Acórdão nº 1122/22.2BELRA-A de Tribunal Central Administrativo Sul, 21-08-2024

Data de Julgamento21 Agosto 2024
Número Acordão1122/22.2BELRA-A
Ano2024
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
ACÓRDÃO

Acordam, em conferência, os juízes do Tribunal Central Administrativo Sul:


I – RELATÓRIO

R…, LDA, instaurou processo cautelar contra o MINISTÉRIO DA COESÃO TERRITORIAL, pedindo a suspensão da eficácia do despacho do Vice-Presidente da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro, de 16.11.2022, que determinou a suspensão do seu alvará de licença n.º 15/2016/CCDRC para o exercício da actividade de gestão de resíduos.
Pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria foi proferida sentença a julgar procedente o processo cautelar, tendo sido decretada a providência cautelar requerida com a consequente autorização da requerente a prosseguir com a actividade de gestão de resíduos.
O requerido interpôs o presente recurso de apelação, cujas alegações contêm as seguintes conclusões:
“1.ª Em causa nestes autos está a decisão do Vice-Presidente da CCDR-C, de 16 de novembro de 2022, pela qual se determinou a suspensão temporária de uma licença de atividade de gestão de resíduos, pelo prazo máximo de um ano, para correção de desconformidades várias detetadas na sequência da vistoria de reexame.
2.ª Não estão em causa neste recurso questões de facto, uma vez que todos os factos alegados e relevantes foram dados como provados na Sentença recorrida.
3.ª A Sentença recorrida está fundamentada (i) na conclusão de que existem danos de difícil reparação por haver suspensão de laboração no mínimo por um ano e por essa ser a única atividade da Recorrida; (ii) na aplicação do artigo 65.º, n.ºs 1 e 2, do RGGR ao caso, do qual resulta que a vistoria de reexame não poderia ser feita antes de 27/05/2023; (iii) na falta de fundamentação do Auto de Vistoria; (iv) da contradição e obscuridade da fundamentação do ato suspendendo pelo facto de decidir num sentido, quando o Auto de Vistoria, para o qual o ato suspendendo remeteria, propõe decisão noutro sentido.
4.ª No que toca à verificação do periculum in mora, a Sentença não está fundamentada em qualquer facto, mas apenas em especulação não justificada,dado que nenhum facto foi alegado ou dado como provado quanto à verificação de danos, não tendo a então Autora cumprido o seu ónus probatório.
5.ª Além disso, a Sentença é baseada na premissa de que a suspensão de laboração vigorará no mínimo pelo prazo de ano, quando resulta textualmente do ato suspendendo que a suspensão vigora pelo prazo máximo de um ano e poderá cessar logo que sejam corrigidas as desconformidades, pelo que a vigência da suspensão e os prejuízos da suspensão estão na inteira disponibilidade da Recorrida.
6.ª No que toca à aplicação do artigo 65.º, n.º 1, do RGGR ao caso, a Sentença incorre em manifesto erro de interpretação do direito aplicável, dado que a interpretação que propugna – de que a situação no caso se subsume simultaneamente ao n.º 1 e ao n.º 2 – é de aplicação impossível, uma vez que da aplicação do n.º 1 resulta que vistoria de reexame teria de ocorrer após 13.5.2023; e da aplicação do n.º 2 que teria de ocorrer antes de 04.10.2021.
7.ª Além disso, o Tribunal a quo ignora que, ao abrigo do atual RGGR, nenhuma licença emitida terá prazo de validade, pelo que o n.º 2 só pode aplicar-se às antigas licenças, restando concluir que o n.º 1 só se aplica às novas licenças, atendendo à impossibilidade de aplicação simultânea.
8.ª No que toca ao dever de fundamentação, o Tribunal a quo confunde o Auto de Vistoria com o ato suspendendo, imputando ao segundo a falta de fundamentação verificada no primeiro quanto à proposta de revogação da licença e à insusceptibilidade de correção das desconformidades.
9.ª Sucede que quem tinha competência decisória – o Vice-Presidente da CCDR – discordou da proposta feita no Auto, concluindo no sentido diametralmente oposto, ou seja, que as desconformidades eram suscetíveis de correção e que a licença deveria ser suspensa para que assim se procedesse.
10.ª Daqui resulta que essa falta de fundamentação, quanto a esses aspetos, é absolutamente inconsequente para o ato praticado, dado que não foi essa a decisão tomada.
11.ª A Sentença recorrida incorre também em erro ao declarar que o ato suspendendo, ao remeter para o Auto, se suporta na sua fundamentação.
12.ª A mera leitura do ato suspendendo leva à conclusão clara de que o ato apenas remete para o Auto no que toca à fundamentação de facto quanto à verificação das desconformidades, mas dá uma qualificação jurídica diferente, razão pela qual decide em sentido diferente do proposto.
13.ª Restando concluir que a fundamentação quanto ao sentido da decisão tem de ser procurar no ato suspendendo.
14.ª O ato suspendendo fundamenta essa diferença, bem como a decisão de suspensão da laboração, de forma expressa e clara, no número, magnitude e relevância das desconformidades identificadas, que não permite a correção em prazo razoável e a proteção ambiental, especificando até aquela desconformidade que é mais relevante – a laboração no exterior.
15.ª A interpretação conferida pelo Tribunal a quo levaria, no extremo, a que quem tem poder decisório tivesse sempre de subscrever integralmente uma proposta de decisão, sob pena de obscuridade e contradição entre a decisão e a fundamentação.
16.ª O que a CCDR-C tinha de fazer – e fez – é a fundamentação específica naquilo em que diverge do Auto de Vistoria.
17.ª Da leitura do ato suspendendo não é possível que restem quaisquer dúvidas de que (i) há um rol de desconformidades, que aliás nunca são contestadas, pelo que a Recorrida exerce a sua atividade em condições ilegais; (ii) que essas desconformidades são múltiplas, graves e com impacto ambiental, em particular uma delas que é expressamente elencada; (iii) que a laboração provisória não é, por esse motivo, adequada à proteção ambiental.
18.ª E, assim sendo, o Tribunal fez uma errada interpretação do ato suspendendo, e consequentemente uma errada aplicação do artigo 153.º, n.º 1, do CPA ao caso.
19.ª Acresce que, conforme jurisprudência pacífica, a atividade de gestão de resíduos é uma atividade ambientalmente perigosa, em regra proibida, e que o incumprimento da licença é suficiente para se ter por certa a criação de risco para a saúde humana e o ambiente, não tendo a administração de provar mais do que a existência de violação dos termos da licença.
20.ª Assim sendo, não se verificam os pressupostos constantes do artigo 120.º do CPTA, e a providência cautelar devia ter sido recusada.”
Notificada das alegações apresentadas, a requerente, ora recorrida, contra-alegou, tendo apresentado as seguintes conclusões:
“I. O tribunal a quo dá como provado o facto 22 que não é sequer minimamente colocado em causa pela Recorrente, ou seja, a Recorrente conforma-se plenamente com isso, tanto mais que não requer que o mesmo seja sequer eliminado ou modificado da matéria de facto provada.
II. Aliás, isso mesmo é notório, claro e evidente quando o Recorrente de forma cristalina, elucidativa e de forma taxativa e isenta de margens para dúvidas no ponto 4 e 5 das alegações de Recurso diz o seguinte: “4. Não estão em causa neste recurso questões de facto, uma vez que todos os factos alegados e relevantes foram corretamente dados como provados na Sentença recorrida. (negrito e sublinhado nosso)
III. Assim, uma vez que 100% da atividade da Recorrida reconduz-se ao desmantelamento de equipamentos elétricos e eletrónicos em fim de vida, a que corresponde o CAE 38312, o que está devidamente comprovado documentalmente, e atente-se, a Recorrente não impugnou sequer os documentos juntos pela Recorrida, os mesmos fazem prova dos factos alegados e não impugnados pela Recorrente.
IV. Em função do que vem dito, bem como com as demais conclusões exaradas na sentença recorrida com as quais se concorda integralmente, o tribunal a quo decidiu corretamente que se verifica o preenchimento do requisito do periculum in mora.
V. Uma vez que a vistoria de reexame nunca se poderia ter realizado por ainda não terem decorrido 7 anos sobre a data de emissão do Alvará, o ato suspendendo ao determinar a suspensão do Alvará de que a Recorrida é titular é um ato manifestamente violador do artigo 65º do RGGR, pelo que não merece censura a decisão recorrida.
VI. O auto de vistoria, e menos ainda, o ato suspendendo, em momento algum indica as razões pelas quais as alegadas desconformidades assumem relevo suficiente para a não autorização da exploração conforme corretamente menciona a sentença recorrida.
VII. Não existe qualquer confusão entre o auto de vistoria e o ato suspendendo, sendo que aquele e este podem padecer de vícios próprios e autónomos, sendo que não obstante o auto de vistoria não colocar termo ao procedimento administrativo que terminou com a prática do ato suspendendo, os vícios de que padece são suscetíveis de serem alegados em sede de ato suspendendo, conforme resulta do artigo 51º, nº 3 do CPTA.
VIII. Note-se que uma coisa é o auto de vistoria, e coisa substancialmente distinta, é o ato suspendendo, sendo que a legislação faculta ao Recorrida a possibilidade de impugnar judicialmente o conteúdo do ato suspendendo tendo por base ilegalidades perpetradas ao longo do procedimento administrativo em curso, como foi o caso.
IX. Analisado o conteúdo da decisão suspendenda não resulta da mesma qualquer fundamentação de facto ou de direito, sendo que a decisão suspendenda para além de ser totalmente omissa quanto aos motivos para não conferir um prazo razoável para a Recorrida proceder à correção das alegadas desconformidades, bem como de não constar do Auto de Vistoria qualquer referência ao relevo suficiente das mesmas para indeferir a vistoria de reexame e proceder à suspensão do Alvará, é claramente insuficiente, incompleta e obscura por não esclarecer concretamente a motivação do indeferimento da vistoria de reexame e suspensão do Alvará, o que equivale à falta de fundamentação, conforme a sentença recorrida reconheceu.
X. Desta...

Para continuar a ler

Comece Gratuitamente

Desbloqueie o acesso total com um teste gratuito de 7 dias

Transforme a sua pesquisa jurídica com a vLex

  • Acesso completo à maior coleção de jurisprudência de common law numa única plataforma

  • Gere resumos de casos com IA que destacam instantaneamente os principais pontos jurídicos

  • Funcionalidades de pesquisa avançada com opções precisas de filtragem e ordenação

  • Conteúdo jurídico abrangente com documentos de mais de 100 jurisdições

  • Confiado por 2 milhões de profissionais, incluindo os principais escritórios de advocacia do mundo

  • Aceda a pesquisas potenciadas por IA com o Vincent AI: consultas em linguagem natural com citações verificadas

vLex

Desbloqueie o acesso total com um teste gratuito de 7 dias

Transforme a sua pesquisa jurídica com a vLex

  • Acesso completo à maior coleção de jurisprudência de common law numa única plataforma

  • Gere resumos de casos com IA que destacam instantaneamente os principais pontos jurídicos

  • Funcionalidades de pesquisa avançada com opções precisas de filtragem e ordenação

  • Conteúdo jurídico abrangente com documentos de mais de 100 jurisdições

  • Confiado por 2 milhões de profissionais, incluindo os principais escritórios de advocacia do mundo

  • Aceda a pesquisas potenciadas por IA com o Vincent AI: consultas em linguagem natural com citações verificadas

vLex

Desbloqueie o acesso total com um teste gratuito de 7 dias

Transforme a sua pesquisa jurídica com a vLex

  • Acesso completo à maior coleção de jurisprudência de common law numa única plataforma

  • Gere resumos de casos com IA que destacam instantaneamente os principais pontos jurídicos

  • Funcionalidades de pesquisa avançada com opções precisas de filtragem e ordenação

  • Conteúdo jurídico abrangente com documentos de mais de 100 jurisdições

  • Confiado por 2 milhões de profissionais, incluindo os principais escritórios de advocacia do mundo

  • Aceda a pesquisas potenciadas por IA com o Vincent AI: consultas em linguagem natural com citações verificadas

vLex

Desbloqueie o acesso total com um teste gratuito de 7 dias

Transforme a sua pesquisa jurídica com a vLex

  • Acesso completo à maior coleção de jurisprudência de common law numa única plataforma

  • Gere resumos de casos com IA que destacam instantaneamente os principais pontos jurídicos

  • Funcionalidades de pesquisa avançada com opções precisas de filtragem e ordenação

  • Conteúdo jurídico abrangente com documentos de mais de 100 jurisdições

  • Confiado por 2 milhões de profissionais, incluindo os principais escritórios de advocacia do mundo

  • Aceda a pesquisas potenciadas por IA com o Vincent AI: consultas em linguagem natural com citações verificadas

vLex

Desbloqueie o acesso total com um teste gratuito de 7 dias

Transforme a sua pesquisa jurídica com a vLex

  • Acesso completo à maior coleção de jurisprudência de common law numa única plataforma

  • Gere resumos de casos com IA que destacam instantaneamente os principais pontos jurídicos

  • Funcionalidades de pesquisa avançada com opções precisas de filtragem e ordenação

  • Conteúdo jurídico abrangente com documentos de mais de 100 jurisdições

  • Confiado por 2 milhões de profissionais, incluindo os principais escritórios de advocacia do mundo

  • Aceda a pesquisas potenciadas por IA com o Vincent AI: consultas em linguagem natural com citações verificadas

vLex

Desbloqueie o acesso total com um teste gratuito de 7 dias

Transforme a sua pesquisa jurídica com a vLex

  • Acesso completo à maior coleção de jurisprudência de common law numa única plataforma

  • Gere resumos de casos com IA que destacam instantaneamente os principais pontos jurídicos

  • Funcionalidades de pesquisa avançada com opções precisas de filtragem e ordenação

  • Conteúdo jurídico abrangente com documentos de mais de 100 jurisdições

  • Confiado por 2 milhões de profissionais, incluindo os principais escritórios de advocacia do mundo

  • Aceda a pesquisas potenciadas por IA com o Vincent AI: consultas em linguagem natural com citações verificadas

vLex

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT