Acórdão nº 0802/17 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 07-06-2018

Data de Julgamento07 Junho 2018
Número Acordão0802/17
Ano2018
ÓrgãoSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)
I. Relatório

1. A……….., LDA - identificada nos autos - instaurou no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa [TAC] a presente «acção para efectivação de indemnização emergente de responsabilidade civil», contra o ESTADO PORTUGUÊS [EP], o INSTITUTO GEOLÓGICO E MINEIRO[IGM], e o INSTITUTO DE APOIO ÀS PEQUENAS E MÉDIAS EMPRESAS E INVESTIMENTO[IAPMEI], pedindo, pelas razões insertas na petição inicial [ver folhas 2-12 dos autos], a condenação dos réus no seguinte:

a) A indemnizá-la de todos os danos patrimoniais que se cifram em 29.928,00€;
b) A pagar-lhe os trabalhos de prospecçãoe pesquisa, na altura em curso [Imobilizações], e perdidos, no montante de 92.200,00€;
c) A pagar-lhe uma indemnização por danos morais em valor nunca inferior a 49.880,00€, mercê dos grandes prejuízos que lhe foram causados e que a marcaram negativamente, abalando a confiança das várias entidades, nomeadamente bancárias e pessoas singulares, que com ela sempre trabalharam;
d) A pagar-lhe os subsídios acordados e esperados relativos aos 6 processos de candidatura apresentados no montante global de 2.025.033,00€;
e) A repor a situação, para que ela possa reiniciar o projecto inicialmente previsto;
f) A conceder-lhe os direitos mineiros das três concessões;
g) A conceder-lhe os direitos mineiros das áreas de prospecção e pesquisa requeridas, designadamente a área do contrato de prospecção e pesquisa que é referido no ponto 36º da petição;
h) A pagar-lhe os lucros que vierem a resultar no futuro da transmissão dos direitos mineiros e/ou da exploração das concessões em causa e áreas de prospecção e pesquisa referidas, se as mesmas tiverem sido ou vierem a ser atribuídas a outros interessados.

2. O TAC de Lisboa declarou-se territorialmente incompetente para conhecer dos pedidos formulados nos autos, por tal competência pertencer, a seu ver, ao Tribunal Administrativo de Círculo do Porto [TAC], para onde foi remetido o processo [folhas 212/214 dos autos].

3. O réu IGM foi extinto pelo DL nº186/2003, de 20.08 [ver artigo 46º, nº1, alínea f)] pelo que a sua representação foi assegurada pelo réu ESTADO PORTUGUÊS.

4. A autora requereu a habilitação da Direcção-Geral de Energia e Geologia [DGEG] em substituição do réu IGM, para contra ela prosseguirem os autos, em virtude de a matéria em causa passar a ser do âmbito das competências atribuídas a esta Direcção-Geral ex vi do artigo 47º, nº4, do DL nº186/2003, de 20.08 [ver folhas 3/4 e 5/6 dos autos de incidente de habilitação nº92/02.BELSB-B apensos, e folhas 355/358 destes autos], requerimento que acabou indeferido por se tratar de serviço integrado na pessoa colectiva Estado, e, como tal, carecer de personalidade jurídica e judiciária [ver despacho de folhas 27/29 dos autos de incidente de habilitação nº92/02.BELSB-B apensos, nos termos do qual o Estado Português passou a representar a DGEG].

5. Porque a matéria vertida na petição inicial, relativamente à DGEG[ex-IGM], é diversa da que concerne ao EP, foi determinada a notificação do Ministério Público para contestar a presente acção na parte relativa àquela [ver folhas 362 e 363 dos autos] o que ele fez, suscitando as excepções de ilegitimidade passiva e da prescrição, e impugnando os factos alegados pela autora [ver folhas 369/387 dos autos].

6. Foi proferido despacho saneador, seleccionada a matéria de facto assente e elaborada a base instrutória da causa [ver folhas 490/512].

Nos termos do despacho saneador, foi «julgada improcedente» a excepção dilatória de ilegitimidade do réu Estado Português, e «julgada procedente» a excepção peremptória de prescrição invocada pelos réus, absolvendo-os dos pedidos de indemnização fundada em responsabilidade civil extracontratual, concretamente, dos pedidos de condenação dos mesmos:

- A indemnizar a autora de todos os danos patrimoniais que se cifram em 29.928,00€;
- A pagar-lhe os trabalhos de prospecçãoe pesquisa, na altura em curso [Imobilizações], e perdidos, no montante de 92.200,00€;
- A pagar-lhe uma indemnização por danos morais em valor nunca inferior a 49.880,00€, mercê dos grandes prejuízos que lhe foram causados e que a marcaram negativamente, abalando a confiança das várias entidades, nomeadamente bancárias e pessoas singulares, que com ela sempre trabalharam;
- A pagar-lhe os lucros que vierem a resultar no futuro da transmissão dos direitos mineiros e/ou da exploração das concessões em causa e áreas de prospecção e pesquisa referidas, se as mesmas tiverem sido ou vierem a ser atribuídas a outros interessados.

7.Não se conformando com tal julgamento sobre a prescrição, a autora veio dele interpor recurso [folha 521-544], e concluiu assim as suas alegações:

A) Vem este recurso interposto do saneador proferido pelo TAF, que julgou procedente a excepção peremptória de prescrição invocada pelos apelados e em consequência absolveu-os dos pedidos de indemnização fundada em responsabilidade civil extracontratual;

B) Ora, salvo o devido respeito por melhor opinião, não pode a apelante conformar-se com a decisão proferida, nem com os fundamentos que a sustentam;

C) Ao contrário do sustentado no despacho saneador proferido, o facto do qual emerge a obrigação de indemnizar não é o ofício nº00793, de 15.03.1990, emitido pelo Director de Serviços de Administração Industrial da Direcção-Geral de Geologia e Minas;

D) Efectivamente, e conforme resulta alegado na réplica junta aos autos, «a 1990 remonta sim o início de todo um longo processo que só teve o seu terminus em 1999, altura em que a autora é notificada do arquivamento do processo de inquérito nº253/97.OTDPRT, levado a cabo pela Inspecção Geral das Finanças»;

E) Conforme consta no documento 1 junto com a réplica da apelante, no âmbito deste processo nº253/97.OTDPRT foram a autora e os seus sócios acusados do crime de fraude na obtenção de subsídio, previsto e punido pelo artigo 36º do DL nº28/84, de 20.01, referente às Infracções Económicas e contra a Saúde Pública;

F) Discutiu-se, assim, no âmbito desse processo crime, a eventual existência de declarações não verdadeiras, inexactidões ou omissões sobre factos importantes referentes aos requisitos que deveriam estar reunidos para obter os subsídios no âmbito das candidaturas aos fundos comunitários do programa SIPE - Sistema de Incentivos ao Potencial Endógeno, em causa nos presentes autos;

G) Equivale isto a dizer que a discussão naqueles autos versava sobre a eventual existência de comportamento fraudulento por parte dos representantes legais da aqui autora no processo de candidatura aos subsídios em causa, e, assim, da validade ou não do subsídio atribuído;

H) É certo que, tivessem os representantes legais e sócios da autora sido condenados no crime do qual estavam a ser acusados no âmbito daquele processo, não assistiria à autora o direito que esta vem reclamar na presente acção, uma vez que, nesse caso, os subsídios em causa não haviam sido licitamente obtidos, e ficaria judicialmente estabelecido que os subsídios haviam sido atribuídos à autora em inobservância do condicionalismo fáctico previsto nas disposições legais que regulam essa atribuição;

I) Caso tivesse sido proferida sentença de condenação no âmbito daquele processo-crime, não só não existiria causa de pedir que fundamentasse a presente acção de condenação, como seria a apelante condenada à restituição da quantia do subsídio, e à perda dos lucros emergentes, como, de resto, seria judicialmente ordenada a dissolução da ora apelante, o que, notoriamente, teria como consequência inevitável a total extinção dos direitos que a apelante pretende fazer valer na presente acção;

J) Pelo já exposto, a condenação dos arguidos no âmbito do processo nº253/97.OTDPRT implicaria, desde logo, a inexistência da causa de pedir da presente acção, e, por outro lado, um automático decaimento da apelante no seu pedido indemnizatório, seja a título de danos patrimoniais ou morais, já que este pedido assenta na existência, na validade e na regularidade dos processos de candidatura em causa;

K) Por outro lado não pode entender-se aquele parecer do IGM como o facto ilícito gerador da obrigação de indemnizar, uma vez que, e como alega a apelante na sua réplica, durante o tempo que mediou o ano de 1990 [ano em que começaram a surgir os problemas com a IGM], e até à data em que foi notificada do despacho de arquivamento do processo de inquérito nº253/97, a apelante sempre considerou que tudo se iria resolver e que os contratos em questão iriam ser cumpridos por parte dos réus;

L) Ao que acresce o facto de a autora haver sido informada pelo réu IAPMEI que todo o processo de candidatura iria ficar suspensa, somente, enquanto corria a investigação por parte da Inspecção Geral de Finanças;

M) O que, de resto decorre do próprio articulado de contestação do apelado IAPMEI, no qual consta a efectivação de diligências no âmbito do processo de candidatura a 26.09.91, 28.02.92 e 01.06.92, designadamente a solicitação de elementos à apelante;

N) Pelo que, também por aqui se vê que o ofício nº00793, de 15.03.1990, não consolidou a obrigação indemnizatória, não constituindo o facto gerador da obrigação de indemnizar, há que, em data posterior a tal ofício [26.09.1991, 28.02.1992 e 01.06.1992], tanto a apelante como o apelado IAPMEI continuaram as diligências no sentido de ser realizado o pagamento dos subsídios à apelante;

O) Esta factualidade evidencia que, ao longo dos anos em que correu o processo de inquérito nº253/97.OTDPRT, a apelante manteve-se confiante de que o processo de candidatura se mantinha suspenso até ao encerramento daquele processo; confiança que, de resto, lhe foi sempre induzida pelo apelado IAPMEI; e que, sendo proferida despacho de arquivamento ou sentença absolutória nesse processo, seria retomado o normal andamento daquele processo;

P) O decurso do prazo de prescrição inicia-se a partir...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT