Acórdão nº 02258/13.6BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 07-07-2017
Data de Julgamento | 07 Julho 2017 |
Número Acordão | 02258/13.6BEPRT |
Ano | 2017 |
Órgão | Tribunal Central Administrativo Norte |
RELATÓRIO
T..., S.A., com sede em …, Paredes de Coura, intentou acção administrativa comum, para efectivação de responsabilidade civil contra o Estado Português, formulando o seguinte pedido:
Termos em que deve a presente ação ser julgada procedente, por provada, e, em consequência, ser o Réu condenado a:
a) Ressarcir, pagando, à aqui Autora os danos patrimoniais que a conduta omissiva do Ministério Público junto do Tribunal Judicial da Maia lhe causou, no valor de € 39.579,92 (trinta nove mil quinhentos e setenta nove euros e noventa dois cêntimos), acrescidos de juros moratórios à taxa legal de 4% ao ano, desde a citação até efetivo e integral pagamento;
b) Pagar as custas e demais despesas que a Autora venha a despender com esta ação, a liquidar em ulterior incidente de liquidação, incluindo os honorários à sua mandatária.
c) Pagar os juros de mora sobre a referida quantia, à taxa legal, desde a data da citação até integral e efetivo pagamento.
Por sentença proferida pelo TAF do Porto foi julgada procedente a excepção de prescrição suscitada pelo Réu na contestação e, em consequência, foi o mesmo absolvido do pedido.
Desta vem interposto recurso.
Alegando, a Autora formulou as seguintes conclusões:
A – Por sentença proferida pelo Tribunal a quo foi julgada procedente a exceção de prescrição suscitada pelo Réu Estado Português, na sua contestação e, em consequência, foi o mesmo absolvido do pedido formulado pela Autora, ora Recorrente;
B – Com o presente recurso, visa a Recorrente a alteração do entendimento jurídico vertido na sentença no que concerne à questão da prescrição, mormente saber em que data surgiram os danos e a partir de quando se inicia a contagem do prazo de prescrição a que alude o artigo 498º do Código Civil;
C – Na sentença e para o efeito de dar por verificada a exceção da prescrição, o Tribunal a quo entende que a contagem do aludido prazo se iniciou, pelo menos, em 07 de Fevereiro de 2006;
D – Para tanto, com relevância para a matéria em discussão e considerando a matéria de facto assente nos pontos 11 e 23, o Tribunal a quo considerou que a Autora, pelo menos desde a data da apresentação na CRPredial de Gondomar, da Ap. 19 de 07 de Fevereiro de 2005, tinha conhecimento do cancelamento da inscrição F3 [Ap. 151/110..., requerida pelo Ministério Público junto do Tribunal Judicial da Maia];
E – Desconsiderando o Tribunal a quo as várias vicissitudes processuais e judiciais (recurso hierárquico interposto para o Instituto dos Registos e Notariado e recurso contencioso interposto para o Tribunal Judicial de Gondomar e recurso interposto para o Tribunal da Relação do Porto) e suas repercussões na contagem do inicio do prazo prescricional a que alude o artigo 498º/1 do Código Civil, entendendo que o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto apenas põe termo a uma contenda jurídica envolvendo a Autora e a CRPredial sobre a viabilidade/legalidade dos pedidos registrais;
F – Nessa sequência, conclui o Tribunal a quo que se a Autora entendia que ao Réu estava assacado o poder/dever de pedir a renovação do registo da ação (ap. 151 de 110...), a responsabilização por essa sua omissão tinha de ocorrer no prazo de 3 anos a contar de 07 de Fevereiro de 2006, ou seja, até 07 de Fevereiro de 2009;
G – Por sua vez, a Recorrente entende que o prazo de prescrição de 3 anos a que alude o artigo 498º do Código Civil se iniciou a partir da data de 19 de Outubro de 2010, data em que ocorreu o trânsito em julgado do Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto;
H – O artigo 306º do Código Civil estipula que o prazo de prescrição começa a correr quando o direito puder ser exercido, sendo que o momento relevante para o início da contagem do prazo de prescrição é aquele em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete, isto é, a partir da data em conhece a verificação dos pressupostos que condicionam a responsabilidade e de que é juridicamente fundado o direito à indemnização;
I - O que significa que o início de contagem de tal prazo supõe que o lesado conheça os factos constitutivos do seu direito, isto é, saiba que o ato foi praticado ou omitido por alguém e que dessa prática ou omissão resultaram para si danos.
J – Sendo pacífico na jurisprudência que não há obrigação de indemnizar sem dano;
L – Ora, no caso em apreço, antes de ocorrer o trânsito em julgado do Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto não estavam verificados todos os pressupostos que legitimariam a Autora, aqui Recorrente, a interpor a ação administrativa comum para efetivação de responsabilidade civil extracontratual contra o Réu Estado Português;
M – Por ser incerto, antes dessa data, que se verificasse a existência do dano, face à possibilidade de o Tribunal da Relação do Porto vir a confirmar a sentença proferida pelo (extinto) Tribunal Judicial de Gondomar;
N – A decisão recorrida não deu qualquer relevância jurídica aos meios de reação processuais e judiciais utilizados pela ora Recorrente contra o despacho de recusa proferido pelo Exmo. Senhor Conservador da Conservatória do Registo Predial de Gondomar no que concerne aos registos apresentados em 07.02.2005 – Ap. 119 e Ap 20 e sua repercussão no início da contagem do prazo prescricional;
O- Não podendo, salvo o devido respeito, desconsiderar-se que a ora Recorrente utilizou todos os meios de reação ao seu alcance para reagir contra a recusa do pedido de cancelamento da inscrição G2 e que, ao invés do entendimento perfilhado pelo Tribunal a quo, o trânsito em julgado do Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, ocorrido em 19 de Outubro de 2010, não só põe termo a essa contenda jurídica registral;
P - Como define o momento a partir do qual à Recorrente assiste o direito de peticionar o ressarcimento dos danos patrimoniais e não patrimoniais que lhe causou a conduta omissiva do Ministério Público (por não ter pedido a renovação da inscrição F3, como era seu dever, antes de decorrido o prazo de 3 anos e a que faz referência o artigo 92º/3 do Código de Registo Predial, deixando caducar os seus efeitos por caducidade).
Q - Ficando, assim, a Recorrente T..., a partir desse momento, impedida de registar a sua aquisição em termos definitivos, tornando inútil a aquisição que fez no processo executivo e revelando-se totalmente inócua a decisão proferida na ação que correu trâmites no Tribunal Judicial da Maia, permitindo-se, ao arrepio da legalidade, que um individuo declarado contumaz celebre negócios jurídicos onerosos.
R – Razões pelas quais o prazo prescricional só se iniciou a partir de 19 de Outubro de 2010 data em que transitou em julgado o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto e a Autora, ora Recorrente, viu definitivamente arredada a possibilidade de o registo de aquisição de quinhão hereditário (Ap. 20 de 07022005) que apresentou produzir qualquer efeito útil, atenta a feitura dos registos que o antecedem e a que se reportam as inscrições G2, G3, C3 e C4;
S - Ora, com o devido respeito, que é muito, o Tribunal a quo não procedeu à rigorosa ponderação dos argumentos deduzidos pela Autora para sustentar a não verificação da exceção de prescrição;
T – O Tribunal a quo violou, por erro de interpretação e aplicação, o disposto no artigo 306º e 498º/1, ambos do Código Civil.
TERMOS EM QUE, com o suprimento, deve o presente recurso ser julgado procedente, revogando-se a decisão recorrida.
Como é de JUSTIÇA!
O Réu ofereceu contra-alegações, sem conclusões, terminando assim:
não merece censura a decisão recorrida, não padecendo de qualquer vício que lhe seja assacado, falecendo os argumentos contra ela invocados pela Recorrente, pelo que deve ser integralmente confirmada.
Negando-se provimento ao recurso, far-se-á
JUSTIÇA
Cumpre apreciar e decidir.
FUNDAMENTOS DE FACTO
Na decisão foi fixada a seguinte factualidade:
1 - Correu termos no 4.º juízo cível do Tribunal Judicial da Maia sob o Processo n.º 783/2002, ação declarativa, sob a forma sumária, instaurada pelo Ministério Público junto desse Tribunal em 31 de maio de 2002, contra CDRF e esposa AMRF, FMCRF e M... – Actividades Imobiliárias, Ld.ª, visando a declaração de nulidade do negócio jurídico de compra e venda titulado por escritura pública celebrada em 27 de março de 2000, no Cartório Notarial de Espinho, mediante a qual, os preditos CDRF, AMRF e FMCRF venderam à empresa “M... - Actividades Imobiliárias, Ld.ª”, o prédio urbano sito na Rua VG, n.º ..., da freguesia de Fânzeres, concelho de Gondomar, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 2342 e descrito na competente Conservatória sob o número 02752/290... – Cfr. doc. 1 junto com a Petição inicial;
2 - A referida ação foi instaurada pelo Procurador Adjunto subscritor da Petição Inicial, ao abrigo do disposto no artigo 337.º, n.ºs 1 e 2 do CPP e artigo 5.º, n.º 1 alínea g) da LOMP, uma vez que, aquando da celebração do sobredito negócio, o aludido CDRF havia sido declarado contumaz em vários processos de natureza criminal – Cfr. doc. 1 junto com a Petição inicial;
3 – O Magistrado do Ministério Público apresentou a registo a ação junto da competente conservatória do registo predial – ap. 151 de 11/07/2002 -, o qual foi lavrado provisório, por natureza, nos termos do artigo 92.º, n.º 1, alínea a) do Código Registo Predial, dando origem à inscrição F3, de 11 de julho de 2002 – Cfr. doc. 2 junto com a Petição inicial;
4 - No âmbito do referido processo judicial, foi proferida sentença datada de 02 de agosto de 2005, transitada em julgado, que decidiu julgar a ação procedente, por provada, e em consequência, além do mais, anular o negócio jurídico de compra e venda titulada pela escritura em apreço, e determinou o cancelamento da inscrição “G2” averbada na descrição predial n.º 027572/290... da...
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