Acórdão nº 08P3552 de Supremo Tribunal de Justiça, 04-12-2008
Data de Julgamento | 04 Dezembro 2008 |
Case Outcome | NEGADO PROVIMENTO |
Classe processual | RECURSO PENAL |
Número Acordão | 08P3552 |
Órgão | Supremo Tribunal de Justiça |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça
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- sete crimes de furto, previstos e puníveis pelo art.203º, nº1, do Código Penal;
- um crime de abuso de cartão de crédito, previsto e punível pelo art. 225º, nº1, do Código Penal.
- trinta e quatro crimes de falsificação de documento, previstos e puníveis, pelo art.256º, nºs 1, alínea a), e 3, do Código Penal;
- um crime de falsificação de documento na forma tentada, previsto e punível pelas disposições conjugadas dos arts.22º, 23º e 256º, nºs 1, alínea a), e 3, do Código Penal;
- trinta crimes de burla qualificada, previstos e puníveis pelas disposições conjugadas dos arts.217º, nº1, e 218º, nº2, al.b), do Código Penal;
- dois crimes de burla qualificada, na forma tentada, previstos e puníveis pelas disposições conjugadas dos arts.22º, 23º, 217º, nº1, e 218º, nº2, al.b), do Código Penal.
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Na qualidade de lesados e com base nos factos descritos na acusação vieram os lesados Ourivesaria ........ Lda., DD, EE, FF – Comércio Internacional de Electrodomésticos, Lda. e GG, vieram deduzir contra a arguida pedidos de indemnização civil, no montante global de € 750,66, a título de danos não patrimoniais e acrescido de juros vincendos à taxa legal, ---
No decurso do julgamento vieram a ser apresentadas desistências das queixas por parte dos queixosos HH, II, JJ, KK e LL MM e NN, que foram homologadas, declarando-se, extinto o procedimento criminal instaurado nos autos contra a arguida relativamente aos seis crimes de furto em que eram ofendidos esses mesmos desistentes; e, tendo ainda, a arguida confessado os pedidos de indemnização civil contra si deduzidos nos autos, confissão essa que foi homologada, prosseguindo então o julgamento para apuramento da responsabilidade criminal da arguida referente ao restante crime de furto e demais crimes que lhe são imputados na acusação. ---
Realizado julgamento, foi proferido acórdão em 24 de Julho de 2008, que decidiu:“1. Declarar extinta a responsabilidade criminal da arguida relativamente aos nove crimes de burla referentes aos cheques por si entregues nos aludidos estabelecimentos e espaços comerciais OO, estabelecimento comercial PP – LOJA ... Farmácia ........, estabelecimento comercial QQ LDA., RR PERUMARIA LDA., SS, estabelecimento comercial TT, estabelecimento comercial LINGERIE, e UU.
2. Ordenar o arquivamento relativamente aos factos integradores do crime de burla simples praticados na SAPATARIA VV imputados na acusação deduzida nos autos contra a arguida.
3. Condenar a arguida AA, como autora material e em concurso real, de:
- um crime de furto simples, p. e p. pelo Art. 203º Nº1 do C. Penal actualmente em vigor, na pena de 8 meses de prisão.
- um crime de abuso de cartão de crédito, p. e p. pelo Art. 225º Nº1 do C. Penal actualmente em vigor, na pena de 18 meses de prisão;
- um crime de falsificação de documento ( referente às assinaturas nos talões das compras ), p. e p. pelo Art. 256ºNº1 c) do C. Penal actualmente em vigor, na pena de 15 meses de prisão;
- um crime de falsificação de documento, p. e p. pelo Art. 256º Nº1 b) e Nº3 do C. Penal actualmente em vigor ( referente à falsificação do bilhete de identidade de JJ ), na pena de 10 meses de de prisão;
- um crime de falsificação de documento, p. e p. pelo Art. 256º Nº1 c) e Nº3 do C. Penal actualmente em vigor ( referente à falsificação da assinatura da mencionada JJ no verso do cheque da conta titulada por XX no espaço reservado à assinatura do endossante Calças ), na pena de 14 meses de prisão;
- um crime de falsificação de documento, na forma continuada, p. e p. pelo Art. 256º Nº1 c) e Nº3 e 30º Nº2 do C. Penal actualmente em vigor ( referente à falsificação dos cheques da conta bancária do Montepio Geral titulada por HH ), na pena de 2 anos e 4 meses de prisão;
- um crime de falsificação de documento, na forma continuada, p. e p. pelo Art. 256º Nº1 c) e Nº3 e 30º Nº2 do C. Penal actualmente em vigor ( referente à falsificação dos cheques das contas bancárias do BCP e do BPN tituladas por JJ), na pena de 3 anos e 6 meses de prisão ( pena esta que substitui as pena de 18 meses de prisão e de 15 meses de prisão que foram aplicadas à arguida no âmbito do Proc. Colectivo Nº .......0TACBR, da Vara de Competência Mista, 1ª secção, do Tribunal Judicial de Coimbra e do Proc. Comum Colectivo Nº ......4GCTND, do 2º Juízo do Tribunal Judicial de Tondela pela prática de crime de falsificação de documento na forma continuada ).
- um crime de burla simples, p. e p. pelos Arts. 217º Nº1 e 30º Nº2 do C. Penal actualmente em vigor ( referente à entrega do cheque da conta titulada por XX ), na pena 10 meses de prisão;
- um crime de burla simples, na forma continuada, p. e p. pelos Arts. 217º Nº1 e 30º Nº2 do C. Penal actualmente em vigor ( referente à entrega dos cheques da conta bancária do Montepio Geral titulada por HH ), na pena de 2 anos de prisão;
- um crime de burla simples, na forma continuada, p. e p. pelos Arts. 217º Nº1 e 30º Nº2 do C. Penal actualmente em vigor ( referente à entrega dos cheques das contas bancárias do BCP e do BPN tituladas por JJ), na pena de 2 anos e 10 meses de prisão ( pena esta que substitui a pena de 14 meses de prisão que foi aplicada à arguida no âmbito do Proc. Colectivo Nº 302/05.0TACBR, da Vara de Competência Mista, 1ª secção, do Tribunal Judicial de Coimbra, pela prática de crime de burla simples na forma continuada.
2. Efectuar o cúmulo jurídico de tais penas, e, consequentemente, condenar a mesma arguida, na pena única de 7 anos e 6 meses de prisão.
3. Condenar, ainda, a arguida nas custas do processo (…)
4. Declara-se perdida a favor do Estado a quantia em dinheiro apreendida nos autos.
5. Ordena-se a restituam-se dos documentos pessoais apreendidos nos autos aos respectivos titulares, após notificação dos mesmos para procederem ao seu levantamento, nos termos previstos no Art. 186º Nºs 3 e 4 do C.P.P.
6. Ordena-se a restituição dos demais bens apreendidos nos autos a quem provar ser legítimo proprietário dos mesmos, e, ainda, a notificação das pessoas em relação ás quais resulta, inequívoco da factualidade provada, serem proprietárias dos mesmos, para procederem ao seu levantamento, sob pena de se considerarem tais objectos perdidos a favor do Estado, nos termos previstos no Art. 186º Nºs 3 e 4 do C.P.P.
7. Com cópia do presente acórdão, comunique ao Proc. Colectivo Nº 302/05.0TACBR, da Vara de Competência Mista, 1ª secção, do Tribunal Judicial de Coimbra e ao Proc. Comum Colectivo Nº 391/04.4GCTND, do 2º Juízo do Tribunal Judicial de Tondela que as penas neles aplicadas à arguida foram substituídas pelas penas aplicadas à mesma arguida nos presentes autos.
8. Remeta boletins à D.S.I.C.
9. Deposite.”
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Inconformada, recorre a arguida para o Supremo Tribunal de Justiça, apresentando as seguintes conclusões:1 - A arguida discorda da forma como foi aplicado o direito, no que concerne à determinação da medida da pena, bem como, a apreciação da matéria provada na fixação concreta da pena.
2 - No crime de abuso de cartão de crédito o bem jurídico protegido é o património individual cujo tipo legal supõe um dano patrimonial, ou seja, causar prejuízo material a terceiro e para o efeito o agente do crime tem de utilizar os estratagemas que induzirão ao erro ou engano de outrem.
3 - O crime de falsificação praticado pela arguida constituiu o meio para o cometimento do crime de abuso de cartão e a posse por furto do cartão o instrumento imprescindível para a prática daquele ilícito (abuso de cartão de crédito).
4 - Por isso, na nossa humilde opinião, aqueles crimes, falsificação e furto, foram consumidos pelo crime de abuso de cartão de crédito e. assim, verifica-se que a prática destes crimes preenche um concurso aparente de normas, cuja relação é de consumpção e não de concurso aparente.
5 - Entende-se que este raciocínio também tem de ser aplicado aos crimes de falsificação e de burla, ambos na forma continuada, sob pena de violação do nº 5 do art° 29° da C.R.P.
É nosso entendimento partilhar a opinião do Ilustre Conselheiro Sá Nogueira que no seu voto de vencido do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça proferido no processo 728/88 de Dezembro/1998, no qual foi relator, e citado no acórdão uniformizador 8/2000, que defende que a reforma de 1995 teve como principio filosófico o retomo à regra tradicional de que "no concurso de circunstâncias qualificativas agravantes, só à mais grave é dado relevo, com as consequências de fazer incluir no tipo legal da burla todos os meios usados pelo agente para cometer o ilícito no sentido de utilização de erro ou engano, o que, necessariamente, implica que a falsificação, por ser uma das formas do erro ou engano, seja incluída no tipo legal de burla. A falsificação portanto faz parte do tipo legal de burla e não pode ser autonomizada em relação à burla de que faz parte, sob pena de violação do princípio constitucional de "non bis in idem"".
6 - Na nossa opinião é violento e juridicamente reprovável que apesar do bem jurídico protegido (património individual) ser comum aos dois crimes e que para a concretização de um deles (burla) seja imprescindível a falsificação, este não seja consumido com a prática daquele e com isso o arguido seja condenado por este ilícito, não o sendo pela...
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