Acórdão nº 114/20.0T8ALJ-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 18-04-2024

Data de Julgamento18 Abril 2024
Ano2024
Número Acordão114/20.0T8ALJ-A.G1
ÓrgãoTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

.I - Relatório

Identificação do processo
Cabeça-de-casal e Apelante: AA
Interessados e apelados: BB e CC
Autos de: apelação em inventário

Nos presentes autos procede-se a inventário para partilha da herança aberta por óbito de DD e EE, falecidos, respetivamente em ../../2019 e ../../2021.
Os interessados BB e CC deduziram incidente de reclamação à relação de bens, alegando, em suma, a falta de relacionamento de contas bancárias tituladas pela inventariada EE e de bens móveis (trator, reboques, alfaias agrícolas, motocultivador e motosserras, roçadoura e carro de bois, carrinha, bem como objetos em metais preciosos, relógio e mobília e recheio de casa de habitação com arrecadação e mercearia).
Em resposta à reclamação apresentada, na matéria que respeita ao presente recurso, o cabeça-de-casal invocou que o inventariado, quando o seu filho FF ainda era vivo, fez uma partilha verbal entre os seus três filhos: ao seu filho FF doou um prédio onde possuía uma garagem e um armazém, que agora pertence aos reclamantes e sua mãe (os quais não foram relacionados neste inventário); ao seu filho GG doou os alguns bens móveis (agora em discussão: o trator, os dois reboques , as alfaias agrícolas, o motocultivador com charrua, as motosserras, a roçadora, o carro de bois e a carrinha ...); e ao seu filho DD doou de forma verbal e com reserva de usufruto a favor dos inventariados, em compensação daquelas doações, os prédios urbanos descritos na relação de bens sob as verbas 1 e 2.
Juntou relação de bens adicional.
Os reclamantes impugnaram as doações por não lhe terem sido nunca comunicadas.

Produzidas provas, foi proferida decisão:
decido julgar parcialmente procedente o incidente de reclamação à relação de bens suscitado pelos interessados BB e CC e, em consequência:

a) determinar que o cabeça de casal relacione os valores monetários das contas descritas em 3) d), 4), 5), 8) a 10), dos factos provados;
b) determinar que o cabeça de casal relacione os bens em 12), dos factos provados;
c) declarar a nulidade da doação pelo inventariado DD ao filho GG dos bens descriminados em 11), determinado, em sua consequência, que os mesmos sejam relacionados pelo cabeça de casal como bens dos inventariados;”

É desta decisão que o Réu apela, formulando, para tanto, as seguintes
conclusões:

“1) A doação feita pelo inventariado DD, antes de falecer, a favor do seu filho GG, dos bens móveis comuns do casal discriminados no ponto 11. dos factos considerados provados na decisão proferida pelo tribunal a quo, sem a intervenção da sua esposa, insere-se na previsão do artigo 1682.º do CC.
2). Tendo havido omissão do consentimento da esposa do inventariado para aquele acto de doação, o regime sancionatório não é o da nulidade, mas sim o regime específico da anulabilidade previsto no artigo 1687.º do CC, nos termos do qual, o acto era passível de anulação, a requerimento do cônjuge que não deu o consentimento ou dos seus herdeiros, desde que exercido no prazo previsto no n.º 2 do mesmo artigo.
3). A doação feita pelo inventariado a favor do seu filho ocorreu através de documento particular datado de 24/09/2018. Independentemente da data desse documento, a doação teve lugar antes do falecimento do inventariado, o que sucedeu em ../../2019 (facto provado sob o n.º 11).
4) Não há conhecimento nos autos de que a inventariada ou algum dos herdeiros tenha exercido o direito de anulação daquele ato de doação, pelo que, o vício (anulabilidade) derivado da falta de consentimento do cônjuge do inventariado ficou sanado e o contrato de doação tornou-se definitivamente convalidado (artigos 1682.º e 1687.º, n.ºs 1 e 2 do CC).
5) A sentença recorrida, no segmento em que declara “a nulidade da doação pelo inventariado DD ao filho GG dos bens descriminados em 11)”, e determina que o cabeça de casal relacione esses bens como bens dos inventariados, contém um erro de interpretação e aplicação do direito, por violação do regime específico da anulabilidade previsto no artigo 1687.º do CC para os atos praticados por um dos cônjuges, sem a legitimidade necessária, por falta de consentimento do outro cônjuge.

Pelo exposto, deve a sentença em recurso, na parte em que declara “a nulidade da doação pelo inventariado DD ao filho GG dos bens descriminados em 11)” dos factos provados, e determina que o cabeça de casal relacione esses bens como bens dos inventariados, ser revogada, sendo declarado que aquele acto de doação se tornou definitivamente válido, por falta de exercício do direito de anulação, nos termos supra referidos, de molde a fazer-se JUSTIÇA..”

II- Objeto do recurso

O objeto do recurso é definido pelas conclusões das alegações, mas esta limitação não abarca as questões de conhecimento oficioso, nem a qualificação jurídica dos factos (artigos 635º nº 4, 639º nº 1, 5º nº 3 do Código de Processo Civil).
Este tribunal também não pode decidir questões novas, exceto se estas forem de conhecimento oficioso ou se tornaram relevantes em função da solução jurídica encontrada no recurso e os autos contenham os elementos necessários para o efeito. - artigo 665º nº 2 do mesmo diploma.
Assim, é apenas uma a questão a apreciar: se devem ser relacionados como bens da herança os bens móveis que integraram os bens móveis comuns do falecido casal e que foram objeto da doação efetuada pelo inventariado a favor de um dos herdeiros legitimários, sem menção do consentimento da inventariada, por tal disposição padecer de nulidade de conhecimento oficioso.

III- Fundamentação de Facto

Segue o elenco da matéria de facto provada e não provada a considerar, indicando-se os factos selecionados na sentença, com indicação das...

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