Acórdão nº 0700/16 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 01-02-2017

Data de Julgamento01 Fevereiro 2017
Número Acordão0700/16
Ano2017
ÓrgãoSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)
I. Relatório
1. A………… - Juiz de Direito, colocada no Tribunal Administrativo e Fiscal de …… - demanda o CONSELHO SUPERIOR DOS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS E FISCAIS [CSTAF] pedindo a sua «condenação na prática do acto devido», ou seja: «em substituição da sua deliberação de 19.04.2016» - quanto ao «ponto 2 da Tabela» - «admitir a reclamação por ela apresentada em 07.12.2015 da deliberação do CSTAF de 27.10.2015 e conhecer do mérito da mesma, emitindo a necessária deliberação, no prazo de trinta dias a contar do trânsito em julgado da decisão que vier a ser proferida nestes autos».

Alega que o CSTAF indeferiu liminarmente a sua reclamação de 07.12.2015, por «extemporânea», devido a ter considerado que ela foi notificada da deliberação reclamada em 02.11.2015 e que o «prazo de reclamação» era de 15 dias úteis, nos termos do artigo 191º nº3 do Código do Procedimento Administrativo [CPA].

Porém, defende que tal indeferimento deve ser substituído, por ilegal, uma vez que a sua reclamação foi apresentada a tempo, pois que o prazo para a mesma é de 30 dias, por via da «aplicação subsidiária» do artigo 167º nº1 do Estatuto dos Magistrados Judiciais [EMJ], e, mesmo que o prazo fosse de 15 dias, sempre deveria ser contado só a partir da data em que ela manifestou conhecimento da deliberação reclamada, ou seja, a partir de 16.11.2015.

2. O CSTAF contestou, por excepção e impugnação. Excepcionou a «caducidade do direito de acção, por entender que o respectivo prazo é de 30 dias [artigo 169º do EMJ], e, contado a partir de 26.04.2016, terminou em 26.05.2016, razão pela qual a acção, interposta em 01.06.2016, o foi numa altura em que o direito de o fazer já tinha caducado. Impugnou, no demais, a tese jurídica defendida pela autora relativamente à notificação da deliberação reclamada e ao prazo da dita reclamação.

3. A autora «replicou» defendendo o julgamento de improcedência da invocada questão da caducidade do direito de acção.

4. Face ao estado dos presentes autos não se justifica a prolação de «despacho pré-saneador» [artigo 87º do CPTA], nem, com a anuência das partes, a realização de «audiência prévia».

II. Despacho Saneador

1. O Tribunal é competente. O processo é o próprio e sem nulidades. As partes, dotadas de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas.

2. Para além da questão da caducidade do direito de acção, suscitada pelo réu, não há qualquer outra que cumpra conhecer antes da apreciação do «mérito da acção», caso tal se mostre possível.

3. Passemos, portanto, ao conhecimento da excepção invocada, começando por elencar os factos pertinentes e que se encontram já provados.

III. De Facto

Encontram-se já adquiridos nos autos os seguintes factos pertinentes:

1. A autora é Juiz de Direito, a exercer funções no Tribunal Administrativo e Fiscal de ...... [TAF ......] na área de contencioso administrativo - acordo;

2. No período de 04.09.2015 a 04.12.2015, esteve em situação de incapacidade temporária para o trabalho devido a «gravidez de risco» - documentos de folhas 21 a 23 destes autos;

3. Nesse período manteve-se em repouso total na sua residência - sita na Rua ……, nº……, ……, no Porto - por «risco de parto prematuro» - acordo;

4. No dia 04.12.2015 nasceu a sua filha [………] - documento de folha 24 destes autos;

5. Desde 04.12.2015 até 01.05.2016, a autora gozou «licença de parentalidade» - documento de folha 23 destes autos;

6. Durante todo esse período - 04.12.2015 a 01.05.2016 - manteve-se afastada do serviço, e não se deslocou ao TAF de ...... - acordo;

7. No dia 02.05.2016 regressou ao seu serviço no TAF de ...... - acordo;

8. A autora foi sujeita a «inspecção judicial» ao serviço prestado entre 01.09.2012 e 30.01.2015 [processo de inspecção nº1369 do CSTAF] - documento de folha 25 destes autos;

9. Por deliberação de 27.10.2015, e no âmbito desse processo de inspecção, o CSTAF atribuiu-lhe a classificação de serviço de «BOM» - documento de folhas 26 a 29 destes autos;

10. Por carta registada em 30.10.2015, esta deliberação foi enviada à autora pelo ofício nº1078 - datado de 28.10.2015 - para o seu domicílio profissional: Tribunal Administrativo e Fiscal de ......, Rua de ……, nº…, ……-……, …… - documento de folha 25 destes autos e 51 do PA;

11. E foi recepcionada, no TAF de ......, em 02.11.2015 - acordo;

12. Posteriormente, o Secretário do TAF de ...... remeteu-a para o referido domicílio da autora - acordo;

13. Em 16.11.2015, a autora remeteu ao CSTAF - por carta registada com A/R - requerimento a solicitar elementos relativos ao processo de inspecção realizado aos juízes de direito do «I Curso Normal de Formação de Magistrados para os Tribunais Administrativos e Fiscais» - documento de folhas 30 a 37 destes autos, e 53 e 54 do PA;

14. Em 17.11.2015, este requerimento foi recebido no CSTAF - documento de folha 35 destes autos, e 53 do PA;

15. A autora remeteu esse requerimento do seu domicílio - sito na Rua ……, nº……, ……, no Porto - e terminou o mesmo da seguinte forma: «Mais solicita que, face ao curto prazo de que dispõe para reagir administrativa e/ou judicialmente da deliberação desse Conselho, que o presente requerimento seja apreciado com a maior brevidade e que tais elementos lhe sejam remetidos para o seguinte endereço: Rua ……, ……, ……, 4100-…… Porto» - documento de folhas 33 e 34 destes autos, e 53 e 54 do PA;

16. Em 04.12.2015 a autora remeteu ao CSTAF, por carta registada com A/R, da sua residência - sita na Rua ……, nº……, ……, no Porto - RECLAMAÇÃO da deliberação de 27.10.2015 - documentos de folhas 37 a 50 destes autos, e folhas 58 a 70 do PA;

17. Esta reclamação foi recebida no CSTAF em 07.12.2015 - documento de folha 50 destes autos;

18. Por deliberação de 19.04.2016, o CSTAF indeferiu liminarmente essa «reclamação» da autora, por entender que tendo ela sido notificada da «deliberação reclamada» em 02.11.2015, no dia 07.12.2015 estava já esgotado o prazo de 15 dias úteis de que dispunha - documento de folhas 52 a 54 destes autos;

19. Por carta registada em 22.04.2016, esta deliberação foi enviada à autora, pelo ofício nº480 - datado de 20.04.2016 - para o seu domicílio profissional: Tribunal Administrativo e Fiscal de ......, Rua de ……, nº……, ……-……, ……… - documento de folha 78 e verso do PA;

20. E aí foi recepcionada em 26.04.2016 - documento de folha 113 destes autos;

21. Em 02.05.2016, quando regressou ao serviço, foi entregue à autora o ofício do CSTAF - nº480 - notificando-a da deliberação de 19.04.2016 - por acordo;

22. Por deliberação de 24.05.2016, e na sequência de pedido de reapreciação feito pela autora - em 12.05.2016 - o CSTAF manteve a decisão de indeferimento liminar da referida reclamação - documento de folhas 55 a 67 destes autos, e 79 a 81 do PA;

23. Por carta registada em 27.05.2016, esta deliberação foi enviada à autora, pelo ofício nº616 - datado de 25.05.2016 - para o seu domicílio profissional: Tribunal Administrativo e Fiscal de ......, Rua de ……, nº……, ……-……, …… - documento de folha 98 do PA;

24. A petição inicial desta «acção administrativa» [AA] deu entrada em tribunal [STA] no dia 01.06.2016 - folha 2 destes autos.

IV. De Direito

1. Conforme decorre da matéria de facto provada, a deliberação de 19.04.2016, através da qual o CSTAF indeferiu liminarmente a reclamação apresentada pela autora, por considerá-la extemporânea, foi-lhe notificada por carta registada de 22.04.2016 e recebida no TAF de ...... em 26.04.2016 [pontos 18, 19 e 20 do provado].

A presente acção administrativa [AA] deu entrada neste STA em 01.06.2016 [ponto 24 do provado].

E com base nestes dados factuais, o CSTAF entende que a interposição da AA se mostra extemporânea, uma vez que o prazo para a intentar seria de 30 dias - por aplicação do artigo 169º do EMJ - contados nos termos do artigo 279º do Código Civil, sendo certo que entre a data da notificação - 26.04.2016 - e a da interposição da acção - 01.06.2016 - decorreram 36 dias.

Por via disso, e com fundamento na «intempestividade da acção», solicita a sua absolvição da instância ao abrigo do artigo 89º, nº2 e nº4 alínea k) do CPTA.

2. A autora discorda da assim invocada excepção por duas fundamentais razões: - primo, porque a notificação «enviada para o TAF de ......», e aí recebida em 26.04.2016, mostra-se irregular; - secundo, porque se o CSTAF entende que o prazo para a interposição da acção é o previsto no EMJ [artigo 169º] - entendimento de que ela não discorda - então, e por uma questão de lógica jurídica, deveria entender, também, que o prazo para a reclamação é o de 30 dias, previsto no artigo 167º nº1 do EMJ, e não, como efectivamente entendeu, que é o de 15 dias, previsto no artigo 191º, nº3, do CPA.

3. A alegada «irregularidade» da notificação de 26.04.2016 [pontos 19 e 20 do provado], brotará do facto de dever ter sido realizada para o domicílio pessoal da autora e não para o seu domicílio profissional. Efectivamente, explica a autora, o CSTAF sabia que ela se encontrava de licença de parentalidade desde 04.12.2015 [ponto 5 do provado], e que, por via do requerimento que lhe dirigiu em 16.11.2015 [pontos 13 a 15 do provado], sabia e devia enviar as notificações para o seu domicílio pessoal e não para o seu domicílio profissional.

4. Mas não será bem assim. Vejamos as pertinentes normas legais.

Estipula o artigo 57º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais [ETAF] que «Os juízes da jurisdição administrativa e fiscal formam um corpo único e regem-se pelo disposto na Constituição da República Portuguesa, por este Estatuto e demais legislação aplicável e, subsidiariamente, pelo Estatuto dos Magistrados Judiciais, com as necessárias adaptações».

Nos termos do artigo 87º do nosso Código Civil [CC], sobre o «domicílio legal dos empregados públicos» estipula-se que «1- Os empregados públicos, civis ou militares, quando haja lugar certo para o exercício dos seus empregos, têm nele domicílio...

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