Acórdão nº 1084/13.7TBFAF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 24-09-2015
Data de Julgamento | 24 Setembro 2015 |
Número Acordão | 1084/13.7TBFAF.G1 |
Ano | 2015 |
Órgão | Tribunal da Relação de Guimarães |
I – RELATÓRIO.
Recorrente: AA.
Nos presentes autos de insolvência de pessoa singular, veio a Insolvente AA, no seu requerimento inicial, declarar pretender a exoneração do passivo restante, nos termos do disposto no artigo 235.º e segs. do CIRE.
Por decisão proferida nos autos, em razão da falta de fundamento da oposição, e por se entender inexistir qualquer motivo de indeferimento liminar, foi deferido o pedido de exoneração do passivo, determinando-se que durante os cinco anos do período de cessão, o rendimento disponível que a insolvente AA venha a auferir se considere cedido ao fiduciário, cabendo-lhes, ainda, cumprir as obrigações previstas no n" 4, do artigo 239°, do CIRE, sob pena de cessação antecipada do respectivo procedimento.
Nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 239º do CIRE, o tribunal “a quo” determinou a exclusão do rendimento disponível do valor correspondente a salário e meio, mínimo nacional, mensalmente, se auferidos, que se considerou como sendo o necessário para o sustento minimamente condigno da Insolvente.
Inconformada com tal decisão, dela interpôs recurso a Insolvente, de cujas alegações extraiu, em suma, as seguintes conclusões:
“1 - A recorrente aufere, mensalmente, a quantia líquida de € 1.514,64.
2 - Está alegado e provado que a recorrente suporta em média, por mês, com despesas inevitáveis ao seu sustento (nomeadamente, despesas médicas e medicamentosas, água, luz, gás, condomínio, entre outras), o montante global de € 1.174,17,00;
3 - O art. 239°, n° 3, aI. b) do CIRE exclui do rendimento disponível o que seja razoavelmente necessário para assegurar o sustento minimamente digno do devedor e respectivo agregado familiar;
4 - A ratio legis desta regra e correspondente excepção (...) "é a salvaguarda do quantitativo monetário necessário à sobrevivência humanamente condigna dos insolventes, em concretização do princípio da dignidade humana, decorrente do princípio do Estado de Direito, vertidos nas disposições conjugadas dos art.rs 1.°, 59.°, n." 2 aI. a) e 63.°, n.rs 1 e 3 da Constituição da República Portuguesa, segundo a jurisprudência do Tribunal Constitucional." - cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães datado de 22/06/2010, proferido no âmbito do processo nº 536/09.8TBFAF-C.G1, consultável in www.dgsi.pt.
5- Perante o supra exposto, conclui-se que o montante que a recorrente pode entregar de molde a garantir o sustento minimamente digno do agregado familiar é de 300,00 €;
6- A Insolvente terá de (sobre) viver com um rendimento mensal inferior a 505,00 €, que corresponde actualmente ao salário mínimo nacional, e é entendido como um indicador mínimo abstracto de sobrevivência humanamente digna;
7- Por isso se refere, no Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra proferido em 28/09/2010, no âmbito do processo nº 1826/09.5T2AVR- C.C1, consultável in www.dgsi.pt, que: “Na fixação do montante a ceder aos credores (“rendimento disponível”) deve partir-se do valor correspondente a um salário mínimo nacional, adicionando-se, de seguida, se for caso, o valor de outras despesas que se mostrem imprescindíveis para garantir um sustento minimamente digno do devedor e do seu agregado familiar;
8- Assim, o montante mensal a entregar pela recorrente ao fiduciário deve ser fixado em € 300,00 mensais;
9- Pelo que, ao decidir como decidiu fez o Mmº Juiz “a quo” errada interpretação e aplicação, entre outros, do disposto nos artigos 239 e 241, do CIRE.
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Não foram apresentadas contra alegações.
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Colhidos os vistos, cumpre decidir.
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II- Do objecto do recurso.
Sabendo-se que o objecto do recurso é definido pelas conclusões no mesmo formuladas, sem prejuízo do que for de conhecimento oficioso, a questão decidenda é, no caso, a seguinte:
- Interpretadas as conclusões formuladas pelo recorrente, conclui-se que a única questão a decidir consiste na de saber se, na concreta situação, o montante fixado e a excluir dos rendimentos a entregar pelo devedor insolvente ao fiduciário se revela ou não adequado em face dos citérios legalmente estipulados.
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III- FUNDAMENTAÇÃO.
Fundamentação de facto.
Além dos factos que foram referenciados no relatório que antecede, e com relevância para o esclarecimento da situação patrimonial da Insolvente e, consequentemente, para a decisão do recurso, consta da fundamentação de direito da decisão recorrida o que a seguir se transcreve:
(…)
“Não obstante neste momento e atentos os documentos juntos pela insolvente relativo às suas despesas e a pronúncia dos credores encontra-se este Tribunal de Comércio, habilitado a proferir decisão nesse sentido.
Temos apenas como certo o valor do seu vencimento em Maio de 2014 no montante de € 1282,57 e que terá as despesas de casa e as normais de utilização do lar, como sejam agua, luz, gás.
~~~
Quanto às despesas de internet e telefone apresentadas pela insolvente, além de terem sido apresentadas desactualizadas por referência ao ano de 2013, reflectem uma utilização descuidada e que terá de ser moderada. (plafond de € 15 e € 95 excedente- fls. 355)
No mais não existe qualquer comprovativo de despesas médicas regulares e necessárias, além das correntes e a renda de casa, pelo que não pode o tribunal inclui-las como certas, sendo também a alimentação não comprovada, pelo que teremos de nos nortear pelos montantes usuais para a composição do agregado familiar da insolvente.
Afigura-se-nos assim que atentas as despesas comprovadas e o rendimento declarado, a insolvente podendo dispor de salário e meio mínimo nacional verá assegurado o sustento minimamente digno da devedora.
Isto porque diga-se que esta figura jurídica consagrada neste Código da Insolvência destina-se a permitir além da recuperação da pessoa singular, também o recebimento de alguma quantia no período de cessão pelos credores.
Ora caso não existam bens para essa cessão, nem deverá ser proferido tal despacho de admissão, uma vez que levará à prática de actos inúteis, por nada haver para dispor às partes nesse período de 5 anos de cessão.
Deste modo consideramos ser situação de declaração de que a exoneração será concedida uma vez observadas pelo devedor as condições previstas durante os cinco anos posteriores ao encerramento do processo de insolvência.
Assim considera-se cedido à fiduciária (actual AI)...
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