Acórdão nº 01788/17.5BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 12-01-2018

Data de Julgamento12 Janeiro 2018
Número Acordão01788/17.5BEPRT
Ano2018
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Norte
Acordam em conferência os juízes da 1ª Secção do Tribunal Central Administrativo Norte:
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RELATÓRIO
PRESIDENTE DA CÂMARA MUNICIPAL DO PORTO veio interpor recurso da sentença do TAF do PORTO que no presente processo de natureza urgente contra MDPC indeferiu o pedido de emissão de mandado judicial para entrada no prédio sito na Avenida ….., nº 164, 4000-420 Porto.
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Conclusões do Recorrente:
A. Vem o presente recurso interposto da douta sentença que decidiu indeferir o pedido de emissão de mandado judicial, por ser manifesta a falta de fundamento legal para a pretensão do Recorrente.
B. A sentença recorrida enferma de erro de julgamento por errónea interpretação e aplicação do artigo 95°, n.º 2 e 3 e RJUE, com a necessária consequência de ser revogada a decisão recorrida.
C. Para tanto, entendeu o tribunal a quo recorrer ao Acórdão n.º 195/2016, de 23 de maio, do Tribunal Constitucional, que decidiu julgar inconstitucional a norma extraída do artigo 95°, n.º 2 do decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de outubro (Regime Jurídico de Urbanização e Edificação - doravante designado de RJUE).
D. Contudo, e pese embora a existência de alguns acórdãos no mesmo sentido do próprio Tribunal Constitucional, existem boas e fortes razões para se defender um entendimento diferente.
E. Desde logo, porque, hoje, encontra-se esta questão resolvida.
F. Os funcionários municipais incumbidos da fiscalização de operações urbanísticas podem realizar inspeções aos locais sujeitos à fiscalização prevista no RJUE, sem prejuízo da obtenção de prévio mandado judicial para a entrada no domicílio de qualquer pessoa sem o seu consentimento, com vista à salvaguarda de um nível aceitável de qualidade de vida no território.
G. Aquele mandado judicial é, nos termos do artigo citado, concedido pelos tribunais administrativos, a pedido do presidente da câmara municipal.
H. O controlo judicial envolvido no mandado judicial não implica um escrutínio de mérito sobre a decisão administrativa tomada, antes se assemelhando à aposição de um visto formal, mediante o qual o juiz controla a compatibilidade da decisão administrativa com alguns parâmetros jurídicos que permitem afirmar o cumprimento de prescrições e exigências de ordem pública.
I. É certo que o Tribunal Constitucional, no Acórdão n.º 195/2016, de 23 de maio, decidindo 'julgar inconstitucional, por violação do disposto na alínea b), do n.º 1, do artigo 165.°, da Constituição da República Portuguesa, a norma, extraída do artigo 95.°, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de outubro (RJUE), que permite a realização de inspeções ao domicílio de qualquer pessoa, sem o seu consentimento, nos termos e para os efeitos do referido diploma, ainda que sem a dispensa de prévio mandado judicial".
J. Porém, a inconstitucionalidade em causa foi declarada em sede de fiscalização concreta da constitucionalidade, pelo que a decisão de inconstitucionalidade tem efeitos restritos à causa submetida a julgamento (eficácia inter partes) e não vincula nem o próprio tribunal que a proferiu nem os demais tribunais que, porventura, tenham de julgar questões similares no futuro.
K. É que, nesse mesmo acórdão, invoca-se que “o Decreto-Lei n. ° 555/99 - editado ao abrigo da Lei n.º 110/99, de 3 de agosto, que autorizou o Governo a legislar, no âmbito do desenvolvimento da Lei de Bases do Ordenamento do Território e do Urbanismo, em matéria de atribuições das autarquias locais no que respeita ao regime de licenciamento municipal de loteamentos urbanos e obras de urbanização e de obras particulares. [...] Percorridas as alíneas do artigo 2.° da Lei, é de concluir que nenhuma delas constituía credencial parlamentar bastante para o Governo editar norma que atribuísse ao juiz da comarca competência para a concessão de mandado para entrada em domicílio de pessoa que não dê o seu consentimento, no qual se desenvolvam atividades sujeitas a fiscalização por parte de funcionários municipais”.
L. Conclui-se, por isso, que a norma, cuja constitucionalidade se sindicava, era inovatória, carecendo, por isso, de específica credencial parlamentar, que não foi concedida pela Lei n.º 110/99, de 3 de agosto, quanto à admissibilidade de restrição ao direito à inviolabilidade do domicílio.
M. O raciocínio exposto foi corroborado, ainda, pelo Acórdão n.º 160/2012, quanto à não sanação do vício de inconstitucionalidade orgânica, por força da republicação determinada pelo artigo 4.° da Lei n.º 60/2007, de 4 de setembro, nos seguintes termos: “Na verdade, a mera republicação de decreto-lei governamental, sem que seja acompanhada de alteração do(s) preceito(s) anteriormente ferido(s) de inconstitucionalidade orgânica, constitui um mero expediente de técnica legística, que visa facilitar a apreensão do conteúdo normativo dos atos legislativos, sem que signifique uma integral novação de toda e cada uma das normas constantes do diploma republicado. Diferente seria, caso a Lei n.º 60/2007 tivesse procedido a uma revogação global do decreto-lei em causa, mediante aprovação de um novo texto normativo, ainda que este recuperasse uma parcela significativa das normas anteriormente vigentes. Não foi isso, porém, o que sucedeu”.
N. Entretanto, tendo em conta a publicação do Decreto-Lei n.º 214-G/2015, de 2 de outubro, que procedeu à alteração do CPTA e de outros diplomas legais, entre os quais o RJUE, com o objetivo de clarificar algumas regras procedimentais e de competência, vindo dar uma nova redação ao artigo 95°, n.º 3, isto é, reconhecendo aos tribunais administrativos a competência para conceder mandado para entrada em domicílio de pessoa que não dê o seu consentimento, no qual se desenvolvam atividades sujeitas a fiscalização por parte de funcionários municipais, considera-se que o entendimento resultante de tal decisão constitucional não deverá ser transponível, sem mais, para o caso dos autos.
O. É que este diploma...

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