Acórdão nº 0555/18.3BECBR de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 17-10-2024

Data de Julgamento17 Outubro 2024
Número Acordão0555/18.3BECBR
Ano2024
ÓrgãoSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)
Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

- Relatório -

1 –
A..., LDA, com os sinais dos autos, não se conformando com o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 7 de fevereiro de 2024, proferido nos presentes autos, vem, nos termos da al. b) do n.º 1 do artigo 284.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), dele interpor recurso para uniformização de jurisprudência, por alegada oposição com o decidido no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 13 de dezembro de 2023, proferido no processo n.º 02922/12.7BELRS, no que respeita às questões de saber se a aplicação correta da taxa de IVA é um requisito formal ou substancial e se a liquidação de uma taxa incorreta impede o direito à dedução do imposto.

A recorrente termina a sua alegação de recurso formulando as seguintes conclusões:
1. O presente recurso é dirigido contra o Acórdão do STA proferido nos autos, por na modesta opinião da ora Recorrente se encontrar em direta Oposição, com o Acórdão igualmente do STA, de 13 de Dezembro de 2023, proferido no âmbito do no Processo n.º 2922/12, sobre a mesma questão de direito.
2. Não existe jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo, que perfilhe orientação semelhante à do Acórdão Impugnado.
3. O Acórdão impugnado proferido nos presentes autos e o Acórdão fundamento, proferido pelo STA a 13 de Dezembro de 2023, no âmbito do Processo n.º 2922/12, debruçam-se sobre as seguintes duas questões de direito, perfilhando posições opostas: (i) a correta taxa de IVA ser um requisito formal ou substancial; (ii) se o facto de não ter sido liquidado IVA à taxa correta impede o direito à dedução do imposto.
4. O Acórdão impugnado proferido nos presentes autos, defende que (i) a aplicação da correta taxa de IVA que é um requisito substancial, aderindo ao decidido em 1ª Instância pelo TAF de Coimbra e que (ii) a liquidação de IVA a uma taxa incorreta impede o direito à dedução.
5. O Acórdão fundamento, proferido pelo STA a 13 de Dezembro de 2023, no âmbito do Processo n.º 2922/12 entende que (i) taxa correta é um requisito formal e que (ii) o direito à dedução é aceite independentemente da taxa de IVA aplicada, indo até mais longe, sufragando o entendimento de que até nos casos em que não é possível saber qual a taxa a aplicar, se tiver sido aplicada a taxa máxima de 23% o imposto é dedutível.
6. O Acórdão ora colocado em crise assume que o Acórdão fundamento, proferido no âmbito no Processo n.º 2922/12, trata das mesmas questões de direito.
7. Paradoxalmente, o Acórdão impugnado assume que o Acórdão fundamento tem entendimento igual, quando este último fundamenta e se pronuncia no sentido de admitir o direito à dedução, ao contrário do constante da decisão ora colocada em crise.
8. A Recorrente adere ao entendimento constante do Acórdão, do STA de 13 de Dezembro de 2023, proferido no âmbito do no Processo n.º 2922/12, discordando do entendimento seguido nos presentes autos pelo Acórdão impugnado.
9. Conforme foi já assumido por diversas vezes pelo Tribunal de Justiça da União, a taxa não é um requisito substancial de (vide Acórdão PPUH Stehcemp, de 22 de Outubro de 2015, no âmbito do proc. nº C-277/14, bem como acórdãos Centralan Property, C-63/04, EU:C:2005:773, n.° 52; Tóth, C-324/11, EU:C:2012:549, n.° 26; Bonik, C-285/11, EU:C:2012:774, n.° 29; e despacho Jagiełło, C-33/13, EU:C:2014:184, n.° 27.
10. Conforme discorre da mencionada jurisprudência comunitária, são condições materiais requeridas para a constituição do direito a dedução, que o interessado seja um sujeito passivo no sentido da 6ª Diretiva e “que os bens e serviços invocados para fundamentar esse direito sejam utilizados pelo sujeito passivo a jusante para os efeitos das suas próprias operações tributadas e que, a montante, esses bens tenham sido entregues ou os serviços prestados por outro sujeito passivo”.
11. A al. d) do n.º 5 do art. 36.º do CIVA refere “As taxas aplicáveis e o montante de imposto devido”, como elementos formais, tendo o cuidado de dar ênfase a que não são quaisquer taxas, mas as “aplicáveis”, ou sejas as legais.
12. Assim, sem mais, tal como exposto no Acórdão Fundamento a taxa de imposto correta ou não, deve ser entendida como um requisito formal e não um requisito material do direito à dedução, o que deve, sem mais, nessa medida conduzir à anulação do Acórdão impugnado, bem como dos atos tributários impugnados nos autos, respeitantes à correção que foi feita à Recorrente respeitante ao direito à dedução, por violação direta do disposto nos arts. 19.º n.º 1 e 2 do CIVA, da na al. d) do n.º 5 do art. 36.º do CIVA, bem como do artigo 17.°, n.° 2, alínea a), da Sexta Diretiva.
13. E note-se – elemento aqui apresentado estritamente à cautela - que é assumido no Acórdão recorrido, bem como na Sentença de 1.ª Instância, que a Recorrente pagou o imposto que lhe foi liquidado pelos fornecedores, que as operações de aquisição são reais, tal como as subsequentes vendas dos bens fornecidos.
14. O entendimento constante do Acórdão impugnado de que a menção incorreta da taxa de imposto impede o direito à dedução não pode manter-se por violação frontal do disposto no art. 19.º n.º 2, em consonância com a posição vertida no Acórdão fundamento.
15. Para efeitos do direito à dedução a taxa de IVA concretamente aplicada é irrelevante, sendo que até nos casos em que se desconheça qual a taxa a aplicar por dúvidas acerca da natureza dos serviços, nem por isso pode ser limitado ou eliminado o direito à dedução (vide nesse sentido Acórdão do TJUE de 24-05-2023, no âmbito do Proc. nº C-690/22 – Acórdão Barlis).
16. Conforme resulta do parecer do Prof. Xavier do Basto junto aos autos:Nenhuma disposição do CIVA, nem da directiva europeia, faz depender o cumprimento das formalidades da factura, e o consequente direito à dedução do respectivo destinatário, da aplicação correcta da taxa do imposto por parte do emissor. A factura está formalmente correcta desde que indique a taxa de imposto e o imposto liquidado. Se as condições materiais do direito à dedução estiverem preenchidas – ou seja, se os bens foram efectivamente usados nas operações activas do sujeito passivo, sujeitas a imposto – o destinatário da factura tem o direito a deduzir integralmente o imposto suportado.
17. O Acórdão Genius Holding, de 13 de Dezembro de 1989 – C-342/87, referido no Acórdão impugnado, não pode ser mobilizado para a análise do direito à dedução em Portugal, pois reporta-se a um ordenamento jurídico diverso do português.
18. Enquanto que, no caso nacional, o art. 78.º n.º 3 do CIVA não obriga à retificação do IVA liquidado a mais, o Acórdão Genius parte de um quadro legal em que existe sempre a obrigação de corrigir a liquidação indevida de imposto, seja a mais ou a menos.
19. Ora, sendo em Portugal a correção é meramente facultativa e não obrigatória, já não se justifica a ratio estabelecida pelo Acórdão Genius de que, por a correção ser obrigatória, limita o direito à dedução ao imposto corretamente apurado, para não existir o risco de haver dedução superior ao imposto que foi posteriormente corrigido.
20. Entendimento diverso colocaria o Acórdão Genius em contradição com o mais recente Acórdão C-566/07, Stadeco, que afirma explicitamente o direito à dedução de faturas com liquidação de IVA indevido.
21. A jurisprudência nacional do STA vai também no sentido de admitir o direito à dedução do IVA, mesmo que indevidamente liquidado (vide Acórdão do STA proferido no processo n.º 0555/12, de 26/9/2012 e Acórdão do TCA do Sul proferido no processo n.º 07111/13, de 4/6/2015).
22. Para além disso o Acórdão Genius reporta-se e a uma situação fáctica bem diversa da constante do Acórdão impugnado e do Acórdão fundamento, já que a situação do Acórdão Genius reporta-se à liquidação de IVA numa operação em que não havia lugar a qualquer liquidação de imposto e as situação analisadas nos Acórdãosimpugnado e fundamento estão relacionadas com operações sujeitas em que houve dúvida e divergência da taxa de IVA aplicada.
23. Da mesma forma não é mobilizável para a situação vertente a doutrina do Acórdão Fatorie, de 6 de Fevereiro de 2012 –Processo C-424/12 do TJUE, está onde discussão (i) um quadro legal totalmente diferente do português, (ii) em que o titular do direito à dedução violou diretamente a lei não entregando ao Estado o imposto em auto-liquidação que lhe era legalmente imposto (iii) estando em causa a impossibilidade legal da autoridade tributária nacional poder sequer controlar a operação.
24. Ao invés, já é amplamente mobilizável a doutrina do Acórdão do TJUE no processo C-453/22, de 7 de Setembro de 2023 (Schütte), onde é assumido que numa situação de compra de madeira, em que foi liquidado IVA a uma taxa superior à devida ao adquirente, este último tem direito a deduzir o IVA pago (o que só seria posto em causa se existissem situações de fraude ou de abuso).
25. Donde, deve ser aceite a posição jurídica perfilhada pelo Acórdão fundamento, que considera existir direito à dedução do IVA, ainda que o mesmo tenha sido liquidado a uma taxa diversa da legal, ou mesmo que não haja certeza sobre a taxa a aplicar, anulando-se, consequentemente o Acórdão impugnado, bem como os atos tributários sub judice, respeitantes à não aceitação da dedução do imposto pela Recorrente.

2 – Não foram apresentadas contra-alegações.

3 – O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto junto deste Supremo Tribunal Administrativo emitiu douto parecer no sentido de que não se encontram reunidos os requisitos legais para a prolação de acórdão de uniformização de jurisprudência porquanto “(…) as situações de facto em cada um dos processos revelam diferenças relevantes, atento que no acórdão recorrido está em causa a aplicação incorreta de diferentes taxas de IVA nos...

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