Acórdão nº 114/15.2GABRR.L2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça, 27-03-2019
Data de Julgamento | 27 Março 2019 |
Case Outcome | PROVIDO EM PARTE |
Classe processual | RECURSO PENAL |
Número Acordão | 114/15.2GABRR.L2.S1 |
Órgão | Supremo Tribunal de Justiça |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça
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Como consta do proc. nº 114/15.2GABRR.L2.da 5ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:
“Iº 1. No Processo Comum (Tribunal Colectivo) nº114/15.2GABRR, da Comarca de Lisboa (Juízo Central Criminal de ... - Juiz ...), foram julgados, AA e BB, pronunciados, cada um deles, pela prática, em autoria e concurso efectivo, de um crime de homicídio, na forma tentada, p. e p. pelos arts.131, 22 e 23, todos do Cód. Penal e de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelos arts. 2º, nº1, als. ae) e az), 3º, nº5, al. a) e 86º, nº1, al.c), da Lei nº5/2006, de 23/2.
Os arguidos/ofendidos, constituiram-se assistentes nos autos e deduziram pedido de indemnização civil, um contra o outro.
O tribunal, após julgamento, por acórdão de 21Dez.17, decidiu:
"...
a) Absolver o arguido BB da prática de um crime de homicídio simples, na forma tentada, p. e p. pelos arts. 131º, 22º, 23º, do Cód. Penal, por que se encontra pronunciado;
b) Condenar o arguido AA, pela prática de um crime de homicídio simples, na forma tentada, p. e p. pelos arts. 131º, 22º, 23º, do Cód. Penal, na pena de 6 (seis) anos de prisão e, pela prática de um crime de detenção ilegal de arma, p. e p. pelo art. 86º, nº1, al. c) da Lei nº5/2006, de 23/2, na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão;
c) Condenar o arguido AA, ao abrigo do disposto no art. 77º, do Cód. Penal, na pena única de 7 (sete) anos de prisão;
d) Condenar o arguido BB pela prática de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art. 86º, nº3, da Lei nº5/2006, de 23/2, na pena de 2 (dois) anos de prisão, suspensa na sua execução por igual período de tempo;
e) …;
f) Absolver o demandado BB do pedido de indemnização civil formulado contra si pelo demandante AA;
g) Condenar o demandado AA no pagamento ao demandante BB da indemnização, por danos não patrimoniais sofridos, no valor de 10.000,00 € acrescidos de juros, à taxa legal, contados desde a data de trânsito da decisão condenatória e até integral cumprimento.
h) Ao abrigo do disposto no art. 109º, nº1, do Cód. Penal, declaram-se perdidas a favor do Estado a totalidade das armas apreendidas aos arguidos, sendo-lhes devolvidos todos os demais bens.
....”.
2. Desta decisão recorre o arguido/assistente, AA, tendo apresentado motivações,[…]:
[…}
3. Admitido o recurso, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito suspensivo, o Ministério Público respondeu, concluindo pelo seu não provimento.
4. Neste Tribunal, a Exma. Srª. Procuradora-geral Adjunta apôs visto.
5. Colhidos os vistos legais, realizou-se a audiência.
6. O recorrente AA (admitido a intervir como assistente a fls.827), além do mais, pede a condenação do arguido BB pelo crime de homicídio, na forma tentada, por que foi pronunciado a fls.904.
Como decidiu o douto Ac. de Fix. Jurisprudência nº5/11 (de 9Fev.11, acessível em www.dgsi.pt), “Em processo por crime público ou semi-público, o assistente que não deduziu acusação autónoma nem aderiu à acusação pública pode recorrer da decisão de não pronúncia, em instrução requerida pelo arguido, e da sentença absolutória, mesmo não havendo recurso do Ministério Público”.
Assim, apesar do Ministério Público não ter recorrido da absolvição do arguido BB, tem o assistente AA legitimidade para o recurso que interpôs.
O objecto do recurso, tal como se mostra delimitado pelas respectivas conclusões, reconduz-se à apreciação das seguintes questões:
-vício do art.410, nº2, al.c, CPP;
-impugnação da matéria de facto;
-qualificação jurídica dos factos;
-indemnização civil;”
A final, veio a ser proferida a seguinte:
“IVº DECISÃO:
Pelo exposto, os juízes do Tribunal da Relação de Lisboa, após audiência, dando parcial provimento ao recurso do arguido/assistente, AA, acordam:
a) Condenar o arguido BB, como autor material, de um crime de homicídio simples, na forma tentada, p. e p. pelos arts.131, 22,23 e 73, do Código Penal, na pena de cinco (5) anos de prisão;
b) Em cúmulo jurídico desta pena com a pena de dois anos de prisão, em que foi condenado em 1ª instância pelo crime de detenção de arma proibida, condena-se o arguido BB, na pena úncia de seis (6) anos de prisão;
c) Julgar parcialmente procedente o pedido de indemnização formulado pelo demandante/assistente AA, condenando o demandado BB, a pagar-lhe a quantia de €25.000 (vinte e cinco mil euros), a título de inemnização por danos não patrimoniais, acrescida de juros, à taxa dos juros legais, a contar do trânsito da decisão condenatória;
d) Confirma-se o acórdão recorrido no restante;
e) Tendo decaído integralmente quanto ao recurso que interpôs como arguido e parcialmente como assistente, condena-se o recorrente AA, em 4Ucs de taxa de justiça;
Custas do pedido cível formulado pelo demandante AA, na proporção do decaimento.”
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AA, Arguido e Assistente nos autos , notificado do acórdão do Tribunal das Relação de Lisboa de 5 de Junho de 2018, não se conformando, dele veio interpor recurso, ao abrigo dos arts. 399.º, 401.º, n.º 1, b), 407.º, n.º 2, a) e 408.º, n.º 1, a), e 432.º, n.º 1, b), todos do C.P.P., para o Supremo Tribunal de Justiça,
Apresentou a motivação com as seguintes:
IV - CONCLUSÕES
--- DA NULIDADE DO ACÓRDÃO ---
A. Na sua parte decisória – parte III –, o acórdão recorrido aprecia a matéria de facto impugnada nos seguintes termos:
· Em III.1, o acórdão recorrido avalia a matéria das conclusões D. a L. apenas no âmbito do art. 410.º, n.º 2, c), do C.P.P., o que o faz restringir a avaliação da argumentação apresentada apenas àquilo que seja “vício [que] resulte do texto da decisão recorrida por si só ou conjugada com as regras da experiência comum”; “do texto da decisão recorrida, porém, não resulta que o recorrente só efectuou três disparos”; “segundo o texto do acórdão recorrido, o AA efectou disparos”; “pois do texto da decisão recorrida resulta que se dirigiu ao local”;
· Em III.2, o acórdão recorrido avalia a matéria das conclusões M. a T., considerando insubsistente a argumentação apresentada relativamente aos pontos da matéria de facto impugnados (factos provados n.ºs 5 a 10 e 16 a 18).
B. Todavia, e ressalvado o devido respeito, a verdade é que o Recorrente não arguira um erro grave e notório na apreciação da prova apenas reportado ao texto do acórdão recorrido, mas, como claramente consta da conclusão L., “considerando o teor do próprio acórdão, e tendo apenas de se recorrer à análise da prova material decorrente dos exames periciais, bem como à mais elementar experiência comum”; isto é, nessa parte do recurso, era fundamental conjugar o texto do acórdão recorrido com a prova material decorrentes dos exames periciais.
C. Assim sendo, a restrição efectuada pelo Tribunal da Relação de Lisboa – no que diz respeito à matéria das conclusões D. a L. –, limitando-se a avaliar o vício invocado apenas em face do texto da decisão recorrida, quando se pedia que essa avaliação fosse feita de forma conjugada com a prova material decorrente dos exames periciais, consubstancia uma omissão de pronúncia sobre matéria que não podia deixar de ser apreciada, o que gera a nulidade do acórdão, nos termos do art. 379.º, n.º 1, c), do C.P.P., devidamente conjugado com o art. 425.º, n.º 4, também do C.P.P..
D. Por outro lado, e quanto à apreciação da matéria das conclusões M. a T., a verdade é que o acórdão da Relação não apreciou a matéria da conclusão R. – devidamente conjugada com o 5.º item da conclusão B. e o 2.º item da conclusão N., a qual se reporta ao facto provado n.º 9, relativo à forma como a arma do AA veio a ter à posse do BB –, tendo-se limitado a concluir que nada haveria a alterar quanto a tal facto, porque “O BB confirma também o constante do n.º 9, corroborado com o facto dessa arma ter sido entregue por ele à PJ e de no local se encontrarem familiares seus, em particular os que com ele passaram a tarde na casa dos seus pais, de onde ele acabara de sair.”.
E. Ora, neste item, o acórdão não podia deixar de ter considerado, como expressamente foi invocado no recurso, que, a fls. 114, quando o Arguido BB entregou a arma à Polícia, ele confirmou a versão do ora Recorrente. Ademais, a única plausível à luz de um critério de experiência comum.
F. Não ponderando a questão sob o ângulo em que ela foi devidamente identificada na conclusão R., e salvo melhor opinião, o Tribunal da Relação não se pronunciou sobre uma questão que devia apreciar, o que gera igualmente a nulidade do acórdão proferido, nos termos conjugados dos arts. 379.º, n.º 1, c), e 425.º, n.º 4, ambos do C.P.P..
--- ERRO NOTÓRIO NA APRECIAÇÃO DA PROVA ---
G. O presente recurso funda-se igualmente na existência de erro notório na apreciação da prova, nos termos previstos no art. 410.º, n.º 2, c), do C.P.P..
H. Existindo alguma controvérsia sobre a possibilidade de ser o próprio Recorrente a arguir tal vício – uma vez que, segundo alguma jurisprudência, tal possibilidade seria apenas uma prerrogativa do Supremo Tribunal –, desde já se deixa arguida a inconstitucionalidade do entendimento normativo dado ao art. 410.º, n.º 2, do C.P.P., devidamente conjugado com o art. 434.º do C.P.P., no sentido de que os vícios identificados nas alíneas do art. 410.º, n.º 2 não podem ser invocados pelo Arguido ou Assistente em qualquer recurso (legalmente admissível) de acórdão da Relação para o Supremo Tribunal de Justiça, por violação do direito a um processo equitativo, consagrado no art. 20.º da C.R.P., bem como das garantias de defesa, asseguradas pelo art. 32.º, n.º 1, da C.R.P..
I. Ressalvado o devido respeito, in casu, o erro notório na apreciação da prova reporta-se a dois núcleos factuais:
· Por um lado, aos factos provados n.ºs 16 e 17, no segmento em que foi estabelecido que o Arguido AA quis causar a morte ao Arguido BB, sabendo que os disparos efectuados eram aptos a causar a sua morte;
· Por outro lado, aos...
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