Acórdão nº 10849/15.4T8SNT-L.L1.L1-2 de Tribunal da Relação de Lisboa, 06-02-2020

Data de Julgamento06 Fevereiro 2020
Número Acordão10849/15.4T8SNT-L.L1.L1-2
Ano2020
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam na 2.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:

1. Relatório:
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Por petição inicial apresentada em juízo em 08-03-2019, SM… requereu contra RM…, a presente ação para alteração do regime de exercício das responsabilidades parentais quanto à criança, menor de idade, filha de ambos, CB…, requerendo, a final, o estabelecimento de um regime provisório de regulação das responsabilidades parentais, a atribuição de natureza urgente ao presente processo, a autorização para viajar para Paris, quer nas férias da Páscoa, quer ainda entre 31 de julho e 6 de agosto de 2019, sendo no primeiro período temporal para ir à Euro Disney e, no segundo período temporal, para ir ao casamento de um familiar.
Alegou, para o efeito e em síntese, a ausência de visitas da menor à mãe, ora requerente, há cerca de um ano.
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Citado o requerido, o mesmo alegou – artigo 42.º, n.º 3, do RGPTC - pugnando pela improcedência da pretensão da requerente, por infundada.
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Em idêntico sentido se pronunciou o Ministério Público.
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Em 17-05-2019, o Juiz do tribunal recorrido proferiu decisão, indeferindo a nomeação de advogado à criança – pretensão que tinha sido requerida pela mãe desta – e, no mais, dai constando, nomeadamente, o seguinte:
“(…) Ora, a ação de alteração da regulação das responsabilidades parentais destina-se a alterar, em definitivo, regime definitivo.
A alteração provisória do regime, seja provisório ou definitivo, só pode ter lugar na pendência de causa, conforme resulta do disposto no artº 28º, nº 1 do Regime Geral do Processo Tutelar Cível, ao referir que, “em qualquer estado da causa (…) o tribunal pode decidir provisoriamente questões que devam ser apreciadas a final”.
É, pois, essencial, que esteja pendente causa, na qual se decida a final (ou seja, a título de definitivo) da regulação ou da alteração da regulação das responsabilidades parentais. Estando pendente ação de alteração da regulação das responsabilidades parentais (o que só ocorre se já tiver sido efetuada, antes, a regulação definitiva das responsabilidades parentais), pode, nessa ação pendente, ser provisoriamente alterada a decisão que já tinha sido tomada a título definitivo, na ação de regulação das responsabilidades parentais (cfr. artº 28º, nº 2 do Regime Geral do Processo Tutelar Cível). Contudo, a alteração provisória de decisão definitiva ou provisória anterior, tem de se feita em ação pendente, destinada a decidir a final, se essa alteração provisória é ou não de tornar definitiva.
É o que resulta, de forma cristalina, da conjugação das normas constantes dos nºs 1 e 2 do artº 28º do Regime Geral do Processo Tutelar Cível.
Efetivamente o nº 1 restringe as decisões provisórias a “questões que devam ser apreciadas a final”.
Por outro lado, a ação de alteração da regulação das responsabilidades parentais destina-se a alterar em definitivo (ou seja, a final) e não apenas provisoriamente, a regulação anteriormente efetuada. E, portanto, só tem lugar esta ação, quando o pedido formulado na petição inicial, seja precisamente a alteração total ou parcial, mas sempre a título definitivo, da regulação anteriormente efetuada.
Assim resulta da leitura atenta do disposto no artº 42º, nº 1 do Regime Geral do Processo Tutelar Cível, ao dispor que “quando circunstâncias supervenientes tornem necessário alterar o que estiver estabelecido (…) podem requerer (…) uma nova regulação do exercício das responsabilidades parentais”.
Porém, na ensaiada pela requerente, a decisão que regulou a responsabilidades parentais, que agora pretende alterar provisoriamente, fê-lo a título provisório. Se assim, fosse, também não seria admissível a instauração da presente ação, que legalmente só pode ter lugar, quando se pretenda alterar decisão definitiva, e não provisória.
Assim, resulta do disposto no artº 42º, nº 1 do Regime Geral do Processo Tutelar Cível, que se refere a “decisão final”, e não regime provisório, pelo que, quando o que se pretende é a alteração do regime provisório, o meio próprio é, não a ação de alteração, mas sim requerimento nesse sentido, formulado em processo pendente (artº 28º, nº 1 do Regime Geral do Processo Tutelar Cível). Aliás, corre termo simultaneamente a esta, uma outra ação de alteração (que constitui o apenso G), na qual é pedida a fixação de um novo regime definitivo de regulação das responsabilidades parentais.
Ora, a ser verdadeira a tese da requerente que não há regime definitivo, seria legalmente inadmissível a instauração e o prosseguimento de presente ação de alteração da regulação das responsabilidades parentais.
Por último, e conforme já acima explanámos, o estabelecimento de um regime provisório (regulado pelo artº 28º do Regime Geral do Processo Tutelar Cível), sendo instrumental do regime definitivo a fixar, não tem lugar em ação própria e específica cujo único objeto e pedido é a essa fixação provisória, antes carecendo de ter ação pendente, e destinando-se, o tal regime provisório, a ser instrumental do regime a fixar a final.
Mesmo que a presente ação, com o seu objeto e pedido fosse legalmente admissível (que não é), sempre a pretensão da requerente teria de naufragar, por não ser justificada a alteração, nem ter ocorrido alteração superveniente de circunstâncias que apontem para a necessidade da pretendida alteração.
Nos termos do artº 42º, nº 4 do Regime Geral do Processo Tutelar Cível, “o juiz, se considerar o pedido infundado, ou desnecessária a alteração, manda arquivar o processo condenado o requerente em custas”.
Ora, in casu, analisada a argumentação da requerente, verificamos que a mesma, por um lado, não alega quaisquer factos concretos que constituam alteração de circunstâncias relevantes e que tornem necessário altera o regime de regulação das responsabilidades parentais no sentido que pretende.
Isto, porque, o único fundamento invocado, que é estar há quase um ano sem ter visitas da filha, resulta de decisão judicial proferida, que suspendeu as visitas da menor à mãe, pelos fundamentos de facto e de direito constantes de tal despacho, ainda que por remissão para a douta promoção que o antecedeu (cfr. fls. 89 do apenso G).
Por outro lado, e será recordar que, no âmbito do apenso D foi realizada psiquiátrica, pelo isento INML, à ora requerente, cujo relatório consta de fls. 412 e 413 de tal apenso.
No referido relatório pode ler-se, a fls. 413, que, a requerente “apresenta um trajeto de vida nas suas diferentes áreas afetiva, social e laboral caracterizado por instabilidade, intolerância à frustração, impulsividade e incapacidade de aprender com a experiência que apontam para a existência de traços disfuncionais da personalidade”.
Tal perícia concluiu, relativamente à ora requerente, que “a examinada apresenta uma perturbação da personalidade que lhe prejudica o exercício responsável da parentalidade”.
Ao invés, o relatório da perícia realizada ao pai da menor, que consta a fls. 525 e segs, e que concluiu que o “examinado apresenta (…) recurso internos e capacidades parentais para atender às necessidades e cuidados da menor”.
Não existem, pois, fundamentos sólidos e válidos de alteração do regime de regulação das responsabilidades parentais em vigor, no sentido pretendido pela requerente, antes apontando todos os elementos probatórios constantes dos autos (neste se incluindo os apensos), em sentido inverso ao pretendido pela requerente.
Face a todos os elementos constantes dos autos e seus apensos, o presente pedido de alteração, para além de infundado, por injustificado, carece de fundamento, por ausência de alteração relevante de circunstâncias e por o meio próprio não ser a ação de alteração.
Pelas razões expostas, mormente os fundamentos que levaram à suspensão das visitas da menor à mãe, a decisão constante em tal despacho, que se mantém vigente, e as conclusões constantes do citado relatório da perícia psiquiátrica realizada à requerente, não pode o Tribunal, no superior interesse da menor, autorizar a mãe a deslocar-se com a filha para o estrangeiro.
Destarte, importa indeferir o pedido de alteração e os pedidos de autorização para a mãe viajar com a filha para Paris, pelos fundamentos acabados de expor.
Pelo exposto, indefiro o pedido de alteração do regime do exercício das responsabilidades parentais e bem assim, os pedidos da requerente para viajar com a menor para o estrangeiro.
Custas pela requerente, sem prejuízo do AJ.
Valor da causa: €30.000,01 (trinta mil euros e um cêntimo).
Registe e notifique”.
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Não se conformando com a referida decisão, dela apela a requerente, formulando as seguintes conclusões:
“1- O presente recurso vem da sentença judicial de fls.... que julgou improcedentes os pedidos de alteração do regime do exercício das responsabilidades parentais fixados – leia-se provisoriamente-, de viajar com a menor para o estrangeiro, de nomeação de advogado para a menor e de atribuição de natureza urgente aos autos.
2- Não aceita nem pode aceitar a decisão proferida, pelo que se requer a sindicância junto do Tribunal Superior.
3- Nos autos de Apenso D- autos de Promoção e Protecção – não foram nem poderiam ser reguladas definitivamente as responsabilidades parentais da menor, pois a própria natureza do processo, assim, não o admite.
4- As medidas determinadas nos autos de PPP, inclusive as que se referem à regulação de responsabilidades parentais, foram fixadas como medida de protecção e promoção, por forma a complementar a boa execução do apoio junto dos pais e por um prazo de 12 meses, tendo carácter provisório e nunca a título definitivo.
5- O tribunal de primeira instância competente à data sustentou tal decisão judicial ao abrigo do disposto no artigo 113º da Lei 147/99, de 01 de Setembro, como se impunha.
6- O regime do artigo 28º do RGPTC não impõe que o requerimento a solicitar a alteração da medida provisória seja processado nos próprios autos, nem impede que o seja
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