Acórdão nº 02P2137 de Supremo Tribunal de Justiça, 27-06-2002

Data de Julgamento27 Junho 2002
Case OutcomePROVIDO.
Classe processualREC PENAL.
Número Acordão02P2137
ÓrgãoSupremo Tribunal de Justiça
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

1. O Ministério Público deduziu acusação em processo comum e perante tribunal colectivo, contra A, devidamente identificado, imputando-lhe a prática, em concurso real, de um crime de burla p. e p. pelo art. 217.°, n.° 1, do Código Penal, um crime de falsificação de documento p. e p. pelas disposições combinadas dos arts. 255 al. a) e 256, n.° 1, al. a) e n° 3 do Código Penal, e de um crime p. e p. pelo art. 359, n.°s 1 e 2, do Código Penal.
A ofendida C deduziu pedido de indemnização contra o arguido, pretendendo a sua condenação a pagar-lhe a quantia de 310.651$00, correspondente ao valor em que a prejudicou, a acrescer com juros a contar desde 3/3/99, bem como a quantia de 15.000$00 a título de compensação pelas despesas geradas com a cobrança daquele valor .
Realizado o julgamento, veio a ser proferido acórdão em que a final foi decidido, além do mais, o seguinte:
a) julgar a acusação deduzida contra o mencionado arguido parcialmente provada e procedente, pelo que foi condenado como autor de um crime p. p. pelo art. 217, n° 1, do C.P. na pena de oito meses de prisão e como autor de um crime p. e p. pelo art. 359, n.° 2, do C.P. na pena de dois meses de prisão. Em cúmulo, foi o arguido condenado na pena única de nove meses de prisão, substituída por pena suspensa pelo período de dois anos.
b) absolver o arguido da acusação na parte em que lhe fora imputada a prática de um crime p. e p. pelo art. 256, n.° 1, a), e n.° 3, do C.P., em concurso real com o referido crime de burla;
c) julgar o pedido de indemnização deduzido pela demandante parcialmente provado e procedente, em razão do que foi condenado o A a pagar à demandante a quantia de 310.651$00 (1.549,52 Euros), a que acrescerão juros, a contar à taxa anual de 7%, a contar desde a data de notificação do pedido ao arguido, até integral pagamento, julgando-se o mesmo pedido não provado e improcedente no restante que vinha pedido contra o arguido e do que foi este absolvido.

Inconformado, recorreu o Ministério Público a este Supremo Tribunal culminando a sua motivação nesta síntese conclusiva:

1. A conduta do arguido integra, em concurso real, os crimes de burla, p. e p. no art.º 218°, n° 1 do Código Penal e falsificação de documento, p. e p. no art.º 256°, n° 1, alas a) e b ) do Código Penal;
2. Nos termos do assento 8/2000 (publicado no DR, I Série - A, de 23 de Maio de 2000) «no caso de a conduta do agente preencher as previsões de falsificação e de burla do artigo 256°, n° 1, ala c), e do art.º 217°, n° 1, respectivamente, do Código Penal, revisto pelo Decreto - Lei n° 48/95, de 15 de Março, verifica-se concurso real ou efectivo de crimes»;
3. Ao julgar que a punição do arguido pelo crime de burla, p. e p. no art.º 218°, do Código Penal consome a responsabilidade penal emergente da prática do crime de falsificação de documento, p. e p. no art.º 256°, n° 1, alas a) e b) do Código Penal, o Mo Juiz violou o referido assento;
4. Assim, o Supremo Tribunal de Justiça deverá aplicar aquela jurisprudência ou proceder ao seu reexame;
5. Dessa forma se fazendo justiça!

Subidos os autos, a Ex.ma Procuradora-Geral Adjunta apôs o seu visto.

A única questão que importa resolver consiste em saber se se aplica ao caso a doutrina do Assento n.º 8/2000, publicado no DR I Série-A, de 23 de Maio de 2000 ou se é de confirmar a sua não aplicação pelo tribunal a quo.

2. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

Vejamos os factos provados:
Em data não concretamente apurada mas entre os dias 11 e 12 de Fevereiro de 1999 o arguido deslocou-se ao pombal de B, sito na Praceta do Monumento ao Pescador, Matosinhos.
Uma vez naquele local e aproveitando o facto de o referido B ter tirado o casaco que trazia vestido apropriou-se do porta moedas que estava no bolso daquele casaco e que continha no seu interior, entre outros objectos, o cheque n° 4939384136 pertencente à conta n° 00087984142 do B.C.P/Nova Rede, agência da Senhora da Hora, da qual é titular o dito B e que se encontrava totalmente em branco.
Por tais factos foi já o arguido acusado e julgado nos autos processo comum colectivo n° 427/00, do 2° Juízo Criminal do mesmo tribunal.
Em data não concretamente apurada mas anterior a 3 de Março de 1999, o arguido encomendou à empresa "C - Sistemas e Serviços de Informática, L.da" com sede na Rua Nova de Vilar, Armazém 3, Vilar, Aveiro, um computador portátil "Insys Dnote PGMMX".
A "C" enviou à cobrança aquele equipamento informático, através de um funcionário da empresa "Prossegur", que no dia 3 de Março de 1999 o entregou ao arguido, no local que ele designara e onde se encontrava, sito na Rua 1.º de Dezembro, 375, comarca de Matosinhos.
Nessa altura, o arguido muniu-se do supra referido cheque n° 4939384136, apôs-lhe o montante de 310.651$00, preencheu os restantes elementos, assinou-o com o nome de B e entregou-o ao funcionário da " Prossegur " para pagamento do equipamento informático.
Apresentado a pagamento em 8 de Março de 1999 na agência de Aveiro do Banco Melo, veio aquele cheque a ser devolvido em 10 de Março de 1999 com a menção de "revogado - extravio - devolvido da compensação do Banco de Portugal/Mandato do banco sacado".
A" C " sofreu um prejuízo patrimonial correspondente ao valor titulado pelo cheque, no montante de 310.651$00.
Com a sua conduta o arguido conseguiu que lhe entregassem o referido computador, que utilizou em proveito próprio, inculcando no funcionário da Prossegur a convicção de que a C obteria o pagamento do cheque logo que este fosse apresentado a pagamento.
No âmbito deste presente inquérito, o A foi constituído e interrogado como arguido na divisão de Matosinhos da Polícia de Segurança Pública, em 26 de Março de 2001. Nessa altura, após ter sido advertido de que a falsidade de resposta sobre os antecedentes criminais o faria incorrer em responsabilidade criminal, respondeu que" Já foi condenado em Tribunal com pena de multa por crime de furto."
Porém, essa declaração não corresponde à verdade já que o arguido havia já sido condenado:
- por sentença datada de 16 de Junho de 1997, transitada em julgado, proferida no proc. n° 3741/94 do 3° juízo criminal deste tribunal, pela prática de um crime de emissão de cheque sem provisão, na pena de 60 dias de multa à taxa diária de 300$00, num total de 18.000$00;
- por sentença datada de 2 de Fevereiro de 1998, transitada em julgado, proferida no proc. n° 113/95 do 1° juízo criminal do tribunal recorrido, pela prática de um crime de emissão de cheque sem provisão, na pena de 3 meses de prisão cuja execução ficou suspensa pelo período de 2 anos com a condição de o arguido, durante aquele período, ressarcir o lesado do montante
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