Acórdão nº 033/19.3BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 20-10-2021

Data de Julgamento20 Outubro 2021
Número Acordão033/19.3BALSB
Ano2021
ÓrgãoSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)
Processo n.º 33/19.3BALSB
Recurso para uniformização de jurisprudência da decisão arbitral proferida pelo Centro de Arbitragem Administrativa - CAAD no processo n.º 443/2018-T
Recorrente: “A…………. - SGPS, S.A.”
Recorrida: Autoridade Tributária e Aduaneira

1. RELATÓRIO

1.1 A sociedade acima identificada veio, ao abrigo do disposto no art. 25.º, n.º 2, do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, interpor recurso para o Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo da decisão arbitral proferida pelo Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) em 28 de Fevereiro de 2019, no processo n.º 443/2018-T (Disponível em https://caad.org.pt/tributario/decisoes/decisao.php?listPage=156&id=3966.), invocando oposição, quanto à mesma questão fundamental de direito, com o acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, de 26 de Setembro de 2018, proferido no processo n.º 406/18.9BALSB ( Disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/-/a2b15e5a25b2f8b580258328004e7220.).

1.2 Apresentou alegações, com conclusões do seguinte teor:

«A. Pelo presente meio, vem a Requerente interpor recurso da decisão arbitral proferida no âmbito do Processo n.º 443/2018-T, em 28 de Fevereiro de 2019, a qual se encontra em oposição com o Acórdão deste Supremo Tribunal Administrativo, proferido no Processo n.º 0406/18.9BALSB, em 26 de Setembro de 2018, quanto à distribuição do ónus da prova para efeitos da aplicação do método de cálculo indirecto previsto no Ponto 7 da Circular 7/2004 de 30 de Março;

B. A oposição de decisões em apreço tem por base a identidade substancial das situações fácticas, sem que tenha havido alteração substancial da regulamentação jurídica, sendo certo que, em ambos os acórdãos, há uma pronúncia expressa sobre a mesma questão fundamental de direito;

C. Do confronto entre a decisão arbitral recorrida e o acórdão fundamento resulta evidente que foram proferidas decisões antagónicas, quanto à mesma questão fundamental de direito;

D. Na decisão arbitral em crise julgou-se improcedente o pedido de pronúncia arbitral apresentado com fundamento na conduta omissiva do sujeito passivo para a prova da impossibilidade de utilização de métodos direitos, considerando-se legal o recurso ao método indirecto de afectação de encargos financeiros que terão sido suportados com a aquisição de partes do capital;

E. Em sentido inverso, o acórdão fundamento veio conceder provimento ao recurso, esclarecendo que em todo o caso, ie, mesmo em caso de inacção do sujeito passivo, como ali era referido, “(…) é à AT que compete o ónus da prova para a determinação da matéria tributável por métodos indirectos, não permitindo o n.º 3 do art. 74.º da LGT que se faça recair esse ónus sobre o contribuinte”;

F. A decisão arbitral recorrida introduz uma premissa sem qualquer respaldo na lei, ao considerar como demonstrado o ónus da prova que recai sobre a AT, ao abrigo do n.º 3 do artigo 74.º da LGT, através de uma conduta omissiva da Recorrente;

G. Na decisão recorrida entendeu-se que, não tendo a Recorrente fornecido informação declarativa mínima para que a AT pudesse contestar a impossibilidade de uma [avaliação] directa e a necessidade de uma avaliação indirecta, por via das omissões patentes na declaração de rendimentos entregue pela Recorrente, deixou de ser exigível à AT a comprovação e quantificação de forma directa dos encargos dedutíveis e não dedutíveis;

H. Tal interpretação representa uma clara e grave inversão material do ónus da prova, ainda que a decisão arbitral recorrida entenda que é a AT que deve fazer o ónus da prova previsto no n.º 3 do artigo 74.º da LGT;

I. Ora, relativamente à mesma questão fundamental de direito, ficou claro no acórdão fundamento que “o método indirecto propugnado na Circular para cálculo do montante dos encargos financeiros destinados à aquisição de participações sociais só poderia ser aplicado subsidiariamente e depois de se demonstrar a inviabilidade da quantificação directa”, demonstração essa que não pode ser imputada ao contribuinte;

J. No caso dos autos, foi dado como provado que a AT partiu directamente para a aplicação da fórmula prevista na aludida orientação genérica e apurou, de forma indirecta, os montantes de encargos que, alegadamente, teriam sido imputados à aquisição de participações sociais pela Recorrente;

K. Ou seja, a AT não colocou em causa a fiabilidade da contabilidade da Recorrente, optando, ao invés disso, por aplicar imediatamente o método previsto no Ponto 7 da Circular 7/2004, de 30 de Março, sem qualquer esforço no sentido da obtenção de elementos aptos a demonstrar a impossibilidade de recurso à utilização de um método de afectação directa respeitasse a afectação real destes encargos, compatível com o princípio da legalidade e da tributação pelo lucro real;

L. Neste contexto, a tese subscrita na decisão arbitral recorrida colide com a orientação jurisprudencial mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo, de que é exemplo o acórdão fundamento – uniformizador de jurisprudência –, nos termos do qual se julgam ilegais as correcções efectuadas pela AT para efeitos de apuramento do lucro tributável em obediência à orientação constante no ponto 7 da Circular n.º 7/2004, de 30 de Março, se antes de recorrer ao método indirecto aí previsto, a AT não logrou demonstrar a inviabilidade da determinação directa dos encargos financeiros suportados com a aquisição de participações sociais (conforme se verificou in casu);

M. Assim, tendo em consideração que a tese consagrada no acórdão fundamento é a que deverá prevalecer, por ser a única que está conforme não só com a letra da lei, como com o espírito do legislador, garantindo o efectivo respeito pelos princípios da legalidade e da tributação pelo lucro real, deve ser julgado ilegal o entendimento subscrito pela decisão arbitral recorrida.

Termos em que deve o presente recurso ser admitido e julgado totalmente procedente e, em consequência, ser revogada a decisão arbitral recorrida e substituída por outra que julgue procedente a pretensão da Recorrente».

1.3 A Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) apresentou contra-alegações, com conclusões do seguinte teor:

«A) Em causa no presente Recurso está a decisão arbitral proferida no processo n.º 443/2018-T que correu termos no Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), de acordo com o disposto no Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, aprovado pelo DL n.º 10/2011, de 20 de Janeiro.

B) Não obstante a Recorrente afirmar que “(…) a decisão recorrida não procedeu a uma correcta interpretação e aplicação da lei ao caso concreto, encontrando-se inclusive em oposição com aquele que é o entendimento professado por este Digníssimo Tribunal, mormente aquele que foi professado no âmbito do processo n.º 0406/18.9BALSB e cujo acórdão, […], é datado de 26.09.2018”, como se demostrará, não se encontram preenchidos os requisitos exigidos pelo artigo 152.º do CPTA, pelo que não deve esse douto STA tomar conhecimento do mérito do recurso.

C) O Tribunal Arbitral definiu como questão decidenda: “35. A questão decidenda prende-se, fundamentalmente, com a legalidade da aplicação do método de cálculo consagrado no ponto 7 da Circular n.º 7/2004, de 30 de Março, referente ao regime fiscal das SGPS previsto, à data, no artigo 32.º do EBF, que, nos termos dos autos, fundamentou as correcções efectuadas pelos SIT, constantes da declaração Modelo 22 de substituição submetida pela Requerente”(cf. ponto 3.4 da decisão arbitral).”

D) A douta decisão arbitral assenta a sua convicção com base no seguinte pressuposto (cf. ponto 91 da decisão arbitral): “91. Por outras palavras, nos termos gerais, [cfr. n.º 1 do art. 85.º e alínea b) do n.º 1 do art. 87.º, da LGT] o recurso ao método indirecto do Ponto 7 só é admissível nos casos em que se verifique a inviabilidade de determinação directa dos encargos resultantes de financiamentos directamente associados à aquisição de participações sociais, competindo à AT o ónus da prova da verificação desses pressupostos, nos termos do n.º 3 do art. 74.º da LGT.

E) Vindo o Tribunal arbitral a constatar, no ponto 94 da decisão:“94. Uma vez produzidos os documentos necessários ao estabelecimento de factos básicos (v.g. empréstimos; pagamento de juros; aquisição de participações sociais) que possibilitam a determinação da matéria colectável, não valeria aqui a tese de que os factos falam por si (res ipsa loquitur). Antes caberia à Autoridade Tributária, nos termos do artigo 74.º n.º 3 da LGT, o ónus da prova da verificação dos pressupostos da aplicação de métodos indirectos, a partir de uma análise compreensiva, causal, coerente e consistente dos dados factuais pertinentes. Ora a Requerente, não oferece sequer – como podia e devia ter feito na sua qualidade de parte nas transacções relevantes – documentos a partir dos quais se pudesse estabelecer os montantes de empréstimos obtidos remunerados e de encargos financeiros inerentes aos respectivos empréstimos e a relação com os alegados empréstimos contraídos. 95. Essa omissão na prestação de elementos declarativos na Declaração Modelo 22 deixou concretamente patente, junto da AT e do presente tribunal, a impossibilidade de se proceder à utilização de métodos directos, sendo que o sujeito passivo é quem estaria em melhores condições para oferecer elementos que permitissem ao menos sustentar prima facie a sua viabilidade – mesmo sem ter o ónus de provar, de forma clara e convincente, o mérito substantivo da sua posição fiscal em termos definitivos – em virtude de poder dispor de toda documentação que lhe permitiria proceder a uma afectação directa. O ónus da prova da AT não exonera a Requerente do adequado cumprimento das suas obrigações acessórias declarativas, antes deve ser entendido na...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT