanto o despacho como a sentença recorridas incorreram em erro de julgamento da matéria de direito.
O. No que respeita ao despacho recorrido, que dispensou a produção de prova por declarações de parte, além da nulidade que se entende existir em virtude do disposto no n.º 2 do artigo 195.º do CPC, o Tribunal a quo errou ao considerar desnecessária a referida produção de prova, porquanto a factualidade constante dos artigos 4.º a 25.º da petição inicial – a não ser dada como assente, como se entende que devia – podia ser facilmente provada através do referido meio de prova.
P. A dispensa de produção de prova em causa colocou em causa, irremediavelmente, os direitos de defesa do Recorrente, o direito à tutela jurisdicional efetiva.
Q. Por outro lado, a sentença recorrida incorreu num erro de julgamento da matéria de Direito, porquanto não considerou que, com base nos elementos do processo, ao Recorrente devia ter sido concedido asilo ou, pelo menos, proteção subsidiária, nos termos, respetivamente, dos artigos 3.º e 7.º da Lei do Asilo – nos termos da instrução a realizar na sequência da admissão a essa fase do Recorrente.
R. Com efeito, como anteriormente se referiu, a factualidade e argumentos jurídicos invocados pelo Recorrente, deveria ter levado o douto Tribunal a quo a concluir que, em face da factualidade exposta – não considerada como não provada pelo Tribunal a quo – deveria culminar na concessão de apoio internacional ao Recorrente.
Termina requerendo:
Termos em que se requer a V/ Excelências, muito respeitosamente, seja julgado procedente o presente recurso jurisdicional e seja a sentença recorrida revogada e substituída por outra que julgue procedentes os pedidos formulados pelo Recorrente.”
O Recorrido não contra-alegou.
O Ministério Público, junto deste Tribunal, notificado nos termos e para efeitos do disposto nos artigos 146º e 147°, do CPTA, não emitiu parecer.
Sem vistos dos Exmos. Juízes-Adjuntos, por se tratar de processo urgente (cfr. o nº 2 do artigo 36º do CPTA), o processo vem à Conferência para julgamento.
As questões suscitadas pelo Recorrente, delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, nos termos do disposto no nº 4 do artigo 635º e nos nºs 1 a 3 do artigo 639º, do CPC ex vi nº 3 do artigo 140º do CPTA, consistem, no essencial, em saber se a sentença recorrida:
- incorre em nulidade por o juiz a quo ter indeferido a realização de prova por declarações de parte e não ter determinado a possibilidade de apresentação de alegações escritas;
- incorre em nulidade processual por a não admissão das declarações de parte ter influído no exame e na decisão da causa, nos termos do artigo 195º do CPC;
- enferma de erro de julgamento na decisão da matéria de facto ao considerar não provados factos que deveriam ter sido dados como provados, por não terem sido impugnados e por serem essenciais para a decisão a proferir o que facilmente podia ser provado se tivesse sido admitida as declarações de parte;
- enferma de erro de julgamento da matéria de direito por não ter considerado que lhe devia ter sido concedido asilo ou pelo menos protecção subsidiária.
A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos:
“A) O Requerente nasceu em 25/02/1982 na Guiné Bissau e é nacional deste país (cfr. processo administrativo apenso, que ora se dá por integralmente reproduzido);
B) Em 26/11/2019, o Requerente apresentou um pedido de protecção internacional, junto do Gabinete de Asilo e Refugiados do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (cfr. PA apenso a fls. 28 que ora se da por integralmente reproduzido);
C) Em 30/01/2020, o Requerente prestou declarações perante o SEF, quanto aos fundamentos do seu pedido de asilo, com o seguinte teor:
(cfr. PA apenso, a fls. 35 a 41, que ora se dá por integralmente reproduzido)
D) Em 12/02/2020, foi elaborada a informação n.º ....., pelo Gabinete de Asilo e Refugiados do SEF, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, na qual se exarou nomeadamente que:
(…)
Questionado, declarou ter sido membro da “A.....” e não ter tido nenhum problema por pertencer a essa associação. Afirmou ainda não ter tido
(cfr. PA a fls. 66 a 76 que ora se dá por integralmente reproduzido);
E) Em 12/02/2020, a Directora-Nacional Adjunto do SEF proferiu o seguinte despacho:
(cfr. PA a fls. 77., que ora se dá por integralmente reproduzido);
F) Em 09/01/2019, o Requerente foi notificado da decisão referida na alínea anterior;
G) Dá-se por integralmente reproduzido o teor de fls. 45 a 58 do P.A.
*
Com interesse para a decisão da presente causa não se mostram provados quaisquer outros factos.”
Apreciando.
i) Da nulidade da sentença:
As nulidades da sentença vêm previstas no artigo 615º do CPC, ex vi artigo 1º do CPTA e, como resulta do seu teor, prendem-se com o cumprimento ou a violação de regras de estrutura, de conteúdo ou dos limites do poder ao abrigo do qual são decretadas, tratando-se de defeitos de actividade ou de construção da própria sentença, ou seja, vícios formais da sentença ou relativos à extensão do poder jurisdicional por referência ao caso submetido ao tribunal [v. a título de exemplo, o vertido no acórdão do STA de 8.3.2018, no proc. nº 01144/17 in www.dgsi.pt].
Ora, a não admissão da prova por declarações de...
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