Acórdão nº 0260/08 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 19-06-2008

Data de Julgamento19 Junho 2008
Número Acordão0260/08
Ano2008
ÓrgãoSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)
Acordam na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:
I Relatório
A..., com melhor identificação nos autos, veio recorrer do acórdão do Tribunal Central Administrativo, Sul (TCA), de 14.11.07, que negou provimento ao recurso contencioso por si deduzido do acto tácito imputado ao Ministro dos Negócios Estrangeiros, constituído na sequência do recurso hierárquico que para ele interpôs do despacho de homologação da lista de classificação final do concurso aberto por aviso publicado no DR, II Série, de 13.7.01, para a categoria de Conselheiro de Embaixada.
Terminou as suas alegações formulando as seguintes conclusões:
a) o acto objecto de recurso contencioso - o indeferimento tácito do recurso hierárquico necessário interposto do despacho de homologação da lista de classificação final concursal para a categoria de conselheiro de embaixada - encontra-se insanavelmente ferido de violação de lei;
b) esse acto viola o princípio de divulgação atempada do sistema de classificação e avaliação, pois o júri só o estabeleceu depois de ter acesso à integral identificação e curricula dos candidatos.
c) foi outrossim violada lei de forma por força do verificado incumprimento do dever de audiência prévia - art.ºs 100° e 101° do C.P.A., atento a que não estava em causa, nem sequer invocada foi, qualquer causa de excepção prevista no artº 103°;
d) e foi violada lei de forma por incumprimento do dever de fundamentação de actos lesivos, o que por seu turno deixa incumprido o disposto nos artºs 124° e 125° do mesmo C.P.A.;
e) conformando-se com tais erros de interpretação e aplicação da lei por parte do júri, incorreu o autor do acto administrativo recorrido em iguais erros de interpretação e aplicação da lei;
f) e ainda em iguais erros de interpretação e aplicação da lei incorreu o Tribunal a quo, razão pela qual deve proceder o presente recurso jurisdicional e em consequência proceder o recurso contencioso, assim se devendo decidir, revogando-se o douto acórdão recorrido, com o que será feita JUSTIÇA.
A autoridade recorrida concluiu assim as suas:
a. A identidade dos potenciais candidatos - os detentores há mais de 8 anos da categoria de secretários de embaixada e que tenham exercido funções nos serviços externos, pelo menos, 4 anos - numa pequena carreira especial como a dos diplomatas, é total e completamente determinada, na medida em que, nos termos do n.º 1, do artigo 35.º, do Estatuto da Carreira Diplomática, são publicadas anualmente as listas de antiguidade;
b. O artigo 100.º do CPA sobre a audiência prévia dos interessados, constitui uma norma geral, afastável pela vigência de normas especiais como as constantes do Estatuto da Carreira Diplomática;
c. No caso em apreço, a aplicação das normas do Estatuto da Carreira Diplomática justifica-se ainda em virtude de o CPA ser anterior ao Estatuto e, por isso, deixou de ser aplicável aos procedimentos especiais relativos à carreira diplomática previstos no Estatuto uma vez que este diploma não prevê tal formalidade nem remete para a lei geral, como faz a propósito de outros assuntos regulados;
d. Por outro lado, reforça este argumento, a circunstância de o Estatuto da Carreira Diplomática e a Portaria n.º 665/2001, de 30 de Junho, não violarem nem a Constituição nem a lei ao não preverem uma fase de audiência prévia dos interessados;
e. Quanto à fundamentação, também não colhem as alegações do Recorrente. A fundamentação tem em vista assegurar que o destinatário do mesmo entenda a razão da prática do acto, todavia, o Recorrente nunca explicou o que não percebeu em concreto na fundamentação contida nas actas sobre a classificação das provas dos candidatos, de onde se conclui que percebeu o sentido e alcance da decisão;
f. Ademais, como manda a lei, as actas, de forma suficiente e sintética, contêm a explicação necessária sobre a classificação da prestação das provas orais.
g. Por fim, salienta-se que tais classificações constituem parte da margem de livre apreciação e decisão sobre a prestação discursiva dos candidatos.
O Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal emitiu o seguinte parecer:
"A... recorre do Acórdão do TCA Sul que negou provimento ao recurso contencioso interposto do acto de indeferimento tácito do recurso hierárquico, por si interposto, do despacho de homologação da lista de classificação final do concurso aberto para a categoria de Conselheiro de Embaixada, pedindo a sua revogação. Alega, em breve síntese, em sede de argumentação conclusiva, que esse acto viola o principio da divulgação atempada do sistema de classificação e avaliação, pois, o júri só o estabeleceu depois de ter acesso à integral identificação e curricula dos candidatos, viola o princípio de audiência prévia e padece de falta de fundamentação, vícios esses em que o autor do acto incorreu, tal como o Acórdão recorrido. No recurso contencioso alegara o Recorrente que fora violado o princípio da divulgação atempada do sistema de classificação e avaliação, pois o júri só o estabeleceu depois de ter acesso à integral identificação e curricula dos candidatos. Escudando-se no douto Acórdão de folhas 565/585, transcrevendo parte do que consta a folhas 578, concluiu o Acórdão recorrido: "Ou seja, a circunstância do universo muito restrito de potenciais candidatos na categoria que constitui condição sine qua non de oposição ao concurso de acesso à categoria de conselheiro de embaixada - 8 anos de serviço efectivo na dita categoria de secretário de embaixada e funções em serviços externos não inferior a um período de 4 anos - tem como consequência não apenas a evidência do conhecimento recíproco de todos os intervenientes, opositores e júri, como, ainda, envolve o decaimento do alegado vício de violação do princípio da divulgação atempada do sistema de classificação e fixação de critérios de avaliação exarado na acta n.º 1 de 30.10.2001 - ponto 2 do probatório - já que, desde logo aquando da abertura do concurso em 13.07.2001 essa identidade de potenciais candidatos era por demais consabida. O conhecimento quase perfeito e ab initio do universo de candidatos que se vai ter pela frente é uma consequência do âmbito de candidatos claramente determináveis, para além de reduzido, adveniente dos requisitos legais de candidatura". Todavia, o Acórdão recorrido, na apreciação da violação do princípio de audiência prévia, (em contradição com o que afirmara) escudando-se de novo no douto Acórdão de folhas 565 e seguintes, transcreve: "Já atrás se enunciou o quadro jurídico aplicável ao concurso. Em primeira linha, o DL 40-A/98, de 27.2 e a Portaria n.º 665/2001 de 30.6. Depois, o DL 204/98, de 11. 7. Qualquer dos Decretos-Lei foi emitido a coberto de autorização legislativa nos termos constitucionais (art.º 165, n.º 1, alínea t) da CRP). Como se viu então, de acordo com o disposto nos n.ºs 2 e 3 do art.º 3 os regimes de recrutamento e selecção do pessoal dos corpos especiais observará as regras próprias com respeito, todavia, "pelos princípios e garantias consagrados no artigo 5.º " Esses princípios são os enunciados nesse preceito, nomeadamente "princípios de liberdade de candidatura, de igualdade de condições e de igualdade de oportunidades para todos os candidatos", "a neutralidade da composição do júri", a "divulgação atempada dos métodos de selecção a utilizar, do programa das provas de conhecimentos e do sistema de classificação final", a "aplicação de métodos e critérios objectivos de avaliação" e o "direito de recurso". Portanto, fora destas áreas, definidas como limites ao poder regulamentar em matéria de concursos dos corpos especiais, aplicam-se as regras específicas previstas para os concursos do pessoal de cada corpo, sendo, no caso em apreço, o da carreira diplomática, são os supra citados DL e Portaria ". Ou seja, apesar de os funcionários diplomáticos serem um corpo especial com o seu estatuto e regime de recrutamento estar regulamentado no Dec. Lei n.º 40-A/98, de 27.2, terá que respeitar os princípios consagrados no art.º 5.º do DL 204/98, entre eles, a divulgação atempada dos métodos de selecção. Este entendimento foi, já, acolhido no Acórdão do Pleno da Secção, proferido em 13.11.2007, no processo n.º 1140/06, onde estava em causa um concurso para professor catedrático (também, um corpo especial).
Neste douto Acórdão diz-se, a dado passo: "O referido art. 3. ° do DL n.° 204/98, ao estabelecer que «os regimes de recrutamento e selecção de pessoal dos corpos especiais e das carreiras de regime especial podem obedecer a processo de concurso próprio com respeito pelos princípios e garantias consagrados no artigo 5.º», contém uma resposta legislativa expressa para a questão que é objecto do presente recurso jurisdicional, no sentido da aplicação global destes princípios e garantias, inclusivamente, por isso, a divulgação atempada do sistema de classificação final. Por outro lado, pela repetição da ressalva da aplicação destes princípios e garantias, que se constata no n. ° 3 do art. 2. ° e no n.° 2 do art. 3.º, conclui-se que houve uma especial preocupação legislativa em generalizar essa aplicação, não se admitindo excepções, mesmo nas situações em que se admite que os concursos possam ser submetidos a regimes especiais. Num Estado de Direito, assente na soberania popular e no primado da Lei (arts. 2.° e 3.º n.ºs 1 e 2, da C.R..P.), na sua aplicação aos casos concretos têm de ser acatados os juízos de valor legislativamente formulados, quando não ofendam normas de hierarquia superior nem se demonstre violação de limitações legais de carácter geral (abuso do direito), não podendo o intérprete sobrepor à ponderação legislativa os seus próprios juízos sobre o que pensa que deveria ser regime legal, mesmo que os considere mais adequados e equilibrados que os emanados dos órgãos de soberania com competência legislativa. Sendo assim,...

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