Acórdão nº 070/23.3BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 24-01-2024

Data de Julgamento24 Janeiro 2024
Ano2024
Número Acordão070/23.3BALSB
ÓrgãoSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)
Acordam no Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

I – RELATÓRIO

I.1 Alegações

I. Banco 1..., S.A, inconformado com a decisão arbitral proferida no processo nº 612/2022-T, datada de 27 de abril de 2023 que correu termos no Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), julgou totalmente improcedente o pedido de pronúncia arbitral visando a declaração de ilegalidade da decisão de indeferimento da Reclamação Graciosa, apresentada pelo ora Recorrente a solicitar a anulação do ato tributário de (auto)liquidação de Imposto sobre o Valor Acrescentado (“IVA”) referente ao ano 2020, vem dela apresentar Recurso para Uniformização de Jurisprudência, para o Supremo Tribunal Administrativo, nos termos dos n.ºs 2 e 3 do artigo 25.º do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (“RJAMT”) e do artigo 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (“CPTA”).
O recorrente invoca oposição entre o acórdão arbitral recorrido e os seguintes arestos fundamento:
a) O acórdão arbitral, datado de e 26 de julho de 2021 proferida no processo n.º 885/2019-T quanto à questão «…de saber se, na aplicação do método de dedução de imposto incorrido nos bens e serviços de utilização mista, devem ser considerados no numerador e no denominador da fracção de cálculo o valor da transmissão das viaturas relativas à actividade de concessão de crédito com reserva de propriedade»
b) O acórdão arbitral, datado de 19 de outubro de 2022 proferida no processo n.º 493/2021-T, quanto à questão «…de se saber se, na aplicação do método de dedução do IVA incorrido na atividade de gestão da carteira própria de títulos, deve ser implementado um critério objetivo para determinação do imposto dedutível (em recursos exclusivos e partilhados) e, consequentemente, desconsiderados, na percentagem de dedução, os proveitos referentes a esta área».
II. A recorrente, veio apresentar alegações de recurso a fls. 4 a 52 do SITAF, no sentido de demonstrar alegada oposição de julgados, formulando as seguintes conclusões:
A. O presente Recurso tem como objeto a Decisão Arbitral proferida, a 27 de abril de 2023, no âmbito do processo n.º 612/2022-T, por Tribunal Arbitral constituído no âmbito do CAAD, a qual julgou improcedente o Pedido de Pronúncia Arbitral apresentado pelo ora Recorrente com vista à declaração de ilegalidade da decisão de indeferimento da Reclamação Graciosa do ato tributário de (auto)liquidação de IVA referente ao ano 2020.
B. Visou aquele Pedido de Pronúncia, no que concerne às áreas de atividade do Recorrente aqui em juízo – componente de CRP e gestão da carteira própria de títulos, a contestação do ato tributário de (auto)liquidação de IVA, referente ao ano 2020, materializada na declaração periódica de imposto com referência a dezembro do ano em apreço, no montante de € 2.665.410,60 e a consequente declaração de (i)legalidade daquele ato de (auto)liquidação de IVA.
C. O presente recurso baseia-se na contradição, sobre a mesma questão fundamental de direito, quanto à componente do CRP, entre a Decisão Recorrida e a Decisão Arbitral de 26 de julho de 2021, proferida no âmbito do processo n.º 885/2019-T, e quanto à componente da gestão da carteira própria de títulos, a contradição entre a Decisão Recorrida e a Decisão Arbitral de 19 de outubro de 2022, proferida no âmbito do processo n.º 493/2021-T, estando ambas as decisões disponíveis para consulta em https://www.caad.org.pt/.
D. Este recurso é interposto ao abrigo do disposto no n.º 2 do artigo 25.º do RJAMT e do artigo 152.º do CPTA – normas que consagram os requisitos de admissibilidade do recurso, para o Supremo Tribunal Administrativo, da Decisão Arbitral que tenha conhecido do mérito da pretensão deduzida, com vista à uniformização de jurisprudência.
E. In casu, encontram-se verificados os pressupostos legais para a admissibilidade do presente recurso da Decisão Recorrida, em virtude da sua manifesta oposição, quanto à componente da CRP, com a Decisão arbitral de 26 de julho de 2021 proferida no processo n.º 885/2019-T e, quanto à gestão de carteira própria de títulos, a sua oposição com a Decisão arbitral de 19 de outubro de 2022 proferida no processo n.º 493/2021-T.
1. Da oposição de acórdãos, quanto à componente de CRP, entre a Decisão recorrida e a Decisão arbitral de 26 de julho de 2021 proferida no processo n.º 885/2019-T
F. Com vista a demonstrar a existência de contradição, relativamente à mesma questão fundamental de direito, entre ambas as decisões aqui em confronto, em primeiro lugar, nota a Recorrente que se verifica uma identidade da questão de direito sobre que recaíram as decisões. De facto, em ambos os arestos aqui em confronto, a questão decidenda ou a questão colocada, expressamente identificada pelos Tribunais Arbitrais nas Decisões em análise, foi a de saber se, na aplicação do método de dedução do IVA incorrido na atividade de concessão de CRP, deve ser considerado o valor da transmissão das viaturas no numerador e no denominador da fração de cálculo da percentagem de dedução aplicada ao IVA incorrido pelo Recorrente nos recursos de utilização mista – cf. páginas 33, 35 e 36 da Decisão recorrida e página 17 da Decisão fundamento.
G. Adicionalmente, nota a Recorrente que se vislumbra, também, uma identidade substancial das situações fácticas subjacentes a ambas as decisões. Especificamente, ambas as decisões versaram sobre uma instituição de crédito, sujeito passivo “misto” para efeitos de IVA, que na sua atividade adquire recursos que são utilizados, simultaneamente, em operações tributadas que conferem o direito à dedução do imposto (v.g., locação financeira mobiliária, locação de cofre e custódia de títulos) e operações isentas do imposto que não permitem a dedução do IVA incorrido (nomeadamente concessão de crédito e operações associadas a pagamentos)-(Cf. pag. 30 da Decisão recorrida e pag. 6 da Decisão fundamento)
H. Em concreto, na Decisão Arbitral recorrida, referente ao IVA do ano 2020, foi dado como provado que: “[n]ão sendo viável ao Requerente determinar um ou vários critérios objetivos passíveis de permitir, de forma rigorosa e segura, o montante do IVA dedutível, através do método da afetação real, nas aquisições daqueles recursos de utilização mista, o Requerente aplicou o referido método da percentagem de dedução. O que foi efectuado no estrito cumprimento dos ditames constantes no ponto 9 do Ofício-Circulado n.º 30108, de 39 janeiro de 2009, do Gabinete do Subdiretor-geral da Área de Gestão Tributária do IVA, procedimento que determinou uma percentagem de dedução apurada para o ano de 2020 de 7% (…)” – cf. pontos l, m e n da matéria de facto da Decisão recorrida.
I. Acrescentando-se que “[e]ntende o Requerente que as restrições impostas pela AT no referido Ofício-Circulado não podiam ser aceites, porque manifestamente ilegais, e que, como tal, deveria ter: (…) b) [i]ncluído na percentagem de dedução: 1. os valores relativos à transmissão das viaturas no âmbito da atividade de CRP;” sendo que, “com tal correção na determinação da percentagem de dedução apurada para o ano 2020, a mesma passou a ser de 32% (ao invés de 7%) e o valor de IVA dedutível na aquisição de recursos de utilização mista passou a ser de € 10.719.376,96 (ao invés de € 2.359.297,35)” – cf. pontos p. e q. da matéria de facto da Decisão recorrida (realce nosso).
J. E, na Decisão fundamento, referente ao IVA do ano 2015, nos mesmos moldes, foi dado como provado que: “[p]ara determinar a medida de IVA dedutível relativamente às demais aquisições de bens e serviços, afectas indistintamente às diversas operações por si desenvolvidas, ou seja, aos recursos de “utilização mista”, o Requerente aplicou o método geral e supletivo da percentagem de dedução, previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 23.º do Código do IVA, sendo que “[a] determinação da percentagem de dedução, (…), foi concretizada através do cumprimento do disposto no Ofício-Circulado n.º 30108, de 30 de Janeiro de 2009, do Gabinete do Subdirector Geral da Área de Gestão Tributária do IVA”. Pelo que “(…) o Requerente apurou uma percentagem de dedução definitiva para o ano de 2015 de 7% (…)”. Não obstante, “[o] Requerente decidiu proceder à alteração da percentagem de dedução do imposto incorrido no ano 2015 no âmbito da actividade de crédito com reserva de propriedade e atendendo ao consumo de recursos necessários para o realizar passou a ter em consideração a componente de transmissão de viaturas no coeficiente de imputação específico. Da alteração da percentagem de dedução do imposto incorrido no ano 2015 resulta uma dedução adicional no montante de € 916.768,7019 ” – cf. pontos 12, 13, 29 e 30 da matéria de facto da Decisão fundamento.
K. Assim, e como não podia deixar de ser, na Decisão recorrida e na Decisão fundamento, foi dado como provado que o Recorrente, tendo verificado que, no âmbito da sua atividade de CRP, não estava a exercer plenamente o direito à dedução do IVA incorrido que lhe assistia, procedeu ao recálculo da percentagem de dedução (para os anos 2020 e 2015, respetivamente), passando a considerar, no numerador e no denominador da fração de cálculo, os montantes relativos à transmissão de viaturas adquiridas no âmbito da atividade de CRP. E que, na sequência daquele recálculo, o Recorrente – apurou, para o ano 2020, uma percentagem de dedução, atendendo à atividade de CRP, de 15% (em vez dos anteriores 8%). Por outro lado, no acórdão fundamento, a ali Requerente apurou, para o ano 2015, uma percentagem de dedução de 11% (em vez dos anteriores 9%). Deste modo, a aqui Recorrente constatou que a nova percentagem de dedução apurada conduziria a uma dedução adicional de € 2.344.863,71. Igualmente, na Decisão fundamento, o Recorrente (Requerente naqueles autos) constatou que a nova percentagem de dedução representaria um pagamento em excesso de IVA...

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