Acórdão nº 10157/16.3T8LRS.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça, 13-05-2021
Data de Julgamento | 13 Maio 2021 |
Case Outcome | NEGADA |
Classe processual | REVISTA |
Número Acordão | 10157/16.3T8LRS.L1.S1 |
Órgão | Supremo Tribunal de Justiça |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, Segunda Secção Cível.
O Autor AA demandou os Réus:
o ASF- Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundo de Pensões — Fundo de Garantia Automóvel e
o BB.
Pede a condenação solidária de ambos no pagamento de € 148.930,00, acrescido dos juros vencidos, desde a citação, até integral pagamento e no ressarcimento.
Alega, em síntese, que seu pai foi vítima mortal num acidente de viação, quando seguia no veículo automóvel, propriedade do 2° réu, BB, sendo que acidente ocorreu por culpa exclusiva do 2º Réu.
Os valores peticionados (que decorrem do aludido acidente) correspondem a: €80.000, 00 pela perda do direito à vida de seu pai (dano morte); €25.000,00 pelo sofrimento de seu pai antes de falecer; € 40.000,00 por danos não patrimoniais sofridos pelo Autor e; €3.930,00 de despesas que suportou com o vestuário, flores e deslocações ao tribunal.
A Segurança Social, I.P., interveniente no processo, deduziu pedido de reembolso das despesas por si suportadas relativas ao funeral (€ 1.257,66) e às pensões de sobrevivência pagas ao autor, durante o período de Setembro de 2015 a Agosto de 2018, no valor de € 14.996,19, num total de € 16.253,85.
Os Réus apresentaram contestação.
- O Fundo de Garantia Automóvel, impugnou, in totum, o alegado pelo autor concluindo pela absolvição do pedido. E no que concerne ao pedido de reembolso efectuado pela Segurança Social, excepcionou a sua ilegitimidade quanto ao pedido de reembolso do valor das retribuições pagas ao autor, a título de prestações por morte, ex vi art. 51 DL 291/2007, de 21/8, defendendo que o direito de regresso (pagamentos efectuados/lesado) é exercido tão só contra o responsável civil do acidente, no mais impugnou o alegado, concluindo pela absolvição do pedido.
A Segurança Social, pugnou pela improcedência da excepção arguida.
- O 2° réu BB, impugnando parcialmente o alegado pelo autor quanto à dinâmica do acidente, concluiu pela absolvição do pedido.
Foi dispensada a audiência prévia, tendo sido proferido despacho saneador que julgou improcedente a excepção dilatória de ilegitimidade arguida pelo Fundo de Garantia Automóvel.
Após julgamento foi sentenciada a causa nos seguintes termos:
“Pelo exposto, julgo a presente acção parcialmente procedente e, em consequência,
1. Condeno o réu BB a pagar ao autor, a título de danos não patrimoniais, a quantia de € 80.000,00 — dano de morte € 55.000,00 e danos morais (sofridos pelo Autor) € 25.000,00 — acrescida dos juros de mora, à taxa legal (civil), desde a citação até efectivo e integral pagamento.
2. Condeno o réu BB a pagar ao Instituto de Segurança Social a quantia de € 1.257,66, a título de despesas de funeral e € 14.996,19, a título de pensões de sobrevivência, ambas acrescidas de juros de mora à taxa legal (civil), desde a citação até integral pagamento.
3. Condeno o réu “ASF – Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundo de Pensões - Fundo de Garantia Automóvel” a satisfazer as indemnizações, despesas, pensões e juros discriminados em 1 e 2.
4. Absolvo os réus do demais peticionado pelo Autor.”
Inconformados, interpuseram recurso de apelação o Autor e réu FGA, em cujas conclusões rematam:
§ O Autor, para além de sustentar a alteração da decisão da matéria de facto nos termos que ali verte, pede se mantenham os valores indemnizatorios que havia peticionado na petição inicial, e bem assim sejam também condenados solidariamente os recorridos no pagamento dos danos futuros/lucros cessantes peticionados pelo recorrente a calcular em execução de sentença.
§ O Réu Fundo de Garantia Automóvel sustenta que a condenação dos Réus deve ser solidária, mas entende que lhe não assiste a obrigação de pagar as quantias peticionadas pelo ISS.
Contra-alegou o Réu BB.
O Tribunal da Relação de Lisboa, em acórdão, decidiu:
o Rejeitar o recurso da impugnação da matéria de facto, por incmprimento pelo recorrente dos ónus ínsitos noartº 640º do CPC;
o Sentenciar a causa nos seguintes termos:
“… acorda-se em julgar a apelação parcialmente procedente e, consequentemente, revogando-se os segmentos da decisão no que concerne ao valor de indemnização respeitante ao dano de morte, que se fixa em € 80.000,00, e ao que condenou de per si cada um dos réus, determina-se a condenação solidária dos réus (BB e Fundo de Garantia Automóvel) no pagamento ao autor, a título de danos não patrimoniais a quantia de € 105.000,00, confirmando-se, no mais, a sentença”.
De novo inconformado, vem o réu Fundo de Garantia Automóvel apresentar recurso de revista, concluindo as suas alegações nos seguintes termos:
A) O douto Acórdão recorrido, veio aumentar o dano morte fixado pela 1ª instância em € 55.000,00 para € 80.000,00.
B) Embora se aceite que o entendimento, de não aplicação dos valores fixados pela Portaria 377/2008 de 26 de maio, por estabelecerem valores mínimos de proposta razoável, o que é certo é que cada vez mais se verifica uma grande aproximação de valores face à jurisprudência superior mais recente.
C) Estamos em crer que a situação mais harmoniosa e justa à situação em preço deverá passar por valor não superior a € 55.000,00 ao invés dos € 80.000,00 fixados pelo Douto Tribunal “a quo”.
D) Salientando-se, ainda, que tal valor ainda deveria ter sido sancionado por se entender que a vítima terá contribuído para os seus danos, a aceitar transportar-se num veículo, bem sabendo que o Réu BB não possuía habilitação legal para conduzir.
E) Conforme dispõe o artigo 570º do C.C., o pedido indemnizatório pode ser reduzido ou até mesmo excluído, na medida em que este possa ter contribuído para o resultado ou agravamento dos seus próprios danos.
F) A douta sentença recorrida ao fixar o montante indemnizatório em termos de dano morte violou, assim, o disposto nos art.ºs 494º, 496º, 562º e 570º todos do Código Civil.
G) Por outro lado, o douto Acórdão recorrido também condena o FGA a satisfazer a indemnização devida ao Instituto de Segurança Social, I.P.;
H) Quando, na verdade, por forma do disposto nos números 3 e 4 do art.º 51º do DL 291/2207 de 21.08, deveria ter condenado apenas o Réu BB.
I) A douta Sentença violou, assim o disposto nos art.ºs 51º n.ºs 3 e 4 e 62º n.º 1, ambos do DL 291/2007 de 21 de Agosto.
Termos em que,
Revogando-se o Douto Acórdão recorrido, se fará, como sempre,
JUSTIÇA
Colhidos os vistos cumpre apreciar e decidir.
*
É a seguinte a matéria de facto assente nas instâncias:
1 - No dia 1 de Agosto de 2015, por volta das 7 horas e 11 minuta, ocorreu um acidente de viação na Estrada Nacional n° ..., ao Km junto à localidade de ....
2 - O referido acidente foi causado pelo despiste, e consequente capotamento, por cerca de 100 metros, do veículo da marca ..., Modelo …, com a matrícula …-…-CP, propriedade do réu BB e por este conduzido.
3 - A Estrada Nacional n° ..., ao Km …, é plana e tem uma recta com mais de 300 metros de extensão, depois de descrever uma curva à esquerda, face ao sentido de marcha em que seguia o veículo automóvel com a matrícula ...-...-CP (... - ...), com duas hemi-faixas de rodagem, uma para cada lado do trânsito.
4 - Encontrava-se, à data do acidente, bem asfaltada, com o piso limpo, seco e em bom estado de conservação.
5 - À data do sinistro o mencionado veículo automóvel não tinha seguro válido.
6 - À data do acidente o réu BB não possuía habilitação legal para conduzir.
7 - Em resultado deste acidente resultaram dois feridos com gravidade: um passageiro, CC, que seguia ao lado do condutor do veículo, e o condutor do veículo, ora réu BB.
8 - Em resultado deste acidente resultou ainda um morto, DD, que seguia no banco traseiro do veículo com a matrícula ...-...-CP e que, por força do despiste e consequente capotamento, foi "cuspido" do interior do referido veículo pelo para-brisa dianteiro, tendo falecido de imediato, na berma da estrada onde o seu corpo embateu.
9 - O falecido DD tinha uma taxa de álcool no sangue de 2,10 g/l.
10 - Após o acidente descrito supra, o réu BB abandonou o local através dos campos de milho.
11 - Tendo comparecido mais tarde no posto da GNR, acompanhado pelo tio, de onde depois seguiu de ambulância para o Hospital de ....
12 - Em consequência do acidente supra descrito, o veículo automóvel com a matrícula ...-...-CP ficou totalmente danificado.
13 - À data da morte, o falecido DD tinha 45 anos.
14 - O falecido DD era pai do ora autor.
15 - O autor tinha com o falecido DD um bom relacionamento familiar.
16 - O autor sofreu e sofre de muita tristeza, angústia e amargura, com a morte do pai, e com as circunstâncias da mesma.
17 - Em consequência do falecimento de DD, o ISS/CNP pagou as despesas de funeral do falecido DD a EE, no montante de € 1.257,66 e...
18 - Pagou ao autor pensões de sobrevivência, no período de tempo de Setembro de 2015 a Agosto de 2018, no montante global de € 14.996,19.
*
Todos os restantes factos descritos nos articulados, bem como os aventados na instrução da causa, distintos dos considerados provados – discriminados entre os “factos provados” ou considerados na “motivação” (aqui quanto aos instrumentais) –, resultaram não provados.
Resultaram, assim, não provados os factos que seguem:
a) O falecido DD seguia no lugar do pendura (art. 13)
b) O réu BB, à data dos factos, efectuava uma condução perigosa, desatenta, com falta de perícia e em excesso de velocidade (art. 17 p. i.);
c) O autor recebia, à data do acidente, pensão de alimentos do falecido DD, bem como tudo o que se tornava necessário à frequência da escola, convívio com os amigos despesas escolares e extra-curriculares, deslocações e actividades lúdicas, médicas e medicamentosas, e que vivia exclusivamente da pensão de alimentos e das dádivas do pai (art. 19 p. i.);
d) O autor, em consequência do acidente dos autos, tenha tido gastos com roupa para o funeral, que não tinha, com compra de flores, e tenha tido de efectuar...
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