Acórdão nº 0289/18.9BELLE de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 09-12-2021
Data de Julgamento | 09 Dezembro 2021 |
Número Acordão | 0289/18.9BELLE |
Ano | 2021 |
Órgão | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo
1. – Relatório
Vêm interpostos dois recursos jurisdicionais, um por B………… – SOCIEDADE GESTORA DE FUNDOS DE INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO, S.A., na qualidade de sociedade gestora do fundo de investimento imobiliário «A………… ARRENDAMENTO HABITACIONAL - FUNDO DE INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO FECHADO PARA ARRENDAMENTO HABITACIONAL», com os sinais dos autos, e o outro pela REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA, visando a revogação da sentença de 30-12-2020, do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, que recusou a aplicação das normas constantes do n.º 2 do artigo 236.º da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de Dezembro, em conjugação com o n.º 16.º do artigo 8.º da Lei n.º 64-A/2008, de 31 de Dezembro, na redacção dada pela Lei n.º 83-C/2013, com fundamento na sua inconstitucionalidade, julgou a impugnação procedente, anulando os actos de liquidação de IMT e IS impugnados e julgou improcedente o pedido de pagamento de juros indemnizatórios, tudo relativo aos actos de liquidação oficiosa de Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis, no valor de €17.255,96 e de Imposto do Selo, no valor de €4.044,48.
Irresignada, nas suas alegações, formulou a recorrente B………… – SOCIEDADE GESTORA DE FUNDOS DE INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO, S.A., na qualidade de sociedade gestora do fundo de investimento imobiliário «A………… ARRENDAMENTO HABITACIONAL - FUNDO DE INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO FECHADO PARA ARRENDAMENTO HABITACIONAL», as seguintes conclusões:
(i) O artigo 43.º (Pagamento indevido da prestação tributária) da LGT, estabelece o dever das entidades públicas de pagar juros indemnizatórios pelo pagamento de prestações tributárias que sejam indevidos por a sua cobrança se ter fundado em normas declaradas judicialmente como inconstitucionais ou ilegais;
(ii) A douta sentença do Tribunal a quo, tendo determinado a desaplicação da norma que sustentaria as liquidações, conduzindo à anulação das mesmas, teve como fundamento a respectiva inconstitucionalidade;
(iii) Tendo as liquidações sido anuladas, com base em inconstitucionalidade da norma que as fundamentava, a sentença do Tribunal a quo teria de concluir pela aplicação do artigo 43.º, número 3, alínea d) da LGT e, em consequência, condenar a Autoridade Tributária ao pagamento de juros indemnizatórios tal como peticionado pelo então Impugnante e ora Recorrente.
Pelo que, com o douto suprimento do Venerando Supremo Tribunal Administrativo (Secção de Contencioso Tributário), que desde já se invoca, deverá ser concedido provimento ao presente recurso, devendo consequentemente ser parcialmente anulada a sentença do Tribunal a quo, no segmento decisório que constitui o seu objecto, e condenada a Autoridade Tributária ao pagamento de juros indemnizatórios nos termos peticionados pelo então Impugnante e ora Recorrente.
Assim agindo cumprirão V.Ex.as, Venerandos Conselheiros, a Lei, fazendo a costumada e sã JUSTIÇA!
A recorrente Representante da Fazenda Pública veio apresentar alegações, que rematou com as seguintes conclusões:
I) Decidiu o Meritíssimo Juiz “a quo” pela procedência dos autos de Impugnação, por desaplicar o n.º 2 do artigo 236º da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de Dezembro, em conjugação com o n.º 16 do artigo 8º da Lei 64-A/2008 de 31 de Dezembro, na redacção dada pela Lei n ”83-C/2013 de 31 de Dezembro;
II) O Mmº Juiz “a quo” ancorou a sua decisão sufragando o mui douto entendimento vertido no Acórdão n.º 175/2018 do Tribunal Constitucional;
III) Salvo melhor e douta opinião, não pode a FP concordar com tal conclusão;
IV) Com efeito, afigura-se-nos que a sentença recorrida afirma um entendimento incorreto no que concerne à invocada inconstitucionalidade das normas mencionadas que fundamentaram as liquidações impugnadas;
V) Desde logo, porque a condição resolutiva que se encontra na base da concessão das isenções de IMT e IS de que beneficiou a Impugnante aquando da aquisição das fracções autónomas em causa nos presentes autos e aqui suficientemente identificadas, sempre existiu no regime especial dos FIIAH cuja aplicação determinou a tributação;
VI) Também porque tal condição tinha de verificar-se pelo menos até ao termo do prazo de caducidade do direito á liquidação dos impostos sobre o património impugnados;
VII) A possibilidade de alienação a terceiros, que não os arrendatários dos prédios pelos fundos imobiliários, não era permitida anteriormente;
VIII) As normas desaplicadas vieram favorecer e não agravar a situação tributária dos sujeitos passivos ao instituir o n.º 16 do invocado artigo 8º o prazo de 3 anos durante o qual os imóveis não poderiam ser alienados pois que no regime anterior essa alienação não era permitida;
IX) Da actuação da AT não resultou qualquer prejuízo que afectasse as legítimas expectativas do sujeito passivo ora recorrido;
X) Ao decidir pela procedência do pedido, incorreu o Mmº Juiz a quo em erro de julgamento, violando a douta sentença recorrida o disposto nos art.º 236º n.º 2 da Lei n.º 83-C/2013.
Pelo exposto e com mui douto suprimento de V. Exas., deve ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, revogada a sentença recorrida e julgado a Impugnação improcedente como é de inteira JUSTIÇA.
A recorrente B………… – SOCIEDADE GESTORA DE FUNDOS DE INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO, S.A., na qualidade de sociedade gestora do fundo de investimento imobiliário «C………… - FUNDO DE INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO FECHADO PARA ARRENDAMENTO HABITACIONAL» (anteriormente denominado «A………… ARRENDAMENTO HABITACIONAL - FUNDO DE INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO FECHADO PARA ARRENDAMENTO HABITACIONAL» veio aduzir contra-alegações, que concluiu nos seguintes termos:
§19 Sendo, pois, indisputável que as liquidações cuja anulabilidade se peticiona nos autos de impugnação assentam no artigo 236.º (Norma transitória no âmbito do regime especial aplicável aos FIIAH e SIIAH), número 2, da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de Dezembro (Orçamento do Estado para 2014), que enferma de inconstitucionalidade por violação do princípio da não retroactividade da lei fiscal, consagrado no artigo 103.º (Sistema fiscal), número 3, e/ou por violação do princípio da protecção da confiança, decorrente do artigo 2.º (Estado de direito democrático) da Constituição da República Portuguesa, conforme resulta do Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 175/2018, da Decisão Sumária do Tribunal Constitucional n.º 485/2018, do Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 489/2018 e do Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 622/2019, proferido em 23 de Outubro de 2019, a AT não deveria ter liquidado o IMT e o IS correspondente às liquidações, devendo ser anuladas em conformidade por estarem feridas de ilegalidade abstracta e não poderem manter-se na ordem jurídica;
§20 Assim tendo procedido, isto é, acolhendo a douta e reiterada jurisprudência do Tribunal Constitucional sobre a matéria sub judice, a sentença do Tribunal a quo não merece, pois, qualquer censura.
Pelo exposto, deve ser negado in totum provimento ao recurso interposto pela Recorrente, por improcedente e não provado, devendo consequentemente manter-se na íntegra a douta sentença do Tribunal a quo, a qual não merece qualquer censura no julgamento da matéria de facto e na interpretação e aplicação do Direito.
Assim agindo cumprirão V.Ex.as, Venerandos Conselheiros, a Lei, fazendo a costumada e sã JUSTIÇA!
Neste Supremo Tribunal, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta, notificada nos termos do art. 146.º, n.º 1, do CPTA, pronunciou-se no sentido de dever ser concedido provimento ao recurso interposto pela Fazenda Pública, mantendo-se as liquidações oficiosas impugnadas e em consequência dever considerar-se prejudicado o conhecimento do recurso interposto pela impugnante, em Parecer a que adiante se dará o devido relevo.
*
Os autos vêm à conferência satisfeitos os vistos legais.
*
2. FUNDAMENTAÇÃO:
2.1. - Dos Factos:
Na decisão recorrida foi fixado o seguinte probatório reputado relevante para a decisão:
1. Com data de 30 de Abril de 2018, os serviços da Autoridade Tributária e Aduaneira dirigiram comunicação escrita à Impugnante, da qual se retira o seguinte extracto:
[Imagem]
(…)
– cfr. documento n.º 1 junto com a petição inicial;
2. Com data de 30 de Abril de 2018 foi emitida, em nome da Impugnante, a liquidação de IMT a que corresponde o documento com o n.º 160.718.140.913.030, no valor de € 15.635,76, acrescida de juros compensatórios no valor de € 1.620,20, no valor total de € 17.255,96 – cfr. documento n.º 1 junto com a petição inicial;
3. Da liquidação referida no ponto anterior extrai-se o seguinte excerto:
[Imagem]
– cfr. documento n.º 1 junto com a petição inicial;
4. Com data de 30 de Abril de 2018 foi emitida, em nome da Impugnante, a liquidação de IS a que corresponde o documento com o n.º 163.118.025.808.815, no valor de € 3.652,80, acrescida de juros compensatórios no valor de € 391,68, no valor total de € 4.044,48 – cfr. documento n.º 1 junto com a petição inicial;
5. Da liquidação referida no ponto anterior extrai-se o seguinte excerto:
[Imagem]
– cfr. documento n.º 1 junto com a petição inicial;
6. Em 4 de Maio de 2018, a Impugnante procedeu ao pagamento das liquidações de IMI e de IS referidas – cfr. documento n.º 2 junto com a petição inicial;
7. A Impugnante representa um fundo de investimento imobiliário fechado para arrendamento habitacional denominado “A………… Arrendamento Habitacional – Fundo de Investimento Imobiliário Fechado para Arrendamento Habitacional” – não controvertido;
8. Os imóveis correspondentes às fracções autónomas designadas pelas letras “……” e “……” do prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo ……… da freguesia de Portimão foram adquiridos em 27 de Março de 2013 pelo “A………… Arrendamento Habitacional – Fundo de Investimento Imobiliário Fechado para Arrendamento Habitacional”, beneficiado...
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