Acórdão nº 06A3231 de Supremo Tribunal de Justiça, 31-10-2006

Data de Julgamento31 Outubro 2006
Case OutcomeCONCEDIDA A REVISTA
Classe processualREVISTA
Número Acordão06A3231
ÓrgãoSupremo Tribunal de Justiça

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça

I – Nas Varas Cíveis da Comarca de Lisboa, Banco AA, S.A., em acção com processo ordinário, intentada contra BB, pediu que, com a procedência da acção, seja o Réu condenado a pagar ao Autor a importância de € 16.915,71, acrescida de € 1.903,46 de juros vencidos até ao presente – 22 de Fevereiro de 2002 – e de € 76,14 de imposto de selo sobre estes juros e, ainda, os juros que, sobre a dita quantia de € 16.915,71, se vencerem à taxa anual de 17,33 %, desde 23 de Fevereiro de 2002 até integral pagamento, bem como o imposto de selo que, à taxa de 4%, sobre estes juros recair.

Para fundamentar a sua pretensão, invoca um contrato de mútuo que celebrou com o Réu para aquisição de uma viatura e o não pagamento por este de prestações a que estava vinculado.

Contestou o Réu, defendendo que o contrato de mútuo não foi concluído, pelo que é inexistente.

Houve réplica.

A final, foi proferida sentença, segundo a qual a acção foi julgada improcedente, por não provada, e, consequentemente, foi o Réu absolvido do pedido, decisão que foi confirmada por acórdão proferido no Tribunal da Relação de Lisboa, após apelação do Autor.

Ainda inconformado, veio o Autor interpor o presente recurso de revista, o qual foi admitido.

O recorrente apresentou alegações, formulando as seguintes conclusões:
1ª - O contrato de mútuo dos autos foi assinado pelo punho do R., ora recorrido.

2ª - Do contrato de mútuo dos autos consta, das respectivas Condições Gerais – Cláusula 3ª –, que a concessão do empréstimo directo ao R., ora recorrido, no valor de Esc. 2.400.000$00 se considerava efectivada mediante a entrega desta importância directamente ao vendedor constante do contrato de mútuo dos autos.
3ª - A importância do referido crédito directo, no montante de Esc. 2.400.000$00, foi efectivamente entregue pelo A., ora recorrente, ao fornecedor do veículo.
4ª - O A., ora recorrente, não ajustou com o fornecedor do veículo qualquer acordo em que se tenha comprometido a financiar, em regime de exclusividade, as aquisições a crédito pelos clientes compradores deste de bens ou equipamentos, não tendo igualmente ajustado com o dito fornecedor qualquer acordo que obrigasse este a solicitar exclusivamente ao ora recorrente a concessão de financiamento para a aquisição a crédito pelos clientes compradores de bens ou equipamentos por ele vendidos.
5ª - As Condições Gerais do contrato dos autos não foram fisicamente inseridas no mesmo após a assinatura do referido contrato pelo recorrido.
6ª - Aliás, o próprio recorrido, como se vê do seu articulado de contestação, jamais pôs em causa que, aquando da assinatura do contrato de mútuo dos autos, ele não contivesse já, como continha, as respectivas Condições Específicas e Condições Gerais, todas elas impressas aliás.
7ª - O recorrido, “sempre que contactado pelo A., (ora recorrente), para proceder ao pagamento das prestações em débito relativamente ao contrato dos autos, nunca referiu que o mesmo não teria sido celebrado, pelo contrário, referiu que foi enganado pelo fornecedor e que não podia registar o veículo em seu nome, pelo que não iria proceder ao pagamento de mais prestações”.
8ª - A sentença confirmada pelo acórdão recorrido fez assim errada interpretação e aplicação da matéria de facto dada como provada nos autos, tendo violado o disposto no artigo 8º, alínea d), do Decreto-Lei 446/85, de 25 de Outubro, e, consequentemente, o disposto nos artigos 405º, 406º e 1142º do Código Civil, donde o presente recurso dever ser julgado procedente e provado e, em consequência, revogada a sentença recorrida e a mesma substituída por acórdão que julgue a acção inteiramente procedente e provada, nos precisos termos que dela constam.

Contra-alegou o recorrido, defendendo a manutenção da decisão impugnada.

Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

II – Ao abrigo do disposto no artigo 713º, nº 6, aqui aplicável por força do artigo 726º, ambos do Código de Processo Civil, remete-se para a fundamentação de facto constante do acórdão recorrido, a qual se dá por reproduzida.

III – 1. Entenderam as instâncias (a Relação com um voto de vencido) ser de excluir do contrato de mútuo a que os autos se reportam a cláusula 3ª das Condições Gerais, nos termos do artigo 8º do Decreto-Lei nº 446/85, de 25 de Outubro, pelo facto de a mesma se inserir na 2ª página do contrato e ser posterior à aposição das assinaturas dos contraentes.

A cláusula 3ª, sob a epígrafe UTILIZAÇÃO DO EMPRÉSTIMO, refere:
“O empréstimo considera-se utilizado com a entrega pelo Banco Mais de um cheque emitido à ordem do Mutuário ou do Fornecedor do bem a adquirir pelo Mutuário, no montante do empréstimo fixado nas Condições Específicas”.

2. Estamos perante um contrato de mútuo (oneroso) – artigo 1142º do Código Civil.
Deve o contrato ser qualificado como um contrato de adesão, com inclusão de cláusulas contratuais gerais – artigo 1º do citado DL 446/85.
Trata-se igualmente de uma operação de crédito, realizada por uma instituição de crédito ou parabancária – artigo 1º do Decreto-Lei nº 344/78, de 17 de Novembro.

Estamos, pois, aqui no âmbito das denominadas “cláusulas contratuais gerais”, regidas pelo Decreto-Lei nº 446/85, de 25 de Outubro, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei nº 220/95, de 31 de Agosto, pelo Decreto-Lei nº 249/99, de 7 de Julho, e pelo artigo 24º do Anexo ao Decreto-Lei nº 323/2001, de 17 de Dezembro.

Assim, a falta de negociação prévia sobre a matéria versada em cláusulas desta natureza faz nascer o risco de o contraente que a elas se submete sem ter participado na sua elaboração o fazer de modo pouco esclarecido e consciente, assim chamando a si obrigações cujo alcance e medida não ponderou devidamente, em clara postergação do princípio da liberdade negocial.

Quis, por isso, o legislador acautelar a sua posição, para tanto impondo a observação de certas práticas na celebração dos contratos e limitando a margem de arbítrio das partes na definição do conteúdo concreto do acordo celebrado (cfr. acórdão da Relação de Lisboa de 21.01.2003, in CJ, Ano XXVII-2003, Tomo I, pág. 70).

Há, pois, que saber se as “Condições Gerais” impressas em documento autónomo ou no verso do documento formalizador do contrato, assinado pelos outorgantes no documento ou no seu rosto (onde foram apostas as assinaturas), devem ou não ser excluídas do contrato,

Nos artigos 5º e 6º do citado DL 446/85, é imposto à parte que utilize cláusulas gerais contratuais pré-formuladas para uma pluralidade de contratos, independentemente das pessoas que as venham a
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