Acórdão nº 07B1860 de Supremo Tribunal de Justiça, 13-09-2007
Data de Julgamento | 13 Setembro 2007 |
Case Outcome | CONCEDIDA PARCIALMENTE A REVISTA |
Classe processual | REVISTA |
Número Acordão | 07B1860 |
Órgão | Supremo Tribunal de Justiça |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:
I – Nas Varas Cíveis de Lisboa, com distribuição à 15.ª, AA instaurou a presente acção declarativa ordinária contra:
BB;
CC;
DD;
EE e
FF.
Alegou, em síntese, que:
Construiu uma casa para habitação em bairro clandestino;
Teve necessidade de fazer e fez, a expensas suas, uma ligação a esgoto;
Os RR., em nome de uma comissão de moradores constituída no bairro, destruíram essa ligação a esgoto, causando-lhe os danos patrimoniais e não patrimoniais que detalhadamente descreve.
Pediu, em conformidade:
A condenação dos réus a pagarem-lhe:
5.159.816$00 de indemnização, dos quais 2.000.000$00 para o compensar dos danos não patrimoniais.
Contestaram estes.
Na parte que agora importa, impugnaram a versão factual apresentada pelo autor e negaram a bondade da construção jurídica que ele apresenta.
II – A acção prosseguiu, tendo na altura própria, sido proferida sentença, que absolveu os réus do pedido.
A qual se fundamenta do seguinte modo:
“Vejamos pois o fundo da questão.
Tudo está em saber se a actuação do R. BB (quanto aos outros RR. nada se apurou) foi lícita.
O A. construiu a sua casa em bairro nascido clandestinamente-supra II-B).
Para a legalização do bairro e construção das infraestruturas necessárias, constituiu-se uma Comissão de Melhoramentos ou Comissão de Moradores, reconhecida pela Câmara Municipal de Loures (CML), havendo estreita colaboração entre as duas entidades-supra II-C) e 18).
Os prejuízos invocados pelo A. têm que ver com a destruição da ligação à rede de esgotos por ele feita (em 1980).
Em 1980 o A. fez uma primeira ligação à rede de esgotos-II-5) e 6.
Não estava autorizado para o fazer - II - 57.
Em 19-3-92 o A. executou, pelos seus meios, um ramal de esgotos – II - F).
Foi condenado por esse facto.
Em 1990 o R. BB exigiu ao A. o pagamento de 425.500$00-II-7.
Por carta de 17-7-91 o mesmo BB comunicou ao A. que devia proceder até 31-7-91 no sentido de lhe serem executados os ramais pluvial e doméstico – II - 10).
Em Maio de 91 o BB mandou destruir o ramal de esgotos- II -12).
Foi a Comissão de Moradores que executou os trabalhos referentes à colocação de colectores de esgotos – II - 59) e 63).
As obras levadas a cabo implicaram terraplanagem da rua, abertura de valas, remoção do colector existente e substituição por outro e corte de ramais pré-existentes e construídos clandestinamente-II-62.
Concluindo:
- em lugar de colaborar na obra do interesse geral que era o saneamento básico do bairro, o A. optou por agir sempre à margem da lei, actuando como Robinson isolado na sua ilha.
A actuação do R. BB mostra-se legitimada pelo apoio e colaboração do ente autárquico (ver ainda II - 64 e 65), interessado primeiro na legalização do bairro.”
III – Apelou o autor e o Tribunal da Relação de Lisboa entendeu em resumo, que:
A Comissão de que os réus fazem parte não tem personalidade jurídica, sendo, portanto, estes pessoalmente responsáveis por actuação ainda que em pretenso nome daquela;
O autor tinha um compromisso contratual que violou, mas perante essa violação, não podiam os réus agir – ainda que em nome da Comissão - por suas próprias mãos.
Daí que tivessem incorrido em responsabilidade;
Mas apenas reportada aos danos consistentes no custo da reposição dos ramais, da reparação da parte do muro destruído, dos objectos estragados com a inundação da garagem e conexa reparação desta.
Concedeu, por isso, parcial provimento ao recurso, condenando os réus a pagarem, solidariamente, ao autor a quantia que se liquidar em execução de sentença correspondente à reparação de tais danos.
IV – Inconformado, pede revista o réu BB.
Conclui as alegações do seguinte modo:
1ª - O Douto Acórdão recorrido fez uma errada e insustentável subsunção dos factos provados, nomeadamente porque não retirou as devidas conclusões da factualidade descrita nas alíneas A), B) e F) dos Factos Assentes e nas respostas ao perguntado nos números 57º, 64º e 65º da Base Instrutória.
2ª - E, por via desse erro, não aplicou nem interpretou correctamente as normas efectivamente aplicáveis à regulamentação da situação sub judice.
3ª - O Autor, à data dos factos, não era proprietário da casa em que habitava com a sua família, antes sendo comproprietário, na proporção referida na alínea A) dos Factos Assentes, do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de Odivelas sob o n.º 11748.
4ª - E, como comproprietário, estava sujeito, nomeadamente, às obrigações estatuídas nos artigos 1405º n.º 1, 1406º nºs 1 e 3, e 1411º n.º 1 do Código Civil, as quais não cumpriu.
5ª - Os actos praticados, por forma voluntária, livre e esclarecida, pelo Autor, contra a vontade expressamente manifestada por todos os demais consortes, são anuláveis e estavam a causar a estes últimos graves prejuízos, em concreto: estavam a impedir a legalização de todo o chamado “Bairro …”, construção clandestina com mais de mil – 1.000 – fogos,
6ª - constituindo, portanto, esses actos do Autor um manifesto e evidente abuso de direito.
7ª - A construção dos ramais de esgotos feita pelo Autor e a sua ligação à rede pública, rede esta feita construir a mando da “Comissão de Moradores e de Melhoramentos”, representada pelos Réus e de que o ora recorrente era apenas o Presidente, e por ela custeada, foi realizada sem autorização da Câmara Municipal de Loures e ao arrepio do instrumento de reconversão aprovado para o clandestino “Bairro …”, pelo que nunca poderia ser legalizada, antes tendo que ser, como o foi, obrigatoriamente demolida,
8ª - e representando esses actos voluntários, livres e esclarecidos do Autor uma violação ilícita dos direitos e interesses legítimos de todos os demais comproprietários do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de Odivelas sob o n.º 11748, bem como uma violação de normas legais destinadas a proteger esses direitos e interesses de todos os outros consortes.
9ª - A “Comissão de Moradores e de Melhoramentos”, representada pelos Réus e de que o ora recorrente era apenas o Presidente, limitou-se a agir em conformidade com o disposto no n.º 5 do artigo 985º do Código Civil e respeitando os limites definidos no artigo 334º e no n.º 2 do artigo 335º, ambos do mesmo Código,
10ª - não tendo, pois, praticado qualquer acto ilícito gerador do dever de indemnizar que o Autor pretende ver reconhecido em juízo através do presente processo.
11ª - Ao invés, os prejuízos sofridos pelo Autor decorrem única e exclusivamente e de modo directo e necessário, da sua própria conduta ilícita e irresponsável.
12ª - À actividade da “Comissão de Moradores e de Melhoramentos”, representada pelos Réus e de que o ora recorrente era apenas o Presidente, aplica-se o disposto no artigo 198º do Código Civil.
13ª - Com o Douto Acórdão recorrido foram violadas, por não terem sido aplicadas, as disposições contidas nos artigos 334º, 335º n.º 2, 1403º, 1405º, n.º 1, 1406º, 1407º, nºs 1 e 3, 1411º, n.º 1, 1483º, 985º, n.º 5, e 198º do Código Civil e 659º n.º 3 do Código de Processo Civil.
14ª - E, por todas estas razões, deve o Douto Acórdão recorrido ser revogado e, em conformidade e tal como foi decidido em 1ª instância, devem todos os Réus ser absolvidos de todo o pedido contra eles formulado pelo Autor através do presente processo.
Contra-alegou o autor, batendo-se pela manutenção do decidido.
V – Ante as conclusões das...
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