Acórdão nº 1069/14.6TBOER.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça, 04-07-2024
Data de Julgamento | 04 Julho 2024 |
Case Outcome | NEGADA |
Classe processual | REVISTA |
Número Acordão | 1069/14.6TBOER.L1.S1 |
Órgão | Supremo Tribunal de Justiça |
Acordam os Juízes no Supremo Tribunal de Justiça
I. Relatório
1. Da acção
AA intentou em 3/3/2014 acção declarativa de condenação em processo comum, contra Condomínio do prédio urbano situado na Rua Bernardo Santareno, n.º 21,..., Banco Comercial Português, S.A., T..., Lda, BB, CC São DD, EE, FF, GG, HH, II, JJ, KK, LL, MM, NN, OO, PP, QQ, RR, SS, TT, UU, VV, WW, N...., Lda, XX, YY, ZZ, AAA, BBB, CCC e DDD, pedindo a condenação dos RR. no pagamento da quantia de € 59.351,20, acrescida de juros, desde a data da citação, até efectivo e integral pagamento, sendo o R. condomínio no pagamento da totalidade dessa quantia e os restantes RR. na proporção do valor das fracções de que são proprietários no prédio correspondente àquele condomínio, de acordo com a respectiva permilagem.
Em fundamento do seu pedido, alegou em síntese que, perante as infiltrações existentes na sua fracção, provenientes de partes estruturais do prédio, detectadas no ano de 2001, agravadas ao longo do tempo, que sempre comunicou à administração do condomínio, sucessivas vistorias da Câmara dando o local como insalubre, o condomínio não actuou, vindo apenas em 2010 a realizar algumas obras que logo se revelaram inadequadas, mantendo-se a situação na casa da autora.
Face à natureza urgente e necessária da intervenção na zona comum para tornar a sua casa habitável, procedeu a Autora a suas expensas às obras e, também no interior da sua fracção, no valor de € 33.351,20, cujo pagamento reclama dos Réus, acrescendo a quantia de € 26.000,00, a título de compensação pelo sofrimento que enfrentou.
Na contestação os condóminos invocaram a prescrição do direito da Autora.
O Réu Banco Comercial Português, SA contestou, invocando, por um lado, a prescrição do direito da Autora e, por outro, impugnou os factos alegados, bem como que a eventual responsabilidade no pagamento da indemnização não lhe poder ser imputada, uma vez que, sendo locador financeiro da fracção de que é proprietário, apenas a respectiva locatária dela frui.
A Ré N...., Lda, invocou a sua ilegitimidade por ter vendido a fracção e também a ilegitimidade do Réu Condomínio.
Todos os demais Réus, com excepção do Réu Condomínio, contestaram e arguiram a prescrição do direito da autora nos mesmos termos do Réu Banco, alegaram que foram feitas obra no terraço pelo condomínio em 2012, não tendo, porém, a Autora procedido à imediata colocação do soalho no interior da casa, provocando os danos e impugnaram parte da factualidade alegada.
A autora respondeu, separadamente, a cada uma das contestações defendendo a improcedência das excepções de ilegitimidade passiva por a ré N...., Lda e por o réu condomínio ter personalidade judiciária.
No que se refere à excepção de prescrição, sustentou não poder esta operar por ter havido o reconhecimento da existência de responsabilidade pelo condomínio pelas infiltrações e a sua obrigação de reparação, tendo, inclusive, realizado obras, pelo que tal importa a interrupção do prazo de prescrição, nos termos do artigo 325.º do CC.
Sustentou, ainda, que os danos patrimoniais se referem às obras urgentes realizadas em 2013, pelo que os factos não se reportam exclusivamente a 2001, constituindo abuso do direito a invocação de prescrição atentas as inúmeras trocas de correspondência e apresentação de orçamentos, tendo os réus sempre adiado a realização das obras necessárias.
Verificaram-se, posteriormente, as seguintes alterações subjectivas da instância, a saber. Em virtude da procedência de incidente de habilitação de adquirente, que correu termos sob o apenso A, foram, por sentença de 14/3/2016, julgados habilitados EEE e FFF, para ocuparem a posição processual da R. N...., Lda, por terem adquirido, por compra, a fracção P do prédio em causa nos autos.
Ocorrido o óbito da R. JJ, veio a ser proferida nestes autos, em 8/1/2018, sentença de habilitação de herdeiros, que julgou habilitados, para prosseguir a acção, na posição daquela R., II, GGG, HHH e III.
Atenta a declaração de insolvência da R. T..., Lda, foi julgada extinta a instância, em relação àquela R., por inutilidade superveniente da lide, mediante decisão de 25/10/2018.
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Dispensada a realização de audiência prévia e proferido despacho saneador a fixar o valor da causa, julgando improcedentes as excepções de ilegitimidade passiva deduzidas pela ré N...., Lda, e o réu condomínio, relegando-se para final o conhecimento da excepção de prescrição.
Seguidos os demais trâmites da instância, teve lugar a audiência de discussão e julgamento e proferida sentença, a acção foi julgada improcedente, em consequência, absolveram-se os RR dos pedidos.
2. Da apelação
Inconformada, a Autora interpôs recurso de apelação, pugnando pela revogação do julgado, devendo os RR serem condenados conforme peticionou.
O Réu BCP, SA, em contra-alegações, requereu a ampliação do objecto do recurso, para o conhecimento da excepção invocada da prescrição, atenta a improcedência da acção e o não conhecimento da excepção pelo tribunal recorrido, na hipótese de procederem os fundamentos do recurso da Autora, por cautela de patrocínio.
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O tribunal da Relação deu provimento parcial ao recurso da Autora, deliberando conforme o dispositivo final do acórdão - «Pelo exposto, acorda-se em: A) Aditar aos factos provados na sentença o seguinte ponto: “82. Uma das principais causas das infiltrações verificadas na fracção da A. é o facto de a cota do piso interior da fracção ser mais baixa do que a do piso do terraço exterior, quando devia ser o contrário, tendo existido um erro de projecto e de construção do edifício”;B) Eliminar a alínea M) dos factos não provados; C) Eliminar a alínea Q) dos factos não provados;D) Revogar parcialmente a decisão recorrida, na parte em que absolve os RR. de todos os pedidos, a qual se substitui pela seguinte:
“1 – Condena-se o R. Condomínio a entregar à A. a quantia de € 21.909,48, por esta despendida em obras nas partes comuns, descontada da quota que couber à A. nessa quantia, de acordo com a permilagem da sua fracção;2 – Condena-se o R. Condomínio a pagar à A. juros de mora, à taxa legal, sobre a quantia que foi condenado a entregar, referida em 1, desde a data da citação, até efectivo e integral pagamento;3 – Condenam-se os restantes RR., solidariamente com o R. condomínio, a entregarem à A. a quantia referida em 1, na proporção das quotas que lhes couberem nessa quantia, de acordo com a permilagem das suas respectivas fracções;4 –Condenam-se os restantes RR. a pagarem à A. juros de mora, à taxa legal, sobre a quantia que foram condenados a entregar, referida em 3, desde a data da citação, até efectivo e integral pagamento;5 – Condena-se o R. Condomínio a entregar à A. a quantia de € 8.590,58; 6 –Condena-se o R. Condomínio a pagar à A. juros de mora, à taxa legal, sobre a quantia referida em 5, desde a data da citação, até efectivo e integral pagamento;7 – Condenam-se os restantes RR., solidariamente com o R. condomínio, a entregarem à A. a quantia referida em 5, na proporção das quotas que lhes couberem nessa quantia, de acordo com a permilagem das suas respectivas fracções;8 – Condenam-se os restantes RR. a pagarem à A. juros de mora, à taxa legal, sobre a quantia que foram condenados a entregar, referida em 7, desde a data da citação, até efectivo e integral pagamento;9 –Condena-se o R. Condomínio a entregar à A. a quantia de € 5.000,00;10 – Condena-se o R. Condomínio a pagar à A. juros de mora, à taxa legal, sobre a quantia referida em 9, desde a data da presente decisão, até efectivo e integral pagamento;11 – Condenam-se os restantes RR., solidariamente com o R. condomínio, a entregarem à A. a quantia referida em 9, na proporção das quotas que lhes couberem nessa quantia, de acordo com a permilagem das suas respectivas fracções;12 – Condenam-se os restantes RR. a pagarem à A. juros de mora, à taxa legal, sobre a quantia que foram condenados a entregar, referida em 11, desde a data da presente decisão, até efectivo e integral pagamento”. E) Manter a decisão recorrida quanto à absolvição do demais peticionado.»
3. Da Revista
Inconformados, os Réus condóminos interpuseram recurso de revista.
As suas alegações finalizam com as conclusões que se transcrevem:
«I – O termo inicial do prazo de prescrição aplicável é a data a partir da qual lesado tem conhecimento do direito que lhe compete, nos termos do art. 498.º do Cód. Civil, não aquela a partir da qual o lesado tem conhecimento da extensão dos danos.
II – A Autora, aqui recorrida, tinha conhecimento do direito que lhe competia desde 2001, vindo a acção a ser proposta apenas em 2014, mais (muito mais) de 3 anos depois da data em que teve conhecimento do direito que lhe competia.
III - Ao decidir fixar o termo inicial do prazo de prescrição em 2013, quando a Autora pagou as despesas decorrentes das obras que efetuou, o douto Acórdão recorrido violou, por inadequada interpretação e aplicação, o disposto no art. 498.º, nº 1 do Cód. Civil.
IV - O direito da Autora, aqui recorrida, estava e está prescrito, ao abrigo do disposto no art. 498.º do Cód. Civil, e ao julgar improcedente a excepção peremptória de prescrição o douto Acórdão recorrido violou, por inadequada aplicação e interpretação, o disposto nos arts. 309.º, 498.º, 1424.º e 1427.º, todos do Código Civil.
V - Recai sobre os Condóminos a obrigação de indemnizar nos termos gerais do art.º
483.º do Código Civil, o condómino que sofra prejuízos decorrentes dos danos produzidos na sua fração autónoma e provenientes de partes comuns.
VI -Esta obrigação de indemnizar pressupõe a verificação dos pressupostos gerais da responsabilidade civil extracontratual.
VII - No caso de indemnização por danos causados a condómino, na sua fracção (sejam directos, sejam derivados ou sucedâneos), decorrente de infiltrações de águas pluviais de parte comum do prédio, a responsabilidade civil do...
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