Acórdão nº 0315263 de Tribunal da Relação do Porto, 07-01-2004
Data de Julgamento | 07 Janeiro 2004 |
Número Acordão | 0315263 |
Ano | 2004 |
Órgão | Tribunal da Relação do Porto |
Acordam, em audiência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto:
No proc. comum singular nº ../.., do -° Juízo da comarca de....., em que são arguidos “A......, LDA. E VÍTOR....., foi proferida a seguinte decisão:
«Face ao exposto, julgo a acusação púbica procedente e, em consequência, condeno, como autores materiais de dois crimes p. e p. pelo art°. 23°, n° l, al. a) e c) do Dec. Lei n° 28/84 de 20/01 e 264°, n° 2 do C.P.I., em concurso efectivo e na forma consumada:
A) O arguido Vítor....., na pena de 90 (noventa) dias de prisão, substituída por igual tempo de multa e 40 (quarenta) dias de multa, à taxa diária de 10 (dez) euros, quanto ao crime de fraude sobre mercadoria;
B) O arguido Vítor....., na pena de 40 (quarenta) dias de multa, à taxa diária de 10 euros, quanto ao crime de uso fraudulento de marcas;
C) Em cúmulo, operado com as penas referenciadas em A) e B), na pena única de 120 (cento e vinte) dias, à taxa diária de 10 (dez) euros, num total de 1.200 (mil e duzentos euros) euros;
D) A arguida “A......, Lda” nas penas parcelares de 40 (quarenta) dias de multa, à taxa diária de 50 (cinquenta) euros e na pena única, derivada da efectivação de cúmulo jurídico, de 60 (sessenta) dias de multa, a igual taxa, no valor global de 3.000 (três mil euros) e, solidariamente nas penas referenciadas em A) e C) (Artº. 2°, n° 3 do Dec. Lei 28/84 de 20/01».
*
Inconformado com tal decisão, dela interpôs recurso o arguido VÍTOR....., que remata a sua motivação com as seguintes conclusões:
«1°- Incide o presente recurso sobre matéria de facto.
2º - Enferma a Douta sentença recorrida, e salvo o devido e merecido respeito, de várias contradições e ilegalidades.
3°- Os pontos de facto incorrectamente julgados foram, entre outros:
a) Considerar que a firma arguida e consequentemente o arguido não tinham autorização para produzir material com a marca Adidas e Quiksilver;
b) ter considerado que o material apreendido da marca Adidas e Quiksilver era todo igual,
c) pelo que não foram sujeitas à peritagem 56 peças da marca Adidas e 184 da marca Quiksilver;
d) assim sendo o Tribunal não poderia ter-se pronunciado sobre tais artigos igualmente apreendidos;
e) O arguido não chegou a vender o material apreendido, mas tão só limitou-se a tentar vender.
f) O arguido não induziu em erro o potencial comprador sobre o material em causa, pois este sabia que se tratava de restos de colecções já antigas.
4- Ora, compulsando as gravações dos depoimentos prestados em sede de audiência de discussão e julgamento, parece-nos que estamos perante uma efectiva insuficiência de prova para a decisão de facto proferida e para a formulação da decisão e sentença que veio a ser propalada.
5- Perante este contexto, nunca o arguido e, consequentemente a pessoa colectiva de que este era representante legal, poderia ter sido condenado pela prática dos crimes de que vem acusado, pois resultando sérias dúvidas sobre a imputação dos crimes ao agente, a decisão da sentença só poderia ser absolutória.
6- A sentença condenatória consubstancia, entre outras, uma clara violação do princípio in dubio pro reu.
7- A verdade é que o Tribunal a quo terá ultrapassado o que os elementos de prova lhe permitiam, e o que os próprios factos provados (mesmo aqueles com que não concordamos e que acima elencamos) lhe permitiam concluir.
8 - Deve ser dado PROVIMENTO ao presente recurso, sendo em consequência:
a) Revogada a sentença ora recorrida e, sequentemente, anulado o julgamento efectuado na 1ª instância;
b) Caso assim não se entenda deverá a pena aplicada ser revista, atendendo ao facto de arguido não ter consumado a prática dos crimes de que vem acusado, devendo apenas ser punido pela tentativa.»
«Discutida a causa, resultaram provados os seguintes factos:
O arguido foi sócio gerente da firma “A....., Ldª”, com sede em....., que exercia a actividade de confecção e fabrico de artigos de vestuário, nomeadamente, malhas, competindo-lhe, além do mais, em nome, por conta e no interesse da sociedade, decidir e orientar sobre os processos de produção e comercialização.
No dia 27/09/01, pelas 17h30m, no IP.., o arguido circulava ao volante do veículo de mercadorias de matrícula ..-..-JG, marca “Ford Transit”, fruída no sistema de leasing pela sociedade em causa.
No cruzamento de....., nesta comarca, o arguido foi interceptado por patrulha da Brigada Fiscal, da GNR de....., com vista à realização de acção de fiscalização.
Realizada a diligência, os agentes detectaram no veículo, misturadas num lote de 2.392 peças de malha, diversas camisolas de lã, de marca, em condições que motivaram a suspeita de que se tratava de mercadoria contrafeita.
Em conformidade, a Brigada Fiscal procedeu à apreensão de:
- 545 camisolas de lã ostentando a marca “Billabong”, no valor de 5.450.000$00;
- 185 camisolas de lã ostentando a marca “Quiksilver”, no valor de Esc.: 1.850.000$00
- 58 camisolas de lã ostentando a marca “Adidas” no valor de Esc.: 580.000$00;
Submetidos aos competentes exames periciais, apurou-se que tais artigos de marca “Quiksilver” e “Adidas” não eram originais, não sendo provenientes do fabrico ou do comércio dos titulares das respectivas marcas, nem de outra autorizada, sendo, no entanto, susceptíveis de induzirem em erro os consumidores, mormente, em virtude dos sinais figurativos e nominativos bordados e apostos nos mesmos, semelhantes aos dos originais.
Da marca “Quiksilver”:
Os bordados/estampados são imperfeitos e de qualidade muito rudimentar;
A qualidade dos materiais/tecidos empregues são bastante inferiores aos originais;
As peças não fazem parte de qualquer colecção apresentada pela marca;
O tamanho das peças não corresponde ao que a marca costuma usar;
As etiquetas da gola, composição e lavagem não correspondem aos que a marca costuma utilizar;
Da marca “Adidas”:
Os artigos não fazem parte de nenhuma colecção da marca;
Os modelos não são originais;
As peças não ostentam as etiquetas estampadas com as instruções de lavagem, tamanhos e origem do fabrico das mesmas, originais da marca;
O material com que foram fabricadas, assim como os acabamentos, bordados e estampados não respeitam os padrões de qualidade exigidos pela marca;
As peças não tem apostas as etiquetas de cartão com as referências, cores, tamanhos e códigos internos dos respectivos artigos e não estavam embaladas em sacos plásticos originais da marca.
Os artigos da marca “Billabong” são originais, produzidos por empresa autorizada, não o sendo a empresa “A......, Ldª”, tratando-se de restos de produção e de segunda escolha.
Conclui-se, então, pela fraude e pela utilização abusiva das marcas em causa, registadas em território nacional pelos respectivos titulares.
...
No proc. comum singular nº ../.., do -° Juízo da comarca de....., em que são arguidos “A......, LDA. E VÍTOR....., foi proferida a seguinte decisão:
«Face ao exposto, julgo a acusação púbica procedente e, em consequência, condeno, como autores materiais de dois crimes p. e p. pelo art°. 23°, n° l, al. a) e c) do Dec. Lei n° 28/84 de 20/01 e 264°, n° 2 do C.P.I., em concurso efectivo e na forma consumada:
A) O arguido Vítor....., na pena de 90 (noventa) dias de prisão, substituída por igual tempo de multa e 40 (quarenta) dias de multa, à taxa diária de 10 (dez) euros, quanto ao crime de fraude sobre mercadoria;
B) O arguido Vítor....., na pena de 40 (quarenta) dias de multa, à taxa diária de 10 euros, quanto ao crime de uso fraudulento de marcas;
C) Em cúmulo, operado com as penas referenciadas em A) e B), na pena única de 120 (cento e vinte) dias, à taxa diária de 10 (dez) euros, num total de 1.200 (mil e duzentos euros) euros;
D) A arguida “A......, Lda” nas penas parcelares de 40 (quarenta) dias de multa, à taxa diária de 50 (cinquenta) euros e na pena única, derivada da efectivação de cúmulo jurídico, de 60 (sessenta) dias de multa, a igual taxa, no valor global de 3.000 (três mil euros) e, solidariamente nas penas referenciadas em A) e C) (Artº. 2°, n° 3 do Dec. Lei 28/84 de 20/01».
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«1°- Incide o presente recurso sobre matéria de facto.
2º - Enferma a Douta sentença recorrida, e salvo o devido e merecido respeito, de várias contradições e ilegalidades.
3°- Os pontos de facto incorrectamente julgados foram, entre outros:
a) Considerar que a firma arguida e consequentemente o arguido não tinham autorização para produzir material com a marca Adidas e Quiksilver;
b) ter considerado que o material apreendido da marca Adidas e Quiksilver era todo igual,
c) pelo que não foram sujeitas à peritagem 56 peças da marca Adidas e 184 da marca Quiksilver;
d) assim sendo o Tribunal não poderia ter-se pronunciado sobre tais artigos igualmente apreendidos;
e) O arguido não chegou a vender o material apreendido, mas tão só limitou-se a tentar vender.
f) O arguido não induziu em erro o potencial comprador sobre o material em causa, pois este sabia que se tratava de restos de colecções já antigas.
4- Ora, compulsando as gravações dos depoimentos prestados em sede de audiência de discussão e julgamento, parece-nos que estamos perante uma efectiva insuficiência de prova para a decisão de facto proferida e para a formulação da decisão e sentença que veio a ser propalada.
5- Perante este contexto, nunca o arguido e, consequentemente a pessoa colectiva de que este era representante legal, poderia ter sido condenado pela prática dos crimes de que vem acusado, pois resultando sérias dúvidas sobre a imputação dos crimes ao agente, a decisão da sentença só poderia ser absolutória.
6- A sentença condenatória consubstancia, entre outras, uma clara violação do princípio in dubio pro reu.
7- A verdade é que o Tribunal a quo terá ultrapassado o que os elementos de prova lhe permitiam, e o que os próprios factos provados (mesmo aqueles com que não concordamos e que acima elencamos) lhe permitiam concluir.
8 - Deve ser dado PROVIMENTO ao presente recurso, sendo em consequência:
a) Revogada a sentença ora recorrida e, sequentemente, anulado o julgamento efectuado na 1ª instância;
b) Caso assim não se entenda deverá a pena aplicada ser revista, atendendo ao facto de arguido não ter consumado a prática dos crimes de que vem acusado, devendo apenas ser punido pela tentativa.»
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Na sua exaustiva resposta, o Ministério Público opina pela total improcedência do interposto recurso.*
Nesta Instância, o Senhor Procurador Geral Adjunto, em seu douto parecer, adere à resposta do Ministério Público no tribunal recorrido, sufragando a total improcedência do recurso.*
Cumprido o disposto no art° 417° n°2 do CPP, o arguido reitera as suas conclusões.*
Colhidos os legais Vistos, cumpre decidir, atenta a fundamentação e motivação da sentença sob censura, que se transcreve seguidamente:«Discutida a causa, resultaram provados os seguintes factos:
O arguido foi sócio gerente da firma “A....., Ldª”, com sede em....., que exercia a actividade de confecção e fabrico de artigos de vestuário, nomeadamente, malhas, competindo-lhe, além do mais, em nome, por conta e no interesse da sociedade, decidir e orientar sobre os processos de produção e comercialização.
No dia 27/09/01, pelas 17h30m, no IP.., o arguido circulava ao volante do veículo de mercadorias de matrícula ..-..-JG, marca “Ford Transit”, fruída no sistema de leasing pela sociedade em causa.
No cruzamento de....., nesta comarca, o arguido foi interceptado por patrulha da Brigada Fiscal, da GNR de....., com vista à realização de acção de fiscalização.
Realizada a diligência, os agentes detectaram no veículo, misturadas num lote de 2.392 peças de malha, diversas camisolas de lã, de marca, em condições que motivaram a suspeita de que se tratava de mercadoria contrafeita.
Em conformidade, a Brigada Fiscal procedeu à apreensão de:
- 545 camisolas de lã ostentando a marca “Billabong”, no valor de 5.450.000$00;
- 185 camisolas de lã ostentando a marca “Quiksilver”, no valor de Esc.: 1.850.000$00
- 58 camisolas de lã ostentando a marca “Adidas” no valor de Esc.: 580.000$00;
Submetidos aos competentes exames periciais, apurou-se que tais artigos de marca “Quiksilver” e “Adidas” não eram originais, não sendo provenientes do fabrico ou do comércio dos titulares das respectivas marcas, nem de outra autorizada, sendo, no entanto, susceptíveis de induzirem em erro os consumidores, mormente, em virtude dos sinais figurativos e nominativos bordados e apostos nos mesmos, semelhantes aos dos originais.
Da marca “Quiksilver”:
Os bordados/estampados são imperfeitos e de qualidade muito rudimentar;
A qualidade dos materiais/tecidos empregues são bastante inferiores aos originais;
As peças não fazem parte de qualquer colecção apresentada pela marca;
O tamanho das peças não corresponde ao que a marca costuma usar;
As etiquetas da gola, composição e lavagem não correspondem aos que a marca costuma utilizar;
Da marca “Adidas”:
Os artigos não fazem parte de nenhuma colecção da marca;
Os modelos não são originais;
As peças não ostentam as etiquetas estampadas com as instruções de lavagem, tamanhos e origem do fabrico das mesmas, originais da marca;
O material com que foram fabricadas, assim como os acabamentos, bordados e estampados não respeitam os padrões de qualidade exigidos pela marca;
As peças não tem apostas as etiquetas de cartão com as referências, cores, tamanhos e códigos internos dos respectivos artigos e não estavam embaladas em sacos plásticos originais da marca.
Os artigos da marca “Billabong” são originais, produzidos por empresa autorizada, não o sendo a empresa “A......, Ldª”, tratando-se de restos de produção e de segunda escolha.
Conclui-se, então, pela fraude e pela utilização abusiva das marcas em causa, registadas em território nacional pelos respectivos titulares.
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