Acórdão nº 1208/19.0T8CHV-C.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 09-11-2023

Data de Julgamento09 Novembro 2023
Ano2023
Número Acordão1208/19.0T8CHV-C.G1
ÓrgãoTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães

I – RELATÓRIO (que se transcreve)

Por apenso à execução que “Banco 1..., S.A.” move contra AA, BB, CC e DD, veio o executado AA veio apresentar embargos de executado alegando, em síntese, que a Adega Cooperativa foi objeto de um processo de revitalização, tendo a exequente reclamado contra a revitalizada o valor que agora peticionada nestes autos, sendo que, com a homologação do plano, a obrigação exequenda extinguiu-se tendo sido alterado os termos do contrato de mútuo celebrado coma a Adega pelo que não sendo exigível à Cooperativa, neste momento, a obrigação constante da livrança, também não é possível exigi-la aos avalistas até porque o cumprimento do plano pela Cooperativa pode ser suficiente para pagar toda a dívida exequenda e somente no caso de a exequente não receber da Cooperativa é que poderia receber dos avalistas.
Alega também a prescrição do crédito reclamado pois a exequente alega que o contrato de mútuo foi celebrado em 20/04/2005 e para garantia do cumprimento desse contrato foi entregue uma livrança em branco, sendo que, em 27/02/2019 o Banco mutuário remeteu uma carta ao executado onde lhe comunicou a sua intenção de resolução do contrato de mútuo com hipoteca, subjacente à livrança, tendo ainda sido comunicado o vencimento antecipado de todas as prestações de capital e juros fixadas nesse contrato de mútuo.
Também alega o preenchimento abusivo ou indevidos da livrança por inexistir nos autos qualquer autorização ou acordo de preenchimento do título dado à execução, sendo que o embargante prestou o seu aval única e exclusivamente na qualidade de diretor da Adega Cooperativa de ... e enquanto desempenhasse essas funções, tendo-lhe sido garantido pelos representantes do Banco exequente que só viria a ser eventualmente demandado após a excussão prévia de todo o património da Adega, sendo certo que esta tem imóveis hipotecados a favor da exequente que ainda não foram vendidos pelo que, não tendo a livrança sido preenchida de acordo com o pactuado, conclui pelo abuso no preenchimento da livrança.
Acresce ainda que existiram alterações substanciais das circunstâncias que constituíram a base do negócio e que levaram o executado a prestar o seu aval pois, desde 2011 que o ora embargante deixou de ter qualquer função ou relação com a Adega, tendo sido, durante todos estes anos, completamente alheio às resoluções contratuais que aí ocorreram, para além de, com o processo de revitalização da Adega ocorreu outra alteração entendendo que, apesar de ter sido aposta na livrança a data de 27/02/2019, esta não pode ter relevância, porque seguramente há mais de 8 anos que a mutuária entrou em incumprimento, razão pela qual também por este motivo entende que o preenchimento da livrança com data de 27/02/2019 é abusivo, por violação do pacto de preenchimento, sendo que há muito decorreu o prazo de 3 anos a que alude o art.70.º da LULL, aplicável às livranças por força do art.77.º do mesmo diploma legal.
Acrescenta que dispõe o art.º 15º o regime das Cláusulas Contratuais Gerais constante do Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de Outubro (RCCG) que são proibidas as cláusulas contratuais gerais contrárias à boa-fé, ora, uma liberdade total na inserção das datas de emissão e de vencimento de uma livrança subscrita em branco permitiria ao credor defraudar os interesses públicos e do devedor que presidem ao instituto da prescrição dos créditos cambiários, proporcionando, no mínimo, uma desvirtuação irrazoável dos padrões legais, que deve ser considerada proibida pela norma mencionada.
Assim, confirmando-se que a convenção dessa liberdade de preenchimento viola a proibição contida no art.º 15º do RCCG, o disposto na cláusula 12ª do contrato outorgado entre o banco mutuário Banco 2... e o aqui executado, é nulo – art.º 12º do RCCG, o que acarreta óbvias e legais consequências.
Concluiu pela procedência dos presentes embargos de executado.
*
O Banco exequente veio apresentar contestação alegando, em síntese, que, efetivamente, existiu um processo especial de revitalização (“PER”) da sociedade “Adega Cooperativa de ..., Crl” (ora “Mutuária”), que correu termos no Juízo de Comércio ... do Tribunal Judicial da Comarca ..., sob o n.º 29/16...., no qual o Embargado viu reconhecido o crédito que nos presentes autos reclama, constando o mesmo do Plano aprovado e homologado para efeitos de revitalização da Mutuária, no qual se cristalizaram os termos da respetiva liquidação, entre eles um período de carência de 2 (dois) anos contados do trânsito em julgado da presente decisão de homologação, sendo que a aprovação e homologação do plano de revitalização da Mutuária vinculou todos os seus credores mas não afetou a existência nem o montante dos direitos do Exequente/Embargado contra os respetivos codevedores da obrigação em referência, sendo que, por força do aval que prestou à mutuária, passou a ser devedor solidário relativamente aos montantes em dívida provenientes do incumprimento contratual da sociedade subscritora (ora Mutuária).
No que concerne à prescrição alega que a livrança prescreve no prazo de 3 anos a contar do seu vencimento, ou seja, a contar da respetiva data de vencimento (08 de Março de 2019) e não da data em que a Mutuária deu início ao incumprimento contratual ora verificado sendo que, no caso em apreço, sendo acordado um regime diferente para o vencimento integral das prestações acordadas entre as partes, este prevalece sobre a regra geral preceituada no artigo 781.º do CC., resultando do art.14.º do contrato que com o incumprimento verificado pela Mutuária, o Embargado passou a ter o direito opcional de resolver a relação contratual, declarando vencidas todas as prestações acordadas e exigir o seu cumprimento imediato, desde que, para tal, notificasse por carta registada a parte incumpridora, produzindo efeitos no oitavo dia posterior à sua expedição, ou seja, relevando para os prazos prescritivos associados ao direito de vencimento antecipado das prestações em análise, estes nunca começaram a contar a partir do momento em que o Embargado passou a poder exercer o respetivo direito (i.e., data da primeira prestação incumprida pela Mutuária), mas sim a partir da comunicação de resolução contratual exigida e necessária para o efeito, datada de 27 de Fevereiro de 2019.
Realça que, para efeitos de prescrição do crédito reclamado, as prestações não se venceram integralmente no momento a partir do qual o Embargante não realizou determinada prestação a que estava obrigado, mas sim apenas na data em que o Embargado efetivamente exerceu o seu direito de resolução contratualmente previsto, encontrando-se expressamente previsto no n.º 2 do Artigo Décimo Sexto do contrato de mútuo, que: “O não exercício, por parte do (…) Embargado (…), de qualquer direito ou faculdade que lhe seja conferido pelo presente Contrato, em nenhum caso poderá significar renúncia a tal direito ou faculdade ou acarretar a sua caducidade, pelo que se manterá válido e eficaz, não obstante o seu não exercício”.
Também alega que, como refere o embargante no art.23.º da Oposição, o contrato de mútuo celebrado estava previsto vencer em abril de 2016, sendo que, não existindo qualquer comunicação resolutiva por parte do Embargado – e tendo sempre em referência a exigência desta comunicação por escrito para o efeito do vencimento antecipado das prestações –, só nesta data se poderia considerar terem-se efetivamente vencido, a título integral, as prestações incumpridas.
Ora, atento o disposto no n.º1 do art.323.º do CC, uma vez que o requerimento executivo do ora Embargado deu entrada em 10 de agosto de 2019, tendo as consequentes diligências para citação do Embargante sido iniciadas em 02 de setembro de 2019, por causa não imputável ao Embargado, após frustração das tentativas de citação promovidas, o Embargante só acabou por ser devidamente citado em 09 de novembro de 2020, sendo que, ainda assim, nos termos do n.º 2 do mencionado preceito legal, a prescrição do crédito reclamado interrompeu-se cinco dias após o início das respetivas diligências, ou seja, em 07 de setembro de 2019, momento em que o prazo prescritivo de 5 (cinco) anos se interrompeu – não prescreveu o crédito existente, nem o direito de o exigir solidariamente ao Embargante, estando, à data, o prazo de prescrição do crédito reclamado suspenso até trânsito em julgado da decisão que puser termo à presente instância executiva (vide n.º 1 do artigo 327.º do CC), reforçam-se os votos de improcedência das alegações de extinção da obrigação cambiária e de prescrição dos créditos reclamados a título subjacente.
No que concerne ao alegado preenchimento abusivo invoca o Banco exequente que não pode o embargante opor as exceções da relação entre a sociedade subscritora da livrança e o Embargado, nomeadamente no respeitante a um hipotético preenchimento abusivo do título de crédito por carecer de legitimidade para tal sendo que o art.17.º da LULL traduz dois dos princípios basilares dos títulos cambiários: o da sua autonomia e abstração.
Mais alega que dúvidas não subsistem que existe pacto de preenchimento nos presentes autos uma vez que o mesmo foi junto com o requerimento executivo do Embargado, como doc.... sendo que, em 20 de Abril de 2005, aquando da celebração do contrato de mútuo entre o Embargado e a Mutuária, o Embargante assinou o aludido pacto de preenchimento correspondente à livrança por si avalizada, reconhecendo assim, nessa data, a sua responsabilidade perante os montantes em dívida que viriam a resultar do incumprimento da relação contratual encetada, encontrando-se os presentes autos executivos em plena conformidade para com o pacto de preenchimento autorizado pelo mesmo e para com a conceção legal do acto de avalizar.
Também alega que, a data de vencimento aposta na livrança não...

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