Acórdão nº 02305/09.6BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 22-01-2021

Data de Julgamento22 Janeiro 2021
Número Acordão02305/09.6BEPRT
Ano2021
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Norte
EM NOME DO POVO

Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

A., EM, S.A. interpôs RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, de 30.06.2016, pela qual foi julgada parcialmente procedente a acção, na parte em que lhe era dirigida, intentada pelo ora Recorrido F. contra a ora Recorrente, a G., EM e o Município de (...) à declaração de nulidade ou anulação dos seguintes actos: - parecer da A. comunicado pelo ofício n.º 20636/06, de 19.07.2006, relativo aos projectos de abastecimento de águas e de drenagem de águas residuais; - informação da A. comunicada pelo ofício com a referência 16538, de 29.12.2008; - alvará de licença de obras de construção n.º 426/07, de 28.04.2009, atribuído pela Câmara Municipal de (...); - despacho de 15.11.2005, de vereador da Câmara Municipal de (...), que deferiu o pedido de aprovação condicionada do aditamento ao projecto de arquitectura; - despacho de 24.07.2006, de vereador da Câmara Municipal de (...), que deferiu o pedido de licenciamento de construção de obra; mais foi pedido na acção o pagamento de uma indemnização no valor total de 3.257.500,00 €, acrescido de juros vincendos, por danos patrimoniais e não patrimoniais que alega ter como sofrido como consequência da aludida alteração dos pressupostos do licenciamento e dada a recusa das entidades públicas demandadas em infraestruturar a Rua do (...); finalmente foi pedida também a condenação da Ré A. ao cumprimento do seu dever de construção, com a máxima urgência, de todas as infraestruturas públicas na Rua do (...).

Invocou para tanto, em síntese, que: a decisão recorrida errou no julgamento da matéria de facto, pois houve factos que no seu entender deveriam ter sido dados como não provados e outros que deveriam ter sido dados como provados, além de existir matéria de facto a rectificar; quanto ao enquadramento jurídico, defende que a decisão recorrida errou nos seguintes pontos fundamentais, o que determinou a procedência da acção em vez da sua improcedência, decisão esta que, na sua perspectiva, era a acertada: a obrigação de construção de infraestruturas; a condenação além do pedido; a formulação ilegal de pedido genérico ou ilíquido e ilegalidade da liquidação oficiosa ; a indevida quantificação da indemnização; o pagamento do sinal em dobro; o pagamento do sinal do terreno de (...) dobro; os encargos a pagar no futuro à Caixa Geral de Depósitos; os danos não patrimoniais; a desproporcionalidade da indemnização fixada.

O Autor, ora Recorrido, F., contra-alegou, defendendo a improcedência deste recurso e, logo, a manutenção da decisão recorrida.

A A., EM, S.A. recorreu também da decisão que indeferiu a dispensa (ou redução) do pagamento do remanescente da taxa de justiça.

Invocou para tanto nesta parte, em resumo, que a decidida não dispensa nem redução do pagamento do remanescente da taxa de justiça viola os princípios da proporcionalidade e do acesso aos tribunais e à tutela jurisdicional consagrados nos artigos 2.°, 20.° n.° 1, 18.° n.°2, 266.° n.° 2 da Constituição da República Portuguesa; pela violação ostensiva e flagrante de tais normativos é inconstitucional o n.° 7 do artigo 6.° do Regulamento das Custas Processuais, se interpretado no sentido de que a tabela anexa ao Regulamento das Custas Processuais pode ser aplicada "de forma cega", de forma literal, como mera operação aritmética, tendo por base apenas o valor atribuído ao processo, sem qualquer ponderação prévia sobre a proporcionalidade entre a efectiva actividade processual prestada e o valor da taxa de justiça, nos termos e com todas as consequências legais.

A G., EM interpôs recurso da decisão de 05.04.2017, que julgou improcedente o pedido de dispensa (ou redução) do pagamento do remanescente da taxa de justiça; no essencial pelas razões aduzidas a este propósito pela A., EM, S.A. .

O Município de (...) aderiu a este segundo recurso.

Não foram apresentadas contra-alegações aos recursos da decisão que indeferiu a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça.

O Ministério Público neste Tribunal não emitiu parecer.
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Cumpre decidir já que nada a tal obsta.
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I.I. - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do primeiro, e principal, recurso jurisdicional, da A., EM, S.A.:

1. O Tribunal de 1ª instância não se pronunciou sobre a eventual dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça devida pelas partes.

2. De acordo com o disposto no n°7 do artigo 6° do Regulamento das Custas Processuais, nas causas de valor superior a € 275.000,00, o remanescente da taxa de justiça deverá ser considerado na conta final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz, de forma fundada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento, visando salvaguardar as situações onde a mera aplicação formal do dispositivo legal poderia criar urna verdadeira situação de injustiça, face à desproporcionalidade entre o montante das custas finais apuradas a cargo da parte vencida e a concreta factualidade do processo.

3. A decisão acerca da eventual dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça configura um poder/dever oficioso do Tribunal que, antes de ser elaborada a conta, deve ponderar e apreciar se a complexidade do processo e a conduta das partes exige o pagamento do remanescente da taxa de justiça devida pelas mesmas.

4. E não sendo feita essa avaliação, compete às partes requerer tal dispensa através da reforma de sentença, nos termos do artigo 616° do CPC.

5. Nos termos do disposto no n°7 do artigo 6° do Regulamento das Custas Processuais, nas causas de valor superior a € 275.000,00, o remanescente da taxa de justiça deverá ser considerado na conta final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz, de forma fundada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento, pois caso fosse exclusivamente determinante o valor da acção atingir-se-iam montantes exorbitantes, por vezes incompatíveis com o trabalho desenvolvido pelo tribunal e incomportáveis para quem não tenha acesso ao apoio judiciário;

6. O que poria em causa o acesso ao direito constitucionalmente consagrado no artigo 20° da Constituição da República Portuguesa;

7. Tem que existir correspectividade entre os serviços prestados e a taxa de justiça cobrada aos cidadãos que recorrem aos tribunais, de acordo com o princípio da proporcionalidade, consagrado no artigo 2º, e do direito de acesso à justiça acolhido no artigo 20º, ambos da CRP

8. O n°7 do artigo 6° do Regulamento das Custas Processuais, nas causas de valor superior a C 275.000,00, o remanescente da taxa de justiça deverá ser considerado na conta final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz, de forma fundada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento.

9. No caso em apreço, não se poderá dizer que estivessem em causa questões de elevada especialização jurídica, especificidade técnica ou que importassem a análise combinada de questões jurídicas de âmbito muito diverso, pois as questões essenciais em análise resumiram-se à interpretação do dever de construção das infraestruturas públicas por parte da Ré A. e a verificação dos pressupostos para eventual responsabilidade civil extracontratual das Rés e Interveniente Principal.

10. Tal como decorre dos autos, os meios de prova que foram analisados pelo Tribunal resumem-se essencialmente à prova documental e prova testemunhal e não eram, salvo o devido respeito, extremamente complexos.

11. Foram juntos aos autos muitos documentos, mas também é certo que não foram realizadas quaisquer diligências de produção de prova morosas como perícias ou inspecções judiciais.

12. Assim sendo, e tendo em conta os critérios acima referidos, é patente que os presentes autos não revelam especial complexidade, pelo que o valor da acção não pode ser considerado elemento exclusivo na ponderação da complexidade do processo e de geração de custos para o sistema, e o processo deve ser analisado à luz dos novos parâmetros introduzidos pelo Decreto-Lei n° 34/2008, de 26 de Fevereiro, permitindo a fixação da taxa de justiça de acordo com critérios consentâneos com os princípios gerais de Direito.

13. Quanto à conduta processual de todas as Partes, incluindo a ora Recorrente, diga-se que esta sempre se pautou por uma normal actividade, sem recurso a expedientes dilatórios, de forma cooperante, sempre com vista a obtenção da justa composição do litígio, não merecendo censura e não se justificando qualquer tipo de penalização em sede de taxa de justiça.

14. O factor diferenciador no caso dos autos é precisamente o valor da acção/valor de decaimento, pois bastaria que em situação de facto em tudo igual à dos presentes autos tivesse o valor de € 250.000,00 (que é já um valor consideravelmente elevado para a grande maioria dos cidadãos e das empresas) para não se levantar nenhuma questão relativa ao remanescente da taxa de justiça porque, pura e simplesmente, ela não seria devida!

15. Assim, o cômputo do remanescente das taxas de justiça pagas pelas partes intervenientes com base no valor da acção motivará, uma grave distorção dos princípios legais e constitucionais acima invocados.

16. Tal é tanto mais grave quanto a taxa não é um imposto, sob pena de interpretação inconstitucional do n°7 do artigo 6° do Regulamento das Custas Processuais

17. A antes da elaboração da conta, o Tribunal tem de fazer essa ponderação, a fim de evitar a inconstitucionalidade material em que se traduz a exigência de um pagamento de um valor completamente desproporcionado em relação ao custo da actividade jurisdicional desenvolvida, pois interpretar o...

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