Acórdão nº 1080/17.5T8EVR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 10-10-2019

Data de Julgamento10 Outubro 2019
Número Acordão1080/17.5T8EVR.E1
Ano2019
ÓrgãoTribunal da Relação de Évora


Acórdão da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora
I – Relatório
1.BB propôs acção declarativa comum contraCC, DD, EE, FF, GG e HH,pedindo que os mesmos sejam condenados solidariamente a pagar-lhe a quantia de € 59.855,75 (cinquenta e nove mil oitocentos e cinquenta e cinco euros e setenta e cinco cêntimos), acrescidos dos juros desde a data da citação até efectivo e integral pagamento.

2. Para tanto, alegou, em síntese, que os Réus e os pais do A. - II e JJ - eram legítimos herdeiros de Manuel J… e de Maria L…, falecidos em 15 de Novembro de 1989 e 1 de Maio de 1978; a mãe do Autor faleceu em 19 de Janeiro de 2006 e o pai faleceu em 11 de Janeiro de 2015; Artur L…, faleceu em 22 de Novembro de 2014, sendo seus herdeiros os 1.º e o 3.º Réus; os 5.° a 7.° Réus foram os herdeiros, respectivamente, como cônjuge e filhos de Maria L… M…, falecida em 11 de Janeiro de 1999; em 27 de Setembro de 1999, o Autor, o marido da 1ª Ré, Artur L…, e os 5.º a 7.º RR. como herdeiros de Maria L… M… - todos como herdeiros Manuel J… e de Maria L… R… - celebraram 3 (três) contratos a que deram a designação de "contrato-promessa de compra e venda", no âmbito dos quais o Autor, ainda não herdeiro à data, prometeu comprar aos então proprietários e ora RR., e estes prometeram vender, os seguintes prédios:
– Parte do prédio (quintinha), com a área de 5.248,53 m2, identificada sob a parcela n.º 2 (dois);
– Parte do prédio (quintinha), com a área de 6.253,50 m2, identificada sob a parcela n.º 6 (seis); e
– Parte do prédio (quintinha), com a área de 6.405,50 m2, identificada sob a parcela n." 10 (dez), todas do prédio rústico denominado Herdade da C…, sito em Évora, freguesia da Sé, inscrito na respectiva matriz sob o n.º …-D e descrito na Conservatória do Registo Predial de Évora sob o n.º ….
Alega, ainda, que foi estipulado o preço de € 29.927,87 (vinte e nove mil, novecentos e vinte e sete euros e oitenta e sete cêntimos) por cada parcela, no total de E 89.783,61 (oitenta e nove mil, setecentos e oitenta e três euros e sessenta e um cêntimos), mais se determinando o pagamento do preço em duas prestações iguais, no montante de € 14.963,94, a primeira a efectuar no dia 31 de Maio de 2000 e a segunda em 31 de Outubro de 2000; em cumprimento da primeira prestação acordada, o Autor enviou para cada um dos então promitentes-vendedores, por carta registada com aviso de recepção, datadas de 27 de Março de 2000, 4 (quatro) cheques no valor total de 6.000.000$00 (E 29.927,87), os quais foram descontados pelos respectivos beneficiários, que receberam a quantia neles inscrita.
Posteriormente, acrescentou, que, em cumprimento da segunda e última prestação, o Autor enviou para cada um dos então promitentes-vendedores, por carta registada com aviso de recepção, datadas de 7 de Julho de 2000, 4 (quatro) cheques no valor total de 6.000.000$00 (€ 29.927,87), os quais, igualmente, foram descontados pelos respectivos beneficiários, que receberam a quantia neles inscrita, sendo que, a competente escritura pública de compra e venda não chegou a ser formalizada.
Mais alegou o Autor, que correu termos no Tribunal Judicial de Évora, 2.º Juízo Cível, sob o Proc.° 808/09.1 TBEVR, inventário da herança de Manuel J… e de Maria L… - onde foram requerentes os aqui 1.º e 5.º a 7.º Réus e ainda Artur L…, e interessados o Autor e seu pai, JJ -, no âmbito do qual foi apresentada relação de bens pelo cabeça de casal, onde foi relacionado sob a Verba n.° 2, alínea b), do Activo, o artigo rústico n.º … da secção D, com a área de 172,0455 hectares, na qual é feita referência aos contratos promessa das parcelas de terreno supra identificados e, como Passivo, as promessas de venda dos lotes n.º 2, n.º 6 e n.º 10, pelo valor total de € 89.783,62, tendo sido relacionados para o caso de não serem cumpridos os referidos contratos-promessa de compra e venda pelos identificados promitentes vendedores.
Alegou, também, o Autor, que em 7 de Maio de 2015, nos referidos autos de Inventário os interessados alcançaram acordo, no âmbito do qual, a Verba n.º 2, alínea b), constituída pelo prédio que integrava os lotes de terrenos prometidos vender ao Autor pelos Réus, foi adjudicada ao pai do Autor, JJ, também ele promitente vendedor, tendo os intervenientes no Inventário decidido dar sem efeito os contratos promessa objecto dos presentes autos e não aprovar o respectivo passivo, mas mantendo em seu poder as verbas liquidadas e pagas pelo ora Autor, as quais nunca foram devolvidas em singelo ou em dobro a este pelos então promitentes-vendedores.
Invocou ainda que notificou os Réus, por cartas de 4 de Abril de 2017, no sentido de lhe serem devolvidos os montantes por si pagos, dado terem ficado sem efeito os três contratos-promessa subjacentes aos referidos pagamentos, as quais mereceram resposta através da carta datada de 12 de Abril de 2017, assinada por CC e HH, pela qual comunicam não reconhecerem o direito de ser restituído ao Autor qualquer valor, o que não aceita, pois pagou aos Réus a totalidade do preço das parcelas que lhe foram prometidas vender, no montante de € 89.783,62 e tais parcelas nunca lhe foram transmitidas em propriedade, face à conduta dos então proprietários, motivo pelo qual foram os contratos de promessa de compra e venda considerados na qualidade de então proprietários sem efeito pelos intervenientes no Inventário e, consequentemente, ficaram as partes exoneradas das obrigações assumidas contratualmente, ou seja, o Autor na obrigação de comprar e os Réus na obrigação de vender os referidos terrenos/quintinhas, pelo que, tendo o Autor pago aos promitentes-vendedores a totalidade do preço, impõe-se que o mesmo lhe seja devolvido.
No entanto, diz o A. que, como os pais do Autor também eram promitentes-vendedores, com um direito correspondente a 1/3 sobre a herança de Manuel J… e de Maria L…, o Autor tem a receber dos demais promitentes-vendedores, ora Réus, apenas 2/3 do preço pago, ou seja, o Autor tem direito a receber a devolução, por parte dos Réus, da quantia paga de € 59.855,75 (cinquenta e nove mil, oitocentos e cinquenta e cinco euros e setenta e cinco cêntimos), correspondente aos referidos 2/3.

3. Devidamente citados, vieram os Réus apresentar contestação, tendo, além do mais, alegado que os interessados na partilha não aprovaram o passivo, reconhecendo assim nada haver a pagar ou a restituir em razão dos contratos de promessa; foi esse o acordo firmado entre todos interessados e não outro; o Autor é dono do prédio de onde prometeu comprar parcelas a desanexar, pelo que a haver alguma obrigação, que não há, ela estaria extinta por confusão, no entanto se considerasse haver alguma viabilidade na pretensão do Autor a verdade é que ela constitui um manifesto abuso de direito.

4. Realizou-se tentativa de conciliação, que se frustrou, facultando-se às partes a possibilidade de discussão de facto e de direito, por escrito, com vista ao conhecimento imediato da excepção peremptória do abuso de direito, nos termos previstos no artigo 591.°, n.º 1, al. b), do Código de Processo Civil.

5. Foi então proferido despacho saneador-sentença, que julgou procedente, por provada, a excepção peremptória de abuso de direito na modalidade de "venire contra factum proprium" e, em consequência, absolveu os Réus do pedido deduzido pelo Autor.

6. Inconformado interpôs o A. o presente recurso, o qual motivou, concluindo do seguinte modo [segue transcrição das conclusões do recurso]:
A) Entende o Apelante que os pressupostos do instituto de abuso de direito, na modalidade de "venire contra factum proprium" não se encontram devidamente preenchidos e, portanto, a sua aplicação ao caso concreto é contrária à lei, em violação do art.º 334.º do Código Civil;
B) São pressupostos: a existência dum comportamento anterior do agente susceptível de basear uma situação objectiva de confiança, a imputabilidade das duas condutas (anterior e actual) ao agente, a boa-fé do lesado (confiante), a existência dum "investimento de confiança", traduzido no desenvolvimento duma actividade com base no factum proprium e o nexo causal entre a situação objectiva de confiança e o "investimento" que nela assentou;
C) Os referidos pressupostos do abuso de direito constituem matéria de facto a qual tem de ser alegada e provada por quem dele beneficia, em cumprimento das regras gerais do ónus da prova, previsto no art.º 342.° do Código Civil;
D) Da Contestação não se retira um só facto susceptível de demonstrar os referidos pressupostos, ainda que indiciariamente;
E) Não foi alegado e não resulta dos autos, por exemplo, se foi o comportamento anterior do Apelante (factum proprium) que gerou a confiança nos Apelados de que o crédito jamais iria ser reclamado;
F) E também nada foi alegado nem provado que os Apelados estavam de boa-fé e que a sua suposta confiança foi justificada e não se deveu, por exemplo, a negligência ou culpa própria (sendo dessa forma inimputável ao Apelante);
G) A douta Sentença proferida pelo Tribunal a quo viola, assim, o disposto no art.º 342.° do Código Civil e configura, salvo melhor opinião, um erro de julgamento dada a desconformidade entre o seu conteúdo e a matéria de facto provada;
H) Além disso, a douta Sentença sob recurso sustentou a sua decisão presumindo os pressupostos do abuso de direito o que, salvo o devido respeito, não é admissível;
I) Sem a alegação e prova dos factos base (pressupostos), por parte de quem tinha esse ónus, o Tribunal a quo estava impedido de fazer uso desse meio de prova previsto no art.º 349.° e 351.° do Código Civil;
J) As presunções (judiciais) só são válidas se a ilação for obtida de um facto conhecido/provado, no sentido de dar como provado um facto desconhecido, o que a Sentença ora impugnada não cumpre, violando dessa forma o previsto no art. ° 349. ° do Código Civil;
K) De referir ainda que
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