Acórdão nº 122/13.8TELSB-AH.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça, 10-05-2017

Data de Julgamento10 Maio 2017
Case OutcomeREJEITADO
Classe processualRECURSO PENAL
Número Acordão122/13.8TELSB-AH.L1.S1
ÓrgãoSupremo Tribunal de Justiça

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

I – RELATÓRIO

1. No âmbito do processo nuipc 122/13.8TELSB, a correr termos no Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP) veio o arguido AA requerer, nos termos dos artigos 43.º e seguintes do Código de Processo Penal (CPP), a recusa do Sr. Juiz do Tribunal Central de Instrução Criminal (TCIC), Dr. BB por considerar a intervenção do mesmo no referido processo suspeita de gerar desconfiança sobre a sua imparcialidade, vistos os motivos, sérios e graves, indicados no respectivo requerimento.

2. Por acórdão de 11 de Outubro de 2016, foi indeferido, por infundado, o pedido de recusa formulado pelo referido arguido.

3. O arguido veio, em seguida, arguir a nulidade da constituição do Colectivo, do julgamento e do Acórdão de 11 de Outubro que decidiu o pedido de recusa — por falta do número de juízes que devem constituir o tribunal e violação das regras de competência do tribunal e das regras legais relativas ao modo de determinar a respectiva composição, por emprego de forma de processo especial fora dos casos previstos na lei e por ausência do Ministério Público, do Requerente e do seu advogado —, nos termos e para os efeitos dos artigos 119° alíneas a), c), e) e f) e 122° do Código de Processo Penal.

Concluiu ser o processo insanavelmente nulo desde a sua distribuição à 5ª Secção:

«1. Por falta do número de juízes que devem constituir o tribunal, pois que a tanto equivale a restrição da plenitude do poder de um dos juízes que devam intervir, e por violação das regras legais relativas ao modo de determinar a respectiva composição, como claramente resulta do confronto entre o que foi feito e o que prevê a "lei de processo", seja ela a processual civil ou a processual penal (cf. artigo 119° alínea a) do Código de Processo Penal):

2. Por violação das regras de competência do tribunal, uma vez que a Conferência, ou o Colectivo, a quem coube a instrução, discussão e o julgamento propriamente dito deste processo — constituído pela Senhora Desembargadora Presidente da Secção, como presidente, por inerência dessas funções e com os poderes limitados previstos no artigo 419° do Código de Processo Penal, pelo Senhor Desembargador Dr. ..., como relator, e pela Senhora Desembargadora Dra. ..., como juíza-adjunta, e funcionando em conferência e nos demais termos previstos nesse mesmo artigo 419° — tem apenas competência para julgar recursos penais, é incompetente, material e funcionalmente, para julgar este processo.

3. Por emprego de forma de processo especial, de julgamento de recursos, prevista no artigo 419° do Código de Processo Penal, fora dos casos previstos na lei (artigo 119°, alínea a), do Código de Processo Penal).

4. E, consequentemente, ainda por ausência no julgamento do Requerente e do seu advogado, e do próprio Ministério Público, apesar de se tratar de um caso em que a lei exige a sua obrigatoriedade, já que, sendo competente a secção, o julgamento dos incidentes de recusa de juiz deve ser realizado em audiência e o Requerente e o seu advogado devem ser notificados para comparecerem e estarem presentes se assim o pretenderem.»

Tendo requerido «que seja declarada a nulidade de todos os actos deste processo, inclusivamente a sua distribuição a essa 5ª Secção da Relação de Lisboa, com todos os efeitos devidos, nomeadamente, a anulação da composição do colectivo (da Conferência), a anulação do julgamento e a anulação do Acórdão de 11 de Outubro de 2016, e a remessa do processo ao Senhor Juiz Desembargador Presidente da Relação».

4. Por acórdão de 24 de Janeiro de 2017, a pretensão do arguente foi considerada «manifestamente infundada», tendo-se decidido «indeferir a alegada arguição de nulidades».

5. O presente recurso foi interposto pelo arguido dessa decisão de indeferimento da arguição de nulidades, «nos termos conjugados dos artigos 399° e 432° nº 1 - a) e d) do Código de Processo Penal, não estando a decisão em causa directa ou indirectamente abrangida pela irrecorribilidade prevista no artigo 45° nº 6 - sob pena da norma dever ser considerada inconstitucional, por violação, nomeadamente, dos direitos consagrados no artigo 20°, n.os 1 e 4 e no artigo 32° n.os 1 e 9 da Constituição da República Portuguesa», rematando a respectiva motivação com as seguintes:

«CONCLUSÕES

A. O pedido de recusa de Juiz aqui em causa foi julgado em conferência, por dois Juízes Desembargadores da 5ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa e de acordo com os termos especiais dos julgamentos de recursos em matéria penal previstos no artigo 419º, n.os 1 e 2, do Código de Processo Penal: julgamento pelo relator e pelo juiz-adjunto, sem voto de um dos juízes, no caso e por inerência (nos termos daquele dispositivo legal), como presidente do Colectivo, a Senhora Desembargadora Presidente da Secção, por se ter formado "maioria com os votos do relator e do juiz adjunto".

B. O pedido de recusa de Juiz não é um recurso, mas uma providência excepcional, insusceptível de assimilação, confusão ou analogia com a matéria de um recurso: o que está em causa não é uma decisão de juiz, mas a intervenção de certa pessoa como juiz, em razão (no penal como no cível) de qualquer circunstância que possa, aos olhos da comunidade, diminuir a credibilidade que o órgão decisor, que representa e exerce no caso concreto o poder judicial do Estado, deve merecer.

C. A própria competência das secções, nomeadamente das criminais, para o julgamento pelos tribunais superiores dos pedidos de recusa de Juiz de Instrução Criminal, não pode deixar de ser questionada, já que a competência das Secções das Relações é a que se encontra prevista no artigo 12° nº 3 do Código de Processo Penal e no artigo 73° da Lei de Organização do Sistema Judiciário e tais normas não prevêem tal competência em qualquer das suas alíneas, não existindo (outra) norma legal que lhes a atribua.

D. Pode concluir-se estarmos perante um caso omisso e pela aplicação supletiva da Lei Processual Civil, como o autoriza, se acaso não o exigir, o artigo 4° do Código de Processo Penal: os pedidos de recusa (e de escusa) seriam ou serão, assim, julgados pela Presidência do Tribunal Superior.

E. Fosse competente a secção, caberia aplicar as normas gerais do artigo 12° nº 4, do Código de Processo Penal, e do artigo 56° nºs 1 e 2 (ex vi artigo 74° nº 1), da Lei da Organização do Sistema Judiciário, e respeitar duas regras que estas normas impõem: a de que o julgamento nas secções deve ser efectuado por um colectivo de três juízes, cabendo a um juiz as funções de relator e aos outros juízes as funções de adjuntos - só o sendo por juiz singular nos casos das alíneas f) e g) do artigo 73° da Lei da Organização do Sistema Judiciário e por dois juízes nos julgamentos de recursos nos termos e casos, e por força, do artigo 419° nº 2 (cf. artigo 56° nº 1, ex vi artigo 74° nº 1 da Lei de Organização do Sistema Judiciário); e a regra de que a intervenção dos juízes de cada secção no julgamento é feita, nos termos da lei de processo, segundo a ordem de precedência (cf. artigo 56° nº 2).

F. Estas duas regras não foram respeitadas no caso aqui sob recurso, antes foram violadas ou desprezadas, porque o incidente de recusa foi processado, desde a sua distribuição à 5ª Secção do Tribunal da Relação, e foi julgado de acordo com os termos excepcionais do processo especial de julgamento dos recursos penais previsto no artigo 419º do Código de Processo Penal, quando o deveria ter sido (como preceitua o artigo 56° nº 2, ex vi artigo 74°, da Lei de Organização do Sistema Judiciário) nos termos do processo comum, previstos para os julgamentos na "lei de processo" - em matéria penal, nos termos dos artigos 311° a 380° do Código de Processo Penal (perante o tribunal colectivo, prevendo-se a intervenção do juiz presidente e dos juízes adjuntos em todas as fases, inclusivamente na instrução (cf. artigo 314°, e necessariamente na discussão (cf. artigos 333°, 338°, 340 nº 1) e no julgamento propriamente dito (cf. artigos 345° a 248°,365° a 369° e 372°).

G. Todo o processo é, assim, no modo de ver do arguente, insanavelmente nulo desde a sua distribuição à 5ª Secção: por falta do número de juízes que devem constituir o tribunal e por violação das regras legais relativas ao modo de determinar a respectiva composição - nulidade ex vi artigo 119° alínea a) do Código de Processo Penal); por violação das regras de competência do tribunal, uma vez que a Conferência, ou o Colectivo, a quem coube a instrução, discussão e o julgamento propriamente dito deste processo tem apenas competência para julgar recursos penais, sendo incompetente, material e funcionalmente, para julgar este processo; por emprego de forma de processo especial, de julgamento de recursos, prevista no artigo 419° do Código de Processo Penal, fora dos casos previstos na lei (artigo 119°, alínea f), do Código de Processo Penal); e por ausência no julgamento do Requerente e do seu advogado, e do próprio Ministério Público, apesar de se tratar de um caso em que a lei exige a sua obrigatoriedade.

H. Se é certo que o pedido de recusa de juiz não é um recurso, pois não visa impugnar qualquer acórdão, sentença, despacho (artigo 399° do Código de Processo Penal), nem qualquer outro tipo de decisão de primeira instância, ainda que não explicita, certo é também que a decisão de um tal pedido não é, e nada permite que seja entendida como se fosse, "uma decisão interlocutória, sobre questão processual avulsa que não pôs termo à causa e, assim, abrangida pela al. c) do n° 1 do art. 400° do CPP".

I. O artigo 400° nº 1 alínea c) do Código de Processo Penal não tem aplicação a casos como o dos autos;

J. "Processo" neste caso não é o inquérito no seu todo, mas o "processo" deste incidente de recusa de Juiz.

K. O artigo 400°, é a norma que enuncia e delimita os...

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