Acórdão nº 1001/21.0PHAMD-A.L1-5 de Tribunal da Relação de Lisboa, 21-05-2024

Data de Julgamento21 Maio 2024
Número Acordão1001/21.0PHAMD-A.L1-5
Ano2024
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam, em conferência, na 5ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:


I–RELATÓRIO:


Pelo Juízo de Instrução Criminal da Amadora foi proferido, em 17.01.2024, despacho indeferindo a constituição da requerente AA como assistente relativamente ao(s) crime(s) de natureza particular que se investigava nos presentes autos por factos denunciados com referência a Fevereiro de 2022 e admitindo-a a intervir nos presentes autos na qualidade de assistente quanto aos crimes de natureza não particular denunciados.
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-» Inconformado, o M.º P.º interpôs recurso desta decisão, que motivou e formulando as seguintes conclusões (transcrição):
1.–Nos presentes autos, na sequência da notificação que o Ministério Público fez à denunciante, ao abrigo do disposto nos art.s 68.2/2, 246.2/4 e 2852, n.2 1, do Código de Processo Penal foi AA admitida a intervir nos autos na qualidade de assistente no que concerne aos crimes de natureza não particular, mas não no que concerne ao crime de natureza particular.
2.–Ainda que AA estivesse representada por Ilustre Mandatário desde que apresentou queixa tempestiva nos autos, e ainda que naquela logo tenha manifestado o desejo de se constituir como assistente, a denunciante só foi notificada nos termos e para os efeitos do disposto naqueles preceitos legais no dia 27-11-2023, pelo que, quando no dia 4-12-2023, a denunciante AA veio requerer a sua constituição como assistente e deduzir acusação particular estava em tempo.
3.–Onde o legislador não distingue não cabe ao intérprete distinguir.
4.–Só este entendimento é consentâneo com a tutela constitucional do acesso ao direito e aos tribunais, plasmada nos art. 2s 18.2, 20.2/l e 32.2/7, da Constituição da República Portuguesa, no art. 2 8.2, da Declaração Universal dos Direitos Humanos e no art. 2 6.2, da Convenção Europeia dos Direitos Humanos, que a todos assegura o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos.
5.–Pelo que a denunciante, que apresentou queixa tempestivamente nos autos, e que cumpriu o prazo preclusivo da notificação/advertência que, ao abrigo do dever à informação, lhe foi feita por despacho da autoridade judiciária competente, nos termos dos art.2s 68.2/2 e 246.2/4, do CPP, deve ser admitida a intervir como assistente nos autos também no que concerne ao crime de natureza particular.
6.–Tudo para que o MP possa proceder relativamente ao crime de natureza particular (art.2s 48.2 e 50.2/l, do Código de Processo Penal) - v., por todos, o Ac. do TRC de 05.01.2011, no Processo n.e 256/09.3GBFND-A.C1, relatado por Jorge Jacob.
Nestes termos e nos melhores de Direito deve ser declarado totalmente procedente o recurso apresentado pelo Ministério Público, devendo o douto despacho recorrido ser parcialmente revogado e a denunciante ser admitida a intervir nos autos como assistente também no que concerne ao crime de natureza particular, assim se fazendo JUSTIÇA.”
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O recurso foi admitido, com subida imediata, em separado e efeito devolutivo.
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Não foi apresentada resposta ao recurso.
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-» Uma vez remetido a este Tribunal, o Exm.º Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido da improcedência do Recurso interposto pelo Ministério Público, dizendo:
Analisados os fundamentos do recurso, bem como a fundamentação do Despacho recorrido, e tendo em conta a data da prática dos factos (fevereiro de 2022), a data em que foi apresentada a denúncia (5/4/2022) e a data em que foi requerida a constituição de assistente (4/12/2023), e sempre como devido e muito respeito por diferente opinião, não acompanhamos o recurso apresentado pela Digna Magistrada do Ministério Público junto da 1 .a instância.
Com efeito, no caso em apreço, antes concordamos com o entendimento jurisprudencial plasmado nos Acórdãos do TRG de 11 /9/2017 (relatora Fátima Furtado) e do TRP de 21/2/2018 (relatora Élia São Pedro), ambos consultáveis na base da DGSI, entendimento que aqui damos como reproduzido.”
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Cumprido o disposto no art.º 417º n.º 2 do CPP, veio AA, Recorrida, “reiterar e acompanhar na íntegra o douto recurso apresentado pelaDigna Magistrada do Ministério Público junto da 1ª Instância.”
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Proferido despacho liminar e colhidos os “vistos”, teve lugar a conferência.
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II–OBJETO DO RECURSO

De acordo com a jurisprudência fixada pelo Acórdão do Plenário das Secções do Supremo Tribunal de Justiça de 19.10.1995 (Diário da República, série I-A, de 28.12.1995), o âmbito do recurso define-se pelas conclusões que o recorrente extrai da respetiva motivação, sem prejuízo, contudo, das questões de conhecimento oficioso, designadamente a verificação da existência dos vícios indicados no nº 2 do artigo 410º do Código de Processo Penal.

Das conclusões do recurso extrai-se que com o mesmo visa o recorrente abordar as seguintes questões:
- Admissibilidade da constituição da requerente como assistente relativamente ao crime de natureza particular que foi denunciado.
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III–FACTUALIDADE RELEVANTE PARA A DECISÃO DO RECURSO:

1.AA, melhor identificada nos autos, e através de Mandatário constituído, apresentou queixa-crime a 8-04-2022, junto do Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) de Sintra, contra BB e CC imputando-lhes factos em seu entender integradores de um crime de burla, no art.° 217° n.° 1 do CP, de um crime de difamação previsto e punível pelos artigos 180° n° 1 e 183° n° t al. b) do C.P, de um crime de Extorsão p.e.p. no art. 223° n°1. do Código Penal e de um crime de Falsas Declarações, pe.p. artigo 348°-A do Código Penal, agravadas, de um crime de Dano artigo 212°. p. e p. do Código Penal e de um crime de usurpação p.e.p no artigo 215° do Código Penal;
Declarou, em simultâneo, a sua vontade de se constituir como assistente.
2.Tal queixa foi distribuída à 4ª Secção do DIAP de Sintra e autuada com o nº 2050/22.7T9SNT
3.Por despacho de 20/4/2022 foi excecionada a incompetência territorial daquele Ministério Público e determinada a remessa autos ao Ministério Público junto do DIAP da Amadora por ser este o territorialmente competente para a realização do inquérito, nos termos do disposto nos artigos 264.º n.º 1 e 266.º n.º 1, ambos do CPP.
4.Por despacho de 23/9/2022, determinou-se a incorporação do referido processo no inquérito 1001/21.0PHAMD - DIAP - 2ª Secção da Amadora, uma vez que se trata de uma situação de queixa contra queixa.
5.Por despacho do M.º P.º de 16/11/2023 determinou-se a notificação de AA para, no prazo de 10 dias, querendo, se constituir como assistente nos autos e vir deduzir acusação particular contra BB, nos termos do disposto nos art.ºs 68.º/2, 246.º/4 e 285º, n.º 1, do CPP, consignando-se que, no seu entender, foram recolhidos indícios suficientes da prática pela arguida BB do crime de difamação, com publicidade e calúnia, p. e p. pelo art. 180.º e 183.º nº 1 alíneas a) e b), do Código Penal.
6.Tal notificação ocorreu por via postal simples com prova de depósito remetida para a requerente a 22-11-2023.
7.Por requerimento datado de 4/12/2023, AA, requereu a constituição como assistente.
8.Foi determinada a remessa dos autos ao Mmo Juiz de Instrução, para apreciação do requerimento de constituição de assistente, mais consignando o Magistrado titular do inquérito nada ter a opor ao deferimento de tal pretensão, por se verificarem os correspondentes pressupostos, previstos nos arts. 68º, nº 1 e nº 3, e 70º, nº 1 do Código de Processo Penal.
9.Distribuídos os autos ao Juízo de Instrução Criminal da Amadora foi proferido, em 17.01.2024, o despacho recorrido com o seguinte teor (transcrição):
“Nos presentes autos investiga-se, além do mais, a eventual prática do crime de difamação, assumindo este natureza particular, cfr. art° 188°, n° 1 do C.P..
Nos termos do art° 68°, n° 2 do C.P.P., a constituição como assistente em procedimento dependente de acusação particular deve ser requerida no prazo de 10 dias a contar da advertência ou da declaração do denunciante efectuada nos termos do art° 246°, n° 4 do C.P.P., sendo peremptório este prazo, cfr. decorre do
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