Acórdão nº 08S2270 de Supremo Tribunal de Justiça, 21-01-2009

Data de Julgamento21 Janeiro 2009
Case OutcomeNEGADA
Classe processualREVISTA
Número Acordão08S2270
ÓrgãoSupremo Tribunal de Justiça


Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:


I – O autor AA instaurou, em 23.02.2005, acção declarativa, com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho, contra a ré CP - Caminhos de Ferro Portugueses, EP, pedindo que esta seja condenada:
a) a reconhecer que ele autor foi contratado como trabalhador subordinado e que, por isso, estão vinculados por um contrato de trabalho por tempo indeterminado, desde 1.01.1992;
b) a pagar-lhe as quantias de € 2.120,30, a título de diuturnidades; € 19496,14, a título de subsídios de férias; € 21 245,01, a título de subsídios de Natal; €12 361,58, a título de subsídios de alimentação, acrescidas, respectivamente, de juros de mora, desde a data do vencimento até integral pagamento, computando os juros vencidos até á data da propositura da acção em € 20.691,00.
Alegou, para tanto e em síntese, o seguinte:
Iniciou a sua actividade profissional para a R., em 01/01/1992, formalmente ao abrigo de um contrato de prestação de serviços;
Sempre desempenhou as funções de assessor de imprensa, sob a autoridade, direcção e fiscalização da R.;
Até 27/10/2003 – data em que celebraram, por escrito, um contrato de trabalho por tempo indeterminado – a R nunca lhe pagou quaisquer quantias a título de subsídios de Natal e de férias, subsídios de alimentação, e diuturnidades.

A R., na sua contestação, defendeu-se por excepção e por impugnação.
Por excepção, invocou a incompetência do tribunal, em razão da matéria.
E por impugnação, alegou, em resumo, que, no período compreendido entre 1/01/1992 e 27/03/2003, o A. esteve sempre vinculado à empresa por um contrato de prestação de serviço.
Concluiu pela procedência da excepção invocada e pela sua absolvição da instância ou, se assim não se entender, pela improcedência da acção e pela sua absolvição do pedido.

Foi proferido despacho saneador em que a excepção da incompetência material foi julgada improcedente.
Foi designado o dia 3/07/2006 para a audiência de julgamento.
Nessa data, por falta de comparência do A., – falta que foi julgada justificada pelo tribunal – o julgamento foi adiado, tendo a 1ª sessão sido designada para o dia 13/11/2006, e a 2ª sessão para o dia 15/11/2006.
Como no dia 13/11/2006, na hora designada para o início do julgamento, a R. e o seu mandatário não se encontravam presentes, o M.mo Juiz a quo, a requerimento do A. e ao abrigo do disposto no art. 71°, n.° 1 do CPT, julgou provados os factos alegados por este que considerou serem pessoais da Ré e consignou na acta esses factos.
Irresignado, a R. interpôs recurso de agravo deste despacho, que veio a ser admitido com subida diferida.

Após o julgamento, foi proferida sentença que julgou a acção procedente e, em consequência:
a) Declarou que o A. e a R. estão vinculados por um contrato de trabalho por tempo indeterminado, desde 1/01/1992;
b) Condenou a R. a pagar ao A. € 2.120,30, a título de diuturnidades; € 19.496,14, a título de subsídios de férias; € 21.245,01, a título de subsídios de Natal; e € 12.361,58, a título de subsídios de alimentação.
c) Condenou a R. a pagar ao A. juros de mora, vencidos e vincendos sobre as referidas quantias até integral pagamento, à taxa legal, sendo os vencidos até à data da propositura da acção no valor de € 20.691,00.

Inconformada, a R. interpôs recurso de apelação da referida sentença.
Por seu douto acórdão, a Relação de Lisboa negou provimento aos recursos de agravo e de apelação e confirmou o despacho e a sentença impugnados.

II – Novamente irresignada, a R. interpôs a presente revista em que formulou as seguintes conclusões:
1ª. Tanto na primeira sessão do julgamento como na segunda que era continuação daquela, a R. fez-se representar pelo Senhor Dr. BB, ou seja, pela mesma pessoa;
2ª. Na indicada primeira sessão nenhum reparo ou observação foi feita quanto à representação da R. que então foi considerada válida;
3ª. Diferentemente já na segunda sessão do julgamento – continuação – tal representação da R. foi tida como não válida o que representa uma dualidade de critérios que não era expectável, para além de violadora do princípio da tutela da confiança;
4ª. Exactamente, por isso, não há lugar à aplicação da cominação prevista no artigo 71° n° 2 do CPT que conduziu a uma decisão surpresa, para mais, quando do site oficial Habilus tal agendamento, para esse dia, nem sequer constava;
5ª. Sem conceder e como já foi julgado no acórdão recorrido tal cominação não pode ser aplicada no tocante aos pontos 6 e 56 a que alude a Acta de fls. 162 a 174 o que se aceita;
6ª. Tais pontos – 6 e 56 – ao contrário do julgado no acórdão de que recorre obrigariam por si só a que a sentença da Primeira Instância tivesse sido revogada;
7ª. Efectivamente no acórdão recorrido, a partir dos factos remanescentes fixados por aplicação do citado artigo 71° n° 2 do CPT, conclui-se que o contrato celebrado entre o A. e a R. era de trabalho o que não se aceita como sendo conforme com a Lei;
8ª. Como é pacificamente entendido e decorre da lei – artigo 1.° da LCT e artigos 1152.° e 1154.°, ambos do Código Civil – no contrato de trabalho o objecto é a actividade de uma das partes que se obriga a prestar à outra sob a autoridade [e] direcção desta, enquanto que no contrato de prestação de serviços a obrigação não é a própria actividade, mas sim o resultado dessa actividade;
9ª. É a subordinação jurídica que diferencia o contrato de trabalho do contrato de prestação de serviços já que neste o prestador tem autonomia mas não exclui que o beneficiário da actividade não possa dar orientações, instruções e directivas àquele, como resulta, entre outros, do artigo 1161, alínea a) do Código Civil;
10ª. Ora, e ao contrário do que consta do acórdão recorrido, o facto de o A. receber ordens e orientações, inclusive, através de despachos manuscritos do respectivo Chefe de Gabinete ou de Divisão ou até Conselho de Gerência da R. ou do seu Presidente não é bastante nem suficiente para caracterizar o contrato, como sendo de trabalho;
11ª. Identicamente ocorre com a situação referida no acórdão de serem feitas correcções ou incorporações nos textos elaborados pelo A. que se destinavam a ser divulgados ou publicitados;
12ª. O mesmo se diga do facto de o A. utilizar na sua actividade um gabinete da R. e instrumentos de trabalho da mesma;
13ª. O facto de o A. ir todos os dias às instalações da R. e não ter horário de entrada e de saída, indo quando melhor lhe convinha, ao contrário do que refere o acórdão recorrido, só inculca que o contrato era de prestação de serviços e não de trabalho;
14ª. Atentas as conclusões precedentes, deverá ser revogado o acórdão recorrido e, consequentemente, a Recorrente absolvida dos pedidos por o mesmo violar, entre outros, o artigos 1.°, 5.,° n.° 2, ambos da LCT, os artigos 12.°, 1152.° e 1161.°, alínea a), todos do Código Civil, o artigo 511.° do C.P.C. e ainda o artigo 71.° n.° 2 do C.P.T. com todas as demais consequências legais.

O A. contra-alegou, defendendo a confirmação do julgado.

III – Colhidos os vistos, cumpre decidir.

Na revista, a R. impugna o acórdão recorrido na sua dupla vertente, isto é, na parte em que negou provimento ao agravo, confirmando o despacho da 1ª instância que, ao abrigo do art.º 71º, n.º 2 do CPT, julgou provados os factos pessoais da R. alegados pelo A., na p.i., e na parte em que julgou improcedente a apelação, tendo confirmado a sentença.

Ora, não é de conhecer, na presente revista, da primeira das apontadas decisões do acórdão da Relação.
É que estamos perante matéria de natureza processual a que correspondeu, correctamente, diga-se, recurso de agravo – e não de apelação – para a Relação.
Com efeito, a decisão em causa não foi nenhuma das previstas nos n.ºs 1 e 2 do art.º 691º do CPC (este art.º, bem como os que venham a ser indicados sem outra menção, são os da redacção anterior ao DL n.º 303/2007, de 24 de Agosto, a aplicável nos termos dos art.ºs 11º, n.º 1 e 12º, n.º 1 deste diploma), ou seja, sentença final ou despacho saneador que decidam do mérito da causa ou julguem da procedência ou improcedência de alguma excepção peremptória.
Ora, no caso, a eventual violação de lei de processo, nessa sede cometida pela Relação, não consentia agravo autónomo, nos termos do n.º 2 do art.º 754º, o que veda igualmente a impugnação em sede de revista – no quadro do n.º 1 do art.º 722º - (1).
É que estamos numa situação não subsumível a qualquer das situações em que os n.ºs 2 e 3 do art.º 754 consentem o agravo continuado para o STJ.
Sendo, por outro lado, que não se está perante uma situação de “ofensa de uma disposição expressa
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