Acórdão nº 0941/09 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 09-12-2009
Data de Julgamento | 09 Dezembro 2009 |
Número Acordão | 0941/09 |
Ano | 2009 |
Órgão | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
1. “B…, SA, veio recorrer da decisão do Mmº Juiz do TAF de Sintra que julgou improcedente a impugnação por ela deduzida contra a liquidação de taxas referentes a licenças de ocupação do subsolo com tubagens de gás relativas ao ano de 2002, no total de 456.160,72 euros, apresentando, para o efeito, alegações nas quais conclui:
Iª). Inexistiu qualquer acto de legítimo licenciamento da ocupação da via pública e/ou do subsolo e do devido procedimento administrativo correspondente, no caso dos autos;
IIª). A C.M. Sintra não tem competência nem legitimidade quer para atribuir a licença em apreço quer para aplicar a taxa correspondente, à recorrente.
IIIª). Na sequência da nacionalização da …. e da assunção pelo Estado Português, do dever, da competência e da responsabilidade dos actos conducentes à manutenção e expansão do “Gás de Cidade”, e nos termos da lei que aprovou as bases gerais da concessão e do título contratual desta, a C.M. Sintra ficou privada dos poderes de administração da porção do subsolo que viesse a ser necessária para a instalação das infra-estruturas adequadas ao estabelecimento da concessão - art°. 15° alínea c) do D.L. n° 374/89 de 25/10;
IVª). Por se tratar de um serviço público, no qual o próprio Estado é o concedente, foi até dispensado o licenciamento municipal para a realização de quaisquer obras inerentes à rede de distribuição – n° 3 alínea b) do artº.13° do DL 374/89; Bases XXXIV e XXXV anexas ao D-L 33/91 de 16/1; e cláusula 25ª, nº 2 alínea a) do contrato de concessão, datado de 16/12/1993;
Vª). A consequente impossibilidade de Direito de a C.M. Lisboa negar a atribuição de qualquer licença de ocupação do subsolo para os fins em vista é bem demonstrativa de que não se trata de uma taxa;
VIª). É intempestiva e contra-natura a concessão de qualquer licença de ocupação do subsolo no ano de 2002, relativamente à utilização de uma rede subterrânea já implantada e sob exploração em data anterior.
VIIª) Tal como se considerou nos Acórdãos seguintes e pelos fundamentos neles expendidos, deverão os tributos impugnados ser anulados, porque inconstitucionais e ilegais: Acórdão proferido em 23.10.2001, pela Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo, nos autos de recurso que correram seus termos sob o n.º 5448/01; Acórdão proferido em 12.03.2002, pela Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo, nos autos de recurso que correram seus termos sob o n.º 5575/01; Acórdão proferido em 28.05.2002, pela Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo, nos autos de recurso que correram seus termos sob o n.º 6018/01; Acórdão proferido em 20.04.2004, pela Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo, nos autos de Recurso que ali correm termos sob o n.º 01256/03;
VIIIª). A questão em apreço nos autos respeita à apreciação da legalidade ou ilegalidade de um tributo designado como “taxa” cobrado anualmente à ora Recorrente por parte do Município de Sintra pela ocupação do subsolo concelhio com as condutas, depósitos e tubagens que aquela utiliza para prestar o serviço público de distribuição de gás natural, ao abrigo do Contrato de Concessão celebrado com o Estado Português em 16.12.1993;
IXª). A douta Sentença recorrida considerou erroneamente que os tributos em causa têm a natureza de taxas, sendo as mesmas legais e indeferindo o pedido da sua anulação.
Xª). Para fundamentar a sua decisão, o Mmº Tribunal a quo considerou que o tributo liquidado estava conexionado com a utilização de terrenos no domínio público, considerando ainda que a colocação de condutas e tubos no subsolo consubstanciava uma utilização individualizada deste, nos termos do n.º 2 do artº. 40º da L.G.T., e como tal, seria de concluir que os tributos liquidados tinham a natureza de taxas, tendo cobertura legal na alínea c) do n.º 1 do artº. 19º da Lei das Finanças Locais.
XIª). Com o devido respeito, que é muito, tais considerações assentam numa errada caracterização e qualificação dos factos, o que resultou na incorrecta e insuficiente interpretação dos conceitos e normas jurídicas aplicáveis.
XIIª). Em primeiro lugar, a caracterização dos limites do direito de propriedade do Município face ao subsolo não se resume ao previsto no artº. 1344°, n.º 1 do Código Civil.
XIIIª). As situações jurídicas dominiais locais resultam das atribuições municipais concretas e onde não há atribuições ou competências da autarquia, não se justifica o domínio público local.
XIVª). Por via do Contrato de Concessão celebrado entre a ora Recorrente e o Estado Português, não foi atribuída qualquer competência ao Município de Sintra no que respeita à instalação e manutenção dos depósitos, tubagens e condutas de distribuição do gás natural.
XVª). A responsabilidade pelas despesas relativas a instalação, manutenção, reparações e eventuais alterações à rede do gás foi contratualmente atribuída à B…, S.A.
XVIª). Constituindo obrigação da concessionária perante o concedente o dotar-se de todas as infra estruturas e outros meios necessários, em cada momento, à exploração da concessão e promover a respectiva implantação, a cedência e utilização dos bens públicos municipais não poderiam ficar dependentes da vontade discricionária da respectiva autarquia, sob pena de ficar em risco o cumprimento das obrigações contratuais em causa.
XVIIª). Como tem considerado o Venerando Tribunal Constitucional, nomeadamente no seu Acórdão 558/98, de 29 de Setembro (D.R. II, 11.11.98, 16044): “a diferença específica entre imposto e taxa se situa na existência ou não de um vínculo sinalagmático que é apontado à segunda. Assim, o encargo característico das taxas representa como que (..) o preço do serviço ou da prestação de um serviço ou actividade públicas ou de uma utilidade de que o tributado beneficiará.”, ou no Acórdão 357/99, de 15 de Junho (D.R., II, 02.03.2000, 4255) onde se pode ler “como traço fundamental definidor do conceito de imposto e na sua diferenciação com o de taxa, o de unilateralidade (...) em contraste com a bilateralidade caracterizadora de taxa”.
XVIIIª). Ora, a bilateralidade e o vínculo sinalagmático inexistem, de todo em todo, no caso concreto dos autos em apreço.
XIXª). Todavia, por outro lado, o carácter bilateral e sinalagmático do conceito de “taxa” poderá ser insuficiente para permitir uma solução que leve em conta todos os factos e circunstâncias jurídicas do caso em apreço.
XXª). O conceito de taxa implica também o preenchimento de diversos pressupostos cumulativos, como a existência de uma contraprestação directa e específica por parte da autarquia, em benefício do munícipe,...
1. “B…, SA, veio recorrer da decisão do Mmº Juiz do TAF de Sintra que julgou improcedente a impugnação por ela deduzida contra a liquidação de taxas referentes a licenças de ocupação do subsolo com tubagens de gás relativas ao ano de 2002, no total de 456.160,72 euros, apresentando, para o efeito, alegações nas quais conclui:
Iª). Inexistiu qualquer acto de legítimo licenciamento da ocupação da via pública e/ou do subsolo e do devido procedimento administrativo correspondente, no caso dos autos;
IIª). A C.M. Sintra não tem competência nem legitimidade quer para atribuir a licença em apreço quer para aplicar a taxa correspondente, à recorrente.
IIIª). Na sequência da nacionalização da …. e da assunção pelo Estado Português, do dever, da competência e da responsabilidade dos actos conducentes à manutenção e expansão do “Gás de Cidade”, e nos termos da lei que aprovou as bases gerais da concessão e do título contratual desta, a C.M. Sintra ficou privada dos poderes de administração da porção do subsolo que viesse a ser necessária para a instalação das infra-estruturas adequadas ao estabelecimento da concessão - art°. 15° alínea c) do D.L. n° 374/89 de 25/10;
IVª). Por se tratar de um serviço público, no qual o próprio Estado é o concedente, foi até dispensado o licenciamento municipal para a realização de quaisquer obras inerentes à rede de distribuição – n° 3 alínea b) do artº.13° do DL 374/89; Bases XXXIV e XXXV anexas ao D-L 33/91 de 16/1; e cláusula 25ª, nº 2 alínea a) do contrato de concessão, datado de 16/12/1993;
Vª). A consequente impossibilidade de Direito de a C.M. Lisboa negar a atribuição de qualquer licença de ocupação do subsolo para os fins em vista é bem demonstrativa de que não se trata de uma taxa;
VIª). É intempestiva e contra-natura a concessão de qualquer licença de ocupação do subsolo no ano de 2002, relativamente à utilização de uma rede subterrânea já implantada e sob exploração em data anterior.
VIIª) Tal como se considerou nos Acórdãos seguintes e pelos fundamentos neles expendidos, deverão os tributos impugnados ser anulados, porque inconstitucionais e ilegais: Acórdão proferido em 23.10.2001, pela Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo, nos autos de recurso que correram seus termos sob o n.º 5448/01; Acórdão proferido em 12.03.2002, pela Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo, nos autos de recurso que correram seus termos sob o n.º 5575/01; Acórdão proferido em 28.05.2002, pela Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo, nos autos de recurso que correram seus termos sob o n.º 6018/01; Acórdão proferido em 20.04.2004, pela Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo, nos autos de Recurso que ali correm termos sob o n.º 01256/03;
VIIIª). A questão em apreço nos autos respeita à apreciação da legalidade ou ilegalidade de um tributo designado como “taxa” cobrado anualmente à ora Recorrente por parte do Município de Sintra pela ocupação do subsolo concelhio com as condutas, depósitos e tubagens que aquela utiliza para prestar o serviço público de distribuição de gás natural, ao abrigo do Contrato de Concessão celebrado com o Estado Português em 16.12.1993;
IXª). A douta Sentença recorrida considerou erroneamente que os tributos em causa têm a natureza de taxas, sendo as mesmas legais e indeferindo o pedido da sua anulação.
Xª). Para fundamentar a sua decisão, o Mmº Tribunal a quo considerou que o tributo liquidado estava conexionado com a utilização de terrenos no domínio público, considerando ainda que a colocação de condutas e tubos no subsolo consubstanciava uma utilização individualizada deste, nos termos do n.º 2 do artº. 40º da L.G.T., e como tal, seria de concluir que os tributos liquidados tinham a natureza de taxas, tendo cobertura legal na alínea c) do n.º 1 do artº. 19º da Lei das Finanças Locais.
XIª). Com o devido respeito, que é muito, tais considerações assentam numa errada caracterização e qualificação dos factos, o que resultou na incorrecta e insuficiente interpretação dos conceitos e normas jurídicas aplicáveis.
XIIª). Em primeiro lugar, a caracterização dos limites do direito de propriedade do Município face ao subsolo não se resume ao previsto no artº. 1344°, n.º 1 do Código Civil.
XIIIª). As situações jurídicas dominiais locais resultam das atribuições municipais concretas e onde não há atribuições ou competências da autarquia, não se justifica o domínio público local.
XIVª). Por via do Contrato de Concessão celebrado entre a ora Recorrente e o Estado Português, não foi atribuída qualquer competência ao Município de Sintra no que respeita à instalação e manutenção dos depósitos, tubagens e condutas de distribuição do gás natural.
XVª). A responsabilidade pelas despesas relativas a instalação, manutenção, reparações e eventuais alterações à rede do gás foi contratualmente atribuída à B…, S.A.
XVIª). Constituindo obrigação da concessionária perante o concedente o dotar-se de todas as infra estruturas e outros meios necessários, em cada momento, à exploração da concessão e promover a respectiva implantação, a cedência e utilização dos bens públicos municipais não poderiam ficar dependentes da vontade discricionária da respectiva autarquia, sob pena de ficar em risco o cumprimento das obrigações contratuais em causa.
XVIIª). Como tem considerado o Venerando Tribunal Constitucional, nomeadamente no seu Acórdão 558/98, de 29 de Setembro (D.R. II, 11.11.98, 16044): “a diferença específica entre imposto e taxa se situa na existência ou não de um vínculo sinalagmático que é apontado à segunda. Assim, o encargo característico das taxas representa como que (..) o preço do serviço ou da prestação de um serviço ou actividade públicas ou de uma utilidade de que o tributado beneficiará.”, ou no Acórdão 357/99, de 15 de Junho (D.R., II, 02.03.2000, 4255) onde se pode ler “como traço fundamental definidor do conceito de imposto e na sua diferenciação com o de taxa, o de unilateralidade (...) em contraste com a bilateralidade caracterizadora de taxa”.
XVIIIª). Ora, a bilateralidade e o vínculo sinalagmático inexistem, de todo em todo, no caso concreto dos autos em apreço.
XIXª). Todavia, por outro lado, o carácter bilateral e sinalagmático do conceito de “taxa” poderá ser insuficiente para permitir uma solução que leve em conta todos os factos e circunstâncias jurídicas do caso em apreço.
XXª). O conceito de taxa implica também o preenchimento de diversos pressupostos cumulativos, como a existência de uma contraprestação directa e específica por parte da autarquia, em benefício do munícipe,...
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