Acórdão nº 10394/13 de Tribunal Central Administrativo Sul, 24-10-2013

Data de Julgamento24 Outubro 2013
Número Acordão10394/13
Ano2013
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. RELATÓRIO

... & ... , Lda., devidamente identificada nos autos, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, datada de 09/07/2013 que, no âmbito do processo cautelar, movido contra o Município de Oeiras e a Caixa Económica Montepio Geral, indeferiu as providências cautelares requeridas, de suspensão de eficácia do acto da 1ª Requerida, de execução da garantia bancária nº 168-43.010091-2, emitida pela 2ª Requerida e de aplicação de multa contratual; de intimação da 1ª Requerida a adopção de conduta, a cancelar o pedido de execução de garantia bancária e de intimação da 2ª Requerida a não proceder ao pagamento da garantia bancária.

Formula a aqui recorrente nas respetivas alegações (cfr. fls. 185 e segs. – paginação referente ao processo em suporte físico, tal como as referências posteriores), as seguintes conclusões que se reproduzem:

“a) A sentença de que ora se recorre foi proferida extemporaneamente;

b) Com efeito, a Recorrida Câmara aquando da apresentação em juízo da sua douta oposição ao procedimento cautelar dos autos, de modo a fundamentar o alegado na referida peça processual, protestou juntar processo administrativo referente à obra dos autos;

c) Sucede que a ora Recorrente desconhece se a Recorrida Câmara juntou ou não aos autos o tal processo administrativo que protestou juntar;

d) Pelo simples facto de, deste documento nunca ter sido notificada;

e) Como, desde já se diga, deveria ter sido;

f) Assim, após a oposição apresentada pela Recorrida Câmara, onde apresentou factos novos, que constituíam verdadeiras excepções, assistia o direito de resposta à ora Recorrente. Neste sentido, veja-se os ensinamentos dos doutos Acórdãos do Tribunal da Relação de Guimarães, de 04/12/2008, proc. 2428/08-2 e do Tribunal da Relação de Coimbra, de 05/07 /2005, proc. 2475/05;

g) E a verdade é que, como não poderia deixar de ser, a Recorrente aguardava a notificação dos documentos protestados juntar pela Recorrida Câmara para apresentar resposta à oposição que aquela deduziu;

h) Sendo certo que, no caso dos autos, a notificação à Recorrente dos documentos protestados juntar pela Recorrida Câmara e a correspondente resposta que aquela iria apresentar, se revestia de sobeja importância;

i) Porquanto a Recorrida Câmara na sua douta oposição, alegou factos que são falsos, por ter feito referência a diversos despachos e informações (crê-se por lapso da Recorrida Câmara) por si proferidos que nenhuma correspondência tinham com os factos em apreciação nos autos;

j) Sendo referentes a obra totalmente diversa daquela em apreço nos autos;

k) E referentes a uma outra obra que a Recorrente executou para a Recorrida Câmara;

l) Lapso (crê-se) que iria ser rectificado e esclarecido pela Recorrente aquando da resposta à oposição que iria legitimamente) apresentar após ser notificada dos documentos protestados juntar pela Recorrida Câmara,

m) Assim, ao não ter notificado a Recorrente dos documentos protestados juntar com a sua oposição, o M.mo Juiz a quo não deu cumprimento ao disposto no art.º 526º do Código do Processo Civil (adiante CPC, aplicável aos presentes autos por força do disposto no art.º 1º do CPTA);

n) Ao não ter notificado a Recorrente dos referidos documentos e tendo, sem o ter feito, proferido sentença a julgar do mérito da causa, encontra-se esta enfermada de nulidade;

o) Além do mais, Sucede que, como decorre da douta sentença dos autos, foram os ora Recorrentes, com o devido respeito e salvo melhor opinião, impedidos pelo Tribunal a quo de realizar a prova dos factos por si alegados;

p) Prova que, aliás, expressamente indicaram, em particular, a testemunhal;

q) Porquanto, entendeu o M.mo Juiz a quo estará perante “... todos os elementos para decidir ...”;

r) Mas como se extrai da douta sentença recorrida, o M.mo Juiz a quo, considerou existirem inúmeros factos controvertidos e;

s) Por isso, sobre estes deveria ter sido produzida prova (indicada, nomeadamente, pela Recorrente) que os esclarecesse;

t) Veja-se, a este propósito, fragmento do douto Acórdão do Tribunal Administrativo Central do Norte, Proc. 02459/07.6BEPRT, de 02/03/2012;

u) Também o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, proferido no processo n.º 598/11.STVPRT.Pl, de 23/02/2012, considerou ser admissível o recurso à prova testemunhal no âmbito dos procedimento cautelares destinados a impedir, por falta de fundamento, o pagamento dos valores titulados por garantias bancárias autónomas à primeira solicitação;

v) As garantias bancárias autónomas à primeira solicitação asseguram o cumprimento integral e pontual da obrigação principal a que está vinculado o devedor. Caso este não cumpra o acordado, o beneficiário da garantia pode executá-la e exigir à entidade bancária o seu pagamento, o qual será feito ao primeiro pedido, prontamente e sem qualquer argumentação;

w) No entanto, ao devedor (a aqui Recorrente) é assegurada a possibilidade de recorrer a tribunal para impedir que a garantia seja acionada em casos de fraude manifesta ou de abuso do direito de acionar as garantias bancárias por parte do respetivo beneficiário;

x) Todavia, a necessária providência cautelar só será decretada perante prova líquida, pronta e inequívoca da existência dessa fraude ou abuso;

y) A Relação do Porto considerou que essa prova líquida, pronta e inequívoca não se reduz à prova documental, podendo antes resultar de qualquer outro meio de prova permitido. Nesse sentido, concluiu ser de admitir também o recurso à prova testemunhal no âmbito do procedimento cautelar;

z) Segundo a Relação, apenas no momento da apreciação da prova se poderá aferir se a mesma é pronta e líquida, e nunca em momento anterior, pelo que não deverá o tribunal prescindir da produção da mesma, nomeadamente da audição das testemunhas indicadas, com base nesse argumento;

aa) O mesmo deveria, salvo melhor entendimento e com o devido respeito, ter feito o M.mo Juiz a quo, já que, como se viu e se conclui da sua douta sentença, considerou este existirem situações controvertidas;

bb) Se assim não entender, o que se admite por mera cautela de patrocínio, ainda assim os factos carreados para os autos impunham decisão diversa daquela a que chegou o M.mo Juiz a quo;

cc) Desde logo, porque, como alegou a Recorrente, e a Recorrida Câmara não contestou tendo aceite este facto, as multas aplicadas por esta aquela, foram-no após a recepção provisória da obra em causa nos autos;

dd) Só este facto (para além dos demais invocados pela Recorrente), deveria determinar a procedência do procedimento cautelar dos autos uma vez que, como bem refere a sentença recorrida, em análise ao art.º 120º do CPTA, sendo evidente a procedência da pretensão principal deverá aquela ser decretada;

ee) Pelo facto do CCP já não conter no1ma igual à do n.º 4 do art.º 233º, do D.L. 55/99, tal não significa que passou a ser legalmente admissível aplicar multas contratuais após a recepção provisória de uma obra, por factos anteriores a esta;

ff) Porque não se passa assim, mantendo-se a impossibilidade legal de aplicar tais multas, por incumprimentos ocorridos até à recepção provisória;

gg) O que se extrai quer análise do n.º 3 do art.º 395º do CPP, quer dos n.º 6 e 7 do art.º 394º do mesmo diploma legal;

hh) Dispõe o n.º 3 do art.º 395º do CPP, que versa sobre a recepção provisória de obras, que “Sem prejuízo de estipulação contratual que exclua a recepção provisória parcial, se a obra estiver, no todo ou em parte, em condições de ser recebida, a assinatura do auto de recepção nos termos do disposto nos números anteriores autoriza, no todo ou em parte, a abertura da obra ao uso público ou a sua entrada em funcionamento e implica, sendo caso disso, a sua transferência para o domínio público, sem prejuízo das obrigações de garantia que impendem sobre o empreiteiro.”;

ii) Deste normativo legal é possível concluir que após a recepção provisória da obra, não é possível aplicar multas contratuais, por factos anteriores aquela;

jj) Apenas se mantendo sobre o empreiteiro as obrigações que decorrem da garantia prestada;

kk) Sendo este entendimento pacífico da nossa doutrina;

ll) Citando-se, a título de exemplo, a obra de Jorge Andrade da Silva, “Código dos Contratos Públicos, Comentado e Anotado”, pag. 809, onde se lê no seu comentário ao referido art.º 395º do CCP que “O disposto no n.º 3 tem a ver com os efeitos da recepção provisória da obra, que são, designadamente, os seguintes:

“… Determina a impossibilidade de aplicação de sanções contratuais por incumprimento até ai decorridos”;

mm) Do mesmo modo, os n.º 6 e 7 do art.º 394º do CCP, permitem chegar à mesma conclusão, ali estando estipulado que, apenas no caso especifico do n.º 6, isto é, se por facto imputável ao dono de obra não for agendada ou realizada atempadamente a vistoria para recepção provisória da obra;

nn) A obra se considera tacitamente recebida, e nestes casos (e apenas nestes casos) a recepção tácita não prejudica a responsabilidade por actuação ilícita do empreiteiro na execução da obra (n.º 7 do art.º 394º do CCP);

oo) Entendimento que também é partilhado por Jorge Andrade da Silva na pág. 806 da sua citada obra;

pp) Ao ser criada uma regra específica, para uma situação específica, é evidente que o legislador pretendeu deixar as demais de fora, confirmando esta sua opção através do disposto no n.º 3 do art.º 395º do CCP;

qq) Tendo a Recorrida Câmara ao accionar a garantia bancária dos autos, quando bem sabia (ou não podia ignorar) que já não o podia fazer, actuado em claro abuso de direito e com má-fé (ao contrário do que entendeu o M.mo Juiz a quo);

rr) Pelo que a sua imposição se tem de considerar ineficaz;

ss) E o acto que a determinou tem de ser considerado nulo ou anulado;

tt) A ser assim,...

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