Acórdão nº 09P316 de Supremo Tribunal de Justiça, 12-03-2009

Data de Julgamento12 Março 2009
Case OutcomeDEVOLVIDO À 1ª INSTÂNCIA PARA NOVAS DILIGÊNCIAS
Classe processualREVISÃO DE SENTENÇA
Número Acordão09P316
ÓrgãoSupremo Tribunal de Justiça



1.

O Tribunal do Júri da Comarca da Ilha do Pico condenou, em 14-7-2005, AA, como co-autor da prática, em concurso real, de um crime de homicídio qualificado dos art.ºs 131° e 132° n.ºs 1 e 2, als. f), g) e 1), um crime de profanação de cadáver do art. 254° n.º 1, a) do C. Penal, e cúmplice de um crime de burla informática dos art.ºs 221° n.º 5, a), 27° e 73°, n.º 1, a) e b), nas penas parcelares de 17 (dezassete) anos de prisão, 14 (catorze) meses de prisão e 2 (dois) meses de prisão, respectivamente e, em cúmulo jurídico, na pena única de 18 (dezoito) anos e 4 (quatro) meses de prisão (fls. 2-52).

O Supremo Tribunal de Justiça, por acórdão do de 7-12-2005, negou provimento aos recursos interpostos pelos arguidos, confirmando-se integralmente aquela decisão (fls. 58-87).

Por decisão sumária, de 17-1-2006, o Tribunal Constitucional decidiu não tomar conhecimento do objecto do recurso interposto pelo arguido AA, tendo o acórdão condenatório transitado em julgado.

Em 14-9-2006, o Tribunal Colectivo do Círculo Judicial de Angra do Heroísmo efectuou o cúmulo jurídico da pena já referida, com a pena de um outro processo, tendo-lhe sido aplicada a pena única de 18 (dezoito) anos e 4 (quatro) meses de prisão e (cento e vinte) 120 dias de multa, à taxa diária de €3,00 (fls. 88-92).

Os co-arguidos, identificados a fls. 4, foram condenados.

O condenado AA interpôs, a 6-2-2006, recurso extraordinário de revisão do acórdão condenatório, com os fundamentos constantes de fls. 113-115.

O Supremo Tribunal de Justiça entendeu, por acórdão de 1-3-2007, que a factualidade então indicada pelo requerente não era caracterizável como um facto novo ou novo meio de prova, e também que a mesma, de per si ou combinados com os demais factos que foram apreciados no processo, não suscitava graves dúvidas sobre a justiça da condenação, e decidiu negar a revisão pretendida (fls. 125-140), e indeferiu, a 19-4-2007 (fls. 149-150), o pedido de aclaração formulado pelo condenado (fls. 141-146), tendo sido interposto em 4-05-2007 recurso para o Tribunal Constitucional (fls. 151-154).

Em 23-4-2008, o mesmo condenado AA interpôs, segundo recurso extraordinário de revisão do acórdão condenatório, com os fundamentos, constantes de fls. 93-94 (e invocação de uma carta do co-arguido BB). Esse pedido foi reformulado, a convite (fls. 95-96), mas o Tribunal de 1.ª Instância não o admitiu, por despacho de 19-5-2008, por o ter por legalmente inadmissível – art.ºs 414° n° 2 e 465° do CPP (fls. 98-100).

O requerente não reagiu a esta decisão, mas interpôs depois terceiro recurso extraordinário de revisão da decisão condenatório, com os fundamentos seguintes:

1 – No dia 22 de Julho de 2008, o seu mandatário judicial recebeu um sobrescrito modelo correio azul, o qual foi remetido por CC, co-arguido no processo supra mencionado e a cumprir pena no Estabelecimento Prisional do Linhó (doc. 1).

2 – Tal sobrescrito continha 1 carta não datada, assinada por CC, que se supõe ter sido manuscrita pelo próprio e dirigida ao ora exponente.

3 – Do conteúdo de tal carta resulta que o referido CC pretende mudar as declarações que prestou no âmbito do processo, frisando agora, entre outras afirmações, que o ora exponente nunca esteve no local do crime e nunca recebeu dinheiro pelo crime (doc. 3).

4 – O mesmo sobrescrito, também continha uma outra carta não datada e não dirigida expressamente ao ora exponente e assinada pelo co-arguido DD.

5 – Do conteúdo desta última carta resulta que o DD assume que mentiu em tribunal sic “...sabendo que nunca tiveste lá connosco e nem recebeste dinheiro ...“ (doc. 2).

6 – Tais documentos constituem, do ponto de vista do exponente, novos meios de prova que suscitam graves dúvidas sobre a justiça da condenação do ora exponente.

7 – Sucede que o exponente foi condenado essencialmente pela prova resultante das declarações prestadas pelos co-intervenientes no homicídio, também condenados no processo.

8 – Sendo as declarações prestadas pelo CC, designadamente em sede de instrução, inequivocamente incriminatórias do ora exponente.

9 Ora, passado todo este tempo, vêm os 2 arguidos, por sinal irmãos, desdizerem-se e, de modo solene, afirmar que mentiram em tribunal ao envolver o exponente no assassínio.

10 – Acresce que a co-arguida EE reafirmou à Polícia Judiciária que tinha recebido telefonicamente urna recomendação de um dos irmãos para envolver o AA, visando a obtenção de uma pena mais pequena.

Pelo exposto, vem o condenado, ora exponente, requerer a V Exa, a revisão da sentença já transitada em julgado, o que faz ao abrigo dos arts° 449°, n° 1 – al. d) e 450.º, n.º 1, al. e), ambos do C.P.P.

Mas o Tribunal de 1.ª Instância, em despacho de 10-10-2008, teve este recurso por legalmente inadmissível – art.ºs 414°, n° 2 e 465°do CPP, não o admitindo, pois (fls. 105-110), nos termos seguintes:

«Cumpre apreciar e decidir (…)

Ora, no que respeita à legitimidade para interpor recurso de revisão, dispõe o artigo 450.º do Código de Processo Penal que esta cabe ao Ministério Público, ao assistente (em caso de decisão absolutória ou a despachos de não pronúncia), o condenado ou o seu defensor (no que respeita a decisões condenatórias), ou ainda as pessoas mencionadas no n.° 2 do preceito acima citado.

Por seu turno, o artigo 453° do Código de Processo Penal dispõe que “se o fundamento de revisão for o previsto na alínea d) do n.°1 do artigo 449º, o juiz procede às diligências que considerar indispensáveis para a descoberta da verdade, mandando documentar, por redução e escrito ou por qualquer meio de reprodução integral, as declarações prestadas”, sendo que “c requerente não pode indicar testemunhas que não tiverem sido ouvidas no processo, a não sei justificando que ignorava a sua existência ao tempo da decisão ou que estiveram impossibilitadas de depor”.

Ora, foi este o fundamento invocado pelo requerente para apoiar o recurso de revisão.

Analisado o requerimento em apreço constata-se que aí foi alegado o envio de duas cartas (com um teor em tudo semelhante) pelos co-arguidos CC e DD, onde consta sumariamente que, ao serem-lhes tomadas declarações em sede de audiência de discussão e julgamento, faltaram ambos à verdade ao imputarem-lhe a co-autoria dos factos que integram a prática de um crime de homicídio e manifestam que ao prestarem declarações o fizeram sem pensar (cfr. fls. 4432 e 4433).

Compulsados os autos, constata-se que AA já interpôs recurso de revisão da sentença proferida nos autos, o qual foi apreciado e decidido pelo Supremo Tribunal de Justiça por acórdão datado de 01 de Março de 2003.

No referido acórdão concluiu-se que “a factualidade indiciada pelo requerente AA não é caracterizável como facto novo ou novo meio de prova, a que acresce que, nem de per si nem combinados com os demais factos que foram apreciados no processo, suscitam graves dúvidas sobre a justiça da condenação, já que se relacionam directamente com meios de prova que não serviram de fundamento à condenação” e, nesse sentido, decidiu o Supremo Tribunal de Justiça em denegar a pretendida revisão.

Posteriormente AA interpôs novo recurso de revisão reproduzindo os fundamentos do recurso de revisão primeiramente interposto — falsidade das declarações do co-arguido FF e da co-arguida GG -‘ e que foi negado por legalmente inadmissível (fls.

Diferentemente vem agora AA alegar a falsidade das declarações dos restantes co-arguidos.

Na esteira do acima se deixou exposto, o legislador processual penal português ao fazer o contraponto entre o interesse de estabilidade das decisões judiciais e o interesse de que não prevaleçam sentenças que contradigam ostensivamente a verdade, optou por consagrar a possibilidade de rever as sentenças.

Porém, estabeleceu limites, os quais se encontram consagrados no artigo 465° do Código de Processo Penal, por “tendo sido negada a revisão ou mantida a decisão revista, não pode haver nova revisão com o mesmo fundamento”, visando evitar um segundo pedido de revisão sem fundamento (face à falência do primeiro), mas sem negar em absoluto a possibilidade do segundo pedido ser formulado.

Tendo em consideração todo o supra exposto, vejamos se se trata do mesmo fundamento.

Cotejando os vários requerimentos constata-se que são similares, de novo cartas que atestam a inocência do arguido, mas agora subscritas por co-arguidos diferentes.

Tal diferença não tem relevo no contexto que se discute, uma vez que é invocada a mesma alínea do n.°1 do artigo 449° do Código de Processo Penal como fundamento e indicados novos co-arguidos como tendo prestado declarações falsas em sede de audiência de discussão e julgamento, pelo que são, no essencial, os mesmos factos que são invocados no segundo pedido de revisão.

Por outro lado, o “novo” meio de prova em que AA se fundamenta apenas poderia ser confirmado com a audição de CC e de DD, os quais por se revestirem da qualidade de co-arguidos não podem ser ouvidos na qualidade de testemunhas (artigo 133°, n.°1, alínea a) do Código de Processo Penal), para além de que o teor das suas declarações já foi devidamente valorado em sede de análise crítica e ponderada aquando da prolação de sentença. Ora, “os factos ou meios de prova referidos na al. d) do n.° 1 do art. 449 do CPP devem ser novos no sentido de não terem sido apresentados no processo que conduziu à acusação se bem que não fossem ignorados pelo arguido, aqueles que não tenham sido apreciados no processo que levou à condenação, embora não fossem ignorados pelo arguido na ocasião em que teve lugar o julgamento” (Acórdão do STJ, de 14-05-2005, disponível para consulta in dgsi.pt) fundamento, ou ambas, o fundamento é o mesmo em ambos os pedidos de revisão.

E sendo assim, como é, não é admissível o presente recurso extraordinário.»

Em 3-11-2008, o mesmo condenado recorreu novamente para este Supremo Tribunal invocando o art. 401° n° 1, b) e 400° a...

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