Acórdão nº 02203/18.2BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 17-01-2020

Data de Julgamento17 Janeiro 2020
Número Acordão02203/18.2BEBRG
Ano2020
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Norte
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. RELATÓRIO

M.A.C.L. (devidamente identificada nos autos) instaurou em 02/10/2018 no Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga ação administrativa em que é réu o INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL, IP., na qual peticionou a condenação do réu: a) a reconhecer que as decisões constantes dos Doc.s nºs 5 e 6 juntos com a PI são inválidas; b) a pagar mensalmente à autora o complemento por dependência, bem como todos aqueles que deveria ter pago a esse título desde a data em que o requereu (Maio de 2017) até então, acrescidos de juros de mora legais a contar do vencimento de cada um deles até ao seu integral pagamento, a liquidar oportunamente; c) a reconhecer que não detém qualquer direito de sub-rogação sobre direito da identificada indemnização, no montante de 148.878,00€; d) a reconhecer que o autor, à data da apresentação do seu pedido de reforma reunia os requisitos legais necessários para a sua atribuição (pensão de velhice por antecipação).
A Mmª Juíza do Tribunal a quo absolveu o réu da instância com fundamento na verificação da exceção dilatória de intempestividade da prática de ato processual prevista no artigo 89º nº 4 alínea k) do CPTA.
Inconformada a autora interpôs o pressente recurso de apelação, pugnando pela revogação daquela decisão, com prosseguimento dos autos para conhecimento do mérito da ação, formulando as seguintes conclusões nos seguintes termos:
A. Segundo o art.° 333° CC a caducidade apenas é do conhecimento oficioso em sede de direitos indisponíveis, ou se for invocada pela parte que dela aproveita.
B. Não é este o caso, visivelmente, em que apenas estão em causa determinados direitos de crédito, de origem indemnizatória, depois de constituídos, não existindo nenhuma norma que impeça a sua renúncia ou a sua disposição - cfr. noção de "indisponível" em Ana Prata, Dicionário Jurídico, pagina 541
C. Mesmo que se considerasse que a matéria em causa versa sobre direitos indisponíveis, o tribunal só podia conhecer a caducidade, se ela fosse invocada; o que não sucedeu.
D. Acresce que, para apreciar a caducidade cumpria ao tribunal a quo, decidir antecipadamente se se verifica, em abstracto e nos termos em que foi invocada pela recorrente, o vício apontado, pois se concluísse pela nulidade do acto administrativo, nos termos das ai. a), d) g), i), k, e I) do artigo 161 do CPA, a acção seria tempestiva - artigo 58° n° 1 CPA.
E. O tribunal não dispunha de elementos suficientes para fixar a matéria de facto correspondente ao ponto 2, que até é contraditória pois ora admite a que a recorrente terá recebido a notificação a 28/06/2018, ora refere que a mesma confessou tal matéria no ponto 19° da sua pi.
F. Segundo o art.° 640° do CPC, importa desde já consignar que a resposta constante da matéria de facto dada como provada/fixada no ponto 2 deve ser alterada para "Não Provada" ou, no mínimo deve passar a ter o seguinte teor: "A recorrente desconhece em que dia recebeu a notificação referida no anterior ponto 1 da matéria fixada."
G. Com efeito, na sua pi, concretamente nos artigos 18° a 22°, foi alegado o seguinte (sublinhado nosso):
20. A recorrente não se recorda da data em que recebeu o doc. n.° 2 infra, objecto dos presentes autos. 21 Ora, do doc. 2 consta a data de 27/06/18, pelo que, no máximo, a recorrente poderia tê-la recebido no dia seguinte, ou seja 28/06/18.
24. À partida, segundo o art.° 58° n.° 1 al. b) CPTA, esta acção teria de ser proposta no prazo de 3 meses.
25. Consequentemente, a acção teria de ser proposta até 28 de Setembro, pelo que, no limite, o dia de hoje consubstancia o 2° dia útil com multa, para a propor.
26. Assim e a fim de não correr riscos, a recorrente junta o comprovativo do pagamento da multa correspondente ao 2° dia útil, embora, como acima se referiu, desconheça se a tal estará obrigada ou não.
H. Segundo o art.° 352° do CC "Confissão é o reconhecimento de que a parte faz da realidade de um facto que lhe é desfavorável e favorece a parte contrária".
I. Em lado algum da pi a recorrente confessa ou reconhece que recebeu a carta a 28/06/18; muito pelo contrário, a recorrente alega que não sabe em que dia a recebeu e que só liquida a multa à cautela, justamente porque desconhece a data da sua recepção e consequentemente se o prazo terminava ou não a 28/09/18.
J. Aliás, o ónus de provar a caducidade da acção nem sequer pertence à recorrente, pelo que, no mínimo, antes de decidir, o tribunal devia (ao abrigo dos artigos 6° e 7° CPC) notificar a recorrido para comprovar o dia a recorrente recebeu a carta - art.° 342° n.° 2 e 343° n.° 2 CC pois se não se provar o momento em que esta tomou conhecimento da carta, ao contrário do decidido pelo tribunal a quo, a acção terá de se considerar tempestiva.
K. O tribunal recorrido também se devia ter pronunciado acerca da consequência da omissão da audiência prévia, admitida pelo recorrido pois, em função do seu entendimento, a acção até poderia ser considerada prematura.
L. Com efeito, o art.° 163° n.° 5, al. c) CPA não se enquadra na situação dos autos porquanto, destinando-se a audiência dos interessados a permitir a sua participação nas decisões que lhes digam respeito, contribuindo para um cabal esclarecimento dos factos e uma mais adequada e justa decisão, a omissão dessa audição constitui preterição de uma formalidade legal conducente à nulidade da decisão, salvo se esta só pudesse, em abstracto, ter o conteúdo que teve em concreto e que, por isso se impunha, o seu aproveitamento pela aplicação daquele preceito legal; aproveitamento esse que terá sempre de ser efectuado por um exame casuístico, de análise das circunstâncias particulares e concretas de cada caso, com vista a aferir se se está ou não perante uma situação de absoluta impossibilidade de a decisão do procedimento ser influenciada pela audição da requerente.
M. No caso, lendo a contestação, é absolutamente notório que a recorrido ainda não compreendeu o cerne da questão, pelo que a audição da recorrente mostrava-se imprescindível e iria concerteza influenciar a tomada de decisão por parte da recorrido, pois daria oportunidade à recorrente de alegar, entre outras coisas que:
· A pi é clara: ao contrário do que refere o recorrido, à recorrente foi-lhe reconhecido o direito a receber a quantia de 171.941,00€, e não 148.878,00€, como aquele refere - cfr. acórdão cio STJ junto à pi sob o n.° 1.
· Como refere esse acórdão, há "um outro valor que esta tem direito a receber e que é o complemento de dependência de 1° grau atribuído a pensionistas de invalidez básica da vida quotidiana nomeadamente realização de serviços domésticos, apoio na alimentação, apoio à locomoção ou apoio nas necessidades de higiene. Considerando o seu valor mensal actual, de 101,68 e reportando ás dimensões temporais já ponderadas, ou seja os sobreditos 23 anos vezes 12 meses alcança-se um valor de € 28.063,00. Abatendo ao valor de € 171.941,00 encontra-se o de € 148.878,00." - cit. doc. 1
· Ao recorrido não assiste qualquer direito de subrogação sobre a quantia de 148.878,00€, visto que não foi apenas esta a quantia que lhe foi atribuída, mas antes 171.941,00€.
· O recorrido inculca em erro quando diz que a recorrente pretende receber duas vezes o mesmo direito, pois como se vê, o que esta reclama daquele são os 28.063,00€, acima referidos, ou seja a diferença entre aquilo que tem direito a receber e aquilo que recebeu.
· A recorrente só pretende receber a pensão ordenada pelo STJ, na sua decisão, transitada em julgado, pelo que se a recorrido entender que lhe assiste algum direito de subrogação terá de o fazer junto da companhia de seguros responsável, mas nunca sobre a recorrente.
· Só desta forma é que se respeita o principio geral do não locupletamento à custa alheia e do enriquecimento sem causa, pois de outro modo ocorreria uma grave distorção da unidade jurídica do sistema jurídico, se ao recorrido coubesse o direito de negar (a pensão referida) e retirar (aos 148.878,00€) à recorrente os direitos que lhe foram pessoal e judicialmente reconhecidos por acórdão, transitado em julgado.
N. A violação deste direito ofendeu gravemente o conteúdo essencial de direitos fundamentais nomeadamente os referidos nos artigos 63° n.° 3, 64°, 71°, 202° e 205° n.° 2 CRP) devendo, pois, ser sancionada com a nulidade, que é invocável a todo o tempo (artigo 161° n.° 1, al. a), d), g), i), k, e I) d e n.° 2 do CPA), sob pena de inadmissível denegação da justiça.
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Não foram apresentadas contra-alegações.
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Remetidos os autos a este Tribunal em recurso, neste notificado, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 146º e 147º do CPTA, a Digna Magistrada do Ministério Público emitiu Parecer no sentido de o recurso não merecer provimento, nos seguintes termos:

«I- Inconformada com a sentença do TAF de Braga que julgou improcedente a impugnação administrativa intentada por M.A.C.L. contra “Instituto da Segurança Social ,IP_ Centro Nacional de Pensões”, que absolveu o Réu da instância por entender que a acção de impugnação era intempestiva, a Autora veio interpor recurso para este TCA com os fundamentos indicados nas conclusões das suas alegações, que aqui se dão por reproduzidas.
II - Compulsados os autos, afiguram-se-nos que são 3 as questões a dirimir:
1ª - Saber se houve erro da sentença ao fixar como facto provado que a Autora recebeu a carta para notificação do despacho administrativo no dia 28.06.2018.
2ª - Saber se, findos os articulados, o tribunal tinha elementos suficientes para concluir que à data da entrada em juízo da P.I 02.10.2081, o direito à impugnação estava já caducado.
3ª - Saber se a caducidade do direito à acção pode ser do conhecimento oficioso do tribunal, mesmo que o Réu a não tenha invocado, como sucedeu no caso em apreço.
III - Salvo melhor...

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