Acórdão nº 11857/16.3T8SNT-B.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça, 13-12-2022

Data de Julgamento13 Dezembro 2022
Case OutcomeRECURSOS IMPROCEDENTES.
Classe processualREVISTA (COMÉRCIO)
Número Acordão11857/16.3T8SNT-B.L1.S1
ÓrgãoSupremo Tribunal de Justiça








Processo: 11.857/16.3T8SNT-B.L1.S1
6.ª Secção


ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

I – Relatório
Por apenso à ação especial de insolvência – em que foi declarada em tal situação, por sentença de 6/10/2016, transitada em julgado em 14/11/2016, C... Lda., com os sinais dos autos – veio o Administrador de Insolvência apresentar a lista de créditos reconhecidos e não reconhecidos, nos termos do art. 129.º do CIRE.
Após o que foram apresentadas impugnações pelos seguintes credores não reconhecidos (cujos créditos reclamados haviam sido, na sua totalidade, não reconhecidos pelo Sr. Administrador de Insolvência):
a. AA, reclamando o reconhecimento de um crédito no valor total de € 300.000,00 e não indicando a origem do crédito nem juntando qualquer documentação;
b. BB e, esposa, CC, reclamando um crédito no valor de € 104.800,00, baseado no incumprimento de um contrato promessa celebrado com a insolvente, relativamente à fração “AH”, do prédio melhor descrito nos autos;
c. DD, reclamando um crédito no valor de € 146.240,00, baseado no incumprimento de um contrato promessa celebrado com a insolvente, relativamente à fração “L”, do prédio melhor descrito nos autos, e na quantia necessária para expurgar a hipoteca que incidia sobre a mencionada fração autónoma, na parte a esta respeitante e na respetiva proporção;
d. EE e FF, reclamando um crédito no valor de € 360.000,00, suportado no incumprimento de um contrato promessa celebrado com a insolvente, relativamente às frações “C” e “E”, do prédio melhor descrito nos autos;
e. GG, reclamando um crédito no valor de € 190.000,00, suportado no incumprimento de um contrato promessa celebrado com a insolvente, relativamente às frações “J” e “AB”, do prédio melhor descrito nos autos;
f. HH, reclamando um crédito no valor de € 184.000,00, suportado no incumprimento de um contrato promessa celebrado com a insolvente, relativamente à fração “AC”, do prédio melhor descrito nos autos;
g. II, reclamando um crédito no valor de €180.000,00, suportado no incumprimento de um contrato promessa celebrado com a insolvente, relativamente às frações “AD”, do prédio melhor descrito nos autos;
h. JJ, reclamando um crédito no valor de € 99.147,66, baseado no incumprimento de um contrato promessa celebrado entre a insolvente e a sociedade KK e A..., Lda., relativamente à fração “B”, do prédio melhor descrita nos autos, cuja posição contratual da sociedade KK e A..., Lda., originária promitente compradora, lhe foi cedida;
i. LL e MM, reclamando um crédito no valor de € 95.000,00, baseado no incumprimento de um contrato promessa celebrado com a insolvente, relativamente à fração “A”, do prédio melhor descrito nos autos;
j. NN, reclamando um crédito no valor de €141.000,00, baseado no incumprimento de um contrato promessa celebrado com a insolvente, relativamente à fração “AE”, do prédio melhor descrito nos autos.
Peticionando todos que fosse reconhecido que os seus créditos gozam do Direito de Retenção.

Impugnações a que responderam, opondo-se, quer a CGD, quer o Sr. Administrador de Insolvência.
Foi designada e realizada tentativa de conciliação – infrutífera – após o que foi proferido despacho saneador – em que a instância foi declarada totalmente regular, estado em que se mantém – e fixados o objeto do litígio e os temas da prova.
Instruído o processo e realizado o julgamento, a Exma. Juíza proferiu sentença[1] em que foi decidido o seguinte
a. Julgar improcedentes as impugnações de AA, DD, GG, HH, II, LL e MM e NN.
b. Julgar parcialmente procedente a impugnação BB e CC, reconhecendo-lhes um crédito no valor total de €37.250,36 (trinta e sete mil duzentos e cinquenta euros e trinta e seis cêntimos), de natureza garantida por força do direito de retenção.
c. Julgar parcialmente procedente a impugnação de EE e FF, reconhecendo-lhes um crédito no valor total de €360.000,00 (trezentos e sessenta mil euros), crédito que assume a natureza de crédito comum.
d. Julgar parcialmente procedente a impugnação JJ, reconhecendo-lhe um crédito no valor total de €71.213,88 (setenta e um mil duzentos e treze euros e oitenta e oito cêntimos), crédito que assume a natureza de crédito comum.
e. No mais, julgo improcedentes os pedidos, deles absolvendo a insolvente.

Inconformados interpuseram recurso de apelação os impugnantes BB (e esposa, CC), DD, EE (e esposa FF), GG, HH, II, JJ, LL (e esposa MM), além da credora reconhecida X... SARL, tendo a Relação de Lisboa, por Acórdão de 08/06/2021, decidido:
“(…) 1. Julgam-se totalmente improcedentes as apelações dos credores: BB e CC, DD, GG, HH, II, JJ e LL e MM, e, em consequência, confirmam-se os segmentos da sentença impugnada respeitantes aos créditos dos mesmos;
(…) 2. Julga-se procedente a apelação dos credores EE e FF e, em consequência, altera-se o segmento da sentença relativo ao seu crédito que assume a qualificação de garantido pelo direito de retenção;
(…) 3. Julga-se parcialmente procedente a apelação da credora X... SARL e, em consequência:
i) Altera-se o segmento da sentença respeitante ao crédito dos credores BB e CC e reconhece-se-lhes um crédito garantido pelo direito de retenção no montante de € 18.625,18;
ii) Mantém-se na íntegra o segmento da sentença respeitante ao crédito dos credores EE e FF;
iii) Altera-se o segmento da sentença respeitante ao crédito do credor JJ e reconhece-se-lhe um crédito garantido pelo direito de retenção no valor de € 35.606,94.

Ainda inconformados, interpõem agora os impugnantes BB (e esposa, CC), DD, GG, HH, II, JJ e LL (e esposa, MM), recursos de revista de tal Acórdão.
Terminaram a sua alegação com as seguintes conclusões:
Quanto ao BB e, esposa, CC:
“(…)
a) Vem o presente recurso interposto do Acórdão que decidiu julgar “Julgar integralmente improcedente a apelação, decidindo-se manter a decisão recorrida” e, na sequência de contra-alegação da Credora X... SARL, verem os Recorrentes o segmento da sentença respeitante ao seu crédito ser reduzido de € 37.250,36 para € 18.625,18.
b) Douto Tribunal da Relação de Lisboa considera tratar-se de negócio em curso sendo aplicável o regime da insolvência, previsto no Capítulo IV do CIRE (arts.102º, 104º e 106º do CIRE).
c) Douto o Acórdão foi proferido, com um voto vencido, da Exma. Senhora Doutora Juíza OO que entende, e bem, que não estamos perante um negócio em curso, mas de um incumprimento definitivo do contrato promessa pela Promitente vendedora.
d) Tal incumprimento definitivo ocorreu antes da insolvência, sendo aplicável o regime civilista do art.º 442.º, n.º 2 e art.755.º, nº 1, al. f), ambos do Código Civil, devendo a restituição do sinal ser feita em dobro.
e) Com efeito, e como resulta do Recurso de Apelação dos Recorrentes, o incumprimento definitivo do contrato aludido ocorreu muito antes da declaração de insolvência da promitente vendedora.
f) O contrato de promessa de compra e venda foi celebrado pelos Recorrentes e a Promitente vendedora no dia 10-01-2013, ficando convencionado a realização da escritura pública de compra e venda no prazo de 180 dias a contar dessa data.
g) No aludido contrato, a Promitente vendedora prometeu aos Recorrentes vender a fracção autónoma, livre de quaisquer ónus ou encargos, ficando estipulado que seria a mesma que marcaria a escritura, por comunicação prévia aos Recorrentes.
h) Tais estipulações constam do contrato, matéria que Douto Tribunal da primeira instância deu por provada, sem impugnação nessa parte, como, alias, e bem, refere e fundamenta no seu voto, a Meritíssima Juiz Conselheira.
i) O referido contrato foi dado como provado nunca tendo sido posto em causa a sua autenticidade e bem assim como as assinaturas nele apostas, pelo que, inerência, o seu teor constitui facto provado.
j) Por outro lado, a obrigação de a Promitente vendedora marcar a escritura de compra e venda trata-se de uma obrigação definida, com prazo certo,
k) Pelo que, mostrando-se decorrido o prazo estipulado sem que a promitente vendedora tivesse marcado a escritura pública de compra e venda, tal facto consubstanciou que a mesma entrasse em mora.
l) Douta sentença de insolvência foi proferida no dia 06.10.2016, três anos depois do contrato promessa de compra e venda, quando já há muito se tinha verificado o incumprimento definitivo por parte da Promitente vendedora insolvente!
m) Pelo que bem andou a Exma. Senhora Juiz Conselheira discordando dos seus pares que se decidiram pela redução do valor reconhecido pela 1.ª instância para a quantia de €18.625,18.
n) Como bem fundamenta no seu voto vencido, a Meritíssima Juiz Conselheira, “no contexto assinalado e até por razões de equidade, entende que a situação destes credores é em tudo similar à dos credores EE e FF, relativamente aos quais se considerou que o crédito reconhecido tinha a sua origem no incumprimento contratual verificado antes da declaração de insolvência, não lhes sendo aplicável “o regime da insolvência do art. 102.º do CIRE, mas antes o regime civilista do art. 442.º Código Civil.”
o) Pelo que não há que apelar Douto Acórdão de Uniformização de Jurisprudência n.º 4/2014 e n.º4/2019 porquanto o mesmo não se aplica a este caso.
p) Gravato de Morais refere «o incumprimento definitivo (imputável ao promitente-vendedor) da promessa de compra e venda (por exemplo, com a alienação do bem (...) com a recusa séria e categórica em cumprir ou com a resolução ilegítima daquele promitente) que importe a extinção do contrato-promessa antes da declaração de insolvência – no caso de entrega da coisa ao promitente-comprador que sinalizou a promessa – gera a aplicação das regras civilistas».
q) O Acórdão do STJ, de 27.04.2017, a que apelamos, refere que
«1..2..3. Tendo sido operada a resolução do contrato-promessa em data anterior à da declaração de insolvência, não estamos perante um negócio jurídico em curso, para efeitos do disposto nos artigo. 102º e...

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