Acórdão nº 0258/14.8BECBR de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 08-05-2024
Data de Julgamento | 08 Maio 2024 |
Número Acordão | 0258/14.8BECBR |
Ano | 2024 |
Órgão | Supremo Tribunal Administrativo - (2 SECÇÃO) |
Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo
I – RELATÓRIO
I.1 Alegações
AA, melhor identificado nos autos, vem recorrer da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, que julgou improcedente a presente impugnação judicial por ele interposta visando o ato de liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS), referente ao ano de 2007, no montante de € 84.100,95.
Apresenta as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões a fls. 210 a 222 do SITAF:
A) O recorrente foi objeto de uma inspeção tributária, em cujo relatório se entendeu que, para efeitos da exclusão de tributação das mais-valias por si realizadas na venda de imóvel para habitação permanente, o reinvestimento do valor de realização não teria sido, alegadamente, realizado, tendo sido essa a única fundamentação para justificar a liquidação adicional de IRS, aqui em causa.
B) Contra tal liquidação deduziu reclamação graciosa, na apreciação da qual, os serviços fiscais reconheceram, expressamente, que “andaram mal”, que o contribuinte, efetivamente, procedeu ao reinvestimento conforme havia declarado, e que o (único) fundamento invocado no relatório de inspeção que serviu de base à liquidação impugnada, afinal, não se verifica.
C) O facto de a AT ter considerado que não se verifica o pressuposto da liquidação reclamada seria o suficiente para esta ser anulada. Porém, a reclamação graciosa foi indeferida com base em (outra) fundamentação que não constava da que serviu de base ao ato tributário reclamado.
D) Nos casos em que a impugnação judicial sucede ao indeferimento de uma reclamação graciosa de uma liquidação, a jurisprudência do STA vai no sentido de que, constituindo embora o despacho administrativo de indeferimento da reclamação graciosa o objecto imediato da impugnação, é, contudo, não aquele, mas sim o ato de liquidação e os seus vícios – seu objecto mediato – que constitui a verdadeira questão controvertida na impugnação judicial.
E) Sendo os vícios imputados à liquidação impugnada aqueles que, no entendimento da doutrina e da jurisprudência, estão, verdadeiramente, em crise na impugnação judicial e decorrendo do probatório (Factos 10) e 18) ) a comprovação do vício de ilegalidade imputado pelo impugnante à liquidação, seria forçoso a sentença ter concluído pela total procedência da impugnação e, consequentemente, pela anulação da liquidação ilegal, por violação do disposto no artigo 10º, nº 5, do Código do IRS, tal como peticionado pelo impugnante.
F) Porém, contrariando toda a jurisprudência do STA, a douta sentença recorrida decidiu julgar com base, não na fundamentação que presidiu à prática do ato tributário, mas naquela que foi aditada a posteriori pela decisão de indeferimento da reclamação graciosa, incorrendo, assim em erro de julgamento.
G) Por todo o exposto, a douta sentença recorrida enferma de erro de julgamento em matéria de direito, por violação de lei substantiva, pelo que deverá ser revogada e substituída por Acórdão que julgue a impugnação procedente, por provada e, consequentemente, determine a anulação da liquidação impugnada, por ilegalidade. Conforme peticionado.
H) Normas jurídicas violadas pela sentença recorrida:
− artigo 10º, n.º 5, do Código do IRS.
− artigo 77º, nº 1, da LGT.
I.2 - Contra-alegações
Não foram proferidas contra alegações no âmbito da instância.
I.3 - Parecer do Ministério Público
Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo, veio o Ministério Público emitir parecer com o seguinte conteúdo:
“AA, veio recorrer da douta sentença do TAF de Coimbra a que julgou improcedente a impugnação judicial que apresentou do despacho de indeferimento do Director de Finanças de Coimbra, que recaiu sobre a reclamação graciosa por si deduzida contra o ato de liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (doravante IRS), referente ao ano de 2007, no montante de € 84.100,95.
O Recorrente conclui as suas Alegações de Recurso da seguinte forma:
“A) O recorrente foi objeto de uma inspeção tributária, em cujo relatório se entendeu que, para efeitos da exclusão de tributação das mais-valias por si realizadas na venda de imóvel para habitação permanente, o reinvestimento do valor de realização não teria sido, alegadamente, realizado, tendo sido essa a única fundamentação para justificar a liquidação adicional de IRS, aqui em causa.
B) Contra tal liquidação deduziu reclamação graciosa, na apreciação da qual, os serviços fiscais reconheceram, expressamente, que “andaram mal”, que o contribuinte, efetivamente, procedeu ao reinvestimento conforme havia declarado, e que o (único) fundamento invocado no relatório de inspeção que serviu de base à liquidação impugnada, afinal, não se verifica.
C) O facto de a AT ter considerado que não se verifica o pressuposto da liquidação reclamada seria o suficiente para esta ser anulada. Porém, a reclamação graciosa foi indeferida com base em (outra) fundamentação que não constava da que serviu de base ao ato tributário reclamado.
D) Nos casos em que a impugnação judicial sucede ao indeferimento de uma reclamação graciosa de uma liquidação, a jurisprudência do STA vai no sentido de que, constituindo embora o despacho administrativo de indeferimento da reclamação graciosa o objecto imediato da impugnação, é, contudo, não aquele, mas sim o ato de liquidação e os seus vícios – seu objecto mediato – que constitui a verdadeira questão controvertida na impugnação judicial.
E) Sendo os vícios imputados à liquidação impugnada aqueles que, no entendimento da doutrina e da jurisprudência, estão, verdadeiramente, em crise na impugnação judicial e decorrendo do probatório (Factos 10) e 18) ) a comprovação do vício de ilegalidade imputado pelo impugnante à liquidação, seria forçoso a sentença ter concluído pela total procedência da impugnação e, consequentemente, pela anulação da liquidação ilegal, por violação do disposto no artigo 10º, nº 5, do Código do IRS, tal como peticionado pelo impugnante.
F) Porém, contrariando toda a jurisprudência do STA, a douta sentença recorrida decidiu julgar com base, não na fundamentação que presidiu à prática do ato tributário, mas naquela que foi aditada a posteriori pela decisão de indeferimento da reclamação graciosa, incorrendo, assim em erro de julgamento.
G) Por todo o exposto, a douta sentença recorrida enferma de erro de julgamento em matéria de direito, por violação de lei substantiva, pelo que deverá ser revogada e substituída por Acórdão que julgue a impugnação procedente, por provada e, consequentemente, determine a anulação da liquidação impugnada, por ilegalidade. Conforme peticionado.
H) Normas jurídicas violadas pela sentença recorrida:
− artigo 10º, n.º 5, do Código do IRS.
− artigo 77º, nº 1, da LGT.”
A questão “decidenda” consiste em apreciar se a douta sentença recorrida incorreu em erro de julgamento de direito ao manter a liquidação com base no incumprimento da alínea c) do nº 6 do artigo 10º do CIRC, fundamento que não foi invocado na acção inspectiva que determinou a liquidação.
A jurisprudência do STA tem sido uniforme no sentido de “… nos casos em que a reclamação graciosa é expressamente indeferida, o objecto do processo de impugnação judicial é, formal e directamente, o acto de indeferimento, que manteve a liquidação que foi objecto da reclamação, mas o objecto real da impugnação, o acto cuja legalidade está em causa apurar, é o ato de liquidação que foi mantido pelo ato de indeferimento da reclamação” – cfr. douto Ac. do STA de 28/10/2009, proferido no recurso n.º 595/09 bem como, designadamente, doutos Acórdãos do STA de 03-07-2019, 02957/16 de 11.09.2013, recurso 1138/12, de 18-05-2011 processo nº 0156/11 e de 03-06-2015, processo nº 0793/14.
No caso em apreço, como decorre de 10) do probatório, a liquidação foi determinada pela acção inspectiva levada a cabo pela AT que concluiu : “Apesar do contribuinte ter declarado que pretendia reinvestir o valor da alienação, não o reinvestiu em imóvel destinado a habitação própria e permanente pois nem o valor reinvestido foi utilizado na sua totalidade na compra do bem que declarou ser alvo de reinvestimento, nem o prédio rústico adquirido reúne condições para tal, nem nunca possuiu o seu domicílio fiscal na morada do prédio urbano. Por tal facto, não reuniu as condições necessárias para que pudesse beneficiar da exclusão da tributação das mais-valias obtidas.
Assim, para além de ter mencionado erradamente, no anexo G da modelo 3 de IRS de 2010, o reinvestimento em imóvel que nunca afetou à sua habitação própria e permanente deveria nos “…” entregar uma declaração de rendimentos modelo 3 de IRS para o exercício de 2007, conforme obriga o art.º 60.º do CIRS.
Por tal facto, deveria até à data de 5 de janeiro de 2011, ou seja, 30 dias após o reinvestimento em imóveis que não afetou à sua habitação própria e permanente ter substituído a sua declaração de rendimentos modelo 3 de IRS.
Por não ter reinvestido o valor da realização na aquisição de imóvel destinado a habitação própria e permanente, as mais valias obtidas com a venda do imóvel são sujeitas a tributação, nos termos do artigo 10.º n.º 1 do CIRS…”.
Resultou provado – cfr. 19) do probatório -, através das diligências efectuadas no âmbito do procedimento da Reclamação Graciosa, designadamente que:
“Em dezembro de 2010 o reclamante adquire um prédio misto constituído pelos artigos ...97/ ...98 e ...14. Esta aquisição foi realizada com vista à ampliação e melhoramento das antigas edificações neles existentes e à sua unificação para construção daquela que passou a ser desde setembro de 2010 a sua habitação própria e permanente...” “…não estava em causa o prédio com a matriz ...47, mas os prédios com as matrizes ...97, ...98 e ...14, que tudo indicava não tinham...
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