Acórdão nº 102/17.4JACBR.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça, 21-09-2022

Data de Julgamento21 Setembro 2022
Case OutcomeNEGADO PROVIMENTO
Classe processualRECURSO PENAL
Número Acordão102/17.4JACBR.C1.S1
ÓrgãoSupremo Tribunal de Justiça

Acordam na 3.ª Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça:



I. Relatório

1. O arguido, AA, identificado nos autos, não se conformando com o Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Coimbra, ... Secção, em 2 de março de 2022, veio interpor recurso, ao abrigo do disposto nos artigos 410º, n.º 2, al. b e c) e nº3, 411.º, n.º 1, 412.º e 432º todos do C.P.P., em matéria de direito, para este tribunal.

O arguido foi condenado, em decisão confirmada pela Relação, em pena de 17 dezassete anos de prisão, pela prática como autor material de um crime de homicídio qualificado, previsto e punido pelos artigos 131.º, 132.º, n.ºs 1 e 2, alíneas i) e j), pena de 1 (ano) ano pela prática como autor material de um crime de um crime de profanação de cadáver, previsto e punido pelo artigo 254º, n.º 1, alínea a) e pena de 3 (três) anos e 6 (seis meses) de prisão como autor material de um crime de incêndio, previsto e punido pelo artigo 272º n.º 1, alínea a; todos do Código Penal, em cúmulo jurídico, em pena única de 18 (dezoito) anos de prisão.


2. Formulou as seguintes conclusões (transcrição):

(…)2ª - Foi o arguido condenado no pedido de indemnização civil deduzido por BB que, sendo parcialmente procedente, condenou o demandado AA ao pagamento da quantia de 55.000,00 euros (cinquenta e cinco mil euros), sendo 40.000,00 euros (quarenta mil euros) a título de indemnização pelo dano morte de seu pai CC e 15.000,00 euros (quinze mil euros) a título de danos não patrimoniais sofridos pela demandante, acrescida de juros à taxa legal até efectivo e integral pagamento, do mais peticionado o absolvendo; e, também, condenado no pedido de indemnização civil deduzido por DD que, sendo parcialmente procedente, condenou o demandado AA ao pagamento da quantia de 55.000,00 euros (cinquenta e cinco mil euros), sendo 40.000,00 euros (quarenta mil euros) a título de indemnização pelo dano morte de seu pai CC e 15.000,00 euros (quinze mil euros) a título de danos não patrimoniais sofridos pelo demandante, acrescida de juros à taxa legal até efectivo e integral pagamento, do mais peticionado o absolvendo.

3ª -Inconformado com tal decisão, o arguido recorreu, para o Tribunal da Relação de Coimbra, que por acórdão de 2 de Março de 2022, negou provimento ao recurso e confirmou a decisão recorrida.

4ª- De novo irresignado, o arguido vem interpor recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, apresentando a sua motivação. Vem o presente recurso interposto do acórdão proferido pela ... Secção do Tribunal da Relação de Coimbra que, erroneamente, porque se limitou a confirmar o acórdão proferido pelo Juiz ... do Juízo Central Criminal de Coimbra, decidiu negar provimento ao recurso.

Nulidade a que se reportam os art.ºs 379.º, n.º 1, al. c) e 425.º, n.º 4, do CPP, por omissão pronúncia sobre questão de que deveria conhecer

5ª- O recorrente, no seu recurso para a Relação impugnou a matéria de facto, sindicou o principio in dúbio pro reo e dosimetria da pena.

6ª- Porém entendemos que aquele tribunal não reexaminou a matéria de facto - nos termos das alíneas a) a c) do n.° 3 do art. 412.° do CPP, a que estava obrigado.

7ª- O ora recorrente observou todos dos requisitos formais da motivação de recurso face à imposta delimitação precisa e concretizada dos pontos da matéria de facto controvertidos, que o recorrente considera incorrectamente julgados, com especificação dos concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, das concretas provas e referência ao conteúdo concreto dos depoimentos que o levam a concluir que o tribunal julgou incorrectamente e que impõem decisão diversa da recorrida, tudo com referência ao consignado na acta, com o que se opera a delimitação do âmbito do recurso:

IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO

ERRO DE JULGAMENTO

A) Concretos pontos de facto incorrectamente julgados (Tendo em consideração a numeração usada no douto Acórdão recorrido para discriminar os factos provados)

8ª - O recorrente considera como incorrectamente julgados os factos constantes dos pontos 7 a 9, 12- 26, 30, 33-40 da matéria dada como provada na audiência de discussão e julgamento, remetendo-se a sua leitura para o corpo da motivação supra, a qual se reproduz aqui para todos os efeitos legais tidos por convenientes.

B) Concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida

9ª- Depoimento em audiência de julgamento da testemunha EE, única interveniente no citado negócio dos pinheiros, cfr. Auto de Ocorrência de fls. 316 e 317, mencionado a fls. 30 do Douto Acórdão, que relatou que o arguido, ora recorrente teve um comportamento correctíssimo, chegando a implorar que não fizessem queixa na GNR, pois não queria problemas com a polícia. Não referindo a testemunha que o arguido tenha demonstrado qualquer aborrecimento/exaltação.

Esta testemunha não consegue avaliar o valor da lenha já carregada no tractor do arguido referindo, que o arguido levou duas carradas de lenha que já se encontravam carregadas. No entanto a testemunha FF, Audiência de 28-09-2021 – 16.45h-16.47h, Ficheiro 20210928164459_2955676_2870708 (por referência à acta de audiência), refere que só por 2 metros de lenha, (quantidade muito inferior à carga de apenas um tractor) pagava ao arguido AA 80,00€.

10ª -Consideramos assim que não resultou provado qualquer motivação do arguido para a prática do crime, bem como se encontra provado, ao contrário do que consta do Douto Acórdão que o arguido não ficou prejudicado no negócio da venda dos eucaliptos.

11ª - O Douto Acórdão considera que os depoimentos das testemunhas GG, HH, II, JJ e KK mostraram-se serenos, coerentes e isentos, salientando a situação de medo e pressão do arguido sobre CC devido ao “negócio dos eucaliptos”, o que não corresponde à verdade pois as testemunhas apenas relatam o que a vítima lhes referia.

12ª - Sendo certo em relação à testemunha HH, Audiência de 10-09-2021 – 15.40h-16.03h, (por referência à acta de audiência) Ficheiro 20210910154237_2955676_2870708, irmã mais chegada da vítima, dando-se aqui por reproduzido o depoimento da testemunha, o Douto acórdão “seleciona” algumas partes desse testemunho omitindo outras de suma relevância e imprescindíveis para a descoberta da verdade, nomeadamente situações de conflito com a vítima, relativamente a negócios de droga e de furtos, que surpreendentemente não foram sequer investigadas.

Mais esclarece que, apesar de o irmão ter tido dinheiro para liquidar a pretensa dívida ao arguido, ora recorrente, não o fez, não tendo sequer aceite a ajuda para pagar a pretensa dívida, situação idêntica à ocorrida com a testemunha JJ, (“…e a testemunha até se dispôs a adiantar o dinheiro, mas ele não aceitou”, Audiência de 10-09-2021, com início pelas 16.25h a 16.31h. (por referência à acta de audiência), Ficheiro 20210910162134_2955676_2870708.

13ª- O que, no nosso entender, é bem demonstrativo que não estava preocupado/receoso com a situação. Sendo que a testemunha HH, que de uma forma simples e sincera acaba por explicar que as pessoas que adictam à coca, à heroína (caso da vítima) …são mentirosas compulsivas, permitindo desde logo ter dúvidas sobre todos os contornos do alegado pela vítima.

14ª - Ao contrário do alegado no Douto Acórdão, o Douto Tribunal funda a sua convicção apenas na testemunha LL.

15ª - Antes de nos debruçarmos sobre o seu testemunho, entende o arguido, ora recorrente, tecer algumas considerações, no nosso entender, pertinentes sobre a “investigação”.

16ª- Após os factos em causa nos presentes autos que ocorreram no dia 10-03-2017 pelas 4.30h ou 4.54h, segundo o Douto Acórdão, foram realizados inúmeros exames, inspecções, peritagens, relatórios, que constam da douta fundamentação: relatório de inspecção judiciária, de fls 26 a 36; relatório de exame ao telemóvel da vítima, no qual não foram encontrados vestígios lofoscópicos, de fls 64 e 65; perícia ao hábito externo, com fotos do estado de queimada em que ficou a vítima e as pancadas que sofreu, de fls 66 a 78; relatórios do Núcleo de Perícia Criminalística, de fls. 241 a 262 e até do caixote do lixo da cozinha, bem como recolha de vestígios lofoscópicos de um copo de água que estava em cima da mesa da sala) e 276 a 279, relatórios de Criminalística Biológica de fls 390 -391e 446-447,relatório de autópsia médico-legal, de fls. 441/5; relatório de patologia forense -relatório histopatológico, de amostras do fígado, estômago, dura-mater, pele (braço e região dorsal), de fls 448; aditamento de fls 38/9, auto de verificação de óbito, de fls 41; registo de entrada de cadáver no INMLCF, às 11.11 horas de 10.03.2017, de fls ,relatório de ocorrência do Corpo de Bombeiros de ..., de fls 43; informação prestada pelas operadoras de comunicações de fls 164 , 263 a 275, 284 a 287, 473 (CD com informações prestadas pela NOS), 597-598, extracto de leitura do telemóvel da vítima onde constam SMS enviadas e recebidas, de fls 163 a 170, autos de apreensão de fls 289) e 647 , sem que nenhum indício tivesse sido recolhido contra o arguido/ora recorrente, nomeadamente os vestígios lofoscópicos e as escutas devidamente autorizadas, nada.

17ª - Eis que a 25-05-2020, mais de três anos depois surge nos autos o Relatório de Análise, de fls 500, que após toda uma exaustiva discussão em Audiência de Discussão e Julgamento, o Douto Acórdão veio a considerar que assenta em dados que não se podem considerar fiáveis sendo que também quanto às antenas não foi ponderada a existência de diferentes células de cada uma delas9;

18ª - Três anos depois à que terminar o processo partindo do relatório de fls. 520, conclundo a autoridade policial “Face ao exposto, tudo indica, com elevado grau de certeza, que os dois suspeitos, contrariamente ao que referiram nos autos, sempre estiveram na área da residência da vítima, numa altura temporalmente compatível com o momento do homicídio, devendo tal...

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