Acórdão nº 1029/19.0T8AVR.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 15-11-2021

Data de Julgamento15 Novembro 2021
Número Acordão1029/19.0T8AVR.P1
Ano2021
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Proc. n.º 1029/2019.0T8AVR.P1
Origem: Comarca Aveiro-Aveiro-Juízo Trabalho-J2
Relator - Domingos Morais - Registo 929
Adjuntos - Paula Leal Carvalho
Rui Penha


Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:

IRelatório
1. – B… intentou acção comum emergente de contrato individual de trabalho, na Comarca Aveiro-Aveiro-Juízo Trabalho-J2, contra
Cento Hospitalar …, EPE – Hospital C…, nos autos identificados, alegando, em resumo, que:
Em 09.07.2018, o Cento Hospitalar …, EPE – Hospital C..., deu início a procedimento concursal para preenchimento de vagas na categoria de assistente operacional.
A Autora concorreu, foi admitida e ficou graduada na terceira posição, tendo na entrevista realizada no âmbito desse procedimento referido às enfermeiras que a entrevistaram que se encontrava a amamentar o seu filho de dezassete meses, nada lhe tendo sido dito a esse respeito pelas mesmas.
Foi contactada para se apresentar no dia 19.9.2018, no Hospital C..., a fim de celebrar um contrato individual de trabalho, o que fez, tendo-se pelas 9 horas dirigido ao Departamento de Recursos Humanos onde conjuntamente com mais quatro candidatas preencheu a documentação necessária e, tendo referido a circunstância de se encontrar a amamentar o seu filho foi-lhe entregue também o formulário do pedido de dispensa para esse efeito, com a indicação de o apresentar na reunião que se seguiria com a Enfermeira Directora.
Quando na reunião apresentou tal formulário à Enfermeira Directora, esta sem qualquer justificação disse-lhe que não lhe concederia qualquer horário para amamentação, que tinha que cumprir os turnos existentes, que a amamentação era um problema que tinha que resolver.
Tentou explicar que não se recusava a fazer turnos, podendo fazer os turnos da manhã e os intermédios e que a dispensa para amamentação embora fosse um direito que lhe assistia era uma situação transitória.
A enfermeira directora ignorou os seus argumentos e disse-lhe que não tinha lugar naquele hospital, que tal circunstância era motivo impeditivo para que fosse admitida ao concurso, bem como, para ser desclassificada, que deveria resolver primeiro o problema da amamentação e depois talvez ainda tivesse alguma hipótese de vir a trabalhar naquele hospital.
Terminou, pedindo:
“(D)eve a presente acção ser julgada procedente e provada e consequentemente, ser o Réu condenado:
a) No pagamento da quantia de €4.500,00 (quatro mil e quinhentos euros), a título de danos patrimoniais correspondentes à soma das quantias peticionadas em 47º e 48º, supra;
b) No pagamento de €20.000,00 (vinte mil euros) por danos não patrimoniais
c) E ainda no pagamento de juros à taxa legal desde a data da citação até integral pagamento, com as legais consequências quanto a custas, Procuradoria e demais encargos.”.
2. - Frustrada a conciliação na audiência de partes, o réu contestou, impugnando os factos essenciais da causa de pedir.
Terminou, concluindo:
“(D)eve
a) a presente acção ser julgada totalmente improcedente por não provada e, em consequência, o Réu, CH... EPE, absolvido do pedido.
Caso assim não se entenda e se apure qualquer responsabilidade do Réu no alegado pela Autora,
b) deve a ação ser julgada e decidida de acordo com a prova a produzir e, sendo o caso, segundo as regras de arbitramento da indemnização legalmente estabelecidas tendo, nomeadamente em consideração o grau de culpabilidade do agente, ou seja: o quanto o comportamento culposo do lesado contribuiu para a produção ou agravamento dos danos causados.”.
3. – A autora respondeu, concluindo como na petição inicial.
4. - No despacho saneador, a Mma Juiz fixou o valor da acção em €24.500,00 e admitiu os meios de prova.
5. - Realizada a audiência de julgamento, a Mma Juiz proferiu decisão:
Pelo exposto e, sem necessidade de mais considerações, julgando-se a presente acção parcialmente procedente decide-se:
1º- Condenar o R. a pagar à A. a quantia de €15.000,00 (quinze mil euros) a título de indemnização pelos danos de natureza não patrimonial por esta sofridos, com juros de mora, à taxa legal de 4%, contados a partir da presente decisão até integral pagamento.
2º- Absolver o R. do demais pedido.”.
6. – O réu apresentou recurso de apelação, concluindo:
1. Conforme o que consta dos autos e o alegado supra neste recurso a resposta aos factos identificados na douta sentença como 1, 2, 3, 4, 10, 14, 16, 18, 19, 29, 32, 36, 37, 38 e 39 dever ser precisamente a contrária.
Ou seja, devem considerar-se:
a) provados os factos identificados em 1, 2, 3 e 4 da douta sentença, e
b) não provados os factos ali identificados sob os números 10, 14, 16, 18, 19, 29, 32, 36, 37, 38 e 39.
E em consequência deve revogar-se a sentença e substituir-se a mesma por outra que julgue a ação improcedente por não provada e absolva o Réu, CH… EPE, do pedido.
Quando assim não se entenda, o que, sem consentir, por mera cautela e dever de patrocínio se admite, cumpre então ao Réu recorrente apresentar o seguinte
2. A MMª Juiz “a quo” ao fundamentar a, aliás, douta decisão, no incumprimento pelo A. do disposto nos artigos 23.º a 32.º, 47.º e 48.º e 60.º do Código do Trabalho e nas Directivas 2000/43/CE, a Directiva 2002/73/CE, a Directiva 2000/78/CE, a Directiva 92/85/CEE violou estes normativos, assim como na prolação dessa decisão violados foram
a. os artigos 23.º a 32.º, 47.º e 48.º, 60.º do Código do Trabalho;
b. o artigo 68.º da Constituição da República Portuguesa;
c. o art. 25.º da Portaria n.º 83-A/2009, de 22 de Janeiro, entretanto revogada, dando lugar ao artigo 17.º da Portaria n.º 125-A/2019, de 30 de Abril e
d. os artigos 342.º/1, 496º e 570.º e ss. do Código Civil;
Nestes termos e em conformidade com tudo quanto foi exposto nas presentes alegações, as quais deverão ser julgadas procedentes, e por tudo o mais que V. Exas. Doutamente suprirão, devem V. Exas. julgar totalmente procedente o presente recurso, e assim a douta decisão recorrida por outra que declare improcedentes os pedidos da Autora, com todas as legais consequências.
Se assim não se entender, deve a indemnização fixada pela primeira instância ser reduzida para um valor razoável a arbitrar por V. Exas entendendo-se que excessiva qualquer uma que ultrapasse os 1.000,00€ (mil euros).
Assim se fazendo a devida e esperada Justiça!
7. - A autora contra-alegou, concluindo:
A) Pretende o Réu/Recorrente que seja reapreciada a matéria de facto, sendo que no seu entendimento a resposta dada na douta sentença, aos factos 1, 2, 3, 4, 10, 14, 16, 18, 19, 29, 32, 36, 37, 38 e 39, dever ter sido precisamente ao contrário, pois segundo o mesmo, “a decisão sobre a matéria de facto assentou numa apreciação infundada e incorrecta da prova produzida no processo (…)”
B) À luz do princípio da livre apreciação da prova, não existe qualquer motivo para se considerar como incorrecta e infundada a apreciação da prova, nomeadamente a testemunhal, produzida de forma directa e presencial na audiência de julgamento, tendo ademais, a Mma. Juiz a quo elencado as razões pelas quais deu os factos como provados e, em consequência, decidindo pela clareza e veracidade da mesma.
C) Analisada a douta sentença proferida nos autos, e salvo melhor entendimento, verifica-se que a convicção da Mma juiz a quo assentou nas várias provas testemunhais e documentais, apresentadas em julgamento, tendo convictamente entendido que as provas carreadas e examinadas eram fundamento suficiente para a matéria de facto dada como provada.
D) Ao contrário do que pugna o Recorrente, e salvo melhor entendimento, não existe qualquer motivo para se considerar como incorrecta e infundada, face às regras da experiência, a apreciação e valoração da prova realizada, concretamente a testemunhal, a qual foi produzida de forma directa e presencial na audiência de discussão e julgamento, tendo a Mma. Juiz a quo claramente elencado as razões pelas quais deu os factos como provados.
E) Quanto às normas que o recorrente entende terem sido violadas na prolação da sentença agora em causa, claramente a Mma. Juiz a quo, demonstrou que foi o Réu que violou as mesmas, pois, conforme consta da mesma e que se reproduz “o grau de ilicitude do actuação do R. foi elevado, a A. pelo facto de pretender exercer os seus direitos de lactante, não só se viu preterida e afastada do posto de trabalho a que legitimamente aspirava e de que necessitava, como foi tratada deforma rude e com desconsideração, o que a fez sentir vexada e humilhada. E a actuação do R. é ainda mais grave e censurável porquanto para tentar encobrir o real motivo da não contratação da A. que foi a reivindicação por estada redução de horário e a dispensa de trabalho nocturno para amamentação do filho, lhe imputou declarações inverídicas para arranjar um falso motivo que servisse para justificar a recusa da sua contratação, o que é completamente inadmissível numa entidade pública que tem responsabilidades éticas e sociais e a obrigação de pautar a sua actuação pelos princípios fundamentais do nosso ordenamento jurídico, como são os princípios da igualdade e não discriminação no trabalho e acesso ao emprego, nomeadamente, em função do exercício dos direitos inerentes à parentalidade (…)” – sublinhado nosso.
F) Analisada a douta sentença proferida, bem como as alegações de recurso é, salvo melhor opinião, entendimento da Autora/Recorrida que a douta sentença ora recorrida não merece censura quanto às questões levantadas pelo ora recorrente, e que deve a mesma ser integralmente mantida.
Assim, não padecendo a sentença ora recorrida de nenhum dos erros apontados pelo Recorrente, nem tendo violado qualquer norma legal, deverá concluir-se pela bondade do decidido, pelo que negando provimento ao recurso apresentado, e mantendo a sentença recorrida nos precisos termos em que foi proferida, farão V. Exas. a costumada
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