Acórdão nº 05123/09 de Tribunal Central Administrativo Sul, 18-06-2009
Judgment Date | 18 June 2009 |
Acordao Number | 05123/09 |
Year | 2009 |
Court | Tribunal Central Administrativo Sul |
Laboratórios P..., Lda., sociedade comercial com os sinais nos autos, inconformada com a sentença proferida pela Mma. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra que julgou improcedente o pedido cautelar de suspensão de eficácia dos despachos de AIM datados de 16.09.2008 e 30.09.2008 proferidos pelo ora Recorrido Infarmed - Instituto Nacional da Farmácia e do Medicamento, IP e de intimação à abstenção de prática de quaisquer actos administrativos e/ou operações materiais relacionados com os actos impugnados, dela vem recorrer, concluindo como segue:
1. A decisão recorrida enferma de erro de julgamento, na parte em que decidiu julgar improcedente o pedido de adopção de providência cautelar de suspensão de eficácia dos actos administrativos através dos quais foi concedida, à Contra-Interessada, a autorização para introdução no mercado de medicamento contendo como princípio activo a Atorvastatina;
2. Os actos suspendendos são manifestamente ilegais por violação das regras aplicáveis do Estatuto do Medicamento, nomeadamente, os artigos 15.º, 19º, nº l e 25.-, uma vez que ofendem direitos de propriedade industrial da Recorrente, sendo certo que a necessária observância dos direitos de propriedade industrial de terceiros, titulares de patentes válidas relativas ao medicamento de referência, é pressuposto da decisão de introdução no mercado de medicamentos genéricos, como resulta inequivocamente das referidas disposições do Estatuto do Medicamento;
3. Os actos suspendendos, ao terem sido praticados ao arrepio dos direitos de propriedade industrial da Recorrente, ofendem, ainda, o conteúdo essencial de um direito fundamental, sendo por isso nulos, nos termos do ns2, alínea d) do artigo 133a do CP A;
4. Contrariamente ao que julgou o Tribunal a quo, os actos suspendendos violam de forma evidente os princípios da actividade administrativa, designadamente os princípios da legalidade e do inquisitório, previstos nos artigos 3º e 56.- do Código de Procedimento Administrativo;
5. Finalmente, os actos suspendendos violam também o direito de audiência prévia, previsto no artigo 100ºl do mesmo Código, pelo que também por esta razão padece a decisão recorrida de erro de julgamento;
6. Os argumentos invocados evidenciam, de forma manifesta, a procedência da pretensão a formular no processo principal, por estar em causa a impugnação de acto manifestamente ilegal e, concretamente, de acto nulo, por violação do conteúdo essencial de um direito fundamental, pelo que deveria ter sido decretada a providência pelo Tribunal a quo, nos termos do artigo 120a, al. a) do CPTA;
7. Ao não ter decretado a providência com base na manifesta ilegalidade do acto em crise, a decisão recorrida enferma de erro de julgamento;
8. Ainda que se considerasse não ser manifesta a falta de fundamento da pretensão a formular na acção principal, é inequívoco o preenchimento dos requisitos previstos no artigo 120º, nºl, al b) do CPTA, pelo que deveria ter sido decretada a providência com fundamento na verificação de tais requisitos;
9. Com efeito, não sendo decretada a requerida suspensão de eficácia, a Recorrente confrontar-se-á inevitavelmente com uma situação de facto consumado que se consubstancia, desde logo, na violação dos seus direitos de propriedade industrial, por efeito da comercialização dos medicamentos genéricos a que se referem as autorizações suspendendas;
10. Direitos estes que, conforme foi o entendimento do TCA Sul, no Acórdão proferido em 14.02.2008, são directamente afectados pela AIM, uma vez que esta é "a decisão administrativa principal no que respeita à comercialização do medicamento e integra a fase do procedimento em que se mostra adequado a consideração do exclusivo de terceiro, que se refere a esse determinado produto" (cf. Acórdão citado supra);
11. Por outro lado, ao não ser decretada a suspensão das referidas autorizações de introdução no mercado, a comercialização dos medicamentos genéricos a que se referem tais autorizações na pendência da acção administrativa especial determinará, de forma muito rápida e irreversível, a diminuição da quota de mercado do medicamento de referência e a diminuição das vendas deste;
12. Tal constatação é demonstrada pelos dados fornecidos pela Recorrente, assentes em estimativas baseadas nas regras de experiência do mercado em circunstâncias análogas - tendo por referência os dados relativos às vendas dos medicamentos Norvasc, Zoloft e Zocor - e é confirmada através de dados disponibilizados no site oficial do Recorrido;
13. Com forte probabilidade, a Recorrente estima que as receitas das vendas do Zarator possam decair em 50% a partir do prazo de um ano a contar do início de comercialização do genérico.
14. Além disso, é fortemente provável a ocorrência de uma diminuição irreversível da quota de mercado da Recorrente
15. O que, inevitavelmente, causará ainda uma série de danos consequentes, tais como a desmobilização de parte significativa da estrutura de comercialização do medicamento de referência, com a consequente diminuição de postos de trabalho;
16. Ao contrário do entendido pelo Tribunal a quo, os prejuízos invocados não são susceptíveis de reparação pela via indemnizatória, pois, mesmo concebendo a hipótese de reintegração pecuniária dos prejuízos sofridos, não só o cálculo destes se mostrará extremamente difícil, como ainda o Recorrido não logrará, em caso algum, devolver à Recorrente a sua actual posição no mercado.
17. Com efeito, conforme considerou o Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, em decisão datada de 30.04.2008, "ainda que se afigurasse possível quantificar, por referência a médias de anos anteriores, o volume que deixou de ser vendido, sempre ficariam por determinar os efeitos da introdução do medicamento (genérico) no mercado ao nível da clientela que, deixando de consumir o medicamento de referência por um determinado período, poderia, ainda que a comercialização do referido genérico viesse a ser descontinuada, em consequência da eventual procedência da acção principal, não voltar a consumi-lo";
18. Encontra-se, por isso, também, inequivocamente, preenchido o primeiro dos requisitos de que o artigo 120º, nº l, alínea b) do CPTA faz depender a concessão da providência, ou seja, aexistência de fundado receio da constituição de uma situação de facto consumada ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que a Recorrente pretende ver reconhecidos no processo principal (periculum in mora);
19. Assim sendo, a decisão proferida pelo Tribunal a í/mo, que entendeu não considerar verificado, no caso concreto, o requisito do periculum in mora, necessário para o decretamento da providência requerida, enferma, neste ponto, de erro de julgamento;
20. Quando ao segundo requisito - que não seja manifesta a falta de fundamento da pretensão que a Recorrente visa assegurar no processo principal (fumus boni juris ou aparência de bom direito) e que não existam circunstâncias que obstem ao seu conhecimento de mérito -não existe qualquer dúvida de que o mesmo se encontra preenchido pois a Recorrente demonstrou ser manifesta a ilegalidade dos actos em crise, o que preenche, por excesso, o requisito da norma;
21. Finalmente, quanto à ponderação dos interesses susceptíveis de serem lesados, nos termos do n.º 2 do artigo 120º do CPTA, a Recorrente demonstrou a inexistência de danos relevantes que possam resultar da suspensão de eficácia dos actos em crise, pelo que se encontram verificados todos os pressupostos para que seja revogada a decisão em crise e substituída por decisão que decrete a suspensão de eficácia dos actos de autorização de introdução no mercado de medicamentos genéricos de Atorvastatina concedidas às contra-interessadas.
Nestes termos e nos demais de direito aplicáveis, requer-se aos Venerandos Desembargadores deste Tribunal que se dignem revogar a decisão do Tribunal a quo e substituí-la por decisão que:
a) Decrete a suspensão de eficácia dos actos de autorização de introdução no mercado de medicamentos genéricos de Atorvastatina concedidas às contra-interessadas L...e T...; e
b) Intime o Recorrido a abster-se de praticar quaisquer actos administrativos e operações materiais relacionados com os actos mencionados na alínea anterior.
*
O Recorrido Infarmed - Instituto Nacional da Farmácia e do Medicamento, IP contra-alegou, concluindo como segue:
1. Nos autos em causa discutiu-se uma providência conservatória relativa à suspensão da eficácia de actos de concessão de AIM;
2. Da análise efectuada à douta sentença resulta que o Tribunal concluiu, e bem, que não estava perante qualquer acto manifestamente ilegal, pois este requer-se ostensivo e flagrante, o que não é de todo o caso, não se verificando, assim, o requisito exigido na ai. a) do n.° l do art. 120° do CPTA;
3. Não se verifica o periculum in mora como concluiu a douta sentença, visto que não existe um fundado receio de facto consumado ou da verificação da produção de prejuízos de difícil reparação.
4. Por outro lado, a ver i ficarem-se prejuízos, estes seriam sempre decorrentes da comercialização e não da concessão de AIM, não existindo qualquer nexo de causalidade entre aqueles e os actos de concessão de AIM.
5. Além de que, esses eventuais prejuízos nunca seriam graves prejuízos.
6. Por outro lado, caso fosse concedida a providência também não se verificaria a proporcionalidade exigida nos termos do n.° 2 do art. 120° do CPTA.
7. Não se verificam nos autos os requisitos necessários para a concessão da providência requerida pela Recorrente.
*
A contra-interessada L...–Laboratórios Almiro SA contra-alegou, concluindo como segue:.
1. O Tribunal a quo interpretou e aplicou correctamente os art. 19º e 25º do Estatuto do Medicamento.
2. A protecção concedida pelo Estatuto do Medicamento ao titular da AIM do medicamento de referência refere-se à comercialização...
1. A decisão recorrida enferma de erro de julgamento, na parte em que decidiu julgar improcedente o pedido de adopção de providência cautelar de suspensão de eficácia dos actos administrativos através dos quais foi concedida, à Contra-Interessada, a autorização para introdução no mercado de medicamento contendo como princípio activo a Atorvastatina;
2. Os actos suspendendos são manifestamente ilegais por violação das regras aplicáveis do Estatuto do Medicamento, nomeadamente, os artigos 15.º, 19º, nº l e 25.-, uma vez que ofendem direitos de propriedade industrial da Recorrente, sendo certo que a necessária observância dos direitos de propriedade industrial de terceiros, titulares de patentes válidas relativas ao medicamento de referência, é pressuposto da decisão de introdução no mercado de medicamentos genéricos, como resulta inequivocamente das referidas disposições do Estatuto do Medicamento;
3. Os actos suspendendos, ao terem sido praticados ao arrepio dos direitos de propriedade industrial da Recorrente, ofendem, ainda, o conteúdo essencial de um direito fundamental, sendo por isso nulos, nos termos do ns2, alínea d) do artigo 133a do CP A;
4. Contrariamente ao que julgou o Tribunal a quo, os actos suspendendos violam de forma evidente os princípios da actividade administrativa, designadamente os princípios da legalidade e do inquisitório, previstos nos artigos 3º e 56.- do Código de Procedimento Administrativo;
5. Finalmente, os actos suspendendos violam também o direito de audiência prévia, previsto no artigo 100ºl do mesmo Código, pelo que também por esta razão padece a decisão recorrida de erro de julgamento;
6. Os argumentos invocados evidenciam, de forma manifesta, a procedência da pretensão a formular no processo principal, por estar em causa a impugnação de acto manifestamente ilegal e, concretamente, de acto nulo, por violação do conteúdo essencial de um direito fundamental, pelo que deveria ter sido decretada a providência pelo Tribunal a quo, nos termos do artigo 120a, al. a) do CPTA;
7. Ao não ter decretado a providência com base na manifesta ilegalidade do acto em crise, a decisão recorrida enferma de erro de julgamento;
8. Ainda que se considerasse não ser manifesta a falta de fundamento da pretensão a formular na acção principal, é inequívoco o preenchimento dos requisitos previstos no artigo 120º, nºl, al b) do CPTA, pelo que deveria ter sido decretada a providência com fundamento na verificação de tais requisitos;
9. Com efeito, não sendo decretada a requerida suspensão de eficácia, a Recorrente confrontar-se-á inevitavelmente com uma situação de facto consumado que se consubstancia, desde logo, na violação dos seus direitos de propriedade industrial, por efeito da comercialização dos medicamentos genéricos a que se referem as autorizações suspendendas;
10. Direitos estes que, conforme foi o entendimento do TCA Sul, no Acórdão proferido em 14.02.2008, são directamente afectados pela AIM, uma vez que esta é "a decisão administrativa principal no que respeita à comercialização do medicamento e integra a fase do procedimento em que se mostra adequado a consideração do exclusivo de terceiro, que se refere a esse determinado produto" (cf. Acórdão citado supra);
11. Por outro lado, ao não ser decretada a suspensão das referidas autorizações de introdução no mercado, a comercialização dos medicamentos genéricos a que se referem tais autorizações na pendência da acção administrativa especial determinará, de forma muito rápida e irreversível, a diminuição da quota de mercado do medicamento de referência e a diminuição das vendas deste;
12. Tal constatação é demonstrada pelos dados fornecidos pela Recorrente, assentes em estimativas baseadas nas regras de experiência do mercado em circunstâncias análogas - tendo por referência os dados relativos às vendas dos medicamentos Norvasc, Zoloft e Zocor - e é confirmada através de dados disponibilizados no site oficial do Recorrido;
13. Com forte probabilidade, a Recorrente estima que as receitas das vendas do Zarator possam decair em 50% a partir do prazo de um ano a contar do início de comercialização do genérico.
14. Além disso, é fortemente provável a ocorrência de uma diminuição irreversível da quota de mercado da Recorrente
15. O que, inevitavelmente, causará ainda uma série de danos consequentes, tais como a desmobilização de parte significativa da estrutura de comercialização do medicamento de referência, com a consequente diminuição de postos de trabalho;
16. Ao contrário do entendido pelo Tribunal a quo, os prejuízos invocados não são susceptíveis de reparação pela via indemnizatória, pois, mesmo concebendo a hipótese de reintegração pecuniária dos prejuízos sofridos, não só o cálculo destes se mostrará extremamente difícil, como ainda o Recorrido não logrará, em caso algum, devolver à Recorrente a sua actual posição no mercado.
17. Com efeito, conforme considerou o Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, em decisão datada de 30.04.2008, "ainda que se afigurasse possível quantificar, por referência a médias de anos anteriores, o volume que deixou de ser vendido, sempre ficariam por determinar os efeitos da introdução do medicamento (genérico) no mercado ao nível da clientela que, deixando de consumir o medicamento de referência por um determinado período, poderia, ainda que a comercialização do referido genérico viesse a ser descontinuada, em consequência da eventual procedência da acção principal, não voltar a consumi-lo";
18. Encontra-se, por isso, também, inequivocamente, preenchido o primeiro dos requisitos de que o artigo 120º, nº l, alínea b) do CPTA faz depender a concessão da providência, ou seja, aexistência de fundado receio da constituição de uma situação de facto consumada ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que a Recorrente pretende ver reconhecidos no processo principal (periculum in mora);
19. Assim sendo, a decisão proferida pelo Tribunal a í/mo, que entendeu não considerar verificado, no caso concreto, o requisito do periculum in mora, necessário para o decretamento da providência requerida, enferma, neste ponto, de erro de julgamento;
20. Quando ao segundo requisito - que não seja manifesta a falta de fundamento da pretensão que a Recorrente visa assegurar no processo principal (fumus boni juris ou aparência de bom direito) e que não existam circunstâncias que obstem ao seu conhecimento de mérito -não existe qualquer dúvida de que o mesmo se encontra preenchido pois a Recorrente demonstrou ser manifesta a ilegalidade dos actos em crise, o que preenche, por excesso, o requisito da norma;
21. Finalmente, quanto à ponderação dos interesses susceptíveis de serem lesados, nos termos do n.º 2 do artigo 120º do CPTA, a Recorrente demonstrou a inexistência de danos relevantes que possam resultar da suspensão de eficácia dos actos em crise, pelo que se encontram verificados todos os pressupostos para que seja revogada a decisão em crise e substituída por decisão que decrete a suspensão de eficácia dos actos de autorização de introdução no mercado de medicamentos genéricos de Atorvastatina concedidas às contra-interessadas.
Nestes termos e nos demais de direito aplicáveis, requer-se aos Venerandos Desembargadores deste Tribunal que se dignem revogar a decisão do Tribunal a quo e substituí-la por decisão que:
a) Decrete a suspensão de eficácia dos actos de autorização de introdução no mercado de medicamentos genéricos de Atorvastatina concedidas às contra-interessadas L...e T...; e
b) Intime o Recorrido a abster-se de praticar quaisquer actos administrativos e operações materiais relacionados com os actos mencionados na alínea anterior.
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O Recorrido Infarmed - Instituto Nacional da Farmácia e do Medicamento, IP contra-alegou, concluindo como segue:
1. Nos autos em causa discutiu-se uma providência conservatória relativa à suspensão da eficácia de actos de concessão de AIM;
2. Da análise efectuada à douta sentença resulta que o Tribunal concluiu, e bem, que não estava perante qualquer acto manifestamente ilegal, pois este requer-se ostensivo e flagrante, o que não é de todo o caso, não se verificando, assim, o requisito exigido na ai. a) do n.° l do art. 120° do CPTA;
3. Não se verifica o periculum in mora como concluiu a douta sentença, visto que não existe um fundado receio de facto consumado ou da verificação da produção de prejuízos de difícil reparação.
4. Por outro lado, a ver i ficarem-se prejuízos, estes seriam sempre decorrentes da comercialização e não da concessão de AIM, não existindo qualquer nexo de causalidade entre aqueles e os actos de concessão de AIM.
5. Além de que, esses eventuais prejuízos nunca seriam graves prejuízos.
6. Por outro lado, caso fosse concedida a providência também não se verificaria a proporcionalidade exigida nos termos do n.° 2 do art. 120° do CPTA.
7. Não se verificam nos autos os requisitos necessários para a concessão da providência requerida pela Recorrente.
*
A contra-interessada L...–Laboratórios Almiro SA contra-alegou, concluindo como segue:.
1. O Tribunal a quo interpretou e aplicou correctamente os art. 19º e 25º do Estatuto do Medicamento.
2. A protecção concedida pelo Estatuto do Medicamento ao titular da AIM do medicamento de referência refere-se à comercialização...
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