Acórdão nº 1101/19.7BESNT de Tribunal Central Administrativo Sul, 30-09-2021

Data de Julgamento30 Setembro 2021
Número Acordão1101/19.7BESNT
Ano2021
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
Acordam, em conferência, os Juízes da 1.ª Subsecção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

I - RELATÓRIO

G... - I..., SA, melhor identificada nos autos, veio interpor recurso da decisão do Chefe do Serviço de Finanças De Sintra 1, que, lhe fixou a coima no montante de € 7.221,53, acrescido de custas do processo, nos autos de contraordenação fiscal nº 1562201906000....

O Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, por decisão de 30 de junho de 2020, rejeitou o liminarmente o recurso, nos termos do disposto no artigo 63.°, n.° 1, do RGCO, aplicável ex vi do artigo 3.°, al. b), do RGIT, por no mesmo não constar a formulação de conclusões.

Inconformada, a G... - I..., SA, , veio recorrer contra a referida decisão, tendo apresentado as suas alegações e formulado as seguintes conclusões:

«A. O presente Recurso é interposto da Douta Sentença de 06 de Julho de 2020, a qual julgou o presente recurso de contraordenação rejeitado liminarmente, declarando, que a Recorrente não respondeu a uma notificação para apresentar novo recurso para formulação de conclusões, pelo respeito das exigências de forma.

B. Sucede que, salvo o devido respeito, a ora Recorrente não se pode conformar com o teor da douta sentença proferido pelo Tribunal a quo, conforme se constatará pelos motivos e fundamentos adiante deduzidos.

C. No âmbito do recurso de contraordenação, o Tribunal a quo alega ter notificado a Recorrente por via notificação electrónica, através da sua mandatária, em 05-03-2020, do Despacho para a Recorrente no prazo de 10 dias, vir aos autos sanar as deficiências formais do requerimento de recurso.

D. Mais alega o Tribunal a quo ter notificado a Recorrente a 06-07-2020 por via electrónica, através da sua mandatária, da Sentença que indeferiria liminarmente o recurso de contraordenação.

E. Nesta sequência, a 09-07-2020, a Recorrente é notificada, por via postal, da Sentença que rejeita liminarmente o recurso de contraordenação.

F. Sucede que, tendo a Recorrente dado conhecimento da respectiva notificação via postal de Sentença à sua mandatária, depressa se concluiu que a mesma nunca teria sido notificada via electronicamente no âmbito deste processo.

G. Na verdade, a ora mandatária da Recorrente nunca foi notificada de qualquer processo via SITAF, uma vez que o mesmo não se encontrava configurado, dado o longo período de tempo desde a atribuição da password via Citius.

H. Neste sentido, a ora mandatária da Recorrente remeteu, desde logo, um correio electrónico a solicitar esclarecimentos ao tribunal a quo sobre a notificação referida em Sentença.

I. Bem como, a ora mandatária da Recorrente remeteu, desde logo, um correio electrónico ao Helpdesk do SITAF para solucionar o respectivo acesso, considerando a menção de erro “Certificado inválido”.

J. O Helpdesk do SITAF acabou por responder remetendo o tema para os serviços informáticos da Ordem dos Advogados, não tendo sido prestado qualquer auxílio informático.

K. Na sequência de a ora mandatária da Recorrente ter sanado as dificuldades informáticas de acesso ao SITAF junto dos serviços informáticos, foi possível visualizar toda a tramitação do processo, tendo a ora Recorrente sido então notificada pelo Tribunal a quo sobre o seu pedido de esclarecimentos.

L. Sucede que, não obstante o disposto no n.° 1 do artigo 111.° do Código do Processo Administrativo (CPA), em que “as notificações são efetuadas na pessoa do interessado, salvo quando este tenha constituído mandatário no procedimento, caso em que devem ser efetuadas a este”.

M. A verdade é que, ao abrigo da al. a) do n.° 1 do artigo 112.° do CPA, refere que as notificações podem ser “por carta registada, dirigida para o domicílio do notificando”.

N. Sendo esta uma opção do tribunal a quo, o mesmo não procedeu à respectiva notificação do Despacho, sabendo o Tribunal a quo que tal notificação iria culminar numa decisão sobre a pretensão formulada, bem como, a falta da mesma iria causar prejuízo à Recorrente, nos termos e para os efeitos do n.° 1 do artigo 114° do CPA.A este respeito entendeu o Tribunal da Relação de Lisboa que, "por imposição do disposto no art.° 259, do CPC, a notificação dos despachos, sentenças ou acórdãos terá de fazer-se através do envio ao notificado de cópia ou fotocópia legível da decisão e dos fundamentos. Está em causa uma regra que visa assegurar o conhecimento integral da decisão pela parte, de modo a subtrair qualquer erro ou infidelidade de transcrição. No recebimento de notificações destinadas a dar conhecimento às partes de actos judiciais devem estas agir, não de forma passiva, mas com o normal esforço de compreensão integral do que lhes é levado ao conhecimento.” - in www.dgsi.pt, processo n.° 2164/2007-2, de 26-04-2007.

O. Acresce ainda o Supremo Tribunal de Justiça que, "o direito de acesso aos tribunais implica a garantia de uma protecção jurisdicional eficaz, que envolve o direito, pelo lado das partes, de conhecerem efectivamente as decisões que lhes dizem respeito. Havendo advogado constituído, esse conhecimento deve ser dado por notificação que a este seja dirigida. A omissão da notificação do despacho que admite um recurso, porque pode influir decisivamente no exame ou decisão da causa, é geradora de nulidade processual. O posterior recebimento, pelo advogado, de notificação para pagar custas não torna exigível ao mesmo que se desloque ao tribunal para consultar o processo e verificar se alguma omissão indevida teve lugar. Por isso, não faz presumir que com ela o advogado tomou conhecimento da falta de notificação do despacho que recebeu o recurso.” - in www.dgsi.pt, processo n.° 98A1095, de 02-06-1998.

P. Pelo que, neste contexto, a mandatária da ora Recorrente não foi notificada do Despacho que viria a precludir o direito de sanar as deficiências formais do requerimento de recurso, colmatando assim no indeferimento liminar de recurso, ferindo desde logo, o direito de acesso aos tribunais que garanta uma protecção jurisdicional eficaz, envolvendo o direito de a Recorrente conhecer efectivamente as decisões que lhes dizem respeito.

Q. Por outro lado, a Douta decisão, desde logo, e salvo o devido respeito, padece de um vício de forma e estrutura, mormente quanto à falta de verificação e respeito pelo princípio do contraditório, nos termos e para os efeitos do artigo 3° do CPC, revelando-se, assim, a sentença de indeferimento liminar numa "decisão-surpresa”.

R. Com efeito, o princípio do contraditório é estruturante do nosso direito processual, tanto assim que surge consagrado no artigo 3° do Código de Processo Civil como forma de evitar a chamada "decisão-surpresa”, constituindo inclusivamente uma manifestação do direito fundamental de acesso aos tribunais e da tutela jurisdicional efectiva, consagrado no art.° 20° da Constituição da República Portuguesa.

S. Ora, no presente caso, a falta de certeza jurídica de cognoscibilidade do acto não pôde sequer ser suprida por qualquer comportamento da Recorrente, que revelasse que a mesma teve o efectivo conhecimento da preclusão do direito in casu.

T. A este respeito, entendeu o Tribunal da Relação do Porto: "Suscitada a título oficioso a apreciação de uma questão de direito, o exercício do contraditório, nos termos do art. 3°/3 CPC dependerá sempre da verificação de uma nova abordagem jurídica da questão...

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